
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5014592-25.2021.4.03.6105
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VANDA SOARES DOS SANTOS
Advogados do(a) APELADO: CAMILA PISTONI BARCELLA - SP361558-N, KAIQUE APARECIDO MORAIS DA SILVA - SP456380-N
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5014592-25.2021.4.03.6105
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VANDA SOARES DOS SANTOS
Advogados do(a) APELADO: CAMILA PISTONI BARCELLA - SP361558-N, KAIQUE APARECIDO MORAIS DA SILVA - SP456380-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o restabelecimento do benefício de auxílio por incapacidade temporária e sua conversão em aposentadoria por incapacidade permanente, com o acréscimo de 25%.
A r. sentença, proferida em 17.01.2024, julgou procedente o pedido e condenou o INSS a converter o benefício de auxílio doença NB n° 31/638.086.200-9 em aposentadoria por invalidez, desde a constatação da incapacidade pelo perito administrativo (06.06.2018). Determinou a incidência sobre os valores atrasados, de correção monetária pelos índices constantes da Tabela de Correção Monetária para Benefícios Previdenciários (Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal – CJF - Cap. 4, item 4.3.1), e aplicação de juros de mora, a partir da citação, à razão de 0,5% ao mês, a teor do art. 1º-F da Lei n° 9.494/1997. Condenou o requerido, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios, a ser liquidado oportunamente, no percentual mínimo previsto no inciso I, do §3º, respeitada tal proporção, em eventual aplicação dos incisos II a V, a teor do §5º, todos do art. 85, do CPC/2015, cujo percentual deverá incidir sobre a condenação calculada até a data da sentença. Isentou a autarquia federal do pagamento das custas processuais. Tutela antecipada concedida. Dispensada a remessa oficial. (ID 289568883)
Em suas razões recursais, o INSS requer, preliminarmente, a extinção do processo sem resolução do mérito pela existência da coisa julgada; e a nulidade da sentença por ser extra petita, e por cerceamento de defesa ante a necessidade de realização de perícia judicial.
No mérito, pugna pela decretação de improcedência do pedido, ao argumento da ausência de qualidade de segurada para a concessão de aposentadoria por invalidez, sustentando que a parte autora não a detinha na DII fixada pelo perito administrativo, em virtude do gozo de tutela antecipada, posteriormente revogada, não garantir a manutenção da qualidade de segurado.
Eventualmente, pleiteia o desconto, de eventual montante retroativo, dos valores já pagos administrativamente ou de qualquer benefício inacumulável recebido no período, a observância à prescrição quinquenal, a fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula 111 do STJ, e a isenção ao pagamento das custas processuais. Por fim, suscita o prequestionamento legal para fins de interposição de recursos. (ID 289568886).
Com contrarrazões, na qual em preliminar, a parte autora requer o não conhecimento da apelação do INSS, alegando inovação recursal (ID 289568892), subiram os autos a este Eg. Tribunal.
É o relatório.
dcm
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5014592-25.2021.4.03.6105
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VANDA SOARES DOS SANTOS
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passo ao exame da matéria objeto de devolução.
PRELIMINAR EM CONTRARRAZÕES. NÃO CONHECIMENTO DA APELAÇÃO DO INSS
Requer a parte autora o não conhecimento da apelação do INSS, em razão de existência de inovação recursal, alegando que o requerido repete as alegações feitas em contestação sem indicar o error in procedendo da sentença, conseguindo demonstrar somente seu injustificado inconformismo com o desfecho da presente lide.
Não merece acolhida a pretensão da parte autora, posto que não se não se vislumbra as inconsistências alegadas, exercendo a autarquia federal, regularmente, sua prerrogativa processual de defesa dos interesses públicos.
Rejeito a preliminar suscitada pela parte autora em contrarrazões.
COISA JULGADA.
A teor do disposto no art. 485, V, do Código de Processo Civil/2015, caracterizada a perempção, litispendência ou coisa julgada, o processo será extinto sem julgamento do mérito, independentemente de arguição da parte interessada, uma vez que a matéria em questão pode e deve ser conhecida de ofício pelo Juiz, em qualquer tempo e grau de jurisdição (§ 3º).
Nos termos do art. 337, § 4º, o mesmo código, considera-se efeito da litispendência a impossibilidade de repropositura de um mesmo pleito, ou seja, veda-se o curso simultâneo de duas ou mais ações judiciais iguais, em que há a identidade das partes, do objeto e da causa de pedir, tanto próxima quanto remota. A rigor, a litispendência propriamente dita nada mais é do que uma ação pendente que se mantém até o trânsito em julgado da sentença de mérito.
Igualmente, a coisa julgada material impede o ajuizamento de demanda idêntica à anterior, com fundamento no já citado inciso V do art. 485, entendendo-se como tal, de acordo com o art. 502, a eficácia "que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso".
Constatada a simultaneidade de processos iguais e não havendo sentença de mérito transitada em julgado, deverá ser extinto aquele cuja citação tenha ocorrido por último. Sobrevindo, no entanto, a coisa julgada material, a extinção recairá sobre a ação em trâmite, ainda que sua citação se tenha dado primeiro, neste caso, em observância ao princípio da economia processual.
Na espécie, pugna o apelante pelo reconhecimento da coisa julgada em face da ação anteriormente ajuizada pela requerente (ação n° 1002956-19.2014.8.26.0248).
Conforme se depreende dos documentos juntados aos autos (ID’s 2895688856/887 e consulta autos sistema e-SAJ TJ/SP), a parte autora propôs, em 22.04.2014, perante a 3ª Vara Cível da Comarca de Indaiatuba/SP, ação acidentária de concessão de aposentadoria por invalidez c.c. auxílio doença, desde a data da cessação administrativa em 03.05.2014, em razão de ter sofrido acidente de trabalho, quando fraturou o antebraço, com a consequente redução de sua capacidade laborativa, que foi julgada parcialmente procedente para a concessão do benefício de auxílio doença.
Todavia, a sentença foi anulada em 2ª instância, por violação aos princípios da congruência, do contraditório e da ampla defesa, sendo julgado improcedente o pedido inicial, nos termos do art. 1.013, §§1º e 3º, do CPC/2015, em razão da não constatação do nexo causal entre o quadro clínico apresentado pela autora e o acidente de trabalho.
Na presente demanda, proposta em 18.11.2021, perante a 8ª Vara Federal de Campinas/SP, os benefícios por incapacidade pleiteados pela requerente são de natureza previdenciária.
Desse modo, embora sejam idênticas as partes e os pedidos, a causa de pedir constante nos autos evidencia alteração na situação de fato, pois na ação anterior houve alegação da existência de incapacidade laborativa decorrente de acidente de trabalho, implicando a natureza acidentária da ação antecedente, que não se confunde com a causa petendi da presente demanda, que é de natureza previdenciária.
Assim, diante da novel situação fática declinada no presente feito, não configurada a coisa julgada, pois distintas a causa de pedir.
Nesse sentido é a lição trazida pela nota 19 ao art. 301 do Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante de Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery :
"19. Identidade de ações: caracterização. As partes devem ser as mesmas, não importando a ordem delas nos pólos das ações em análise. A causa de pedir, próxima e remota (fundamentos de fato e de direito, respectivamente), deve ser a mesma nas ações, para que se as tenha como idênticas. O pedido, imediato e mediato, deve ser o mesmo: bem da vida e tipo de sentença judicial. Somente quando os três elementos, com suas seis subdivisões, forem iguais é que as ações serão idênticas".
(Ed. Revista dos Tribunais, 9ª ed. 2006, pág. 496)
Portanto, não é o caso de extinção do feito sem resolução do mérito.
NULIDADE DA SENTENÇA. EXTRA PETITA.
Da peça inicial, infere-se que o pedido da parte autora é restrito ao restabelecimento do benefício de auxílio por incapacidade temporária e sua conversão em aposentadoria por incapacidade permanente desde a data do requerimento administrativo em 09.06.2021, e foi reconhecido, pelo juízo, o direito da autora à conversão do benefício de auxílio doença NB n° 31/638.086.200-9 em aposentadoria por invalidez, desde a constatação da incapacidade pelo perito administrativo (06.06.2018), ou seja,em período diverso daquele requerido na exordial.
Cumpre-me observar que o pedido expresso na inicial ou extraído de seus termos por interpretação lógico-sistemática, limita o âmbito da sentença, isto é, o autor delimita a lide ao fixar o objeto litigioso, não sendo lícito ao julgador alterar o pedido, a causa petendi ou condenar em quantidade superior ao demandado, bem como conhecer de questões não suscitadas, a cujo respeito a lei exija a iniciativa da parte. É a aplicação do brocardo sententia debet esse conformis libello.
No caso, verifico tratar-se de julgamento ultra petita, e não de julgamento extra petita, como sustentado pelo requerido, visto que não houve concessão sobre questão não proposta nos autos, mas apenas um excesso dos limites dos pedidos formulados, ou seja, um vício de excesso.
Nesse contexto, aponto que o julgamento ultra petita é vedado pelos artigos 141 e 492 do Código de Processo Civil/2015. Precedente: TRF3, 7ª Turma, AC nº AC 00455430220084039999, Relator Desembargador Federal Walter do Amaral, e-DJF3 01.04.2009, p. 475.
Por sua vez, vale destacar o teor da norma contida no artigo 281 do CPC/2015, que dispõe que “Anulado o ato, reputam-se de nenhum efeito todos os subsequentes, que dele dependam; todavia, a nulidade de uma parte do ato não prejudicará as outras, que dela sejam independentes”. Precedente: (STJ, AgRg nos EDcl do Agravo de Instrumento nº 885.455/SP, Rel. Des. Conv. Min. Paulo Furtado, j. 23.06.2009).
Desse modo, restrinjo a sentença aos termos do pedido, a fim de nela constar a conversão do benefício de auxílio doença em aposentadoria por invalidez, a partir da data do requerimento administrativo em 09.06.2021 (ID 289568727).
NULIDADE. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE PERÍCIA JUDICIAL
Conforme se depreende do extrato INFBEN/INSS (ID 289568722 – pág. 04), a existência de incapacidade laborativa total e permanente da parte autora é matéria incontroversa, haja vista o reconhecimento de tal requisito legal pela autarquia federal, ante a constatação de tal incapacidade pelo perito judicial, sugerindo a concessão de aposentadoria por incapacidade permanente.
Reitere-se que o benefício foi indeferido administrativamente em razão da não comprovação da qualidade de segurada.
Desse modo, mostra-se prescindível, no caso, a realização de perícia judicial.
Acolho em parte as preliminares, e passo à análise do mérito.
DA APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE E AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
A Lei nº 8.213/91 preconiza, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez, atualmente denominada aposentadoria por incapacidade permanente, nos termos da EC n° 103/2019, será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio doença, atualmente denominado auxílio por incapacidade temporária, nos termos da EC n° 103/2019, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência e a condição de segurado.
Independe, porém, de carência a concessão do benefício nos casos de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social, for acometido das doenças relacionadas no art. 151 da Lei de Benefícios.
Cumpre salientar que a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social não impede a concessão do benefício na hipótese em que a incapacidade tenha decorrido de progressão ou agravamento da moléstia.
Acerca da matéria, há de se observar o disposto na seguinte ementa:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ . CARÊNCIA E QUALIDADE DE SEGURADO NÃO COMPROVAÇÃO. INCAPACIDADE PREEXISTENTE. REFILIAÇÃO.
1- Não é devida a aposentadoria por invalidez à parte Autora que não cumpriu a carência , bem como não demonstrou a manutenção da qualidade de segurado no momento em sobreveio a incapacidade para o trabalho.
2- Incapacidade constatada em perícia médica realizada pelo INSS no procedimento administrativo originado do requerimento de auxílio - doença .
3- Ainda que se considerasse a refiliação da Autora à Previdência pelo período necessário de 1/3 do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido, esta se deu posteriormente à sua incapacidade.
4- A doença preexistente não legitima o deferimento de aposentadoria por invalidez ou auxílio - doença , à exceção de quando a incapacidade laborativa resulte progressão ou agravamento do mal incapacitante.
5- A Autora quando reingressou no sistema previdenciário, logrando cumprir a carência exigida e recuperando sua qualidade de segurada, já era portadora da doença e da incapacidade, o que impede a concessão do benefício pretendido, segundo vedação expressa do art. 42, § 2º, da Lei nº 8.213/91.
6- Apelação da parte Autora improvida. Sentença mantida."
(TRF3, 9ª Turma, AC nº 2005.03.99.032325-7, Des. Fed. Rel. Santos Neves, DJU de 13/12/2007, p. 614).
É certo que o art. 43, §1º, da Lei de Benefícios disciplina que a concessão da aposentadoria depende da comprovação da incapacidade total e definitiva mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social. O entendimento jurisprudencial, no entanto, firmou-se no sentido de que também gera direito ao benefício a incapacidade parcial e definitiva para o trabalho, atestada por perícia médica, a qual inabilite o segurado de exercer sua ocupação habitual, tornando inviável a sua readaptação. Tal entendimento traduz, da melhor forma, o princípio da universalidade da cobertura e do atendimento da Seguridade Social.
É que, para efeitos previdenciários, basta a incapacidade permanente que impeça o exercício da atividade laborativa nos moldes ditados pelo mercado de trabalho, evidenciando, dessa forma, padecer o periciando de incapacidade total.
Nesse sentido, destaco acórdão desta Turma:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ . REQUISITOS: PREENCHIMENTO. NÃO VINCULAÇÃO DO JUIZ AO LAUDO PERICIAL. INVIABILIDADE DE EXERCÍCIO DAS ATIVIDADES HABITUAIS E DE READAPTAÇÃO A OUTRAS. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO.
(...)
II - O laudo pericial concluiu pela incapacidade parcial da autora. Porém, o Juiz não está adstrito unicamente às suas conclusões, devendo valer-se de outros elementos para a formação de sua convicção. No caso, corretamente considerada a falta de condições da autora para exercer suas funções habituais de cozinheira, em razão de tenossinovite no punho e problemas de coluna, que levaram-na a perder as forças das mãos, bem como sua idade avançada e as dificuldades financeiras e físicas para exercer outra profissão ou aprender novo ofício. Mantida a sentença que deferiu o benefício da aposentadoria por invalidez à autora.
(...)
IV - Apelações improvidas."
(9ª Turma, AC nº 1997.03.007667-0, Des. Fed. Rel. Marisa Santos, v.u., DJU de 04.09.2003, p. 327).
É necessário, também, para a concessão da aposentadoria por incapacidade permanente o preenchimento do requisito da qualidade de segurado. Mantém essa qualidade aquele que, mesmo sem recolher as contribuições, conserve todos os direitos perante a Previdência Social, durante um período variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de segurado e a sua situação, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios, a saber:
"Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo."
É de se observar, ainda, que o §1º do supracitado artigo prorroga por 24 meses tal período de graça aos que contribuíram por mais de 120 meses.
Em ambas as situações, restando comprovado o desemprego do segurado perante o órgão do Ministério de Trabalho ou da Previdência Social, os períodos serão acrescidos de mais 12 meses.
Convém esclarecer que, conforme disposição inserta no §4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c.c. o art. 14 do Decreto Regulamentar nº 3.048/99, com a nova redação dada pelo Decreto nº 4.032/01, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do segundo mês seguinte ao término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei nº 8.212/91 para recolhimento da contribuição, acarretando, consequentemente, a caducidade do direito pretendido.
O benefício de auxílio por incapacidade temporária, por sua vez, é devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 contribuições mensais e for considerado temporariamente incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual, por mais de 15 dias consecutivos e possuir a condição de segurado (arts. 59 a 63 da Lei de Benefícios).
Cumpre salientar, ainda, que o benefício acima referido é um "minus" em relação à aposentadoria por incapacidade permanente, a qual sendo concedida não gera cumulação, mas sim cessação daquele.
DO CASO DOS AUTOS
Não há insurgência da autarquia federal quanto à incapacidade laborativa e carência, razão pela qual deixo de analisar tais requisitos, em respeito ao princípio da devolutividade dos recursos ou tantum devolutum quantum appellatum.
No caso concreto, a cópia da CTPS (ID 289568715) e o extrato do sistema CNIS (ID 289568714) demonstra os últimos vínculos empregatícios da autora nos períodos de 08.01.2002 a 05.2002, de 03.01.2009 a 08.2009 e de 01.07.2011 a 09.2011, que efetuou recolhimento de contribuições previdenciárias, na condição de contribuinte individual, em 10.2011 e em 09.2013; nova relação empregatícia no interregno de 18.12.2013 a 06.2014, e que gozou administrativamente de benefício de auxílio por incapacidade temporária no interregno de 12.01.2014 a 03.05.2014.
Posteriormente, a requerente recebeu auxílio por incapacidade temporária no período de 07.2014 até 05.2021, por força de tutela antecipada nos autos do processo n° 1002956-19.2014.8.26.0248 (ID’s 289568845/856/887 e consulta autos sistema e-SAJ TJ/SP), que foi revogada devido à reforma da sentença de procedência, em 2ª instância.
Em tal contexto, observa-se que o perito administrativo indicou o início da incapacidade laboral em “06.06.2018” (Início da Incapacidade – ID 289568722 – pág. 04).
Na hipótese, destaco que a tutela antecipada gerou efeitos jurídicos desde o seu deferimento até a sua revogação, notadamente a manutenção da qualidade de segurada, nos termos do art. 15, I, da Lei 8.213/1991, evidenciando que a requerente a detinha na data de início da incapacidade fixada pelo perito administrativo em 06.06.2018, bem como na data do requerimento administrativo em 09.06.2021 (ID 289568727).
Nesse sentido, confira-se julgados dessa Egrégia Corte: TRF3 - Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2315554 0024448-61.2018.4.03.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL TANIA MARANGONI, TRF3 - OITAVA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/03/2019; TRF3 - AC - APELAÇÃO CÍVEL - 2221980 0005381-47.2017.4.03.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL NELSON PORFIRIO, TRF3 - DÉCIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:24/05/2017.
Em face de todo o explanado, a parte autora faz jus à conversão do benefício de auxílio por incapacidade temporária em aposentadoria por incapacidade permanente, em valor a ser calculado pelo INSS na forma da legislação, nos termos da r. sentença.
Saliento, por oportuno, que é devido o abono anual, nos termos dos arts. 201, § 6º, da Constituição Federal e 40 da Lei n. 8.213/91 aos aposentados e pensionistas, tendo por base o valor dos proventos do mês de dezembro.
COMPENSAÇÃO DOS VALORES ADMINISTRATIVOS JÁ PAGOS.
Verifica-se que o juízo “a quo” fixou a DIB sem indicar a necessidade do desconto de valores inacumuláveis.
Desse modo, determino a compensação dos valores eventualmente pagos a título de auxílio por incapacidade temporária ou outro benefício cuja cumulação seja vedada por lei (art. 124 da Lei 8.213/1991 e art. 20, § 4º, da Lei 8.742/1993) após a data de início do benefício concedido nesta ação, sem prejuízo no que couber do art. 115 da Lei 8213/1991 em sede administrativa.
PRESCRIÇÃO QUINQUENAL PARCELAS ATRASADAS
O Superior Tribunal de Justiça já pacificou a questão da prescrição das parcelas vencidas anteriormente ao ajuizamento da ação previdenciária, com a edição da Súmula 85:
"Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública - aqui incluído o INSS - figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do quinquênio anterior a propositura da ação."
Considerando o ajuizamento da ação em 18.11.2021 e a data do requerimento administrativo em 09.06.2021, verifica-se que não há parcelas atingidas pela prescrição quinquenal.
CONSECTÁRIOS
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Com o advento do novo Código de Processo Civil, foram introduzidas profundas mudanças no princípio da sucumbência, e em razão destas mudanças e sendo o caso de sentença ilíquida, a fixação do percentual da verba honorária deverá ser definida somente na liquidação do julgado, com observância ao disposto no inciso II, do § 4º c.c. § 11, ambos do artigo 85, do CPC/2015, bem como o artigo 86, do mesmo diploma legal.
Os honorários advocatícios, a teor da Súmula 111 do E. STJ incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência.
CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS
Falta de interesse recursal do INSS, pois a sentença já determinou a isenção ao pagamento das custas processuais, nos moldes pleiteados pelo requerido.
PREQUESTIONAMENTO
Por derradeiro, a sentença não ofendeu qualquer dispositivo legal, não havendo razão ao prequestionamento.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, rejeito a preliminar da parte autora em contrarrazões, e acolho em parte as preliminares suscitadas pelo INSS para reduzir a sentença aos limites do pedido, fixando o termo inicial da aposentadoria por incapacidade permanente na data do requerimento administrativo em 09.06.2021, no mérito, dou parcial provimento à apelação do INSS, para determinar a compensação dos valores eventualmente pagos a título de auxílio por incapacidade temporária ou outro benefício cuja cumulação seja vedada por lei após a data de início do benefício concedido nesta ação, observados os honorários advocatícios, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE. PRELIMINAR DA PARTE AUTORA EM CONTRARRAZÕES REJEITADA. PRELIMINARES DO INSS ACOLHIDAS EM PARTE. PRESENÇA DOS REQUISITOS LEGAIS. COMPENSAÇÃO DOS VALORES ADMINSTRATIVOS JÁ PAGOS. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. CONSECTÁRIOS.
- Não merece acolhida a pretensão da parte autora, posto que não se não se vislumbra as inconsistências alegadas, exercendo a autarquia federal, regularmente, sua prerrogativa processual de defesa dos interesses públicos.
- A teor do disposto no art. 485, V, do Código de Processo Civil, caracterizada a perempção, litispendência ou coisa julgada, o processo será extinto sem julgamento do mérito, independentemente de arguição da parte interessada, uma vez que a matéria em questão pode e deve ser conhecida de ofício pelo Juiz, em qualquer tempo e grau de jurisdição (§ 3º).
- In casu, embora sejam idênticas as partes e os pedidos, a causa de pedir constante nos autos evidencia alteração na situação de fato, pois na ação anterior houve alegação da existência de incapacidade laborativa decorrente de acidente de trabalho, implicando a natureza acidentária da ação antecedente, que não se confunde com a causa petendi da presente demanda, que é de natureza previdenciária. Não configurada a coisa julgada, pois distinta a causa de pedir.
- O julgamento ultra petita é vedado pelos artigos 141 e 492 do Código de Processo Civil/2015. O pedido da parte autora é restrito ao restabelecimento do benefício de auxílio por incapacidade temporária e sua conversão em aposentadoria por incapacidade permanente desde a data do requerimento administrativo em 09.06.2021, e foi reconhecido, pelo juízo, o direito da autora à conversão do benefício de auxílio doença NB n° 31/638.086.200-9 em aposentadoria por invalidez, desde a constatação da incapacidade pelo perito administrativo (06.06.2018), ou seja,em período diverso daquele requerido na exordial. Caracterizado o julgamento ultra petita. Redução aos limites do pedido.
- Conforme se depreende do extrato INFBEN/INSS, a existência de incapacidade laborativa total e permanente da parte autora é matéria incontroversa, haja vista o reconhecimento de tal requisito legal pela autarquia federal, ante a constatação de tal incapacidade pelo perito judicial, sugerindo a concessão de aposentadoria por incapacidade permanente. Reitere-se que o benefício foi indeferido administrativamente em razão da não comprovação da qualidade de segurada, de modo que se mostra prescindível, no caso, a realização de perícia judicial.
- É certo que o art. 43, §1º, da Lei de Benefícios disciplina que a concessão da aposentadoria por invalidez, atualmente denominada aposentadoria por incapacidade permanente, nos termos da EC n° 103/2019, depende da comprovação da incapacidade total e definitiva mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social. O entendimento jurisprudencial, no entanto, firmou-se no sentido de que também gera direito ao benefício a incapacidade parcial e definitiva para o trabalho, atestada por perícia médica, a qual inabilite o segurado de exercer sua ocupação habitual, tornando inviável a sua readaptação. Tal entendimento traduz, da melhor forma, o princípio da universalidade da cobertura e do atendimento da Seguridade Social.
- Presentes os requisitos indispensáveis à concessão do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente, especialmente, a comprovação da qualidade de segurada, o pedido é procedente.
- Determinada a compensação dos valores eventualmente pagos a título de auxílio por incapacidade temporária ou outro benefício cuja cumulação seja vedada por lei (art. 124 da Lei 8.213/1991 e art. 20, § 4º, da Lei 8.742/1993) após a data de início do benefício concedido nesta ação.
- Não configurada a prescrição quinquenal, pois não decorreram mais de 05 anos entre a data do requerimento administrativo e da propositura da presente ação.
- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015.
- Falta de interesse recursal do INSS no tocante ao pedido de isenção ao pagamento das custas processuais, pois a sentença já determinou tal isenção, nos moldes pleiteados pelo requerido.
- Preliminar da parte autora em contrarrazões rejeitada. Preliminares acolhidas em parte. Apelação do INSS provida em parte.
