
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5071366-38.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
APELANTE: LUZIA APARECIDA DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: MARIA ROSANGELA DE CAMPOS - SP283780-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5071366-38.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
APELANTE: LUZIA APARECIDA DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: MARIA ROSANGELA DE CAMPOS - SP283780-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
A EXCELENTÍSSIMA DESEMBARGADORA FEDERAL CRISTINA MELO:
Trata-se de ação ajuizada por LUZIA APARECIDA DOS SANTOS contra o INSS objetivando o restabelecimento do benefício de auxílio-doença e sua posterior conversão em aposentadoria por invalidez.
A autora sustenta em síntese que devido a hipertensão, fibromialgia, e depressão crônica, encontra-se incapacitada para o exercício de atividade laborativa, pleiteando a antecipação de tutela para que seja restabelecido o benefício de auxílio-doença, e ao final, a conversão em aposentadoria por invalidez, a partir da data do requerimento administrativo.
Laudos periciais foram juntados no ID 8244086 e 8244091, com manifestação do INSS no ID 8244097, e da parte autora no ID 8244101.
A sentença julgou improcedente o pedido por ausência de nexo entre a incapacidade apontada nos laudos periciais e a atividade laborativa da autora. Os honorários advocatícios foram fixados em 10% sobre o valor da causa, observado o art. 98, §3º do CPC.
A autora recorreu, alegando que não há que se falar em nexo de causalidade entre as incapacidades e atividade laboral da autora, já que se trata de situação de incapacidade por condições orgânicas da apelante. Afirma que as condições rurícolas são rudes, com acentuado esforço físico, além de que a autora tem baixo nível de escolaridade, em conjunto com as doenças impossibilita sua readaptação em outra atividade.
Assim, requer o restabelecimento de auxílio doença c/c aposentadoria por invalidez e pedido de tutela antecipada.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
No ID 252545426, foi proferido acórdão que converteu o julgamento em diligência, determinando o retorno dos autos à Vara de origem para que fosse esclarecido o ponto divergente entre os laudos produzidos em Juízo, já que a perícia do ID 8244086 considerou que a patologia psiquiátrica da autora é suscetível de cura e não causa incapacidade para desempenho de atividade laborativa, já a perícia de ID 8244091 determinou a presença de incapacidade total e temporária, com sugestão de afastamento por 6 meses.
Prestados os devidos esclarecimentos no ID 268257876, com manifestação do INSS no ID 268260692, os autos retornaram para julgamento do recurso autoral.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5071366-38.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
APELANTE: LUZIA APARECIDA DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: MARIA ROSANGELA DE CAMPOS - SP283780-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
A EXCELENTÍSSIMA DESEMBARGADORA FEDERAL CRISTINA MELO: Tempestivo o recurso e preenchidos os demais requisitos de admissibilidade, passo ao exame da matéria devolvida a esta Corte.
APOSENTADORIA POR INVALIDEZ / INCAPACIDADE PERMANENTE
Estabelece o art. 42 da Lei nº 8.213/91 que “a aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição”.
A concessão do benefício dependerá de prévia avaliação por exame médico perito oficial, não sendo considerada, para fins de condição de incapacidade, a doença ou lesão pré-existente à filiação ao RGPS, exceto se a incapacidade decorrer de progressão ou agravamento da doença ou lesão.
AUXÍLIO-DOENÇA
Nos termos do art. 59 da Lei nº 8.213/91, “O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos”, acrescentando o Decreto nº 3.048/99, com redação dada pelo Decreto nº 10.410/2020, que a análise dar-se-á por meio de avaliação médico-pericial.
A incapacidade reportada não pode estar relacionada a doença pré-existente à data da filiação ao RGPS, ressalvada a hipótese em que a incapacidade se der em decorrência do agravamento ou progressão da doença já existente, também estabelecendo a lei ser indevido o benefício a segurado condenado a pena de reclusão, em regime fechado. O valor do benefício consistirá numa renda mensal correspondente a 91% do salário-de-benefício.
Sempre que possível, o ato concessivo do benefício será acompanhado de estimativa de prazo de sua duração e, na ausência de estimativa, será considerada a cessação após decorridos 120 (cento e vinte) dias da data da concessão ou de eventual reativação, caso o segurado não tenha requerido administrativamente a prorrogação do benefício.
Por fim, caso o segurado seja considerado definitivamente incapacitado para o exercício da atividade habitual, deverá ser submetido a processo de reabilitação profissional em outra atividade, sendo mantido o benefício até que seja considerado reabilitado em atividade que lhe garanta a subsistência ou, caso não seja possível, até a conversão em aposentadoria por invalidez.
A legislação previdenciária prevê expressamente que o auxílio doença não pode ser recebido cumulativamente com aposentadoria, salvo no caso de direito adquirido.
CARÊNCIA:
Em regra, a legislação previdenciária exige para fins de concessão de benefício, o preenchimento do período de carência de 12 (doze) contribuições mensais, exceção legal feita aos “casos de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como nos casos de segurado que, após filiar-se ao RGPS, for acometido de alguma das doenças e afecções especificadas em lista elaborada pelos Ministérios da Saúde e da Previdência Social, (...)”, situações para as quais a concessão do benefício independe de carência (arts. 25 e 26 da Lei nº 8.213/91).
Dispõe ainda a legislação pertinente que, no caso de perda da qualidade de segurado, para fins de concessão do benefício de auxílio-doença/auxílio por incapacidade temporária, dever-se-á observar o período de carência correspondente a metade do período de 12 meses inicialmente estabelecido no art. 25, I, da Lei nº 8.213/91, contados a partir da nova filiação à Previdência Social.
Isto estabelecido, tem-se que o benefício de auxílio-doença/auxílio por incapacidade temporária e a aposentadoria por invalidez/aposentadoria por incapacidade permanente exigem, em regra, a presença concomitante dos seguintes requisitos básicos: vínculo com a previdência social, prova de incapacidade para o exercício da atividade profissional e cumprimento do período de carência, se assim o exigir o caso específico.
No que diz respeito ao cumprimento de carência pelo trabalhador rural (art. 26, inciso III), cumpre anotar que não se exige o recolhimento de contribuição previdenciária por determinado número de meses, mas a comprovação do exercício da atividade rural durante o respectivo período (STJ, AgInt no REsp n. 1.793.400/RS, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 6/6/2019, DJe de 17/6/2019).
DO CASO DOS AUTOS
Verifica-se nos autos que a parte autora, com idade atual de 48 anos de idade, agricultora, apresenta transtorno depressivo recorrente e foi submetida a duas perícias judiciais.
Na 1ª perícia, na especialidade de psiquiatria, realizada em 25/04/2017 (ID 8244086), concluiu o r. expert que "Pelos dados anamnésicos, exames realizados, concluo que a periciada é portadora de transtorno depressivo recorrente. Apesar de sua doença e condições atuais, não apresenta a periciada elementos incapacitantes para as suas atividades trabalhistas."
Na 2ª perícia, na especialidade de neurologia, realizada em 23/05/2017 (ID 8244091), concluiu o r. expert que "A requerente é portadora de transtorno depressivo, com incapacidade total e temporária para o trabalho habitual. Portadora também de hipertensão arterial, fibromialgia e doença degenerativa da coluna vertebral com discopatias".
Intimado para esclarecer acerca da existência, ou não, de incapacidade, desconsiderando a eventual enfermidade psiquiátrica, informou o r. expert (ID 268257876):
"O laudo pericial concluiu incapacidade total e temporária para o trabalho habitual pelo transtorno depressivo, pelo prazo de seis meses. Considerando a conclusão de especialista em psiquiatria de que não há incapacidade pelo transtorno depressivo concluímos que há apenas redução da capacidade laborativa da autora por hipertensão arterial, fibromialgia e doença degenerativa da coluna vertebral com discopatias além do tratamento psiquiátrico."
Esclareça-se, de início, que o laudo pericial, elaborado por perito de confiança do Juízo e equidistante das partes, considerou para a respectiva conclusão tanto o exame presencial como os argumentos, documentos particulares e quesitos das partes, consubstanciando, portanto, prova idônea de convencimento, prevalecendo sobre atestados e exames médicos produzidos unilateralmente.
No caso, de acordo com o laudo de ID 8244091, concluiu-se pela incapacidade total e temporária da autora para atividades habituais. De acordo com o esclarecimento de ID 268257876, ficou comprovada a redução da capacidade laborativa, “há apenas redução da capacidade laborativa da autora por hipertensão arterial, fibromialgia e doença degenerativa da coluna vertebral com discopatias além do tratamento psiquiátrico.”
Assim, ainda que o magistrado não esteja adstrito às conclusões do laudo pericial, conforme dispõem o artigo 436 do CPC/1973 e o artigo 479 do CPC/2015, estas devem ser consideradas, por se tratar de prova técnica, elaborada por profissional da confiança do Juízo e equidistante das partes.
O laudo em questão foi realizado por profissional habilitado, equidistante das partes, capacitado, especializado em perícia médica, e de confiança do r. Juízo, cuja conclusão encontra-se lançada de forma objetiva e fundamentada, não havendo que se falar em realização de nova perícia judicial.
Outrossim, o laudo pericial atendeu às necessidades do caso concreto, possibilitando concluir que o perito realizou minucioso exame clínico, respondendo aos quesitos formulados. Além disso, levou em consideração, para formação de seu convencimento, a documentação médica colacionada aos autos.
Desse modo, considerando que a parte autora, conforme concluiu o perito judicial, não pode exercer, de forma temporária, a sua atividade habitual, é possível a concessão do benefício do auxílio-doença, pelo prazo de 6 meses, a contar da data da juntada do esclarecimento de ID 268257876, em 16/05/2022, até porque preenchidos os demais requisitos legais.
CORREÇÃO MONETÁRIA
A correção monetária deve ser aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação superveniente, conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal, observados os termos da decisão final no julgamento do RE n. 870.947, Rel. Min. Luiz Fux.
JUROS DE MORA
Conforme disposição inserta no art. 219 do Código de Processo Civil 1973 (atual art. 240 Código de Processo Civil - Lei nº 13.105/2015), os juros de mora são devidos a partir da citação na ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02, após, à razão de 1% ao mês, consonante com o art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), calculados nos termos deste diploma legal.
DA APLICAÇÃO ÚNICA DA SELIC A PARTIR DA EC N° 113, DE 08/12/2021
A partir do mês de promulgação da Emenda Constitucional n° 113, de 08/12/2021, a apuração do débito se dará unicamente pela taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3°, ficando vedada a incidência da taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária.
CUSTAS
Conquanto a Lei Federal nº 9.289/96 disponha no art. 4º, I, que as Autarquias são isentas do pagamento de custas na Justiça Federal, seu art. 1º, §1º, delega à legislação estadual normatizar sobre a respectiva cobrança nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual no exercício da competência delegada. Note-se que, em se tratando das demandas aforadas no Estado de São Paulo, tal isenção encontra respaldo na Lei Estadual nº 11.608/03 (art. 6º).
A isenção referida não abrange as despesas processuais que houver efetuado, bem como, aquelas devidas a título de reembolso à parte contrária, por força da sucumbência.
Condeno o INSS a pagar honorários de advogado, de forma exclusiva, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até a data deste acórdão, consoante critérios do artigo 85 do CPC e Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Diante do exposto, dou provimento à apelação da Autora, nos termos supra.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA. REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. CUSTAS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO PROVIDA.
Apelação cível interposta por segurada contra decisão que negou a concessão de benefício previdenciário de auxílio-doença, sob alegação de ausência de incapacidade laborativa. A autora, agricultora de 48 anos, apresenta transtorno depressivo recorrente e outras condições de saúde, e foi submetida a duas perícias judiciais.
Há duas questões em discussão: (i) definir se a autora faz jus ao benefício de auxílio-doença, considerando a incapacidade total e temporária para o trabalho habitual; (ii) estabelecer os critérios para a aplicação da correção monetária, juros de mora, e condenação em custas processuais e honorários advocatícios.
O laudo pericial judicial conclui pela incapacidade total e temporária da autora para o exercício de sua atividade habitual, determinando a concessão do benefício de auxílio-doença por seis meses.
A concessão do benefício se justifica pela comprovação da incapacidade temporária, com base no laudo pericial idôneo, elaborado por perito de confiança do Juízo, prevalecendo sobre laudos particulares.
A correção monetária deve seguir a Lei n. 6.899/81, com aplicação da taxa SELIC a partir da promulgação da Emenda Constitucional n° 113/2021, vedada a sua cumulação com outros índices de correção e juros.
Os juros de mora são devidos desde a citação, conforme a legislação vigente em cada período.
A isenção de custas do INSS não abrange despesas processuais que houver efetuado, bem como honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data do acórdão, nos termos do artigo 85 do CPC e da Súmula 111 do STJ.
Recurso provido.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADORA FEDERAL
