
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004461-05.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA
APELANTE: BERNADETE MARETTI BRUSCHI
Advogado do(a) APELANTE: LUIS MANOEL FULGUEIRAL BELL - SP328766-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004461-05.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA
APELANTE: BERNADETE MARETTI BRUSCHI
Advogado do(a) APELANTE: LUIS MANOEL FULGUEIRAL BELL - SP328766-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Exma. Desembargadora Federal SILVIA ROCHA (Relatora):
Trata-se de agravo interno interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS em face de decisão monocrática (ID 331341119), nos autos da Ação Declaratória de Tempo de Serviço cumulada com Pedido de Aposentadoria Integral por Tempo de Serviço, movida por Bernadete Maretti Bruschi.
A decisão agravada deu provimento à apelação interposta pela autora, reformando a sentença que havia reconhecido apenas parcialmente o tempo de serviço rural. A decisão singular reconheceu, com base em início de prova material corroborado por prova testemunhal, o período de labor rural desde 1982, determinando a concessão da aposentadoria integral por tempo de serviço, com DER em 21/08/2015, além da condenação do INSS ao pagamento de honorários advocatícios.
Em suas razões recursais (ID 332625950), o agravante, INSS, sustenta, em síntese:
(i) ausência de início de prova material contemporânea ao período anterior a 1985, desatendendo os critérios do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/1991;
(ii) impossibilidade de extensão dos efeitos de documentos posteriores (CTPS e CNIS) a períodos anteriores sem comprovação documental direta;
(iii) afronta à Súmula nº 149 do C. STJ e entendimento jurisprudencial pacífico de que não se admite prova exclusivamente testemunhal para reconhecimento de tempo de serviço;
(iv) ausência de precisão quanto ao período reconhecido na decisão monocrática, além de argumentos jurídicos baseados na violação de precedentes do C. STJ sobre início de prova material e segurança jurídica nas relações previdenciárias.
Ao final, requer a reforma da decisão agravada, com a exclusão do período anterior a 1985 do cômputo do tempo de serviço, e, caso não provido o recurso, o encaminhamento ao órgão colegiado para apreciação.
Em contraminuta (ID 334211557), a agravada, Bernadete Maretti Bruschi, requer a manutenção da decisão monocrática, alegando:
(i) que demonstrou início de prova material (CTPS e CNIS) complementado por prova testemunhal robusta e coerente, confirmando labor rural desde 1982;
(ii) que a jurisprudência atual admite a comprovação do labor rural com base em prova testemunhal em casos excepcionais, sobretudo nos casos de trabalhadores avulsos/boias-frias;
(iii) que houve preclusão por parte do INSS em não impugnar oportunamente a decisão anterior e que o agravo representa tentativa protelatória de rediscutir matéria já decidida.
Ao final, pugna pelo não provimento do agravo interno.
É o relatório.
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004461-05.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA
APELANTE: BERNADETE MARETTI BRUSCHI
Advogado do(a) APELANTE: LUIS MANOEL FULGUEIRAL BELL - SP328766-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Exma. Desembargadora Federal SILVIA ROCHA (Relatora):
O presente agravo interno não merece acolhimento.
Inicialmente, cumpre observar que a decisão monocrática proferida por esta relatoria deu provimento à apelação da parte autora, reconhecendo o tempo de labor rural no período compreendido entre 01/01/1982 a 31/12/1984, com base em início de prova material robustecido por prova testemunhal harmônica e coerente, ensejando a concessão do benefício de aposentadoria integral por tempo de serviço, com D.E.R. em 21/08/2015.
Em sua insurgência, o INSS alega, em síntese, que:
- não haveria início de prova material contemporânea ao período anterior a 1985, em afronta ao artigo 55, §3º, da Lei nº 8.213/91;
- os documentos apresentados dizem respeito a períodos posteriores e não poderiam, portanto, retroagir para comprovar atividade anterior;
- seria inviável a comprovação da atividade rural exclusivamente por prova testemunhal, nos termos da Súmula 149 do STJ;
- a decisão monocrática careceria de precisão quanto aos marcos temporais reconhecidos.
Nada obstante os argumentos expendidos, constata-se que a insurgência deduzida pelo agravante não traz elementos novos ou aptos a infirmar os fundamentos lançados na decisão agravada, limitando-se à mera reprodução de teses já enfrentadas e devidamente repelidas.
Cumpre observar que o C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.348.633-SP (Tema 638), firmou posicionamento no sentido de ser possível o reconhecimento do "tempo de serviço rural mediante apresentação de um início de prova material sem delimitar o documento mais remoto como termo inicial do período a ser computado, contanto que corroborado por testemunhos idôneos a elastecer sua eficácia" (Primeira Seção, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, por maioria, j. 28/08/2013, DJe 05/12/14).
Destarte, o conjunto probatório colacionado aos autos — notadamente a Carteira de Trabalho e o Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) — constitui válido início de prova material, cuja força probante foi amplamente corroborada pelo depoimento das testemunhas ouvidas em audiência, que foram uníssonas ao reconhecer o exercício de labor rural pela autora desde 1982.
Acrescente-se que aquele C. Tribunal Superior, ao apreciar o Tema Repetitivo nº 554 (REsp nº 1.321.493/PR), firmou posicionamento no sentido de em casos de trabalhadores rurais boias-frias ou diaristas, a mitigação da exigência de prova documental contemporânea, dado o caráter informal das relações de trabalho e a dificuldade de produção documental:
“Aplica-se a Súmula 149/STJ ('A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário') aos trabalhadores rurais denominados 'boias-frias', sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal."
Demais disso, a alegação de imprecisão quanto ao período reconhecido não prospera, pois a decisão agravada delimita expressamente o período de 01/01/1982 a 31/12/1984 como reconhecido, ensejando o cômputo necessário à concessão do benefício.
Por fim, não se verifica qualquer obscuridade ou omissão na decisão ora combatida, tampouco negativa de vigência a dispositivos legais. O agravo interno veicula mera irresignação com o resultado do julgamento monocrático, sem, contudo, atacar especificamente os fundamentos nele lançados, em afronta ao art. 1.021, § 1º, do CPC.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno, mantendo-se, mantendo-se, em sua integralidade, a decisão monocrática que deu provimento à apelação da parte autora.
É como voto.
Ementa: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. PROVA TESTEMUNHAL EM CONSONÂNCIA COM DOCUMENTAÇÃO. NÃO PROVIMENTO.
I. CASO EM EXAME
1. Agravo interno interposto contra decisão monocrática que deu provimento à apelação da parte autora, reconhecendo o exercício de atividade rural no período de 01.01.1982 a 31.12.1984, com base em início de prova material corroborada por prova testemunhal, concedendo aposentadoria integral por tempo de serviço com D.E.R. em 21.08.2015.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. A questão em discussão consiste em saber se é válida a decisão que reconhece tempo de serviço rural anterior a 1985 com base em prova testemunhal harmônica e início de prova material não contemporâneo, especialmente diante do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/1991 e da Súmula 149 do STJ.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. O Recurso Especial Repetitivo nº 1.348.633/SP (Tema 638/STJ) admite a extensão do início de prova material a períodos anteriores, desde que corroborado por prova testemunhal idônea.
4. No caso dos trabalhadores rurais boias-frias, admite-se a mitigação da exigência de prova documental contemporânea, conforme Tema 554/STJ, sendo suficiente a combinação de início de prova material com robusta prova testemunhal.
5. A decisão agravada delimitou expressamente o período reconhecido e enfrentou adequadamente todas as teses invocadas, inexistindo obscuridade, omissão ou negativa de vigência legal.
IV. DISPOSITIVO E TESE
6. Agravo interno conhecido e não provido.
Tese de julgamento: “1. É possível o reconhecimento de tempo de serviço rural com base em início de prova material não contemporâneo ao período laborado, desde que corroborado por prova testemunhal idônea. 2. A ausência de prova documental sobre parte do período não inviabiliza o reconhecimento da atividade rural, notadamente em casos de trabalhadores boias-frias.”
Dispositivos relevantes citados: Lei nº 8.213/1991, art. 55, § 3º; CPC, art. 1.021, § 1º.
Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1.348.633/SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 1ª Seção, j. 28.08.2013, DJe 05.12.2014; STJ, REsp nº 1.321.493/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª Turma, j. 13.03.2013, DJe 18.04.2013; Súmula 149/STJ
ACÓRDÃO
Desembargadora Federal
