
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5157857-77.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
APELANTE: ANTONIA ALVES ANANIAS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: CRISTIANO ALEX MARTINS ROMEIRO - SP251787-N, PAULO HENRIQUE DE OLIVEIRA ROMANI - SP307426-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ANTONIA ALVES ANANIAS
Advogados do(a) APELADO: CRISTIANO ALEX MARTINS ROMEIRO - SP251787-N, PAULO HENRIQUE DE OLIVEIRA ROMANI - SP307426-N
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5157857-77.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
APELANTE: ANTONIA ALVES ANANIAS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: CRISTIANO ALEX MARTINS ROMEIRO - SP251787-N, PAULO HENRIQUE DE OLIVEIRA ROMANI - SP307426-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ANTONIA ALVES ANANIAS
Advogados do(a) APELADO: CRISTIANO ALEX MARTINS ROMEIRO - SP251787-N, PAULO HENRIQUE DE OLIVEIRA ROMANI - SP307426-N
R E L A T Ó R I O
A EXCELENTÍSSIMA DESEMBARGADORA FEDERAL CRISTINA MELO (RELATORA): Trata-se de ação movida pela parte autora contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), cujo objetivo é a concessão de aposentadoria por idade híbrida, com base nos arts. 48 e 143, da Lei 8.213/91 (Lei de Benefícios da Previdência Social – LBPS).
Processado o feito, a demanda foi julgada PARCIALMENTE PROCEDENTE pela r. sentença (ID 123893292).
Em face da r. sentença, houve duplo apelo. Por um lado, a parte autora interpôs o seu recurso de apelação (ID 123893296), reforçando seus argumentos para que a aposentadoria por idade híbrida seja concedida e requerendo a majoração da verba sucumbencial. De outro lado, o INSS interpôs seu recurso de apelação (ID 123893298), para que a pretensão autoral seja julgada totalmente improcedente, uma vez que argumenta não existir início de prova material em nome da parte autora para o reconhecimento do período de atividade rural.
Sem contrarrazões, os autos foram remetidos a este E. Tribunal Regional Federal.
Nesta instância, foi proferida decisão monocrática, na qual a apelação da parte autora foi parcialmente provida, enquanto a do INSS foi desprovida (ID 287419988).
Em face de tal julgado, o INSS interpôs agravo interno, a fim de obter a reforma, com base nos seguintes argumentos: (i) não comprovação de tempo rural; (ii) data de início do benefício na da citação, diante da reafirmação da DER; (iii) juros moratórios após 45 dias da determinação de cumprimento da obrigação; e (iv) descabimento da condenação em honorários advocatícios, diante da ausência de sucumbência.
Intimada, a parte autora não apresentou contrarrazões.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5157857-77.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
APELANTE: ANTONIA ALVES ANANIAS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: CRISTIANO ALEX MARTINS ROMEIRO - SP251787-N, PAULO HENRIQUE DE OLIVEIRA ROMANI - SP307426-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ANTONIA ALVES ANANIAS
Advogados do(a) APELADO: CRISTIANO ALEX MARTINS ROMEIRO - SP251787-N, PAULO HENRIQUE DE OLIVEIRA ROMANI - SP307426-N
V O T O
A EXCELENTÍSSIMA DESEMBARGADOR FEDERAL CRISITNA MELO (RELATORA): Diante da regularidade formal do presente recurso, com suporte no art. 1.011, do CPC, conheço o recurso e passo à análise do objeto da insurgência recursal propriamente dita.
Aposentadoria por idade híbrida
Discute-se nos autos originários o reconhecimento de atividade na condição de trabalhador rural, e a concessão de aposentadoria por idade híbrida.
Nos termos dos arts. 48 e seguintes da Lei n.º 8.213/91, a aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, e o preenchimento etário de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. E, conforme art. 48 § 3º da Lei n. º 8.213/91, os trabalhadores poderão somar tempo rural e urbano para fins de cumprimento de carência. Tal período de carência exigido, por sua vez, está disciplinado pelo artigo 25, inciso II, da Lei de Planos de Benefícios da Previdência Social, o qual prevê 180 contribuições mensais, bem como pela norma transitória contida em seu artigo 142.
Sobre o tema. o E. Superior Tribunal de Justiça (STJ) no Repetitivo nº 1007 fixou a seguinte tese:
“O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3º da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo” STJ. 1ª Seção. REsp 1.788.404-PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 14/08/2019 (recurso repetitivo - Tema 1007).
Ademais, a comprovação do labor rural se dá através de início de prova material, ainda que incipiente, desde que haja corroboração da prova testemunhal, de acordo com arts. 48, 55, § 3º e 143 da LBPS.
Cabe ressaltar que, com relação ao labor campesino, reconhece-se na jurisprudência elenco de posicionamentos assentados sobre o assunto, a nortear apreciação das espécies e a valoração dos respectivos conjuntos probatórios. Dentre esses entendimentos, podem-se destacar os seguintes:
(i) É suficiente à demonstração do labor rural início de prova material (v.g., documentos expedidos por órgãos públicos que contemplem a qualificação rurícola da parte autora, não sendo taxativo o rol de documentos previsto no art. 106 da Lei nº 8.213/91), corroborado por prova testemunhal coesa e harmônica, sendo inservível a tal finalidade prova exclusivamente testemunhal (Súmula STJ 149), inclusive para os chamados "boias-frias" (STJ, REsp 1321493/PR, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 19/12/2012, apreciado na sistemática do art. 543-C do CPC/1973);
(ii) Os documentos em nome de terceiros, como pais, cônjuge e filhos, servem como início de prova escrita para fins de comprovação da atividade rural em regime de economia familiar, onde dificilmente todos os membros da família terão documentos em seu nome, posto que concentrados, na maioria das vezes, na figura do chefe da família (STJ, EREsp 1171565/SP, Relator Ministro Nefi Cordeiro, Terceira Seção, DJe 05/3/2015; AgRg no REsp 1073582/SP, Relator Ministro OG Fernandes, Sexta Turma, DJe 02/03/2009; REsp 447655, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, DJ 29/11/2004).
(iii) Possível o reconhecimento de tempo de serviço rural antecedente ou ulterior ao princípio de prova documental apresentado, desde que ratificado por testemunhos idôneos (STJ, REsp nº 1.348.633/SP, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJE 05/12/2014).
Assinale-se, por oportuno, ser prescindível que o início de prova material se estenda por todo o período laborado, bastando seja contemporâneo aos fatos alegados e corroborado por testemunhos idôneos, de sorte a lhe ampliar a eficácia probante. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO INTEGRAL, MEDIANTE A JUNÇÃO DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL COM O URBANO. ATIVIDADE RURÍCOLA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. RECONHECIMENTO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.1. Para efeito de reconhecimento do tempo de serviço urbano ou rural, não há exigência legal de que o documento apresentado abranja todo o período que se quer ver comprovado, devendo o início de prova material ser contemporâneo aos fatos alegados e referir-se, pelo menos, a uma fração daquele período, desde que prova testemunhal amplie-lhe a eficácia probatória.2. Agravo regimental desprovido.(STJ, AgRg no REsp 1141458/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 23/02/2010, DJe 22/03/2010).
Relevante, ainda, nesse ponto, o posicionamento firmado pelo C. STJ, no sentido de considerar a possibilidade de reconhecimento do tempo anterior à data de emissão do documento mais antigo apresentado pelo segurado. Veja-se:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/91. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. RECONHECIMENTO A PARTIR DO DOCUMENTO MAIS ANTIGO. DESNECESSIDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONJUGADO COM PROVA TESTEMUNHAL. PERÍODO DE ATIVIDADE RURAL COINCIDENTE COM INÍCIO DE ATIVIDADE URBANA REGISTRADA EM CTPS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.1. A controvérsia cinge-se em saber sobre a possibilidade, ou não, de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao documento mais antigo juntado como início de prova material.2. De acordo com o art. 400 do Código de Processo Civil "a prova testemunhal é sempre admissível, não dispondo a lei de modo diverso". Por sua vez, a Lei de Benefícios, ao disciplinar a aposentadoria por tempo de serviço, expressamente estabelece no § 3º do art. 55 que a comprovação do tempo de serviço só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, "não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento" (Súmula 149/STJ).3. No âmbito desta Corte, é pacífico o entendimento de ser possível o reconhecimento do tempo de serviço mediante apresentação de um início de prova material, desde que corroborado por testemunhos idôneos. Precedentes.4. A Lei de Benefícios, ao exigir um "início de prova material", teve por pressuposto assegurar o direito à contagem do tempo de atividade exercida por trabalhador rural em período anterior ao advento da Lei 8.213/91 levando em conta as dificuldades deste, notadamente hipossuficiente.5. Ainda que inexista prova documental do período antecedente ao casamento do segurado, ocorrido em 1974, os testemunhos colhidos em juízo, conforme reconhecido pelas instâncias ordinárias, corroboraram a alegação da inicial e confirmaram o trabalho do autor desde 1967.6. No caso concreto, mostra-se necessário decotar, dos períodos reconhecidos na sentença, alguns poucos meses em função de os autos evidenciarem os registros de contratos de trabalho urbano em datas que coincidem com o termo final dos interregnos de labor como rurícola, não impedindo, contudo, o reconhecimento do direito à aposentadoria por tempo de serviço, mormente por estar incontroversa a circunstância de que o autor cumpriu a carência devida no exercício de atividade urbana, conforme exige o inc. II do art. 25 da Lei 8.213/91.7. Os juros de mora devem incidir em 1% ao mês, a partir da citação válida, nos termos da Súmula n. 204/STJ, por se tratar de matéria previdenciária. E, a partir do advento da Lei 11.960/09, no percentual estabelecido para caderneta de poupança. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do Código de Processo Civil. (STJ, REsp 1348633/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/08/2013, DJe DATA: 05/12/2014).
Da comprovação do período de carência
a) Do período de atividade rural
Conforme relatado, a parte autora almeja que seja reconhecido períodos como de atividade rural em regime de economia familiar.
Para tanto, juntou alguns documentos, dos quais se destacam como eficazes para o fim de constituição de início de prova material:
- Matrícula do Imóvel Rural, na qual consta a profissão de lavrador do marido da parte autora (ID 123893260 – p. 07 a 09);
- Certidão de Casamento, datada em 12/08/1965, na qual consta a profissão de lavrador do marido da parte autora (ID 123893260 – p. 10);
- Certidão de Nascimento da filha, nascida em 02/08/1967, na qual consta a profissão de lavrador do marido da parte autora (ID 123893260 – p. 11).
Em complemento, a prova testemunhal trouxe as seguintes informações aos autos:
- Testemunho do Sr. Antenor José de Sá: informou que conhece a parte autora desde aproximadamente de 1964, desde que ela era criança; que desde aquele tempo a parte autora já trabalhava na lavoura; que continuou trabalhando com o marido na mesma atividade, até o período de 1975, quando se mudaram de cidade; que plantavam amendoim, algodão e milho; que o sítio tinha aproximadamente 5 alqueires; que trabalhava no sítio desde antes do casamento.
- Testemunho do Sr. José Ferreira de Lima: informou que conhece a parte autora desde criança; que a parte autora trabalhava na roça desde essa época e que continuou trabalhando na roça até 1975, quando se mudou; que o sítio do marido tinha aproximadamente 5 alqueires; que o nome do sítio era “São Domingues”; que plantavam lavoura branca, feijão, milho e outros; que que trabalhava desde antes de casar; que não tinham empregados.
Como é sabido, o ambiente rural é marcado pela informalidade, desproteção e estímulo à informalidade. Neste contexto, não é razoável exigir do segurado que ele traga documentação capaz de retratar com absoluta precisão o seu histórico laboral. Tal objetivo somente é alcançado a partir da análise destes documentos à luz dos esclarecimentos trazidos pela prova testemunhal.
Nesse sentido, constata-se que, neste caso em particular, a parte autora logrou êxito em apresentar início de prova material capaz de trazer forte indício de atividade rural em regime de economia familiar.
Não bastasse, a prova testemunhal corroborou a constatação de atividade rural em regime de economia familiar, permitindo que se conclua que a parte autora atuou no campo pelos períodos de 12/08/1965 (data da prova material mais antiga) a 30/04/1969 e de 10/09/1969 a 28/02/1975 (data retificada e de acordo com o pedido da petição inicial).
b) Do período de atividade urbana
Compulsando os autos, também é possível observar que, após os períodos de atividade rural, a parte autora se mudou para ambiente urbano, em que desempenhou atividades diversas. Dentre essas, há sólidas informações de que a mesma passou a ser qualificada como contribuinte individual do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), pelo período compreendido entre 01/01/2016 e 29/02/2024. É o que consta no extrato previdenciário relativo à parte autora no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS):
Neste contexto, em que pese o fato de que, na data de entrada do requerimento administrativo (DER), a parte autora não tinha contribuições suficientes para a concessão do benefício pretendido, é forçoso reconhecer que houve continuidade contributiva, o que constitui fato superveniente que viabiliza a aplicação da tese da reafirmação da DER.
De acordo com o sistema processual brasileiro, o juiz tem o dever de reconhecer, até mesmo de ofício, fatos supervenientes que influam na decisão da demanda. E, frise-se que tal mandamento se impõe também na 2ª instância do Judiciário, como ditam os seguintes dispositivos do CPC:
Art. 493. Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão.
Art. 933. Se o relator constatar a ocorrência de fato superveniente à decisão recorrida ou a existência de questão apreciável de ofício ainda não examinada que devam ser considerados no julgamento do recurso, intimará as partes para que se manifestem no prazo de 5 (cinco) dias.
No âmbito previdenciário, tal preceito processual trouxe grandes repercussões aos casos em que os segurados implementavam o direito a benefícios após a promoção de ações judiciais. Para estas hipóteses, tornou-se majoritário o entendimento de que os segurados fazem jus a benefícios, mesmo que o adimplemento dos requisitos legais se dê em momento posterior ao requerimento administrativo.
Tal tese ganhou a alcunha de “reafirmação da DER” e alcançou o status de posicionamento dominante na jurisprudência. É o que se observa no precedente vinculante do STJ que fixou a seguinte tese do Tema 995:
É possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir.
STJ. 1ª Seção. REsp 1.727.064-SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 23/10/2019 (recurso repetitivo - Tema 995) (Info 661).
Outro entendimento não seria possível, pois a tese da “reafirmação da DER” nada mais é que a mais justa homenagem aos princípios da máxima efetivação dos direitos fundamentais (tendo o direito à previdência o status de autêntico direito humano e fundamental) e da utilidade, economia e instrumentalidade do processo.
Outrossim, a teoria da “reafirmação da DER” concretiza basilar princípio do direito previdenciário, qual seja o da primazia do acertamento. Como bem explica José Antônio Savaris:
“Segundo o princípio da primazia do acertamento, o que realmente importa é a definição da relação jurídica de proteção social. Para tanto, deve-se perquirir sobre a eventual existência de direito e determinar sua realização nos precisos termos a que a pessoa faz jus.
(...)
De acordo com a primazia do acertamento, é insustentável a recusa judicial de satisfação de direito fundamental ao argumento de que o ato administrativo indeferitório se encontra em consonância com a legalidade. Muito mais do que realizar o controle de legalidade do ato administrativo, o exercício da função jurisdicional deve comprometer-se com o acertamento da relação jurídica de proteção social e, por consequência, com a integral defesa, promoção e realização desses direitos fundamentais.
(...)
A conclusão a que se chega a partir da primazia do acertamento é a de que o direito à proteção social, particularmente nas ações concernentes aos direitos prestacionais de conteúdo patrimonial, deve ser concedido na exata expressão a que a pessoa faz jus e com efeitos financeiros retroativos ao preciso momento em que se deu o nascimento do direito - observado o direito ao benefício mais vantajoso, que pode estar vinculado a momento posterior.
(...) o acertamento determina que a prestação jurisdicional componha a lide de proteção social como ela se apresenta no momento da sua entrega.”. (Direito processual previdenciário. 9ª ed., Curitiba: Alteridade, p. 151/154).
Nesse sentido, é possível concluir que a parte autora implementou o requisito da carência da aposentadoria por contribuição em momento posterior ao ajuizamento da ação, conforme tabela demonstrativa abaixo:
Neste cenário, observa-se que a parte autora, como segurada especial, verteu 111 contribuições ao RGPS. Após, como contribuinte individual, somou outras 98 contribuições à Previdência Social. Logo, tendo em vista a regra contida no art. 142, da LBPS, a parte autora alcançou as exigidas 138 contribuições após 27 recolhimentos como contribuinte individual. Com isso, têm-se que a mesma implementou todos os requisitos para a concessão da aposentadoria por idade híbrida em 01/04/2018 (DER reafirmada).
Sendo assim, diante de todos elementos de prova colhidos nestes autos, é possível concluir que a parte autora faz jus ao benefício de aposentadoria por idade híbrida, desde a DER reafirmada.
Data de início do benefício
Neste ponto, ao contrário da matéria de mérito principal, tem razão o INSS em seu recurso de agravo interno.
De fato, o implemento dos requisitos através da reafirmação da DER se deu em período posterior ao processo administrativo e anterior ao ajuizamento da ação. Com isso, é justo que a data de início do benefício seja fixada na data da citação, pois somente com a presente ação judicial o INSS pôde se manifestar a respeito destes fatos supervenientes, configurando-se a sua mora, nos moldes do art. 240, CPC.
Juros da mora
Quanto a este ponto, o INSS busca a aplicação do que foi decidido em sede de embargos de declaração opostos contra o recurso especial paradigmático, cujo julgamento firmou tese vinculante no Tema 995 (STJ, EDcl no REsp nº 1727063 – SP, julgado em 19/05/2020).
E, também, merece guarida este seu pleito recursal. Em que pese o mencionado julgado do Tema 995 se refira às hipóteses em que a implementação dos requisitos se dá posteriormente ao ajuizamento da ação, a mesma inteligência é plenamente aplicável ao presente caso.
Ao analisar a decisão proferida pelo STJ, observa-se que é devida a aplicação por analogia do art. 41-A, § 5º, da LBPS aos casos de reafirmação da DER em momento posterior ao ajuizamento da ação. Assim, é devido um prazo de 45 dias para que o INSS possa se readaptar aos fatos supervenientes e cumpra a obrigação imposta judicialmente.
Nesse sentido, embora o implemento dos requisitos tenha se dado em momento anterior ao ajuizamento da ação neste caso em particular, mostra-se também razoável a aplicação por analogia do art. 41-A, § 5º, da LBPS, para que seja garantido tempo para o INSS cumprir com a obrigação de implementar o benefício e pagar os valores em atraso.
Desta forma, os juros da mora sobre as prestações devidas são devidos somente após 45 dias do eventual descumprimento de sua obrigação de implantação do benefício.
Honorários de sucumbência
Quanto aos honorários advocatícios, o INSS busca afastar sua condenação ao pagamento, suplantado no argumento de que não haveria resistência ou sucumbência no caso presente.
Contudo, não há cabimento em dizer que não houve resistência, quando o INSS apresentou contestação e se manifestou regularmente em todas oportunidades cabíveis neste processo. Além do mais, o presente julgado assenta que a autarquia é sucumbente na obrigação principal de implementar a obrigação previdenciária.
Logo, não assiste razão a este pleito recursal do INSS.
Prequestionamento
Relativamente ao prequestionamento de matéria ofensiva a dispositivos de lei federal e de preceitos constitucionais, tendo sido o recurso apreciado em todos os seus termos, nada há que ser discutido ou acrescentado aos autos.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao agravo interno do INSS, nos moldes da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE RURAL E URBANA. REAFIRMAÇÃO DA DER. REQUISITO ETÁRIO E CARÊNCIA ATENDIDOS. BENEFÍCIO DEVIDO. DATA DO INÍCIO DO BENEFÍCIO. JUROS DA MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AGRAVO INTERNO PARCIALMENTE PROVIDO.
- A aposentadoria por idade híbrida, prevista no § 3º, do art. 48 da Lei n.º 8.213/91, garante ao segurado que não laborou exclusivamente em atividade rural, somar os períodos de labor rural, ainda que de forma descontinuada, a períodos em categorias diversas, notadamente em atividade urbana, para fins de concessão da aposentadoria por idade.
- No caso dos autos, o período de atividade rural, devidamente comprovado por início de prova material e prova testemunhal, foi somado a período contributivo em atividade urbana, no qual a parte autora se enquadrava como contribuinte individual.
- Aplicação da tese da reafirmação da der, fixada no Tema 995, do STJ.
- Requisito etário e carência devidamente observados, sendo devido o benefício de aposentadoria por idade híbrida.
- Nas hipóteses de reafirmação da DER por fatos posteriores ao processo administrativo, é cabível a fixação da data de início do benefício na da citação, com base no art. 240, CPC.
- Quanto aos juros da mora, o STJ decidiu que, na aplicação do Tema 995, somente há incidência destes consectários após 45 dias de eventual descumprimento da obrigação de implantação do benefício.
- Diante da sucumbência, é devida a condenação do INSS em honorários advocatícios, não havendo que se falar em ausência de resistência aos fatos posteriores ao processo administrativo, se há no presente caso regular contestação e manifestações do INSS.
- Agravo interno do INSS parcialmente provido.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADORA FEDERAL
