Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5003980-22.2017.4.03.6120
Relator(a)
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
21/08/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 25/08/2020
Ementa
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. REGRA “85/95”. REQUISITOS PREENCHIDOS. APELAÇÃO
PROVIDA.
1. O mandado de segurança é a ação constitucional, prevista no artigo 5º, inciso LXIX, da Carta
Magna, cabível somente em casos de afronta a direito líquido e certo, conforme se depreende de
seu texto: "conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não
amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso
de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder
Público".
2. Observo pelos documentos juntados aos autos que o "writ" veio instruído com a prova pré-
constituída necessária à comprovação do direito vindicado pelo impetrante.
3. Ressalte-se que, o fato de haver recurso administrativo pendente de julgamento, não obsta, per
si, a apreciação do presente mandamus, tendo em vista que, a omissão de autoridade coatora em
praticar determinado ato devido já configura lesão a direito líquido e certo, de nada adiantando o
recurso com efeito suspensivo, o qual apenas assegura a manutenção da situação questionada.
4. A concessão da aposentadoria por tempo de serviço, hoje tempo de contribuição, está
condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91.
5. Cumpre observar que a Medida Provisória n. 676, de 17.06.2015 (D.O.U. de 18.06.2015),
convertida na Lei n. 13.183, de 04.11.2015 (D.O.U. de 05.11.2015), inseriu o artigo 29-C na Lei n.
8.213/91 e criou hipótese de opção pela não incidência do fator previdenciário, denominada
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
"regra progressiva 85/95", quando, preenchidos os requisitos para a aposentadoria por tempo de
contribuição, a soma da idade do segurado e de seu tempo de contribuição, incluídas as frações,
for:
a) igual ou superior a 95 (noventa e cinco pontos), se homem, observando o tempo mínimo de
contribuição de trinta e cinco anos;
b) igual ou superior a 85 (oitenta e cinco pontos), se mulher, observando o tempo mínimo de
contribuição de trinta anos.
6. Ademais, as somas referidas no caput e incisos do artigo 29-C do Plano de Benefícios
computarão "as frações em meses completos de tempo de contribuição e idade" (§ 1º), e serão
acrescidas de um ponto ao término dos anos de 2018, 2020, 2022, 2024 e 2026, até atingir os
citados 90/100 pontos.
7. Ressalve-se, ainda, que ao segurado que preencher o requisito necessário à concessão do
benefício de aposentadoria por tempo de contribuição sem a aplicação do fator previdenciário
será assegurado o direito à opção com a aplicação da pontuação exigida na data do cumprimento
do requisito, ainda que assim não o requeira, conforme disposto no artigo 29-C, § 4º, da Lei
8.213/1991.
8. No presente caso, da análise dos documentos juntados aos autos, e de acordo com a
legislação previdenciária vigente à época, a parte autora comprovou o exercício de atividades
especiais nos períodos de:
- de 11/02/1980 a 06/12/2016, vez que exercia a função de “técnico agrícola”, nos setores de
laboratório de sanidade animal, gado de corte, curral de gado de corte, manejo de rebanho e de
gado, na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, estando exposto a agentes biológicos,
enquadrados no código 1.3.2, Anexo III do Decreto nº 53.831/64, código 1.3.4, Anexo II do
Decreto nº 83.080/79, código 3.0.1, Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 e código 3.0.1, Anexo IV do
Decreto nº 3.048/99 (Perfil Profissiográfico Previdenciário, id. 64247579).
9. Assim, deve o INSS computar como atividade especial os períodos acima, convertendo-os em
atividade comum.
10. Portanto, computando-se os períodos de atividade especial reconhecidos na r. sentença
recorrida, somados aos demais períodos de atividade comum constantes da sua CTPS, até o
requerimento administrativo (29/08/2016, id. 64247580 - Pág. 2), perfazem-se mais de 50
(cinquenta) anos, bem como totalizou a parte autora a idade de 53 anos de idade, atingindo mais
de 95 pontos, suficientes para a obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição sem a
aplicação do fator previdenciário, na forma prevista no art. 29-C da Lei 8.213/1991.
11. Assim, faz jus a autor à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição
na forma prevista no art. 29-C da Lei 8.213/1991, desde o pedido administrativo, momento em
que o INSS ficou ciente da pretensão.
12. Deixo de deferir a antecipação da tutela, pois o autor recebe aposentadoria por tempo de
contribuição deferida pelo INSS em 29/08/2016 (NB 42/ 1784380277), devendo optar pelo
benefício mais vantajoso.
13. Cabe ressaltar que as parcelas vencidas entre a data do requerimento administrativo e a
impetração do mandamus deverão ser reclamadas administrativamente ou por via judicial própria,
nos termos do artigo 14, § 4º, da Lei nº 12.016/2009 e das Súmulas do STF (Enunciados 269 e
271), tendo em vista que o mandado de segurança não é o meio adequado à cobrança de valores
em atraso, nem pode criar efeitos financeiros pretéritos.
14. Apelação da Impetrante provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5003980-22.2017.4.03.6120
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: NACIR EDSON PARANHOS
Advogado do(a) APELANTE: VICTOR RODRIGUES SETTANNI - SP286907-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5003980-22.2017.4.03.6120
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: NACIR EDSON PARANHOS
Advogado do(a) APELANTE: VICTOR RODRIGUES SETTANNI - SP286907-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO (RELATOR):
Trata-se de writ impetrado por NACIR EDSON PARANHOS, em face de ato atribuído ao Chefe da
Agência do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em Araraquara/SP, objetivando que seja a
autoridade impetrada determinada a reconhecer a atividade especial exercida de 11/02/1980 até
a presente data, ou, alternativamente, entre 11/02/1980 a 28/04/1995, e conceder-lhe o benefício
de aposentadoria por tempo de contribuição, desde 29/08/2016, sem a incidência do fator
previdenciário.
Sobreveio sentença denegando a segurança, extinguindo o feito com resolução de mérito, nos
termos do art. 487, I do CPC.
Sem condenação em honorários advocatícios. Sem custas.
A parte autora apresentou apelação, requerendo o reconhecimento da especialidade das
atividades exercidas de 11/02/1980 até a presente data, ou, alternativamente, de 11/02/1980 a
28/04/1995, com a DER em 29/08/2016, e conceder-lhe o benefício de aposentadoria por tempo
de contribuição, sem a incidência do fator previdenciário.
Sem as contrarrazões subiram os autos a esta E. Corte.
O Ministério Público opinou pelo desprovimento do recurso interposto (id. 73216024 - Pág. 5).
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5003980-22.2017.4.03.6120
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: NACIR EDSON PARANHOS
Advogado do(a) APELANTE: VICTOR RODRIGUES SETTANNI - SP286907-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO (RELATOR):
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado se mostra formalmente regular,
motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação
(art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e
inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o e passo a apreciá-lo nos termos do artigo 1.011
do Código de Processo Civil.
Passo ao mérito.
O mandado de segurança é a ação constitucional, prevista no artigo 5º, inciso LXIX, da Carta
Magna, cabível somente em casos de afronta a direito líquido e certo, conforme se depreende de
seu texto: "conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não
amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso
de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder
Público".
A ação mandamental pode ser utilizada em matéria previdenciária, desde que vinculada ao
deslinde de questões unicamente de direito ou que possam ser comprovadas exclusivamente por
prova documental apresentada de plano pela parte impetrante para a demonstração de seu
direito líquido e certo.
Observo pelos documentos juntados aos autos que o "writ" veio instruído com a prova pré-
constituída necessária à comprovação do direito vindicado pelo impetrante.
Ressalte-se que, o fato de haver recurso administrativo pendente de julgamento, não obsta, per
si, a apreciação do presente mandamus, tendo em vista que, a omissão de autoridade coatora em
praticar determinado ato devido já configura lesão a direito líquido e certo, de nada adiantando o
recurso com efeito suspensivo, o qual apenas assegura a manutenção da situação questionada.
Neste sentido é Súmula nº. 429 do Excelso Supremo Tribunal Federal:
“A existência de recurso administrativo com efeito suspensivo não impede o uso do mandado de
segurança contra omissão da autoridade.”
Portanto, passo ao mérito da demanda.
A concessão da aposentadoria por tempo de serviço, hoje tempo de contribuição, está
condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91.
A par do tempo de serviço/contribuição, deve também o segurado comprovar o cumprimento da
carência, nos termos do artigo 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91. Aos já filiados quando do advento
da mencionada lei, vige a tabela de seu artigo 142 (norma de transição), em que, para cada ano
de implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número
de meses de contribuição inferior aos 180 (cento e oitenta) exigidos pela regra permanente do
citado artigo 25, inciso II.
Para aqueles que implementaram os requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de
serviço até a data de publicação da EC nº 20/98 (16/12/1998), fica assegurada a percepção do
benefício, na forma integral ou proporcional, conforme o caso, com base nas regras anteriores ao
referido diploma legal.
Por sua vez, para os segurados já filiados à Previdência Social, mas que não implementaram os
requisitos para a percepção da aposentadoria por tempo de serviço antes da sua entrada em
vigor, a EC nº 20/98 impôs as seguintes condições, em seu artigo 9º, incisos I e II.
Ressalte-se, contudo, que as regras de transição previstas no artigo 9º, incisos I e II, da EC nº
20/98 aplicam-se somente para a aposentadoria proporcional por tempo de serviço, e não para a
integral, uma vez que tais requisitos não foram previstos nas regras permanentes para obtenção
do referido benefício.
Desse modo, caso o segurado complete o tempo suficiente para a percepção da aposentadoria
na forma integral, faz jus ao benefício independentemente de cumprimento do requisito etário e
do período adicional de contribuição, previstos no artigo 9º da EC nº 20/98.
Por sua vez, para aqueles filiados à Previdência Social após a EC nº 20/98, não há mais
possibilidade de percepção da aposentadoria proporcional, mas apenas na forma integral, desde
que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e de
30 (trinta) anos, para as mulheres.
Portanto, atualmente vigoram as seguintes regras para a concessão de aposentadoria por tempo
de serviço/contribuição:
1) Segurados filiados à Previdência Social antes da EC nº 20/98:
a) têm direito à aposentadoria (integral ou proporcional), calculada com base nas regras
anteriores à EC nº 20/98, desde que cumprida a carência do artigo 25 c/c 142 da Lei nº 8.213/91,
e o tempo de serviço/contribuição dos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91 até 16/12/1998;
b) têm direito à aposentadoria proporcional, calculada com base nas regras posteriores à EC nº
20/98, desde que cumprida a carência do artigo 25 c/c 142 da Lei nº 8.213/91, o tempo de
serviço/contribuição dos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91, além dos requisitos adicionais do art.
9º da EC nº 20/98 (idade mínima e período adicional de contribuição de 40%);
c) têm direito à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98,
desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os
homens, e de 30 (trinta) anos, para as mulheres;
2) Segurados filiados à Previdência Social após a EC nº 20/98:
- têm direito somente à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC
nº 20/98, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para
os homens, e 30 (trinta) anos, para as mulheres.
Cumpre observar que a Medida Provisória n. 676, de 17.06.2015 (D.O.U. de 18.06.2015),
convertida na Lei n. 13.183, de 04.11.2015 (D.O.U. de 05.11.2015), inseriu o artigo 29-C na Lei n.
8.213/91 e criou hipótese de opção pela não incidência do fator previdenciário, denominada
"regra progressiva 85/95", quando, preenchidos os requisitos para a aposentadoria por tempo de
contribuição, a soma da idade do segurado e de seu tempo de contribuição, incluídas as frações,
for:
a) igual ou superior a 95 (noventa e cinco pontos), se homem, observando o tempo mínimo de
contribuição de trinta e cinco anos;
b) igual ou superior a 85 (oitenta e cinco pontos), se mulher, observando o tempo mínimo de
contribuição de trinta anos.
Ademais, as somas referidas no caput e incisos do artigo 29-C do Plano de Benefícios
computarão "as frações em meses completos de tempo de contribuição e idade" (§ 1º), e serão
acrescidas de um ponto ao término dos anos de 2018, 2020, 2022, 2024 e 2026, até atingir os
citados 90/100 pontos.
Ressalve-se, ainda, que ao segurado que preencher o requisito necessário à concessão do
benefício de aposentadoria por tempo de contribuição sem a aplicação do fator previdenciário
será assegurado o direito à opção com a aplicação da pontuação exigida na data do cumprimento
do requisito, ainda que assim não o requeira, conforme disposto no artigo 29-C, § 4º, da Lei
8.213/1991.
In casu, alega a parte autora que exerceu atividade especial no período de 11/02/1980 até a
presente data, que somados aos demais períodos de atividade comum constantes da sua CTPS,
redundam em tempo de serviço suficiente para a concessão da aposentadoria por tempo de
serviço/contribuição, sem a incidência do fator previdenciário.
Portanto, a controvérsia nos presentes autos se restringe ao reconhecimento do exercício de
atividade especial nos períodos reconhecidos na r. sentença recorrida, e no que tange ao
preenchimento dos requisitos legais para a concessão da aposentadoria por tempo de
serviço/contribuição pela regra “85/95”.
Atividade especial:
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei nº 3.807/60.
O critério de especificação da categoria profissional com base na penosidade, insalubridade ou
periculosidade, definidas por Decreto do Poder Executivo, foi mantido até a edição da Lei nº
8.213/91, ou seja, as atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo Poder Executivo
seriam consideradas penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação por
laudo técnico, bastando, assim, a anotação da função em CTPS ou a elaboração do então
denominado informativo SB-40.
Foram baixados pelo Poder Executivo os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, relacionando os
serviços considerados penosos, insalubres ou perigosos.
Embora o artigo 57 da Lei nº 8.213/91 tenha limitado a aposentadoria especial às atividades
profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, o
critério anterior continuou ainda prevalecendo.
De notar que, da edição da Lei nº 3.807/60 até a última CLPS, que antecedeu à Lei nº 8.213/91, o
tempo de serviço especial foi sempre definido com base nas atividades que se enquadrassem no
decreto baixado pelo Poder Executivo como penosas, insalubres ou perigosas,
independentemente de comprovação por laudo técnico.
A própria Lei nº 8.213/91, em suas disposições finais e transitórias, estabeleceu, em seu artigo
152, que a relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física deverá
ser submetida à apreciação do Congresso Nacional, prevalecendo, até então, a lista constante da
legislação em vigor para aposentadoria especial.
Os agentes prejudiciais à saúde foram relacionados no Decreto nº 2.172, de 05/03/1997 (art. 66 e
Anexo IV), mas por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir
da edição da Lei n 9.528, de 10/12/1997.
Destaque-se que o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, em sua redação original, deixou de fazer alusão
a serviços considerados perigosos, insalubres ou penosos, passando a mencionar apenas
atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade
física, sendo que o artigo 58 do mesmo diploma legal, também em sua redação original,
estabelecia que a relação dessas atividades seria objeto de lei específica.
A redação original do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 foi alterada pela Lei nº 9.032/95 sem que até
então tivesse sido editada lei que estabelecesse a relação das atividades profissionais sujeitas a
condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, não havendo dúvidas até
então que continuavam em vigor os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. Nesse sentido, confira-
se a jurisprudência: STJ; Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg.
28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482.
É de se ressaltar, quanto ao nível de ruído, que a jurisprudência já reconheceu que o Decreto nº
53.831/64 e o Decreto nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, ou seja, não houve revogação
daquela legislação por esta, de forma que, constatando-se divergência entre as duas normas,
deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado (STJ - REsp. n. 412351/RS; 5ª Turma; Rel.
Min. Laurita Vaz; julgado em 21.10.2003; DJ 17.11.2003; pág. 355).
O Decreto nº 2.172/97, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a
considerar o nível de ruídos superior a 90 dB(A) como prejudicial à saúde.
Por tais razões, até ser editado o Decreto nº 2.172/97, considerava-se a exposição a ruído
superior a 80 dB(A) como agente nocivo à saúde.
Todavia, com o Decreto nº 4.882, de 18/11/2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos
tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível voltou a ser de 85 dB(A) (art. 2º do Decreto nº
4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Houve, assim, um abrandamento da norma até então vigente, a qual considerava como agente
agressivo à saúde a exposição acima de 90 dB(A), razão pela qual vinha adotando o
entendimento segundo o qual o nível de ruídos superior a 85 dB(A) a partir de 05/03/1997
caracterizava a atividade como especial.
Ocorre que o C. STJ, no julgamento do Recurso especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do artigo
543-C do CPC, decidiu não ser possível a aplicação retroativa do Decreto nº 4.882/03, de modo
que no período de 06/03/1997 a 18/11/2003, em consideração ao princípio tempus regit actum, a
atividade somente será considerada especial quando o ruído for superior a 90 dB(A).
Nesse sentido, segue a ementa do referido julgado:
"ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E
RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA.
PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. TEMPO ESPECIAL. RUÍDO.
LIMITE DE 90DB NO PERÍODO DE 6.3.1997 A 18.11.2003. DECRETO 4.882/2003. LIMITE DE
85 DB. RETROAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE À ÉPOCA DA
PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.
Controvérsia submetida ao rito do art. 543-C do CPC
1. Está pacificado no STJ o entendimento de que a lei que rege o tempo de serviço é aquela
vigente no momento da prestação do labor. Nessa mesma linha: REsp 1.151.363/MG, Rel.
Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011; REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman
Benjamin, Primeira Seção, DJe 19.12.2012, ambos julgados sob o regime do art. 543-C do CPC.
2. O limite de tolerância para configuração da especial idade do tempo de serviço para o agente
ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto
2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto
4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-
LICC). Precedentes do STJ. Caso concreto
3. Na hipótese dos autos, a redução do tempo de serviço decorrente da supressão do acréscimo
da especial idade do período controvertido não prejudica a concessão da aposentadoria integral.
4. Recurso especial parcialmente provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e
da Resolução STJ 8/2008." (STJ, REsp 1398260/PR, Primeira Seção, Rel. Min. HERMAN
BENJAMIN, DJe 05/12/2014)
Destaco, ainda, que o uso de equipamento de proteção individual não descaracteriza a natureza
especial da atividade a ser considerada, uma vez que tal tipo de equipamento não elimina os
agentes nocivos à saúde que atingem o segurado em seu ambiente de trabalho, mas somente
reduz seus efeitos. Nesse sentido, precedentes desta E. Corte (AC nº 2000.03.99.031362-0/SP;
1ª Turma; Rel. Des. Fed. André Nekatschalow; v.u; J. 19.08.2002; DJU 18.11) e do Colendo
Superior Tribunal de Justiça: REsp 584.859/ES, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta
Turma, julgado em 18/08/2005, DJ 05/09/2005 p. 458).
No presente caso, da análise dos documentos juntados aos autos, e de acordo com a legislação
previdenciária vigente à época, a parte autora comprovou o exercício de atividades especiais nos
períodos de:
- de 11/02/1980 a 06/12/2016, vez que exercia a função de “técnico agrícola”, nos setores de
laboratório de sanidade animal, gado de corte, curral de gado de corte, manejo de rebanho e de
gado, na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, estando exposto a agentes biológicos,
enquadrados no código 1.3.2, Anexo III do Decreto nº 53.831/64, código 1.3.4, Anexo II do
Decreto nº 83.080/79, código 3.0.1, Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 e código 3.0.1, Anexo IV do
Decreto nº 3.048/99 (Perfil Profissiográfico Previdenciário, id. 64247579).
Assim, deve o INSS computar como atividade especial os períodos acima, convertendo-os em
atividade comum.
Sendo o requerimento do benefício posterior à Lei 8.213/91, deve ser aplicado o fator de
conversão de 1,20, mais favorável ao segurado, como determina o artigo 70 do Decreto nº
3048/99, com a redação dada pelo Decreto nº 4.827/03.
Observo que os períodos de contribuição da parte autora são suficientes para garantir o
cumprimento da carência, de acordo com a tabela do artigo 142 da Lei nº 8.213/1991.
Logo, computando-se os períodos de atividade especial reconhecidos (11/02/1980 06/12/2016),
somados aos demais períodos de atividade comum constantes da sua CTPS, até o requerimento
administrativo (29/08/2016, id. 64247580 - Pág. 2), perfazem-se mais de 50 (cinquenta) anos,
bem como totalizou a parte autora a idade de 53 anos de idade, atingindo mais de 95 pontos,
suficientes para a obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição, sem a aplicação do fator
previdenciário, na forma prevista no art. 29-C da Lei 8.213/1991.
Portanto, faz jus a autor à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição na
forma prevista no art. 29-C da Lei 8.213/1991, desde o pedido administrativo, momento em que o
INSS ficou ciente da pretensão.
Deixo de deferir a antecipação da tutela, pois o autor recebe aposentadoria por tempo de
contribuição deferida pelo INSS em 29/08/2016 (NB 42/ 1784380277), devendo optar pelo
benefício mais vantajoso.
Cabe ressaltar que as parcelas vencidas entre a data do requerimento administrativo e a
impetração do mandamus deverão ser reclamadas administrativamente ou por via judicial própria,
nos termos do artigo 14, § 4º, da Lei nº 12.016/2009 e das Súmulas do STF (Enunciados 269 e
271), tendo em vista que o mandado de segurança não é o meio adequado à cobrança de valores
em atraso, nem pode criar efeitos financeiros pretéritos.
Do exposto, enfrentadas as questões pertinentes à matéria em debate, DOU PROVIMENTO À
APELAÇÃO DA IMPETRANTE, para reconhecer a especialidade da atividade exercida no
período de 11/02/1980 a 06/12/2016, e lhe conceder a aposentadoria por tempo de contribuição,
na forma prevista no art. 29-C da Lei 8.213/1991, nos termos fundamentados.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. REGRA “85/95”. REQUISITOS PREENCHIDOS. APELAÇÃO
PROVIDA.
1. O mandado de segurança é a ação constitucional, prevista no artigo 5º, inciso LXIX, da Carta
Magna, cabível somente em casos de afronta a direito líquido e certo, conforme se depreende de
seu texto: "conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não
amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso
de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder
Público".
2. Observo pelos documentos juntados aos autos que o "writ" veio instruído com a prova pré-
constituída necessária à comprovação do direito vindicado pelo impetrante.
3. Ressalte-se que, o fato de haver recurso administrativo pendente de julgamento, não obsta, per
si, a apreciação do presente mandamus, tendo em vista que, a omissão de autoridade coatora em
praticar determinado ato devido já configura lesão a direito líquido e certo, de nada adiantando o
recurso com efeito suspensivo, o qual apenas assegura a manutenção da situação questionada.
4. A concessão da aposentadoria por tempo de serviço, hoje tempo de contribuição, está
condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91.
5. Cumpre observar que a Medida Provisória n. 676, de 17.06.2015 (D.O.U. de 18.06.2015),
convertida na Lei n. 13.183, de 04.11.2015 (D.O.U. de 05.11.2015), inseriu o artigo 29-C na Lei n.
8.213/91 e criou hipótese de opção pela não incidência do fator previdenciário, denominada
"regra progressiva 85/95", quando, preenchidos os requisitos para a aposentadoria por tempo de
contribuição, a soma da idade do segurado e de seu tempo de contribuição, incluídas as frações,
for:
a) igual ou superior a 95 (noventa e cinco pontos), se homem, observando o tempo mínimo de
contribuição de trinta e cinco anos;
b) igual ou superior a 85 (oitenta e cinco pontos), se mulher, observando o tempo mínimo de
contribuição de trinta anos.
6. Ademais, as somas referidas no caput e incisos do artigo 29-C do Plano de Benefícios
computarão "as frações em meses completos de tempo de contribuição e idade" (§ 1º), e serão
acrescidas de um ponto ao término dos anos de 2018, 2020, 2022, 2024 e 2026, até atingir os
citados 90/100 pontos.
7. Ressalve-se, ainda, que ao segurado que preencher o requisito necessário à concessão do
benefício de aposentadoria por tempo de contribuição sem a aplicação do fator previdenciário
será assegurado o direito à opção com a aplicação da pontuação exigida na data do cumprimento
do requisito, ainda que assim não o requeira, conforme disposto no artigo 29-C, § 4º, da Lei
8.213/1991.
8. No presente caso, da análise dos documentos juntados aos autos, e de acordo com a
legislação previdenciária vigente à época, a parte autora comprovou o exercício de atividades
especiais nos períodos de:
- de 11/02/1980 a 06/12/2016, vez que exercia a função de “técnico agrícola”, nos setores de
laboratório de sanidade animal, gado de corte, curral de gado de corte, manejo de rebanho e de
gado, na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, estando exposto a agentes biológicos,
enquadrados no código 1.3.2, Anexo III do Decreto nº 53.831/64, código 1.3.4, Anexo II do
Decreto nº 83.080/79, código 3.0.1, Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 e código 3.0.1, Anexo IV do
Decreto nº 3.048/99 (Perfil Profissiográfico Previdenciário, id. 64247579).
9. Assim, deve o INSS computar como atividade especial os períodos acima, convertendo-os em
atividade comum.
10. Portanto, computando-se os períodos de atividade especial reconhecidos na r. sentença
recorrida, somados aos demais períodos de atividade comum constantes da sua CTPS, até o
requerimento administrativo (29/08/2016, id. 64247580 - Pág. 2), perfazem-se mais de 50
(cinquenta) anos, bem como totalizou a parte autora a idade de 53 anos de idade, atingindo mais
de 95 pontos, suficientes para a obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição sem a
aplicação do fator previdenciário, na forma prevista no art. 29-C da Lei 8.213/1991.
11. Assim, faz jus a autor à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição
na forma prevista no art. 29-C da Lei 8.213/1991, desde o pedido administrativo, momento em
que o INSS ficou ciente da pretensão.
12. Deixo de deferir a antecipação da tutela, pois o autor recebe aposentadoria por tempo de
contribuição deferida pelo INSS em 29/08/2016 (NB 42/ 1784380277), devendo optar pelo
benefício mais vantajoso.
13. Cabe ressaltar que as parcelas vencidas entre a data do requerimento administrativo e a
impetração do mandamus deverão ser reclamadas administrativamente ou por via judicial própria,
nos termos do artigo 14, § 4º, da Lei nº 12.016/2009 e das Súmulas do STF (Enunciados 269 e
271), tendo em vista que o mandado de segurança não é o meio adequado à cobrança de valores
em atraso, nem pode criar efeitos financeiros pretéritos.
14. Apelação da Impetrante provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação da impetrante, para reconhecer a especialidade
da atividade exercida no período de 11/02/1980 a 06/12/2016, e lhe conceder a aposentadoria por
tempo de contribuição, na forma prevista no art. 29-c da lei 8.213/1991, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA