Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5000454-15.2019.4.03.6108
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
17/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 23/11/2021
Ementa
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ALUNO-
APRENDIZ. ESTAGIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO. PRESENTES OS
REQUISITOS LEGAIS À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. HONORÁRIOS DE ADVOGADO.
- Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi
convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento
jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer o artigo 201 da Constituição
Federal o direito à aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, ao
completar 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem e 30 (trinta) anos de contribuição,
se mulher.
- Entretanto, o art. 3º da referida Emenda garantiu o direito adquirido à concessão da
aposentadoria por tempo de serviço a todos aqueles que até a data da sua publicação, em 16 de
dezembro de 1998, tivessem cumprido todos os requisitos legais, com base nos critérios da
legislação então vigente.
- Ao segurado inscrito perante o Regime Geral de Previdência Social anteriormente à
promulgação da Emenda Constitucional nº 20/98, mas que, nessa data (16 de dezembro de
1998), ainda não tivesse preenchido os requisitos necessários à sua aposentação, mesmo na
forma proporcional, aplicam-se as regras de transição estabelecidas pelo art. 9º da referida
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
normação constitucional.
- Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados que
cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da EC
20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o mesmo
prazo; e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
- A teor da Súmula 96 do Tribunal de Contas da União, três são os pressupostos básicos à
contagem como tempo de serviço do trabalho prestado como aluno-aprendiz: o curso haver sido
ministrado em Escola Pública Profissional, ter restado comprovada a retribuição pecuniária e que
esta tenha corrido à conta do Orçamento.
- A atividade de estagiário se enquadra como segurado facultativo, nos termos do art. 11,
parágrafo 1º, do Decreto nº 3.048/99.
- Não restaram comprovados os requisitos para o reconhecimento do tempo de serviço como
aluno-aprendiz, bem como não foram efetuados os recolhimentos, em época própria, como
segurado facultativo, no período em que exerceu a atividade de estagiário.
- A somatória dos lapsos temporais autorizam a concessão do benefício de aposentadoria por
tempo de contribuição, ante o preenchimento dos requisitos legais, a contar da data do segundo
requerimento administrativo.
- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso
II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015.
- Apelação do INSS provida em parte.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000454-15.2019.4.03.6108
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIZ CARLOS RAMOS
Advogados do(a) APELADO: CAIO PEREIRA RAMOS - SP325576-A, MARISTELA PEREIRA
RAMOS - SP92010-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000454-15.2019.4.03.6108
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIZ CARLOS RAMOS
Advogados do(a) APELADO: CAIO PEREIRA RAMOS - SP325576-A, MARISTELA PEREIRA
RAMOS - SP92010-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS,
objetivando o reconhecimentocomo tempo de serviço o trabalho exercido como menor aprendiz,
no período de 01/01/1980 a 31/03/1982 e o reconhecimento do período de recolhimento como
Contribuinte Individual, no interregno de 05/2010 a 11/2011 e de 10/2012 a 01/2014,
concedendo-lhe aposentadoria por tempo de contribuição, reafirmando-se a DER, se
necessário.
Na r. sentença, o dispositivo restou assim consignado:
“(...)
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS formulados na inicial
para reconhecer a atividade do Autor de aluno aprendiz (05/02/1980 a 31/03/1982) e as
contribuições individuais vertidas nos períodos de 01/12/2011 a 30/09/2012 e de 01/01/2014 a
31/01/2016. Em consequência, condeno o INSS a conceder-lhe o benefício de aposentadoria
por tempo de contribuição, com base em 35 anos, 4 meses de 18 dias, para a DIB em
15/02/2016. Condeno a Autarquia Previdenciária ao pagamento das parcelas vencidas com
juros de mora a contar da citação na forma do art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela
Lei nº 11.960/2009 mais correção monetária, pelo IPCA-E, a contar de cada parcela vencida,
consoante o decidido pelo STF no julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947, com
repercussão geral (julgamento em 20/09/2017). Tendo o Autor decaído em parte mínima do
pedido, condeno o INSS em honorários advocatícios, que fixo em dez por cento sobre o
montante atualizado das parcelas vencidas até a data desta sentença (Súmula 111 do STJ).
Sem custas, em face da isenção. Sentença que não está sujeita à remessa necessária (artigo
496, §3º, I do Novo Código de Processo Civil). Publique-se. Intimem-se.” (ID n. 190267705)
Em razões recursais, a Autarquia Federal requer seja atribuído efeito suspensivo ao recurso, a
fim de revogar a ordem de imediata implantação do benefício. Afirma que não é possível o
reconhecimento de período laborado como estagiário, sem recolhimento de contribuições em
época própria. Pugna para que seja julgado improcedente o pedido e pela devolução dos
valores recebidos por tutela
Com contrarrazões de apelação, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
cm
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000454-15.2019.4.03.6108
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIZ CARLOS RAMOS
Advogados do(a) APELADO: CAIO PEREIRA RAMOS - SP325576-A, MARISTELA PEREIRA
RAMOS - SP92010-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o apelo e presentes os demais requisitos de admissibilidade recursal, passo a
matéria objeto de devolução.
O pedido de suspensão da tutela antecipada confunde-se com o mérito e com ele será
apreciado.
1. DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
O primeiro diploma legal brasileiro a dispor sobre a aposentadoria por tempo de serviço foi a Lei
Eloy Chaves, Decreto nº 4.682, de 24 de janeiro de 1923. Referido benefício era concedido
apenas aos ferroviários, possuindo como requisito a idade mínima de 50 (cinquenta) anos,
tendo sido suspensa no ano de 1940.
Somente em 1948 tal aposentadoria foi restabelecida, tendo sido mantida pela Lei nº 3.807, de
26 de agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS), que preconizava como
requisito para a concessão do benefício o limite de idade de 55 (cinquenta e cinco) anos,
abolido, posteriormente, pela Lei nº 4.130, de 28 de agosto de 1962, passando a adotar apenas
o requisito tempo de serviço.
A Constituição Federal de 1967 e sua Emenda Constitucional nº 1/69, também disciplinaram tal
benefício com salário integral, sem alterar, no entanto, a sua essência.
A atual Carta Magna manteve o benefício, disciplinando-o em seu art. 202 (redação original) da
seguinte forma:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês,
e comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar
seus valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo
inferior, se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a
integridade física, definidas em lei:
(...)
§1º: É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após
vinte e cinco, à mulher."
Antes da Emenda Constitucional n. 20/98, de 15 de dezembro de 1998, preceituava a Lei nº
8.213/91, nos arts. 52 e seguintes, que o benefício de aposentadoria por tempo de serviço era
devido ao segurado que, após cumprir o período de carência constante da tabela progressiva
estabelecida pelo art. 142 do referido texto legal, completar 30 anos de serviço, se homem, ou
25, se mulher, iniciando no percentual de 70% do salário-de-benefício até o máximo de 100%
para o tempo integral aos que completarem 30 anos de trabalho se mulher, e 35 anos de
trabalho se homem.
Na redação original do art. 29, caput, §1º, da Lei de Benefícios, o salário-de-benefício consiste
na média aritmética simples de todos os últimos salários-de-contribuição dos meses
imediatamente anteriores ao afastamento da atividade ou da data da entrada do requerimento,
até o máximo de 36, apurados no período não superior a 48 meses. Ao segurado que contava
com menos de 24 contribuições no período máximo estabelecido, o referido salário corresponde
a 1/24 da soma dos salários-de-contribuição.
Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi
convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento
jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer, nos arts. 201 e 202 da
Constituição Federal:
"Art. 201 A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter
contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro
e atuarial, e atenderá, nos termos da lei a:
(...)
§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei,
obedecidos as seguintes condições:
I - 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem, e 30 (trinta) anos de contribuição, se
mulher;
Art. 202 O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma
autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na
constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar.
(...)"
Entretanto, o art. 3º da referida Emenda garantiu o direito adquirido à concessão da
aposentadoria por tempo de serviço a todos aqueles que até a data da sua publicação, em 16
de dezembro de 1998, tivessem cumprido todos os requisitos legais, com base nos critérios da
legislação então vigente.
Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados
que cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da
EC n. 20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o
mesmo prazo e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
2. DAS INFORMAÇÕES CONSTANTES NO CNIS
Em 1989, o Governo Federal determinou a criação do CTN - Cadastro Nacional do Trabalhador,
por meio do Decreto nº 97.936 de 1989, destinado a registrar informações de interesse do
trabalhador, do Ministério do trabalho - MTb, do Ministério da Previdência e Assistência Social -
MPAS e da Caixa Econômica Federal - CEF. Posteriormente em 1991 com a publicação da Lei
nº 8.212 que, dentre outras disposições, instituiu o plano de custeio da previdência social; o
CNT passou a denominar-se CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais - composto,
basicamente de quatro principais bancos de dados a saber: cadastro de trabalhadores, de
empregadores, de vínculos empregatícios e de remuneração do trabalhador empregado e
recolhimentos do contribuinte individual.
Vale aqui transcrever o texto do art. 29-A da Lei nº 8.213/91:
O Art. 29-A. O INSS utilizará, para fins de cálculo do salário-de benefício, as informações
constantes no Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS sobre as remunerações dos
segurados, tal artigo fora acrescido no ordenamento jurídico pela Lei nº 10.403 de 08.01.2002,
valendo aqui mencionar que tal inclusão se deu para que fosse possível a utilização das
informações constantes nos bancos de dados do CNIS sobre a remuneração dos segurados,
objetivando simplificar a comprovação dos salários de contribuição por parte dos segurados do
RGPS.
Ocorre que o Decreto nº 3.048/99 que aprova o regulamento da Previdência Social, traz em seu
art. 19 determinação que preceitua que os dados do CNIS valem para todos os efeitos como
prova de filiação à Previdência Social, relação de emprego, tempo de serviço ou de contribuição
e salários-de-contribuição e, quando for o caso, relação de emprego, podendo, em caso de
dúvida, ser exigida pelo Instituto Nacional do Seguro Social a apresentação dos documentos
que serviram de base à anotação.
É ilegal a previsão constante no art. 19 do Decreto nº 3.048/99, com redação dada pelo Decreto
nº 4.079 de 09.01.2002, que determina a desconsideração do vínculo empregatício não
constante do CNIS, pois que cria obrigação não amparada pelo texto legal, principalmente
porque este banco de dados depende da inserção de inúmeras informações decorrentes de
fatos ocorridos muitos anos antes da criação do próprio CNIS , cujas informações os órgãos
governamentais não mantinham um controle rigoroso, para impor efeito jurídico de tal
envergadura.
Não constando do CNIS informações sobre contribuições ou remunerações, ou havendo dúvida
sobre a regularidade do vínculo, motivada por divergências ou insuficiências de dados relativos
ao empregador, ao segurado, à natureza do vínculo, ou à procedência da informação, esse
vínculo ou o período respectivo somente será confirmado mediante a apresentação, pelo
segurado, da documentação comprobatória solicitada pelo INSS, o que prova que tais dados
tem presunçãojuristantum de legitimidade.
O segurado poderá solicitar, a qualquer momento, a inclusão, exclusão ou retificação das
informações constantes do CNIS, com a apresentação de documentos comprobatórios dos
dados divergentes, conforme critérios estabelecidos no art. 393 da Instrução Normativa n° 20
INSS/PRES, de 10 de outubro de 2007.
Informações inseridas extemporaneamente no CNIS, independentemente de serem inéditas ou
retificadoras de dados anteriormente informados, devem ser corroboradas por documentos que
comprovem a sua regularidade.
3. DO CASO DOS AUTOS
O autor pretende o reconhecimento de trabalho exercido sem anotação na CTPS, na atividade
de menor aprendiz (01/01/1980 a 31/03/1982) e com o cômputo das contribuições individuais
vertidas nos períodos de 01/12/2011 a 30/09/2012 e de 01/2014 a 01/2016.
A r. sentença reconheceu a atividade do autor como aluno-aprendiz (05/02/1980 a 31/03/1982)
e as contribuições individuais vertidas nos períodos de 01/12/2011 a 30/09/2012 e de
01/01/2014 a 31/01/2016, concedendo-lhe aposentadoria por tempo de contribuição, para a DIB
em 15/02/2016.
Nas razões de apelação, o INSS insurge-se apenas quanto ao período de 05/02/1980 a
31/03/1982, eis que o recolhimento das contribuições individuais foram posteriormente
reconhecidas na via administrativa, como demonstram o extrato de novo requerimento de
benefício, formulado em 11/06/2018 (id 190266925 - Pág. 104) e o extrato do CNIS (id
190267704). Frise-se que, em sede de contestação, o INSS alegou falta de interesse
processual do autor para os períodos de 01/12/2011 a 30/09/2012 e janeiro de 2014 a janeiro
de 2016, em que realizou recolhimentos na condição de contribuinte individual, já averbados na
esfera administrativa (id 190266930).
Para o reconhecimento e averbação como tempo de serviço, do período de 01/01/1980 a
31/03/1982, o autor trouxe aos autos declaração de matrícula no Centro de Aprendizado
Profissional do Consórcio Intermunicipal da Promoção Social (CIPS), de 04/01/1980,
informando que desenvolveu a atividade de estagiário na Droganova, das 7h às 11h e das 13h
às 17h, de segunda-feira aos sábados (id 190266924 - Pág. 19) e declaração do Centro de
Aprendizado Profissional do Consórcio Intermunicipal da Promoção Social, de 23/03/1982,
informando que o demandante estagiava na COHAB, das 8h às 11h30 e das 13h30 às 18h (id
190266924 - Pág. 21).
Em depoimento pessoal, o autor afirmou que trabalhou na Droganova nos anos de 1979 a
1980, quando contava com 10 anos de idade, fazia entregas e pegava remédios para os
vendedores, recebendo meio salário mínimo da CIPS. Em fevereiro de 1980 passou a exercer
atividades na COHAB, onde laborou até 04/04/1982, quando foi contratado. Naquele local,
atendia telefones e mutuários, separava correspondências e ia aos bancos. Recebia
remuneração da CIPS, além de férias e décimo terceiro salário. Nos sábados fazia cursos de
corte de cabelo e marcenaria.
Foram ouvidas testemunhas, que afirmaram que o autor trabalhou na COHAB, desde os anos
de 1980. Inciou como “boy” ou legionário da CIPS, entidade que contratava meninos para o
primeiro emprego. Fazia atividades externas e não tinha departamento fixo.
Registre-se, neste ponto, que não é possível reconhecer nesta via suposto vínculo empregatício
do autor com as empresas referidas, haja vista a competência da justiça especializada para o
julgamento da matéria, o que enseja a propositura de ação judicial na via própria.
Para fins previdenciários, passo a tecer algumas considerações a respeito do aluno-aprendiz.
Destaco que o cômputo do tempo de atividade nessa condição (aluno-aprendiz ou operário-
aluno) não está condicionado à existência de vínculo empregatício entre este e o
estabelecimento de ensino.
O que importa, segundo a jurisprudência dominante em nossos tribunais, é que o aluno tenha
aprendido trabalhando em escola técnica mantida pelo Orçamento da União e que comprove
mediante certidão, a percepção no mesmo período, de salário indireto em forma de alimentos,
fardamento, pousada, atendimento médico-odontológico, material escolar, etc.
Com efeito, o art. 1º do Decreto-Lei nº 4.073, de 30 de janeiro de 1942 assim prescreve:
"Art. 1º Esta Lei estabelece as bases de organização e de regime do ensino industrial que é o
ramo de ensino, de grau secundário, destinado à preparação profissional dos trabalhadores da
indústria e das atividades artesanais e ainda dos trabalhadores dos transportes, das
comunicações e da pesca".
O art. 58 do Regulamento de Benefícios da Previdência Social, Decreto nº 611, de 21 de junho
de 1992, por sua vez, assim estabelece:
"Art. 58. São contados como tempo de serviço, entre outros:
XXI - durante o tempo de aprendizado profissional prestado nas escolas técnicas com base no
Decreto-Lei nº 4.073, de 30 de janeiro de 1942:
a) os períodos de freqüência a escolas técnicas ou industriais mantidas por empresas de
iniciativa privada, desde que reconhecidas e dirigidas a seus empregados aprendizes, bem
como o realizado com base no Decreto nº 31.546, de 06 de fevereiro de 1952, em curso do
Serviço Nacional da Indústria - SENAI ou Serviço Nacional do Comércio - SENAC, por estes
reconhecido, para noção profissional metódica de ofício ou ocupação do trabalhador menor;
b) os períodos de frequência aos cursos de aprendizagem ministrados pelos empregadores a
seus empregados, em escolas próprias para esta finalidade, ou em qualquer estabelecimento
de ensino industrial".
A frequência do aluno em cursos ministrados pela referida instituição deve ser considerada nos
termos dos dispositivos acima citados, para efeito de tempo de serviço na esfera previdenciária,
desde que comprovado que no mesmo período lhe era oferecida contrapartida pecuniária à
conta do Orçamento.
Equipara-se à retribuição pecuniária o recebimento de alimentação, fardamento, material
escolar e/ou parcela de renda auferida com a execução de encomendas para terceiros, a teor
da Súmula 96 do Tribunal de Contas da União, in verbis:
"Conta-se, para todos os efeitos, como tempo de serviço público, o período de trabalho
prestado na qualidade de aluno - aprendiz, em Escola Pública Profissional, desde que
comprovada a retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se como tal o
recebimento de alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida com a
execução de encomendas para terceiros".
Como se vê em destaque nosso, três são os pressupostos básicos à adequação ao texto
sumulado aos quais a situação dos autos não se amolda: o curso haver sido ministrado em
Escola Pública Profissional, ter restado comprovada a retribuição pecuniária e que esta tenha
corrido à conta do Orçamento.
Nesse sentido, manifestou-se o C. Superior Tribunal de Justiça, conforme ementas que
seguem:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ALUNO APRENDIZ. APOSENTADORIA.
CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO. POSSIBILIDADE. SÚMULA 96 do TCU.
"Conta-se para todos os efeitos, como tempo de serviço público, o período de trabalho prestado
na qualidade de aluno-aprendiz, em Escola Pública Profissional, desde que comprovada a
retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de
alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida com a execução de
encomendas para terceiros. - Súmula 96 do TCU." (Precedente).
- Recurso conhecido, mas desprovido.
(REsp. 433.144 - SE (2002/0052730-6, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, j. 27/08/2002, DJ:
23/09/2002).
"PREVIDENCIÁRIO. ALUNO-APRENDIZ. ESCOLA TÉCNICA FEDERAL. CONTAGEM.
TEMPO DE SERVIÇO. POSSIBILIDADE. REMUNERAÇÃO. EXISTÊNCIA. SÚMULA N.º 96 DO
TCU. PRECEDENTES DESTA CORTE. RECURSO NÃO CONHECIDO.
Restando caracterizado que o aluno-aprendiz de Escola Técnica Federal recebia remuneração,
mesmo que indireta, à conta do orçamento da União, há direito ao aproveitamento do período
como tempo de serviço estatutário federal, o qual deverá ser computado na aposentadoria
previdenciária pela via da contagem recíproca, a teor do disposto na Lei n.º 6.226/1975.
Precedentes.
3. Recurso especial não conhecido".
(5ª Turma, REsp 413.400/RN, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 11.03.2003, DJU 07.04.2003).
"PREVIDENCIÁRIO. ALUNO-APRENDIZ. TEMPO DE SERVIÇO. ESCOLA PÚBLICA
PROFISSIONAL.
1 - O tempo de estudo do aluno-aprendiz realizado em escola pública profissional, sob as
expensas do Poder Público, é contado como tempo de serviço para efeito de aposentadoria
previdenciária, ex vi do art. 58, XXI, do decreto nº 611/92, que regulamentou a Lei nº 8.213/91.
2 - Recurso especial conhecido em parte (alínea "c") e improvido."
(REsp. 396.426-SE (2001/0190150-1), Rel. Min. Fernando Gonçalves, j. 13/08/2002, DJ.
02/09/2002).
Quanto ao reconhecimento como tempo de serviço da atividade de estagiário, verifico que, nos
termos do art. 11, parágrafo 1º, do Decreto nº 3.048/99, a atividade de estagiário se enquadra
como segurado facultativo:
"Art. 11. É segurado facultativo o maior de dezesseis anos de idade que se filiar ao Regime
Geral de Previdência Social, mediante contribuição, na forma do art. 199, desde que não esteja
exercendo atividade remunerada que o enquadre como segurado obrigatório da previdência
social.
§ 1º Podem filiar-se facultativamente, entre outros:
(...)
III - o estudante"
No caso dos autos, não restaram comprovados os requisitos para o reconhecimento do tempo
de serviço como aluno-aprendiz, bem como não foram efetuados os recolhimentos, em época
própria, como segurado facultativo, no período em que exerceu a atividade de estagiário.
Portanto, torna-se inviável o acolhimento do pedido inicial de reconhecimento, como tempo de
serviço, da atividade exercida como aluno-aprendiz ou estagiário.
Quanto ao recolhimento das contribuições do demandante como contribuinte individual, consta
do extrato do CNIS o reconhecimento e averbação dos períodos de recolhimentos, vinculado a
Ramos & Ramos Estacionamento de Veículos, no período de 01/05/2010 a 31/01/2021 (id
190267704).
Assentados esses pontos, passo à análise do pedido de concessão do benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição.
Considerada a contagem dos períodos de recolhimentos como segurado empregado e como
contribuinte individual (empresário), na data do requerimento administrativo, formulado em
15/02/2016, a parte autora não computou tempo suficiente para a concessão da aposentadoria
por tempo de contribuição, que exige, pelo menos, 35 anos de contribuição, nos moldes do art.
201, §7 º, da CF/88.
No entanto, a exclusão acima referida não obsta a concessão do benefício, a partir da data do
segundo requerimento administrativo, formulado em 11/06/2018 (id 190266925 - Pág. 106),
quando o requerente contava com 35 anos 7 meses e 20 dias de tempo de contribuição,
suficientes para a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, em valor a ser
apurado pelo INSS.
Também restou amplamente comprovada pelo conjunto probatório acostado aos autos, a
carência prevista na tabela do art. 142 da Lei de Benefícios.
TERMO INICIAL
In casu, o termo inicial do benefício deve ser fixado na data do segundo requerimento
administrativo, formulado em 11/06/2018, não havendo parcelas prescritas.
Fica o INSS autorizado a compensar valores eventualmente pagos administrativamente ao
autor no período abrangido pela presente condenação, efetivados a título de benefício
previdenciário que não pode ser cumulado com o presente.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Com o advento do novo Código de Processo Civil, foram introduzidas profundas mudanças no
princípio da sucumbência, e em razão destas mudanças e sendo o caso de sentença ilíquida, a
fixação do percentual da verba honorária deverá ser definida somente na liquidação do julgado,
com observância ao disposto no inciso II, do § 4º c.c. § 11, ambos do artigo 85, do CPC/2015,
bem como o artigo 86, do mesmo diploma legal.
Os honorários advocatícios a teor da Súmula 111 do E. STJ incidem sobre as parcelas vencidas
até a sentença de procedência.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS para excluir da condenação o
período de 01/01/1980 a 31/03/1982, mantendo a concessão do benefício de aposentadoria por
tempo de contribuição, com termo inicial fixado na data do segundo requerimento
administrativo, nos termos do voto, fixados os honorários advocatícios na forma acima
fundamentada.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ALUNO-
APRENDIZ. ESTAGIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO. PRESENTES OS
REQUISITOS LEGAIS À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. HONORÁRIOS DE ADVOGADO.
- Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi
convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento
jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer o artigo 201 da Constituição
Federal o direito à aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, ao
completar 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem e 30 (trinta) anos de contribuição,
se mulher.
- Entretanto, o art. 3º da referida Emenda garantiu o direito adquirido à concessão da
aposentadoria por tempo de serviço a todos aqueles que até a data da sua publicação, em 16
de dezembro de 1998, tivessem cumprido todos os requisitos legais, com base nos critérios da
legislação então vigente.
- Ao segurado inscrito perante o Regime Geral de Previdência Social anteriormente à
promulgação da Emenda Constitucional nº 20/98, mas que, nessa data (16 de dezembro de
1998), ainda não tivesse preenchido os requisitos necessários à sua aposentação, mesmo na
forma proporcional, aplicam-se as regras de transição estabelecidas pelo art. 9º da referida
normação constitucional.
- Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados
que cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da
EC 20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o
mesmo prazo; e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
- A teor da Súmula 96 do Tribunal de Contas da União, três são os pressupostos básicos à
contagem como tempo de serviço do trabalho prestado como aluno-aprendiz: o curso haver
sido ministrado em Escola Pública Profissional, ter restado comprovada a retribuição pecuniária
e que esta tenha corrido à conta do Orçamento.
- A atividade de estagiário se enquadra como segurado facultativo, nos termos do art. 11,
parágrafo 1º, do Decreto nº 3.048/99.
- Não restaram comprovados os requisitos para o reconhecimento do tempo de serviço como
aluno-aprendiz, bem como não foram efetuados os recolhimentos, em época própria, como
segurado facultativo, no período em que exerceu a atividade de estagiário.
- A somatória dos lapsos temporais autorizam a concessão do benefício de aposentadoria por
tempo de contribuição, ante o preenchimento dos requisitos legais, a contar da data do segundo
requerimento administrativo.
- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso
II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015.
- Apelação do INSS provida em parte. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
