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PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª TurmaAPELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000733-08.2023.4.03.6125 RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS APELANTE: EDSON JOSE DE MELLO Advogado do(a) APELANTE: SANDRA COSTA PEDRACA - SP380151-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I OO Desembargador Federal Jean Marcos (Relator): Trata-se de ação destinada a viabilizar a concessão de benefício previdenciário de auxílio-acidente ou aposentadoria por invalidez/auxílio-doença. A r. sentença (ID 334059906) julgou o pedido inicial improcedente, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Condenou a parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor da causa, suspensa a exigibilidade em razão da concessão da justiça gratuita. Apelação da parte autora (ID 334059910) em que requer a reforma da sentença. Requer a concessão do benefício de auxílio-doença desde a sua cessação. Subsidiariamente, requer a concessão de auxílio-acidente. Sem Contrarrazões. É o relatório.
V O T OO Desembargador Federal Jean Marcos (Relator): Da disciplina normativa acerca dos benefícios por incapacidade e auxílio-acidente A Constituição Federal de 1988, a teor do preceituado no artigo 201, inciso I, garante cobertura à incapacidade laboral. Dispõe a Lei nº 8.213/91, de 24-07-1991: "Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição. §1º A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de incapacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança. §2º A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão. (...). Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos. §1º Não será devido o auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão. (...). Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia. § 1º O auxílio-acidente mensal corresponderá a cinquenta por cento do salário-de-benefício e será devido, observado o disposto no § 5º, até a véspera do início de qualquer aposentadoria ou até a data do óbito do segurado. § 2º O auxílio-acidente será devido a partir do dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, independentemente de qualquer remuneração ou rendimento auferido pelo acidentado, vedada sua acumulação com qualquer aposentadoria. 3º O recebimento de salário ou concessão de outro benefício, exceto de aposentadoria, observado o disposto no § 5º, não prejudicará a continuidade do recebimento do auxílio-acidente." Conforme se pode ver, a Lei de Benefícios estabelece que o benefício previdenciário deaposentadoria por invalidez(benefício por incapacidade permanente) será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, forconsiderado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência. Por sua vez, oauxílio-doença (auxílio por incapacidade temporária)é direito dosegurado que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos. Por fim, o auxílio-acidente, nos termos dos artigos 26, inciso I, e 86, da Lei de Benefícios, independe de carência e será devido ao segurado quando reduzida sua capacidade para o trabalho habitual, em razão de sequela decorrente de acidente de qualquer natureza. A implantação de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez exige carência de 12 (doze) contribuições mensais nos termos dos artigos 25, inciso I, da Lei Federal nº 8.213/91. Não se exige carência "nos casos de segurado que, após filiar-se ao RGPS, for acometido de alguma das doenças e afecções especificadas em lista elaborada pelos Ministérios da Saúde e da Previdência Social, atualizada a cada 3 (três) anos, de acordo com os critérios de estigma, deformação, mutilação, deficiência ou outro fator que lhe confira especificidade e gravidade que mereçam tratamento particularizado", conforme artigo 26, inciso II, da Lei de Benefícios. Também independe de carência, para a concessão dos referidos benefícios, nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao RGPS, for acometido por uma das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei de Benefícios. É oportuno observar que a patologia ou a lesão de que já portara o trabalhador ao ingressar no RGPS não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia. A lei determina que para o implemento dos benefícios em tela é de rigor a existência do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as respectivas contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável. Trata-se do denominado "período de graça", nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios. Assim dispõe: "Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições: II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração; (...) VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo. § 1º. O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. § 2º. Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social. § 3º. Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social. § 4º. A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos". Observa-se, desse modo, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso da graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. O § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de mais 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social. Na hipótese de perda de qualidade de segurado, é viável a implantação do benefício mediante prova do cumprimento de metade da carência, conforme artigo 27-A, da Lei nº 8.213/91. Em se tratando de benefícios por incapacidade, a comprovação do fato se faz por meio de prova pericial, salvo se desnecessária em vista de outras provas produzidas (CPC, art. 464). Ainda quanto às provas, é oportuno ressaltar que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, na medida em que, a teor do art. 479 do CPC, "O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito". Contudo, é igualmente certo afirmar que a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que não englobe a questão jurídica em debate, depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer doexperto. Examino o caso concreto. Quanto à incapacidade, o perito judicial concluiu em 01/07/2024 (ID 334059896): "QUESITOS JUIZO Quesito 1. DIAGNÓSTICO. A parte autora é (foi) portadora de alguma doença/lesão/moléstia/deficiência/patologia física ou mental? Em caso positivo, qual é (foi), e qual a CID correspondente? Em caso negativo, quais as condições gerais de saúde da parte autora? Sim. amputação hálux, deficiência auditiva neurossensorial, relato de câncer de reto. Quesito 2. EXPLICAÇÕES MÉDICAS. Quais as características, consequências, sintomas e eventuais restrições oriundas da doença/lesão/moléstia/deficiência/patologia apresentada pela parte autora? Apresenta redução de capacidade decorrente de acidente em 2014. Apresenta deficiência auditiva moderada pelos exames(superior a 2 anos). Apresenta deficiência motora leve ortopédica por amputação de hálux dir(superior a 2 anos). Apresenta incapacidade temporária para toda atividade por 6 meses para tratamento de câncer de reto( câncer é relato do paciente, não apresenta documentação e não foi operado- apresenta acesso de quimioterapia em subclavia dir). Sofreu acidente em 24/11/2014, foi resgatado e diagnosticado com fatura exposta hálux, foi operado com regularização de coto de amputação. Ao exame com amputação total há lux dir com boa comunicação em uso de aparelho auditivo. Esteve afastado pelo inss entre 24/11/2014- 30/05/2015. Traz os relatos: 1/12/22- relatório- deficiencia neurosensorial moderada. 29/5/23- relatório psf Quesito 3. DID e DII. É possível precisar tecnicamente a data de início (e de final, se for o caso) da doença/lesão/moléstia/deficiência/patologia que acomete(u) a parte autora? Em caso positivo, é possível estabelecer a data/momento, ainda que aproximadamente, em que a doença/lesão/moléstia/deficiência se tornou incapacitante para a parte autora (data de início e de final, se for o caso)? Com base em quê o perito chegou na(s) data(s) mencionada(s)? Se apenas com base no que foi referido pelo periciando, o que deu credibilidade às suas alegações? Did- 24/11/14 amputação hálux, 1/12/22- deficiencia auditiva Dii- 29/5/23 Quesito 4. INCAPACIDADE - PROFISSÃO HABITUAL. Segundo sua impressão pericial, a parte autora encontra(ou)-se incapaz de exercer sua profissão habitual? Apresenta redução de capacidade decorrente de acidente em 2014.. Apresenta deficiência auditiva moderada pelos exames(superior a 2 anos). Apresenta deficiência motora leve ortopédica por amputação de hálux dir(superior a 2 anos). Apresenta incapacidade temporária para toda atividade por 6 meses para tratamento de câncer de reto( câncer é relato do paciente, não apresenta documentação e não foi operado- apresenta acesso de quimioterapia em subclavia dir). Quesito 5. TOTAL OU PARCIAL. Apesar da incapacidade, a parte autora pode exercer alguma outra profissão? Em caso positivo, citar exemplos de profissões que podem ser desempenhadas pela parte autora sem comprometimento das limitações oriundas de sua incapacidade. Apresenta redução de capacidade decorrente de acidente em 2014.. Apresenta deficiência auditiva moderada pelos exames(superior a 2 anos). Apresenta deficiência motora leve ortopédica por amputação de hálux dir(superior a 2 anos). Apresenta incapacidade temporária para toda atividade por 6 meses para tratamento de câncer de reto( câncer é relato do paciente, não apresenta documentação e não foi operado- apresenta acesso de quimioterapia em subclavia dir). Quesito 6. TEMPORÁRIA OU DEFINITIVA. A incapacidade que acomete a autora é reversível? Se sim, qual o tratamento e qual o tempo de sua duração para a devida recuperação? Temporaria. 6 meses Quesito 7. VIDA INDEPENDENTE. A parte autora precisa de assistência permanente de outra pessoa para os atos do cotidiano? Não O perito judicial concluiu pela incapacidade total e temporária devido ao câncer e redução da capacidade devido a amputação de hálux superior direito. Embora o magistrado não esteja adstrito às conclusões do laudo pericial, nos termos dos artigos 436 do CPC/1973 e 479 do CPC/2015, estas devem ser consideradas, por se tratar de prova técnica, elaborada por profissional da confiança do Juízo e equidistante das partes. Apesar de o laudo pericial ter concluído pela redução da capacidade laboral em razão do acidente ocorrido em 24/11/2014, na referida data a parte autora era segurada do RGPS na qualidade de contribuinte individual, categoria não contemplada para a concessão do auxílio-acidente, uma vez que, nos termos do art. 86 da Lei nº 8.213/91, o benefício é devido apenas ao segurado empregado, trabalhador avulso e segurado especial, não alcançando o contribuinte individual e o segurado facultativo. Também não é devido o auxílio-doença, embora atestada pelo perito a incapacidade total e temporária em virtude de diagnóstico de câncer, pois não houve requerimento administrativo específico nesse sentido, o que inviabiliza a concessão judicial por falta de interesse de agir da parte autora. Ressalte-se que a parte autora pode formular o pedido de benefício por incapacidade diretamente na esfera administrativa, a qualquer tempo. Assim, não há direito à concessão de benefício por incapacidade, nos termos dos arts. 42, 59 e 86 da Lei nº 8.213/91 Por tais fundamentos, nego provimento à apelação da parte autora. É o voto. E M E N T ADIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AUXÍLIO-ACIDENTE. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. SEGURADO NÃO CONTEMPLADO PARA AUXÍLIO-ACIDENTE. AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO PARA AUXÍLIO-DOENÇA. BENEFÍCIO INDEFERIDO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
III. RAZÕES DE DECIDIR
IV. DISPOSITIVO E TESE
Tese de julgamento:
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 201, I; Lei nº 8.213/91, arts. 15, 25, I, 26, I e II, 27-A, 42, 59, 86 e 151; CPC/2015, arts. 464 e 479. Jurisprudência relevante citada: Não há menção a precedentes no voto. A C Ó R D Ã OVistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
JEAN MARCOS
Desembargador Federal |
