
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0015396-41.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LEDA REGINA MONTICO DE PAIVA
Advogado do(a) APELADO: JOSE WAGNER CORREA DE SAMPAIO - SP152803-N
OUTROS PARTICIPANTES:
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0015396-41.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LEDA REGINA MONTICO DE PAIVA
Advogado do(a) APELADO: JOSE WAGNER CORREA DE SAMPAIO - SP152803-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Exma. Desembargadora Federal SILVIA ROCHA (Relatora):
Apelação interposta pelo INSS em face da r. sentença que julgou parcialmente procedente o pedido inicial, condenando a autarquia previdenciária a averbar o tempo de serviço rural exercido pela autora no período de 07/1972 a 10/1977, conforme as provas produzidas nos autos; a implantar o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição a partir da data do requerimento administrativo, em 29 de setembro de 2016 (DER); a pagar as parcelas vencidas desde a data da DER, observada a prescrição quinquenal das parcelas anteriores ao ajuizamento da ação; a corrigir monetariamente os valores das parcelas em atraso com base no IPCA-E e a aplicar juros de mora equivalentes aos da caderneta de poupança, a partir de 30 de junho de 2009; a pagar os honorários advocatícios, fixados em 10% do valor das parcelas vencidas, atualizadas até a data da sentença; a pagar as despesas processuais, com exceção das custas. Foi concedida a tutela antecipada, determinando a imediata implantação do benefício, sob pena de multa diária.
Conforme a sentença, o período de atividade rural da autora foi comprovado com base nos contratos de parceria agrícola em nome de seu pai da autora, que foram celebrados nos anos de 1972, 1973, 1974/75, 1976/77 e 1977/78, além de uma folha de cadastro de trabalhador rural que a listava como dependente, e a prova testemunhal que corroborou a atividade.
Alegou o INSS, em suas razões recursais, que a sentença não deveria ter reconhecido o tempo rural sem os devidos recolhimentos das contribuições previdenciárias. Argumentou também que os documentos apresentados para comprovar o labor rural não teriam valor probatório, por estarem em nome do genitor da autora e por não possuírem autenticação ou registro em cartório. Argumentou, ainda, que a prova exclusivamente testemunhal não bastaria para comprovar a atividade rurícola. Por fim, em pedido sucessivo, requereu a fixação da DIB na data da citação, em caso de manutenção da sentença.
A autora apresentou contrarrazões.
É o Relatório.
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0015396-41.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LEDA REGINA MONTICO DE PAIVA
Advogado do(a) APELADO: JOSE WAGNER CORREA DE SAMPAIO - SP152803-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Exma. Desembargadora Federal SILVIA ROCHA (Relatora)
O apelo interposto pelo INSS merece ser recebido por atender aos requisitos de admissibilidade.
Da Prova da Atividade Rural e do Recolhimento das Contribuições
Os argumentos do apelante não prosperam.
Em primeiro lugar, quanto à alegação de ausência de recolhimento, a Lei n. 8.213/91, em seu art. 55, § 2º, estabelece que o tempo de serviço do trabalhador rural anterior à sua vigência (1991) será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência. A própria sentença já observou essa regra, ao determinar que o período reconhecido não seria computado para fins de carência. Portanto, o reconhecimento do tempo rural sem o recolhimento das contribuições está em total conformidade com a legislação aplicável.
Em segundo lugar, a Lei n. 8.213/91, em seu art. 55, § 3º, exige "início de prova material" para a comprovação do tempo de serviço rural, não admitindo prova exclusivamente testemunhal. No entanto, o conceito de "início de prova material" deve ser interpretado de forma flexível, em consonância com a realidade do trabalhador rural, que muitas vezes não tem acesso a documentos formais.
A jurisprudência desta Corte e dos Tribunais Superiores pacificou o entendimento de que documentos em nome do chefe de família, como o genitor, são válidos como início de prova material para os demais membros que trabalham em regime de economia familiar. O fato de a autora não ter apresentado documentos em nome próprio não invalida a prova, pois, à época dos fatos, era comum que a documentação formal fosse centralizada no nome do pai ou marido.
Ademais, a alegação de que os contratos de parceria agrícola não seriam válidos por falta de registro não se sustenta. O INSS busca aplicar, de forma estrita, as exigências do Código de Processo Civil e do Código Civil, que são incompatíveis com o princípio da flexibilidade da prova no direito previdenciário. O "início de prova material" não exige fé pública ou registro para documentos. A finalidade é a de existir um indício documental mínimo que, em conjunto com a prova testemunhal, torne verossímil a alegação da atividade rural.
A sentença demonstrou que a prova material (os contratos e o cadastro de trabalhador rural) e a prova testemunhal (os depoimentos de Lázara Aparecida Siqueira de Lima e Irineu Franco) foram suficientes e coerentes para demonstrar o trabalho rural da autora. O INSS não questionou o conteúdo das declarações das testemunhas, limitando-se a questionar a validade da prova em si, de modo que permanece hígida a valoração realizada pelo juízo a quo de que ela corroborrou com a prova material.
Por sua vez, a alegação do INSS sobre a ausência da certidão de casamento da autora também não merece prosperar. A petição inicial da autora informa que ela trabalhou na zona rural com seus pais até a data de seu casamento. O período de trabalho rural reconhecido pela sentença (07/1972 a 10/1977) se refere a uma época em que ela ainda vivia com a família de origem. Sendo assim, a apresentação da certidão de casamento para comprovar este período é irrelevante. A documentação em nome do genitor, validada pela prova testemunhal, já é suficiente para comprovar o período.
Assim, fica mantido o reconhecimento da atividade rural tal como foi lançado na sentença.
Do Termo Inicial do Benefício e dos Valores em Atraso
Quanto ao pedido sucessivo, o INSS pleiteou a alteração do termo inicial do benefício para a data da citação, sob o argumento de que a prova documental (contratos de parceria agrícola) e a prova testemunhal só foram produzidas em juízo.
Ocorre que a Data de Início do Benefício (DIB) deve ser mantida na data do requerimento administrativo (DER), pois foi nesse momento que a autora manifestou sua pretensão e que o seu direito à aposentadoria se consolidou, uma vez que o tempo de serviço rural reconhecido já havia sido completado.
No entanto, o termo inicial para o pagamento dos valores em atraso (DIP) deve ser alterado. Os documentos que comprovaram o tempo rural (os contratos de parceria agrícola) foram apresentados somente em juízo, e não no processo administrativo. Consequentemente, o INSS não poderia ter reconhecido a pretensão da autora na via administrativa por falta de prova. A autarquia não pode ser responsabilizada pelo pagamento de parcelas retroativas a um período em que não tinha conhecimento da documentação necessária.
Portanto, os valores em atraso devem ser pagos a partir da data da citação (22/05/2017 - Num. 85410336 - Pág. 56), momento em que o INSS teve conhecimento dos documentos apresentados e restou configurada, definitivamente, a sua resistência à pretensão autoral.
Conclusão
Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação interposta pelo INSS para determinar que os efeitos financeiros incidam a partir da citação. De ofício, determino que a correção monetária observe o INPC, nos termos do Tema 905/STJ, aplicando-se, no que couber, o Manual de Cálculos da Justiça Federal vigente à época da liquidação do julgado.
Mantida a condenação do INSS no pagamento da verba honorária tal como foi fixada na sentença, ante a continuidade, na parte mínimo do pedido, pela autora.
É o voto.
Ementa: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. DOCUMENTOS EM NOME DO GENITOR. VALIDADE COMO INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL CORROBORATIVA. RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES DESNECESSÁRIO PARA PERÍODO ANTERIOR À LEI 8.213/91. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO (DER) MANTIDO. EFEITOS FINANCEIROS FIXADOS A PARTIR DA CITAÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA PELO INPC. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
I. CASO EM EXAME
- Apelação interposta pelo INSS contra sentença que reconheceu o período de atividade rural da autora entre 07/1972 e 10/1977, determinou a averbação do tempo de serviço, a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição desde o requerimento administrativo (29/09/2016), o pagamento das parcelas vencidas, correção monetária pelo IPCA-E, juros da caderneta de poupança, além de honorários e despesas processuais. Foi deferida tutela antecipada para implantação imediata do benefício.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
- Há três questões em discussão:
(i) definir se o tempo de serviço rural pode ser reconhecido sem recolhimento de contribuições;
(ii) estabelecer se documentos em nome do genitor, corroborados por testemunhas, constituem início de prova material válido;
(iii) determinar a data de início dos efeitos financeiros da aposentadoria.
III. RAZÕES DE DECIDIR
- O art. 55, § 2º, da Lei 8.213/91 autoriza o cômputo do tempo de serviço rural anterior à sua vigência sem necessidade de recolhimento de contribuições, ressalvada a carência.
- O art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91 exige apenas início de prova material, não sendo necessária a apresentação de documentos em nome próprio, desde que haja vinculação à economia familiar.
- Documentos em nome do genitor, como contratos de parceria agrícola, constituem início de prova material idôneo, em razão da aplicação do princípio da flexibilização das provas no direito previdenciário.
- A prova testemunhal, não contestada em seu conteúdo pela autarquia, reforça os documentos apresentados, atendendo à exigência legal e mantendo hígida a valoração feita pelo magistrado sentenciante.
- O termo inicial do benefício (DIB) deve ser fixado na DER, pois nessa data a autora já havia preenchido os requisitos para a aposentadoria.
- Os efeitos financeiros (DIP), todavia, devem incidir a partir da citação, pois os documentos comprobatórios foram apresentados apenas em juízo, não sendo possível ao INSS reconhecer administrativamente o direito antes desse momento.
- A correção monetária deve observar o INPC, conforme decidido no Tema 905/STJ, aplicando-se, no que couber, o Manual de Cálculos da Justiça Federal vigente na fase de liquidação.
IV. DISPOSITIVO E TESE
- Recurso parcialmente provido para fixar os efeitos financeiros a partir da citação. Correção monetária ajustada de ofício para adoção do INPC.
Teses de julgamento:
- O tempo de serviço rural anterior à Lei 8.213/91 pode ser computado independentemente do recolhimento de contribuições, ressalvada a carência.
- Documentos em nome do genitor configuram início de prova material válido para comprovar o labor de outros membros da família em regime de economia familiar.
- O termo inicial do benefício (DIB) deve ser fixado na DER, mas os efeitos financeiros somente se projetam a partir da citação quando os documentos comprobatórios são apresentados apenas em juízo.
Dispositivos relevantes: Lei 8.213/91, arts. 55, §§ 2º e 3º.
Jurisprudência relevante: STJ, Tema 905.
ACÓRDÃO
Desembargadora Federal
