
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003762-60.2022.4.03.6106
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VALDIR ACACIO MARTINS
Advogados do(a) APELADO: FABRICIO JOSE DE AVELAR - SP191417-N, RENAN JOSE TRIDICO - SP329393-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003762-60.2022.4.03.6106
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VALDIR ACACIO MARTINS
Advogados do(a) APELADO: FABRICIO JOSE DE AVELAR - SP191417-N, RENAN JOSE TRIDICO - SP329393-N
R E L A T Ó R I O
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL CONVOCADA LUCIANA ORTIZ (RELATORA): Trata-se de apelação interposta contra a sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos deduzidos na inicial, nos seguintes termos:
"(...)
Diante do exposto, e considerando tudo mais que dos autos consta, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, resolvendo o mérito, com fulcro nas disposições do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para declarar a especialidade das atividades desenvolvidas pelo autor nos períodos de 06/01/1985 a 30/09/1987 e 13/10/1987 a 30/09/1989 (motorista - Frigorífico Avícola Guapiaçu Ltda), de 18/10/1989 a 23/10/1989 (motorista – Cizelda Martins ME), 01/11/1989 a 31/10/1991 (motorista – Frango Seranejo Ltda), e de 01/11/1991 a 03/04/1995 (motorista - Frigorífico Guapiasuínos Ltda) - pelo enquadramento na categoria profissional tratada no item 2.4.4, do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64.
Reconheço, também, a possibilidade de conversão dos intervalos de labor acimas citados (06/01/1985 a 30/09/1987, 13/10/1987 a 30/09/1989, 18/10/1989 a 23/10/1989, 01/11/1989 a 31/10/1991 e de 01/11/1991 a 03/04/1995), de tempo especial em tempo comum, com a aplicação do fator de conversão 1,40 (art. 64, do Decreto 611/92 e art. 70, do Decreto 3.048/99), devendo o INSS providenciar a correspondente averbação.
Custas ex lege.
Em suas razões de apelação, sustenta o INSS: que a sentença deve ser parcialmente reformada em relação aos intervalos de 06/01/1985 a 30/09/1987 (motorista); 18/10/1989 a 23/10/1989 (motorista); 01/11/1991 a 03/04/1995 (motorista/vendedor), diante da inexistência de outra prova, que não seja a CTPS, sendo insuficiente para o reconhecimento da atividade especial de motorista, tal como previsto em lei, a documentação acostada aos autos.
Com contrarrazões, os autos foram remetidos a esta E. Corte Regional.
É O RELATÓRIO.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003762-60.2022.4.03.6106
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VALDIR ACACIO MARTINS
Advogados do(a) APELADO: FABRICIO JOSE DE AVELAR - SP191417-N, RENAN JOSE TRIDICO - SP329393-N
VOTO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL CONVOCADA LUCIANA ORTIZ (RELATORA): Por primeiro, recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Codex processual.
DO TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS - CONSIDERAÇÕES INICIAIS.
Em linhas gerais, até o advento da EC 103/2019, a aposentadoria especial era devida após 180 contribuições, para os trabalhadores expostos a condições prejudiciais à saúde por 15, 20 ou 25 anos.
Até 28.04.1995, a especialidade poderia ser reconhecida sem comprovação da exposição, desde que a atividade estivesse enquadrada nos decretos n° 53.831/64 ou n° 83.080/1979, sendo possível e desejável o uso de analogia, para considerar a inserção de determinada categoria profissional, aproximando os diversos grupos de trabalhadores que se enquadrem em atividades assemelhadas, a fim de evitar situações injustas, acarretando sua não aplicação.
Após 28.04.1995, com o advento da Lei 9.032/1995, o segurado passou a ter que comprovar a exposição permanente a agentes prejudiciais à saúde, de forma permanente, não ocasional nem intermitente; entendendo-se como permanente, o trabalho em que a exposição ao agente nocivo é indissociável da produção ou serviço.
As condições especiais de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT), sem prejuízos de outros meios de prova, sendo de se frisar que apenas a partir da edição do Decreto 2.172, de 05.03.1997, tornou-se exigível a apresentação de laudo técnico a corroborar as informações constantes nos formulários, salvo para o agente ruído e calor, que sempre exigiu laudo técnico. Todavia, consoante entendimento já sufragado por esta Turma, por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei n 9.528, de 10/12/1997.
O artigo 58 da Lei 8.213/91 dispõe que cabe ao Poder Público definir quais agentes configuram o labor especial e a forma como este será comprovado. A relação dos agentes reputados nocivos pelo Poder Público é trazida, portanto, por normas regulamentares consideradas exemplificativas (Tema Repetitivo 534, REsp 1306113/SC), de que é exemplo o Decreto n. 2.172/97. Assim, se a atividade exercida pelo segurado realmente importar em exposição a fatores de risco, ainda que ela não esteja prevista em regulamento, é possível reconhecê-la como especial.
A partir de 01.01.2004, é obrigatório o fornecimento do PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário aos segurados expostos a agentes nocivos, documento que retrata o histórico laboral do segurado, evidencia os riscos do respectivo ambiente de trabalho e consolida as informações constantes nos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral antes mencionados.
Diante das inúmeras alterações dos quadros de agentes nocivos, a jurisprudência reconhece como especial o trabalho que assim era considerado pela legislação em vigor na época (Recurso Especial nº 1.398.260/PR – Tema 694/STJ).
A conversão do tempo de trabalho deve seguir a legislação vigente no momento do requerimento administrativo (Tese Repetitiva 546, REsp 1310034/PR).
Nos termos do artigo 57, §5°, da Lei 8.213/91, admite-se a conversão de tempo de atividade especial para comum, devendo-se observar a tabela dos multiplicadores prevista no artigo 70, do Decreto 3.048/99.
A EC 103/2019, por sua vez, proibiu a conversão do tempo especial em comum para atividades após 13/11/2019, não sendo o art. 57, § 5º, da lei 8.213/91, recepcionado pela reforma constitucional (art. 201, §14, da CF e art. 25, caput, e §2º da referida Emenda).
No tocante ao uso de Equipamento de Proteção Individual - EPI, o E. STF assentou a tese de que não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, situação que não se aplica ao agente nocivo ruído (ARE 664335).
Pode-se concluir que (i) a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter exercido trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o labor exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
DOS MEIOS DE COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE ESPECIAL
Até 28/04/1995, é possível a subsunção da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova.
À sua vez, partir de 29/04/1995, é indispensável comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, de maneira habitual e permanente, por formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de 06/03/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP), devidamente preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica.
Com efeito, foi a Lei nº 9.528, de 10/12/1997 ue efetivamente estabeleceu as regulamentações previstas no Decreto nº 2.172, de 05/03/1997 (publicado em 06/03/1997), e que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e/ou pela monitoração
Para períodos laborados a partir de janeiro de 2004, o único formulário aceito pelo INSS é o PPP, cuja existência substitui os demais formulários anteriores.
NO CASO CONCRETO
Apela o INSS do reconhecimento como atividade especial do intervalo de 06/01/1985 a 30/09/1987 (motorista); 18/10/1989 a 23/10/1989 (motorista); e 01/11/1991 a 03/04/1995 (motorista/vendedor).
Quanto aos períodos sobre os quais remanesce controvérsia, os elementos residentes nos autos revelam o seguinte:
- de 06/01/1985 a 30/09/1987 (motorista) e de 18/10/1989 a 23/10/1989 (motorista); a cópia da CTPS de id Num. 293741692 - Pág.04, registra o cargo de motorista junto ao Frigorífico Avícola Guapiaçu Ltda;
- de 01/11/1991 a 03/04/1995 (motorista/vendedor) junto a "Frango Sertanejo Ltda;
Com efeito, jurisprudência desta C. Turma é firme em reconhecer que, até 28.04.1995, é possível o reconhecimento da especialidade do labor do motorista e do cobrador de ônibus, independentemente da comprovação da exposição do segurado a agentes nocivos, eis que o Decreto n° 53.831/64, anexo I, item 2.4.4, e o Decreto n° 83.080, de 24.01.79, no item 2.4.2, enquadravam as atividades de motorista de ônibus/de carga e cobrador como especiais.
Não é de ser reconhecida a especialidade do labor desempenhado nos períodos em questão eis que não foram apresentados laudos técnicos, formulários PPP ou qualquer outro documento descrevendo a exposição a agente agressivo. Tampouco foi produzida prova pericial ou testemunhal.
É certo que a jurisprudência desta C. Turma é firme em reconhecer que até 28/04/1995 é possível o reconhecimento da especialidade do motorista de caminhão, por enquadramento profissional,nos Códigos 2.4.4 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64 e 2.4.2 do Anexo II do Decreto nº 83.080/79.
Contudo, a presunção de insalubridade só perduraria até a edição da Lei nº 9.032/95, que passou a exigir a comprovação do exercício da atividade por meio dos formulários de informações sobre atividades com exposição a agentes nocivos ou outros meios de provas.
Demais disso, na singularidade do caso, sequer existe a comprovação de que o autor era, de fato, nos interstícios, motorista de ônibus ou caminhão, inexistindo, demais disso, a previsão legal da categoria "motorista/vendedor" referente ao período de 01/11/1991 a 03/04/1995.
Logo, não comprovada a exposição a agentes, deve ser reformada a sentença recorrida que reconheceu tais intervalos como especial, devendo INSS averbar tais intervalos como labor comum.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à Apelação do INSS, nos termos expendidos no voto.
É COMO VOTO.
/gabiv/...
E M E N T A
Ementa: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. MOTORISTA. AUSÊNCIA DE PROVAS. RECURSO PROVIDO.
I. CASO EM EXAME
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Apelação interposta pelo INSS contra sentença que reconheceu o período de 06/01/1985 a 30/09/1987, 18/10/1989 a 23/10/1989, e 01/11/1991 a 03/04/1995 como atividade especial para fins de aposentadoria por tempo de contribuição. O autor alegava exercício da função de motorista em condições especiais que permitiriam a contagem diferenciada do tempo de serviço.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
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A questão em discussão consiste em determinar se o autor comprovou o exercício de atividade especial como motorista no período reivindicado, de forma a ensejar a contagem de tempo de serviço com condições diferenciadas para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
III. RAZÕES DE DECIDIR
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Até 28/04/1995, é possível reconhecer a atividade de motorista de caminhão como especial por enquadramento profissional nos Códigos 2.4.4 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64 e 2.4.2 do Anexo II do Decreto nº 83.080/79.
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Após a edição da Lei nº 9.032/95, passa-se a exigir a comprovação do exercício da atividade especial por meio de formulários de informações sobre atividades com exposição a agentes nocivos ou outros meios de prova, como laudos técnicos ou formulários PPP.
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No caso concreto, o autor não apresentou laudos técnicos, formulários PPP, ou qualquer outro documento que comprovasse a exposição a agentes nocivos, nem produziu prova pericial ou testemunhal.
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A jurisprudência admite o reconhecimento da atividade especial do motorista até 28/04/1995, mas, no caso em análise, não há comprovação suficiente da atividade específica exercida pelo autor nos períodos em questão, tampouco previsão legal para a categoria "motorista/vendedor".
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Não comprovada a exposição a agentes nocivos nos períodos alegados, não se pode reconhecer tais intervalos como tempo especial.
IV. DISPOSITIVO E TESE
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Recurso provido.
ACÓRDÃO
JUÍZA FEDERAL
