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PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª TurmaAPELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000014-73.2025.4.03.9999 RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA APELANTE: CLEUSA VIEIRA DA SILVA MOURA Advogado do(a) APELANTE: RAFAELA CRISTINA DE ASSIS AMORIM - MS15387-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I OA EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de apelação interposta pela parte autora em ação ajuizada em face do INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural. A r. sentença de fls. 160/165 julgou improcedente o pedido formulado pela parte autora, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC. Em suas razões recursais, a parte autora pugna pela reforma da sentença aduzindo, em síntese, que restaram comprovados os requisitos necessários à concessão do benefício pleiteado. Regularmente processado o feito, os autos subiram a este Eg. Tribunal. É O RELATÓRIO.Obs: Todas as folhas mencionadas referem-se ao processo extraído em PDF pela ordem crescente de páginas. V O T OA EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil. A parte autora ajuizou a presente ação pretendendo a concessão da aposentadoria por idade rural, prevista no artigo 48, §§1º e 2º, da Lei nº 8.213/91, in verbis: "Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. § 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea "a" do inciso I, na alínea "g" do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. § 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)" Em síntese, para a obtenção da aposentadoria por idade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) idade mínima e (ii) efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao da carência exigida para a sua concessão. Em se tratando de segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até 24/07/91, deve ser considerada a tabela progressiva inserta no artigo 142 da Lei de Benefícios, não havendo que se falar em exigência de contribuição ao trabalhador rural, bastando a comprovação do efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, em número de meses idêntico à carência do referido benefício. Aos que ingressaram no sistema após essa data, aplica-se a regra prevista no art. 25, inc. II, da Lei de Benefícios que exige a comprovação de 180 contribuições mensais. Para a aposentadoria de trabalhadores e trabalhadoras rurais, estão mantidos o tempo de contribuição de 15 anos e as idades mínimas de aposentadoria de 55 anos para as mulheres e de 60 anos para os homens, após a EC 103/2019. A carência a ser cumprida deve levar em consideração a data em que foi implementado o requisito etário para a obtenção do benefício e não a data em que a pessoa formula o requerimento de aposentadoria por idade junto ao Instituto Nacional do Seguro Social. Portanto, caso cumprido o requisito etário, mas não a carência, o aferimento desta, relativamente à aposentadoria por idade, será realizado quando do implemento da idade esperada, ainda que, naquele momento a pessoa não tivesse completado a carência necessária. Anoto, ainda, que a necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, restou firmada pelo C. STJ, no julgamento do REsp nº 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva. Sobre a questão, o CJF erigiu a Súmula 54, que porta o seguinte enunciado "para a concessão de aposentadoria por idade de trabalhador rural, o tempo de exercício de atividade equivalente à carência deve ser aferido no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou à data do implemento da idade mínima". Assim, ao trabalhador rural exige-se a qualidade de segurado no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou implemento de idade, ressalvada a hipótese do direito adquirido, devendo essa exigência ser comprovada por meio de prova material e testemunhal, ou de recolhimentos vertidos ao INSS. COMPROVAÇÃO DO LABOR RURAL A comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, entendimento cristalizado na Súmula nº 149, do C. STJ. Ademais, diante das precárias condições em que se desenvolve o trabalho do lavrador e as dificuldades na obtenção de prova material do seu labor, quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), abrandou-se a exigência da prova admitindo-se início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal. Considerando a dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo (AgRg no REsp nº 1362145/SP, 2ª Turma, Relator Ministro Mauro Campell Marques, DJe 01/04/2013; AgRg no Ag nº 1419422/MG, 6ª Turma, Relatora Ministra Assussete Magalhães, DJe 03/06/2013; AgRg no AREsp nº 324.476/SE, 2ª Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 28/06/2013). Importante dizer que a necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, restou sedimentada pelo C. STJ, no julgamento do REsp nº 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva. CASO CONCRETO A idade mínima exigida para obtenção do benefício restou comprovada, tendo a parte autora nascido em 17/09/1967 e implementado o requisito etário em 2022. Logo, a parte autora deve comprovar o exercício do labor rural no período imediatamente anterior a 2022 ou a entrada do requerimento administrativo (2023), o que lhe for mais favorável, mesmo que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício requerido (180), não tendo o INSS conseguido infirmar a validade dos depoimentos prestados e dos documentos trazidos. Segundo a inicial, a parte autora é trabalhadora rural, eis que a vida inteira lidou com atividades campesinas, em economia familiar, juntamente com seu esposo Adilson Arantes de Moura. Para comprovar suas alegações, a parte autora apresentou os seguintes documentos: conta de energia em nome do cônjuge do ano de 2004 com endereço rural (fl. 16); nota rural diversa em nome do cônjuge, datada de 2006 (fl. 17); nota rural diversa em nome do cônjuge, datada de 2007 (fl. 18); nota rural diversa em nome do cônjuge, datada de 2008 (fl. 19); nota rural diversa em nome do cônjuge, datada de 2009 (fl. 20); conta de energia em nome do cônjuge do ano de 2010 com endereço rural (fl. 21); nota rural diversa em nome do cônjuge, datada de 2011 (fl. 22); nota rural diversa em nome do cônjuge, datada de 2012 (fl. 23); nota rural diversa em nome do cônjuge, datada de 2014 (fl. 24); nota rural diversa em nome do cônjuge, datada de 2017 (fl. 25); nota rural diversa em nome do cônjuge, datada de 2020 (fl. 26); nota rural diversa em nome do cônjuge, datada de 2021 (fl. 27); nota rural diversa em nome do cônjuge, datada de 2022 (fl. 28); conta de energia em nome do cônjuge do ano de 2022 com endereço rural (fl. 29); nota rural diversa em nome do cônjuge, datada de 2015 (fl. 31); conta de energia em nome do cônjuge do ano de 2016 com endereço rural (fl. 32); conta de energia em nome do cônjuge do ano de 2018 com endereço rural (fl. 33) e nota rural diversa em nome do cônjuge, datada de 2019 (fl. 34). O recurso não merece prosperar. A parte autora deveria ter comprovado o labor rural, mesmo que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao implemento da idade, ao longo de, ao menos, 180 meses, conforme determinação contida no art. 142 da Lei nº 8.213/91. Verifica-se que, em seu depoimento pessoal, a parte autora declarou residir com o esposo no imóvel situado na Fazenda Recanto das Grotas, com área total de 193 (cento e noventa e três) hectares. Na audiência, informou que a propriedade está avaliada em aproximadamente R$ 9.650.000,00, considerando o valor médio de R$ 50.000,00 por hectare. Além da expressiva extensão e elevado valor econômico da propriedade, a autora afirmou possuir cerca de 120 (cento e vinte) cabeças de gado, além de ser coproprietária, com o esposo, de uma caminhonete Toyota Hilux 2023, adquirida por R$ 260.000,00, e de um caminhão Ford F4000. A demandante ainda declarou que, em 2020, o casal adquiriu, mediante permuta com cabeças de gado, um imóvel urbano em Campo Grande avaliado em R$ 600.000,00, além de possuírem outras duas casas desde então. De acordo com o art. 11, VII, da Lei n. 8.213/91, para ser considerada segurada especial, a atividade rural deve ser exercida individualmente ou em regime de economia familiar, sem empregados permanentes, e com área de até quatro módulos fiscais. No município de Bandeirante, o módulo fiscal corresponde a 40 hectares, de modo que a propriedade da autora (193 ha) supera significativamente esse limite. No entanto, de acordo com o Tema 1.115 do STJ (REsp 1.947.404-RS, julgado em 23 de novembro de 2022), apesar de a propriedade rural superar em área os quatro módulos fiscais, tal fato não descaracteriza, por si só, a condição de segurado especial, desde que os demais requisitos legais estejam comprovados. Ainda que o STJ admita que o tamanho da propriedade, isoladamente, não caracteriza desfavoravelmente a condição de segurado especial, no presente caso há um conjunto probatório robusto que evidencia significativa capacidade econômica. A propriedade rural de elevado valor, o numeroso rebanho, os veículos de luxo e os imóveis urbanos, ambos de valor considerável, revelam que a autora não depende apenas do trabalho rural para sua subsistência familiar. Diante disso, mesmo reconhecendo a jurisprudência do STJ, o contexto probatório atual demonstra claramente que a parte autora não atende aos requisitos previstos no art. 11, VII, da Lei n. 8.213/91, o que justifica, de forma robusta, o afastamento da condição de segurada especial. Ademais, a prova oral se mostrou frágil, pois as testemunhas arroladas trouxeram relatos superficiais acerca da suposta rotina rural vivenciada pela parte autora, como sempre tendo trabalhado como rural, não sendo seus relatos dotados da robustez necessária para respaldar o reconhecimento do período de trabalho igual ao número de meses correspondente à carência do benefício requerido. Logo, não comprovada a condição de segurada especial, não faz jus a parte autora ao benefício de aposentadoria rural. Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11, como um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os limites estabelecidos na lei. Assim, desprovido o apelo da parte autora interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados na sentença devem, no caso, ser majorados em 10%, nos termos do artigo 85, parágrafo 11, do CPC/2015, suspensa, no entanto, a sua execução, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC/2015, por ser ela beneficiária da gratuidade de justiça. Ante o exposto, nego provimento ao recurso, condenando a parte autora ao pagamento de honorários recursais, na forma antes delineada. É COMO VOTO./gabiv/rrios E M E N T AEmenta: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS LEGAIS. SEGURADO ESPECIAL. EXTENSÃO DA PROPRIEDADE E CAPACIDADE ECONÔMICA. NÃO COMPROVAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
III. RAZÕES DE DECIDIR
IV. DISPOSITIVO E TESE
Tese de julgamento:
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 201, § 7º, II; Lei nº 8.213/91, arts. 11, VII; 25, II; 48, §§ 1º e 2º; 55, § 3º; 106, parágrafo único; 142; CPC/2015, arts. 1.011 e 85, § 11; EC 103/2019. A C Ó R D Ã OVistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso de apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
INES VIRGINIA
Desembargadora Federal |
