
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5098278-62.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: BENEDITO APARECIDO VAZ DOS SANTOS
Advogados do(a) APELADO: LUIS ENRIQUE MARCHIONI - SP130696-N, MARIO LUCIO MARCHIONI - SP122466-N, NICHOLAS SAVOIA MARCHIONI - SP380098-N
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5098278-62.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: BENEDITO APARECIDO VAZ DOS SANTOS
Advogados do(a) APELADO: LUIS ENRIQUE MARCHIONI - SP130696-N, MARIO LUCIO MARCHIONI - SP122466-N, NICHOLAS SAVOIA MARCHIONI - SP380098-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o reconhecimento de atividade rural e a exercida em condições agressivas e a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
Foi proferida a sentença, cujo o dispositivo passo a transcrever:
“(...)
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos autorais, resolvendo o mérito nos termos do artigo 487, I, do CPC, a fim de: (i) RECONHECER a especialidade do labor exercido nos períodos de 27/05/1974 a 19/08/1993, 06/02/2008 a 25/09/2008, 01/10/2008 a 11/09/2009 e 01/10/2009 a 17/08/2016, para fins de aposentadoria de contribuição; (ii) DETERMINAR a averbação do período reconhecido e a implantação do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição do autor, desde o requerimento administrativo (03 de março de 2017), de forma imediata.
Devem os atrasados, observando-se a prescrição quinquenal, serem pagos de uma só vez e acrescidos juros de mora e da correção monetária na forma prevista no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, sem prejuízo da aplicação da legislação superveniente, observando-se, ainda, o precedente vinculante acerca do Tema 810 da Repercussão Geral, até o dia anterior à vigência da Emenda Constitucional nº 113/2021, que instituiu novo regramento jurídico referente aos parâmetros de atualização dos débitos judiciais das Fazenda Públicas (art. 3º), verbas essas a que reconheço caráter alimentício, conforme disposição constitucional, sem prejuízo das prestações prescritas na conformidade com o teor da Súmula 85 do STJ.
Condeno o réu ao pagamento dos honorários advocatícios que arbitro em 10% sobre o valor da condenação, observando-se a Súmula 111 do STJ.
Deixo de condenar a parte ré ao pagamento das custas e demais despesas processuais, diante de sua isenção para tanto, nos termos do art. 6º da Lei 11.608/2003.
Registro dispensado (NSCGJ, art. 72, § 6º). Publique-se. Intimem-se.
(...).”. (ID n. 306035948)
Em razões recursais, a Autarquia Federal sustenta, em síntese, que não restou comprovada a especialidade da atividade, não fazendo jus à aposentação. Pede, caso mantida a condenação, a fixação dos efeitos financeiros a partir da juntada do laudo judicial, a observância da prescrição quinquenal, a intimação da parte autora para firmar a autodeclaração e a redução da verba honorária. (ID n. 306035954)
É o relatório.
SM
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5098278-62.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: BENEDITO APARECIDO VAZ DOS SANTOS
Advogados do(a) APELADO: LUIS ENRIQUE MARCHIONI - SP130696-N, MARIO LUCIO MARCHIONI - SP122466-N, NICHOLAS SAVOIA MARCHIONI - SP380098-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais, passo ao exame da matéria objeto de devolução.
SENTENÇA ULTRA PETITA. REDUÇÃO AOS LIMITES DO PEDIDO.
Por seu turno, antes de adentrar no mérito, verifico que o MM. Juízo a quo, ao reconhecer o labor especial no lapso de 27/05/1974 a 19/08/1993, ampliou o pedido inicial, eis que tal período não foi objeto do pedido da parte autora, que pleiteou o enquadramento nos interstícios de 06/02/2008 a 25/09/2008, 01/10/2008 a 11/09/2009 e 01/10/2009 a 17/08/2016.
De se ressaltar que o pedido expresso na inicial ou extraído de seus termos por interpretação lógico-sistemática, limita o âmbito da sentença, isto é, o autor delimita a lide ao fixar o objeto litigioso, não sendo lícito ao julgador alterar o pedido, a causa petendi ou condenar em quantidade superior ao demandado, bem como conhecer de questões não suscitadas, a cujo respeito a lei exija a iniciativa da parte. É a aplicação do brocardo sententia debet esse conformis libello. (grifei)
Desta feita, o período de 27/05/1974 a 19/08/1993 não poderia ter sido deferido pelo MM. Juiz a quo e, portanto, não pode ser mantido por este Juízo, sob pena de se estar caracterizando julgamento ultra petita.
Saliente-se, por fim, que não há que se falar em nulidade da sentença, mas que a mesma deve, de ofício, ser reduzida aos limites do pedido inicial.
Trago a lume a seguinte decisão:
"PREVIDENCIÁRIO. REAJUSTE. DECISÃO ULTRA PETITA. SÚMULA 260 TFR. ARTIGO 58 ADCT. INCOMPATIBILIDADE.
1. Em havendo a decisão impugnada ultrapassado os limites do pedido, impõe-se a sua reforma, em homenagem ao princípio do tantum devolutum quantum appellatum.
(...)
4. Recurso conhecido e provido".
(STJ, RESP 199900731590, 6ª Turma, DJ: 01/08/2000, p. 354, Min. Hamilton Carvalhido)
1. DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/ CONTRIBUIÇÃO
O primeiro diploma legal brasileiro a dispor sobre a aposentadoria por tempo de serviço foi a Lei Eloy Chaves, Decreto nº 4.682, de 24 de janeiro de 1923. Referido benefício era concedido apenas aos ferroviários, possuindo como requisito a idade mínima de 50 (cinquenta) anos, tendo sido suspensa no ano de 1940.
Somente em 1948 tal aposentadoria foi restabelecida, tendo sido mantida pela Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS), que preconizava como requisito para a concessão do benefício o limite de idade de 55 (cinquenta e cinco) anos, abolido, posteriormente, pela Lei nº 4.130, de 28 de agosto de 1962, passando a adotar apenas o requisito tempo de serviço.
A Constituição Federal de 1967 e sua Emenda Constitucional nº 1/69, também disciplinaram tal benefício com salário integral, sem alterar, no entanto, a sua essência.
A atual Carta Magna manteve o benefício, disciplinando-o em seu art. 202 (redação original) da seguinte forma:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar seus valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior, se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidas em lei:
(...)
§1º: É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após vinte e cinco, à mulher."
Antes da Emenda Constitucional n. 20/98, de 15 de dezembro de 1998, preceituava a Lei nº 8.213/91, nos arts. 52 e seguintes, que o benefício de aposentadoria por tempo de serviço era devido ao segurado que, após cumprir o período de carência constante da tabela progressiva estabelecida pelo art. 142 do referido texto legal, completar 30 anos de serviço, se homem, ou 25, se mulher, iniciando no percentual de 70% do salário-de-benefício até o máximo de 100% para o tempo integral aos que completarem 30 anos de trabalho se mulher, e 35 anos de trabalho se homem.
Na redação original do art. 29, caput, §1º, da Lei de Benefícios, o salário-de-benefício consiste na média aritmética simples de todos os últimos salários-de-contribuição dos meses imediatamente anteriores ao afastamento da atividade ou da data da entrada do requerimento, até o máximo de 36, apurados no período não superior a 48 meses. Ao segurado que contava com menos de 24 contribuições no período máximo estabelecido, o referido salário corresponde a 1/24 da soma dos salários-de-contribuição.
Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer, nos arts. 201 e 202 da Constituição Federal:
"Art. 201 A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei a:
(...)
§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidos as seguintes condições:
I - 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem, e 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher;
Art. 202 O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar.
(...)"
Entretanto, o art. 3º da referida Emenda garantiu o direito adquirido à concessão da aposentadoria por tempo de serviço a todos aqueles que até a data da sua publicação, em 16 de dezembro de 1998, tivessem cumprido todos os requisitos legais, com base nos critérios da legislação então vigente.
Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados que cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da EC n. 20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o mesmo prazo e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
Além do que, a Emenda Constitucional n. 103 de 15 de novembro de 2019 trouxe inúmeras alterações ao sistema de Previdência Social, que passaram a vigorar na data da sua publicação em 13/11/2019.
EMENDA CONSTITUCIONAL N. 103, DE 13.11.2019
A Emenda Constitucional 103, publicada em 13/11/2019, alterou as regras de aposentadoria para os regimes próprio e geral da previdência social e estabeleceu regras de transição para os segurados filiados aos regimes indicados até a data da entrada em vigor da emenda.
As alterações da Emenda Constitucional n. 103 não atingem quem já recebia um benefício na data de sua promulgação, tampouco se aplica àqueles que começarem a receber algum benefício após sua vigência, desde que comprovado o direito antes da Reforma da Previdência, na forma do §4º, do Decreto 3048/99, alterado pelo Decreto n. 10.410, de 30.06.20.
A Emenda Constitucional n. 103, de 13.11.2019 revogou o fator previdenciário, exceto uma norma transitória e a regra de pontos do artigo 29-C da Lei n. 8.213/91.
Para aqueles que entraram no sistema previdenciário após sua vigência, a aposentadoria passou a requerer idade mínima de 65 anos para homens e de 62 para mulheres. Para a aposentadoria especial, há normas específicas para trabalhadores rurais e professores, observado o tempo mínimo de contribuição de 20 anos para homens e de 15 anos para mulheres (artigo 201, § 7º, CF e artigo 19 da EC n. 103/19).
Ainda, a Reforma da Previdência estabeleceu cinco novas regras de transição para os segurados filiados ao RGPS até a data de entrada em vigor da EC n. 103/2019, as quais estão descritas nos seus arts. 15 a 20 da referida e atualmente regulamentados pela Portaria nº 405, de 3 de abril de 2020, do INSS. São elas:
1) Por pontos (art. 15 da EC n. 103/19): ao computar 35 (homem) ou 30 (mulher) anos de e somar 96 (homem) ou 86 (mulher) pontos, respectivamente, de idade e tempo de contribuição. A pontuação será acrescida de um ponto a cada início de ano, a partir de 2020, até o limite de 105 pontos para o homem, em 01.01.2029, e de 100 pontos para a mulher, em 01.01.2033.
2) Por tempo de contribuição e idade mínima (art. 16 da EC n. 103/19): com 35 (homem) e 30 (mulher) anos de contribuição, e completar 61 ou 56 anos de idade, respectivamente. O requisito etário será anualmente acrescido de seis meses, a partir do início de 2020, até quando atingidos 65 anos de idade para o homem, em 01.01.2027, e 62 anos para a mulher, em 01.01.2031.
3) Com “pedágio” de 50% e fator previdenciário (art. 17 da EC n. 103/19): os segurados que, na vigência da EC 103 em 13.11.2019 contavam com mais de 33 anos de contribuição, o homem, ou 28 anos, a mulher, poderão aposentar-se se cumprido o requisito de tempo de 35 ou 30 anos, respectivamente, acrescido de período correspondente a 50% do tempo que, na data da publicação da emenda, faltava para atingir aqueles totais.
4) Com “pedágio” de 100% e idade mínima (artigo 20 da EC n. 103/19): ao preencher os requisitos etário (60 anos, o homem, ou 57, a mulher) e de tempo contributivo (35 ou 30 anos, respectivamente), cumulado com período adicional de contribuição equivalente a 100% do tempo que, em 13.11.2019, faltava para atingir os mencionados 35 ou 30 anos de contribuição.
5) Por idade (artigo 18 da EC n. 103/19): ao completar 65 anos (homem) ou 60 anos de idade (mulher), além de 15 anos de contribuição (ambos os sexos). O requisito etário feminino será anualmente acrescido de seis meses, a partir do início de 2020, até o patamar de 62 anos, em 01.01.2023.
2. DA CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM
2.1 DO DIREITO À CONVERSÃO ANTES DA LEI 6.887/80 E APÓS A LEI 9.711/98
A teor do julgamento do REsp 1.310.034 e do REsp 1.151.363, ambos submetidos ao regime do art. 543-C do CPC, inexiste óbice para se proceder à conversão de tempo de serviço especial em comum, seja antes da Lei 6.887/80 seja após Lei n. 9.711/1998.
2.2 DO RECONHECIMENTO DA ATIVIDADE EXERCIDA EM ATIVIDADE ESPECIAL
Para o reconhecimento da natureza especial da atividade exercida e a conversão desse intervalo especial em comum, cabe ao segurado demonstrar o trabalho em exposição a agentes agressivos, nos termos da lei vigente à época da prestação do trabalho, observando-se o princípio tempus regit actum (Pet 9.194/PR, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
2.2.1 PERÍODO ANTERIOR À EDIÇÃO DA LEI Nº 9.032/95
No período anterior à edição da Lei nº 9.032/95, o direito à aposentadoria especial e à conversão do tempo trabalhado em atividades especiais é reconhecido em razão da categoria profissional exercida pelo segurado ou pela sua exposição aos agentes nocivos descritos nos Anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, a ser comprovada por meio da apresentação de SB 40, sem a necessidade de apresentação de laudo técnico, exceção feita à exposição ao ruído.
2.2.2 PERÍODO POSTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.032/95 ATÉ A EDIÇÃO DO DECRETO Nº 2.172, DE 5 DE MARÇO DE 1997
A comprovação da atividade especial exercida após a edição da Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995 - que promoveu a alteração do art. 57 da Lei n. 8213/91 - se dá com a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, mediante a apresentação do formulário DSS-8030 (antigo SB 40), o qual se reveste da presunção de que as circunstâncias de trabalho ali descritas se deram em condições especiais, não sendo, portanto, imposto que tal documento se baseie em laudo pericial, com exceção ao limite de tolerância para nível de pressão sonora (ruído).
Anote-se que a relação dos agentes nocivos constante do Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e dos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, em vigor até o advento do Decreto Regulamentar nº 2.172/97, de 5 de março de 1997, fora substituído pelo Decreto nº 3.048, de 06 de maio de 1999.
Relevante consignar que, a partir da Lei nº 9.032/95, não é mais possível o reconhecimento da atividade especial, unicamente, com fulcro no mero enquadramento da categoria profissional.
2.2.3 PERÍODO POSTERIOR À VIGÊNCIA DO DECRETO Nº 2.172, DE 5 DE MARÇO DE 1997 E DEMAIS CONSIDERAÇÕES
Com a edição do Decreto nº 2.172, de 5 de março de 1997, que regulamentou a Medida Provisória nº 1523/96, convertida na Lei nº 9.528/97, é indispensável a apresentação de laudo técnico para a comprovação de atividade especial.
Cabe esclarecer que a circunstância de o laudo não ser contemporâneo à atividade avaliada não lhe retira absolutamente a força probatória, em face de inexistência de previsão legal para tanto e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral (AC 0022396-76.2005.4.01.3800/MG, Rel. Desembargador Federal Candido Moraes, 2ª Turma, e-DJF1 p.198 de 18/11/2014). Súmula 68 TNU.
Além disso, é de se apontar que o rol de agentes insalubres, como também das atividades penosas e perigosas não se esgotam no regulamento, tal como cristalizado no entendimento jurisprudencial na Súmula/TFR n. 198:
"Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento."
Nesse sentido, julgados do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 395988, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 18.11.2003, DJ 19.12.2003, p. 630; 5ª Turma, REsp nº 651516, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 07.10.2004, DJ 08.11.2004, p. 291.
2.3 USO DO EPI
No tocante à utilização de Equipamentos de Proteção Individual - EPI, em recente decisão, com repercussão geral, no ARE 664.335/SC, assentou a Suprema Corte que:
"o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial" (grifo nosso). No caso, porém, de dúvida em relação à efetiva neutralização da nocividade, decidiu que "a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete".
No mais, especificamente quanto à eficácia do equipamento de proteção individual - EPI ao agente agressivo ruído, o Pretório Excelso definiu que:
"na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria". Isso porque, "ainda que se pudesse aceitar que o problema causado pela exposição ao ruído relacionasse apenas à perda das funções auditivas, o que indubitavelmente não é o caso, é certo que não se pode garantir uma eficácia real na eliminação dos efeitos do agente nocivo ruído com a simples utilização de EPI, pois são inúmeros os fatores que influenciam na sua efetividade, dentro dos quais muitos são impassíveis de um controle efetivo, tanto pelas empresas, quanto pelos trabalhadores".
2.4 DA CONVERSÃO DO TEMPO DE SERVIÇO COMUM EM ESPECIAL
O direito à conversão do tempo de serviço comum em especial, para fins de concessão de aposentadoria especial, prevaleceu no ordenamento jurídico até a vigência da Lei nº 9.032/95 (28/04/1995) que, ao dar nova redação ao §3º do art. 57 da Lei n. 8.213/91, suprimiu tal possibilidade.
Desta feita, para os pedidos de aposentadoria especial, formulados a partir de 28/04/1995, inexiste previsão legal para se proceder à conversão.
Nesse sentido, a jurisprudência:
"PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. TEMPO DE SERVIÇO COMUM. CONVERSÃO A ESPECIAL. VEDAÇÃO DA LEI Nº 9.032/95. INCIDÊNCIA. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. INVIABILIDADE. COMPLEMENTAÇÃO DE PROVENTOS POR ENTIDADE FECHADA DE PREVIDÊNCIA PRIVADA. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. RECONHECIMENTO.
(...)
IV - A aposentadoria especial requer a prestação de trabalho sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física por 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme o caso. Aplicação do art. 57, caput, da Lei nº 8.213/91, na redação da Lei nº 9.032/95.
V - (...)
VI - Quanto à conversão do tempo de serviço comum ao tipo especial, para fins de concessão de aposentadoria especial, sua viabilidade perdurou até a edição da Lei nº 9.032/95, em virtude da redação então atribuída ao § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
VII - A vedação legal de transformação de tempo de trabalho comum em especial alcança todos os pleitos de benefício formulados a contar da entrada em vigor da nova lei, porquanto o que está protegido seja pelo ato jurídico perfeito, seja pelo direito adquirido, é o reconhecimento da natureza do trabalho prestado (se comum ou especial) em conformidade com legislação vigente à época de seu exercício.
VIII - Não se deve confundir norma de conversão de tempo de serviço com norma de caracterização de atividade laborativa, porque, na hipótese da prestação de labor de natureza comum, não há, por óbvio, condição outra a ser a ela atribuída, sujeitando-se o segurado, por isso, às regras impostas pelo legislador e vigentes quando da reunião dos requisitos necessários à obtenção da prestação de seu interesse, as quais podem depender de múltiplos fatores, sem que se possa extrair violação a qualquer dispositivo constitucional.
IX - Na data do requerimento da aposentadoria por tempo de serviço, deferida na via administrativa em 05 de junho de 1996, já vigorava a proibição para a conversão, em especial, da atividade de natureza comum exercida nos períodos acima mencionados.
X - (...)
XI - Excluída da relação processual a Fundação Cosipa de Seguridade Social, com a extinção do processo, sem julgamento do mérito. Apelação improvida, no tocante ao pleito de conversão da aposentadoria por tempo de serviço para aposentadoria especial" (g.n.).
(AC 2001.03.99.059370-0, Rel. Des. Fed. Marisa Santos, j. 31.05.2010, DJF3 CJ1 08.07.2010, p. 1257)
DOS AGENTES INSALUBRES
RUÍDO
O reconhecimento da insalubridade em decorrência da pressão sonora observa o regulamento vigente na ocasião do exercício da atividade laboral.
Assim, a atividade é considerada insalubre caso constatada a sujeição do trabalhador ao nível de pressão sonora da seguinte forma: até 05 de março de 1997, superior ou equivalente a 80 (oitenta) decibéis (Decreto nº 53.831/64); entre 06 de março de 1997 e 18 de novembro de 2003, superior ou equivalente a 90 (noventa) decibéis (Decreto n. 2.172/97) e, a partir dessa data (edição do Decreto nº 4.882/03), superior ou equivalente a 85 (oitenta e cinco) decibéis, não havendo que se falar em aplicação retroativa deste último diploma legal, conforme entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça (AgRg no REsp nº 1.146.243/RS - 6ª Turma, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJE 12/03/2012).
CHUMBO E SEUS COMPOSTOS TÓXICOS
A pintura com pistola empregando tintas com pigmentos de chumbo autoriza o enquadramento no item 1.0.8 do Decreto n. 20172/97.
DO CASO DOS AUTOS
Nesta seara recursal, cumpre examinar a possibilidade de reconhecimento do labor campesino de 27/05/1974 a 19/08/1993 e da especialidade da atividade nos períodos de 06/02/2008 a 25/09/2008, 01/10/2008 a 11/09/2009 e 01/10/2009 a 17/08/2016 e a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
Para comprovar a veracidade das suas alegações, a parte autora carreou o Perfil Profissiográfico Previdenciário (id 306035788), além da confecção do laudo judicial (id 306035907), em que constam as seguintes informações:
- 06/02/2008 a 25/09/2008 (Manutenção SB de Pirajui Eireli), 01/10/2008 a 11/09/2009 (Ultra-Art Produtos Aramados Ltda) e 01/10/2009 a 17/08/2016 (Metalúrgica D7 Ltda) – Laudo judicial indicando o labor como pintor, exercendo as seguintes funções:
“Executava pintura de materiais destinados a supermercados, ficando exposto a agentes químicos, poeiras de cabine de pintura e jateamento de peças com pistola eletrostática com tinta em pó.”.
De acordo com o expert, “(...) Conforme solicitação prevista na folha 107 do processo, trata-se de realização de prova pericial na empresa D7 Com Ind. Metalúrgica Ltda. – ME. (...)” e ainda aponta a presença de agente químico “pigmentos de chumbo” e agente físico “Ruído” acima de 90db(A).
Além do que, o perfil profissiográfico também indica a exposição a ruído acima de 90db(A) e substancias químicas durante o período de 01/10/2009 a 17/08/2016.
Nesse contexto, restou comprovada a especialidade da atividade durante os intervalos supramencionados, uma vez que é possível o enquadramento no item 2.0.1 do Decreto n. 2.172/97. Além do que, a pintura com pistola empregando tintas com pigmentos de chumbo autoriza o enquadramento no item 1.0.8 do Decreto n. 20172/97
DA ATIVIDADE RURAL
Por sua vez, para demonstrar o labor campesino, durante o período de 27/05/1974 a 19/08/1993, o autor (nascimento em 27/05/1962) trouxe aos autos:
- Certidão de casamento do genitor em que figura como lavrador em 1961;
- CTPS do requerente com registros de 01/03/1978 a 23/10/1978 (serviço gerais em estabelecimento agrícola); de 01/11/1979 a 03/10/1980 (trabalhador rural) e de 01/09/1994 a 01/03/1998 (serviços gerais rurais).
Na audiência de instrução e julgamento foi ouvida a parte autora e uma testemunha. Em seu relato, o requerente afirma que atualmente trabalha como pintor, sendo que por volta de 1970 começou a trabalhar na Fazenda São José com o pai e que residiam na mesma propriedade. Acrescenta que trabalhou desde aproximadamente seus 7 (sete) anos até 14 (quatorze) anos, sem registro em carteira. Por sua vez, a testemunha declara conhecer o requerente da Fazenda São José no ano de 1970, quando o autor se mudou para a propriedade e que ele trabalhava no campo. Afirma que no ano de 1974 deixou a propriedade com a família, não informando se o autor continuou prestando serviços rurais.
É importante destacar que, o trabalho rural, sem formal registro em CTPS, pode ser reconhecido, no entanto, deve ser baseado em início de prova material e corroborado por prova testemunhal, conforme preconizado pelo artigo 55, §3º, da Lei nº 8.213/91, in verbis:
"O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
(...)
§3º: A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento."
Do conjunto probatório, verifica-se que, embora haja início de prova material da atividade campesina alegada, o relato da testemunha é frágil e não abarca o período questionado, o que afasta a pretensão da parte autora.
DO DIREITO À APOSENTADORIA
Prosseguindo, com a somatória do tempo de contribuição incontroverso (id 306035796 – pág. 28: 27 anos, 10 meses e 25 dias) e o labor especial ora reconhecido, devidamente convertido, o requerente até 17/08/2016, data de encerramento do último vínculo empregatício (id 306035795 – pág. 02) não perfaz, pelo menos, 35 anos de contribuição exigidos pela legislação vigente à época.
Portanto, merece reforma, em parte, a r. sentença de primeiro grau.
VERBA HONORÁRIA
Em razão da sucumbência recíproca e proporcional das partes, condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios no valor de 5% do valor da causa e o INSS ao pagamento de 5% do valor da causa. No entanto, quanto à parte autora, suspendo a exigibilidade, por se tratar de beneficiária da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no art. 98, § 3º, do CPC.
As despesas do processo deverão ser suportadas pelas partes em observância ao art. 86 do CPC.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, de ofício, reduzo a r. sentença aos limites do pedido, excluindo da condenação o reconhecimento do labor especial no período de 27/05/1974 a 19/08/1993 e dou parcial provimento à apelação da Autarquia Federal, para reformar a r. sentença de primeiro grau e julgar improcedente o pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, excluindo da condenação o reconhecimento da atividade campesina no período de 27/05/1974 a 19/08/1993, observando-se no que tange à verba honorária os critérios estabelecidos no presente julgado.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. SENTENÇA ULTRA PETITA. NECESSIDADE DE ADEQUAÇÃO AOS LIMITES DO PEDIDO. ATIVIDADE RURAL E ESPECIAL. REQUISITOS PARA A APOSENTAÇÃO NÃO PREENCHIDOS. RECURSO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDO.
I. Caso em exame:
- Apelação do INSS em face da sentença que julgou procedente o pedido de reconhecimento de tempo rural e especial e concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
II. Questão em discussão:
- Há três questões em discussão: (i) adequar a r. sentença aos limites do pedido; (ii) possibilidade de reconhecimento da atividade rural e especial; (iii) saber se preenchidos os requisitos para o deferimento da aposentadoria por tempo de contribuição.
III. Razões de decidir:
- Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados que cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da EC 20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o mesmo prazo; e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
- A Emenda Constitucional n. 103 de 15 de novembro de 2019 trouxe inúmeras alterações ao sistema de Previdência Social, que passaram a vigorar na data da sua publicação em 13/11/2019.
- O pedido expresso na inicial ou extraído de seus termos por interpretação lógico-sistemática, limita o âmbito da sentença, isto é, o autor delimita a lide ao fixar o objeto litigioso, não sendo lícito ao julgador alterar o pedido, a causa petendi ou condenar em quantidade superior ao demandado, bem como conhecer de questões não suscitadas, a cujo respeito a lei exija a iniciativa da parte. É a aplicação do brocardo sententia debet esse conformis libello. Sendo assim, necessário reduzir, de ofício a r. sentença aos limites do pedido, excluindo da condenação o reconhecimento do labor especial no período de 27/05/1974 a 19/08/1993.
- Embora haja início de prova material da atividade campesina alegada, o relato da testemunha é frágil e não abarca o período questionado, o que afasta a pretensão da parte autora.
- Tempo de serviço especial reconhecido, considerando-se a exposição a ruído e substância química (chumbo).
- A somatória do tempo de contribuição não autoriza a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
- Condenação equitativa ao pagamento de honorários advocatícios, conforme a sucumbência recursal das partes, observada a gratuidade da justiça.
IV. Dispositivo e tese
- Apelação do INSS parcialmente provida.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
