APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5380119-37.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: MARCIA LEOPOLDINA RODRIGUES
Advogado do(a) APELANTE: LEONARDO DE LIMA GONCALVES - SP230948-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5380119-37.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: MARCIA LEOPOLDINA RODRIGUES
Advogado do(a) APELANTE: LEONARDO DE LIMA GONCALVES - SP230948-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta por MARCIA LEOPOLDINA RODRIGUES em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o restabelecimento de benefício de aposentadoria por invalidez que recebeu no período de 2005 a 2018.
A r. sentença julgou improcedente o pedido e condenou a parte autora ao pagamento de custas e honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa, observada a gratuidade deferida (ID 149715328).
Em suas razões recursais, a parte requer o restabelecimento de aposentadoria por invalidez desde 25/08/2018 (ID 149715333).
Não foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5380119-37.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: MARCIA LEOPOLDINA RODRIGUES
Advogado do(a) APELANTE: LEONARDO DE LIMA GONCALVES - SP230948-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso, e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais, passo ao exame da matéria objeto de devolução.
In casu, a r. sentença julgou improcedente o pedido, sob a seguinte fundamentação:
“O perito judicial nomeado nos autos, em seu parecer, constatou que a autora apresenta patologia que não gera incapacidade, o que é suficiente para a improcedência dos pedidos contidos na inicial, porque que não preenchido o principal requisito, comum a aposentadoria por invalidez e a concessão de auxílio-doença, a incapacidade total para o exercício da atividade habitual. Saliento ainda que o perito nomeado pelo juízo respondeu a todos os quesitos, elaborados por ambas as partes de forma satisfatória, sendo desnecessária, por supérflua, a realização de nova perícia”.
Extrai-se do laudo médico pericial que a demandante possui o diagnóstico de endometriose, patologia que não gera incapacidade (ID 149715291, p. 6). Em resposta ao quesito 5, concluiu:
“5- Está o Autor, atualmente, incapacitada para sua atividade laborativa habitual? Pela endometriose não”.
A demandante, em manifestação quando ao laudo, apresentou quesitos complementares:
“a) No laudo apresentado pelo Sr. Perito consta que na narrativa da petição inicial foi apresentada a patologia denominada endometriose. No entanto, na referida peça foi claramente demonstrado que a autora teve seu quadro de saúde agravado em razão das consequências que a enfermidade lhe trouxe, com grave caso de depressão e tentativa de suicídio, inclusive com provas documentais de outros profissionais da saúde. b) Neste sentido, ante a resposta do item 5, do anexo 1, do referido laudo em que foi lhe perguntado: “Está o autor, atualmente, incapacitada , para o trabalho?” , e sendo respondido: “Pela endometriose, não”, requer o seguinte esclarecimento:
1 – Foram examinadas as consequências da endometriose na vida da autora, sob a perspectiva da depressão, tentativa de suicídio e demais laudos apresentados pela autora?
2 – Tendo a resposta do item 5, anexo 1, constado que pela endometriose a autora não estaria incapacitada para trabalho, pergunto: e pela depressão”?
Em resposta, o Perito ratificou seu laudo, com as seguintes respostas:
“1) Sim, porém na literatura a endometriose não traz correlação direta com quadro depressivo.
2) A autora durante perícia médica, não apresenta sinais e sintomas que resultem em quadro de reagudização gerando incapacidade laboral.
Conclusão: Mediante aos questionamentos, este perito vem por meio deste ratificar o laudo pericial que foi apresentado nas páginas 104 a 113”.
Consta dos autos atestados médicos, colacionados pela autora, assinados por psiquiatra e psicólogo:
- 04.09.18 e 09.01.20: A paciente apresenta sintomas de angústia, melancolia, idealização suicida, alterações de comportamento e pensamento, pânico, instabilidade emocional, irritabilidade, insônia e fobias sociais. Sugiro afastamento definitivo (ID 149715253 e149715323).
- 23.08.18: A paciente se encontra em processo de análise desde janeiro de 2011, encaminhada com quadro depressivo desencadeado pelo processo de separação conjugal, devido à infertilidade causada pela endometriose. Com o passar do tempo, foi percebido oscilações significativas no seu estado emocional, entre o pânico e os pensamentos suicidas. Também acompanhada pelo psiquiatra. A patologia clínica que traz dores acentuadas, afeta muito sua condição psicológica. As crises vem piorando e, consequentemente, outros sintomas surgindo. Um grau de esquizofrenia já foi detectado – incapacidade de cuidar das coisas básicas: comer, higiene pessoal, ou seja, os cuidados próprios estão sendo negligenciados. Diante do estado depressivo recorrente, da ansiedade e do quadro tipicamente psicótico, se faz necessário o processo de análise e psiquiátrico por tempo indeterminado. A capacidade laboral está seriamente comprometida. Foi sugerido que a família assuma a responsabilidade dos cuidados da paciente e a proteção da mesma (ID 149715251).
Extrai-se da inicial que (ID 149715244):
“Neste ponto cumpre esclarecer, Exª, que ao ser diagnosticada com endometriose e sofrer as consequências da enfermidade, em especial a esterilidade, a requerente acabou passando por um processo de divórcio traumático.
Conforme narra a Dra. Silvana Maril da Silva, a requerente está em análise desde janeiro de 2011, encaminhada com QUADRO DEPRESSIVO (...)
O psiquiatra Dr. Cristiano Rossionoli Camargo, atesta que a requerente está em tratamento desde 13 de dezembro de 2011, APRESENTA QUADRO CLÍNICO COM AUNGUSTIA, MELANCOLIA, IDEALIZAÇÃO SUICIDA, ALTERAÇÕES DE COMPORTAMENTO E PENSAMENTO, PÂNICO, FOBIA SOCIAL, DEVIDO AS SEQUELAS DURANTE O TRATAMENTO DA ENDOMETRIOSE COM ESTERILIDADE (N80.0 / N80.1/N80.5). A FARMACOLOGIA FOI INDICADA PARA O TRATAMENTO (VIDE RELATÓRIO MÉDICO). AS CONSEQUÊNCIAS PARA SAÚDE DA PACIENTE SÃO: PERDA BLOBAL DA QUALIDADE DE VIDA, INCAPACIDADE LABORATIVA, REDUÇÃO DA CAPACIDADE COGNITIVA.
Como se vê, Exa, a requerente está incapacitada para atividade laborativa, necessitando da ajuda de seus familiares para cuidar das responsabilidades mais básicas de sua vida”
Nesse contexto, embora considere que os peritos médicos, devidamente registrados no respectivo Conselho de Classe (CRM), detenham conhecimentos gerais da área de atuação, suficientes ao exame e produção da prova determinada, independentemente da especialidade que tenha seguido, no caso em análise, vislumbro necessária perícia médica realizada por médico psiquiatra, a fim de que sejam examinadas, as moléstias e demais queixas trazidas aos autos pela documentação particular supramencionada.
Assim, para verificação do preenchimento do requisito incapacidade laboral, carecem estes autos da devida instrução em primeira instância, uma vez que a r. sentença apreciou o pedido inicial sem a necessária análise de todas as moléstias apresentadas pelo autor, o que implica cerceamento de defesa e enseja a
nulidade
do feito.Corroborando o entendimento acima exposto, trago à colação precedentes desta Corte:
PREVIDÊNCIA SOCIAL. RESTABELECIMENTO DE AUXÍLIO-DOENÇA OU CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. APELAÇÃO DO(A) AUTOR(A). PRELIMINAR. CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE. NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE NOVO LAUDO PERICIAL. INCAPACIDADE LABORATIVA. PRELIMINAR ACOLHIDA. SENTENÇA ANULADA. ANÁLISE DO MÉRITO PREJUDICADA.
I - O entendimento adotado no juízo de 1º grau inviabilizou a dilação probatória sobre a incapacidade, contrariando o princípio do contraditório e da ampla defesa, em prejuízo das partes, pois impossibilitou a produção de prova essencial para o reconhecimento, ou não, do acerto da pretensão inicial.
II - Embora a prova pericial seja indispensável para a aferição da capacidade ou incapacidade laborativa, o perito judicial nomeado nem sempre tem formação técnica necessária para auxiliar no deslinde da causa.
III – O perito nomeado tem sua especialidade em Clínica Geral e Nefrologia. Mas o(a) segurado(a), nascido(a) em 05/06/1982, “vigilante”, tem diagnóstico de "HAS (hipertensão arterial sistêmica (CID 10: I10), Depressão (CID10: F32) e Diabetes Mellitus (CID 10: E10)”. E, apesar de consignar que o quadro psiquiátrico é grave (conforme laudo), o perito conclui pela ausência de incapacidade. Documentos médicos demonstram a continuidade do tratamento ambulatorial em decorrência de “F32.2 e F 42.0”, com anotação de necessidade de atividade laboral, em decorrência da evolução lenta do quadro.
IV - As divergências entre as conclusões citadas e dúvidas arguidas pelo(a) apelante acerca da incapacidade demonstram a necessidade da produção de nova perícia médica, que deverá ser feita por especialista na área de psiquiatria.
V – Preliminar acolhida. Sentença anulada. Análise do mérito da apelação prejudicada.
(TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5003914-11.2018.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal MARISA FERREIRA DOS SANTOS, julgado em 29/01/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 06/02/2020)
“PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AUXÍLIO-DOENÇA OU APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE DE SENTENÇA. LAUDO MÉDICO PERICIAL INCOMPLETO.
1.Trata-se de pedido de concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez previstos nos artigos 42 e 59/63 da Lei 8.213/91.
2.Cerceamento de defesa caracterizado. Laudo pericial não apresentou resposta aos quesitos apresentados pelas partes. Violação ao contraditório e ampla defesa constitucionalmente assegurados.
3.Reexame necessário não conhecido. Apelação do INSS provida e apelação da parte autora prejudicada.”
(TRF3, 7ª Turma, ApelRemNec nº 0042517-78.2017.4.03.9999, Des. Fed. Rel. Paulo Domingues, e-DJF3 de 12/08/2019).
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. AUSÊNCIA DO LAUDO PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. SENTENÇA ANULADA.
I- In casu, torna-se imprescindível a realização da perícia médica requerida pela parte autora, a fim de que seja demonstrada, de forma plena, ser a autora portadora ou não da alegada incapacidade para o trabalho.
II- A não realização da referida prova implica violação aos princípios constitucionais da ampla defesa e do devido processo legal.
III- Apelação provida. Sentença anulada."
(8ª Turma, AC nº 200203990398785, Rel. Des. Fed. Newton de Lucca, DJF3 12.05.2009)
Diante disso, impõe-se a remessa dos autos ao Juízo a quo, para regular processamento do feito, com a produção de prova pericial realizada por médico psiquiatra.
Ante o exposto,
de ofício, decreto a nulidade da sentença,
determinando o retorno dos autos à Vara de origem, para regular processamento do feito, na forma acima fundamentada ejulgo prejudicada a apelação da parte autora
.É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO PERICIAL INSUFICIENTE. SENTENÇA ANULADA.
- Extrai-se do laudo médico pericial que a demandante possui o diagnóstico de endometriose, patologia que não gera incapacidade (ID 149715291, p. 6). Em resposta a quesitos complementares, o Perito ratificou seu laudo, com as seguintes respostas: “na literatura a endometriose não traz correlação direta com quadro depressivo; a autora durante perícia médica, não apresenta sinais e sintomas que resultem em quadro de reagudização gerando incapacidade laboral”.
- Consta dos os autos atestados médicos, colacionados pela autora, assinados por psiquiatra e psicólogo, mencionados na exordial: 04.09.18: A paciente apresenta sintomas de angústia, melancolia, idealização suicida, alterações de comportamento e pensamento, pânico, instabilidade emocional, irritabilidade, insônia e fobias sociais. Sugiro afastamento definitivo (ID 149715253 e149715323). 23.08.18: A paciente se encontra em processo de análise desde janeiro de 2011, encaminhada com quadro depressivo desencadeado pelo processo de separação conjugal, devido à infertilidade causada pela endometriose. Com o passar do tempo, foi percebido oscilações significativas no seu estado emocional, entre o pânico e os pensamentos suicidas. Também acompanhada pelo psiquiatra. A patologia clínica que traz dores acentuadas, afeta muito sua condição psicológica. As crises vem piorando e, consequentemente, outros sintomas surgindo. Um grau de esquizofrenia já foi detectado – incapacidade de cuidar das coisas básicas: comer, higiene pessoal, ou seja, os cuidados próprios estão sendo negligenciados. Diante do estado depressivo recorrente, da ansiedade e do quadro tipicamente psicótico, se faz necessário o processo de análise e psiquiátrico por tempo indeterminado. A capacidade laboral está seriamente comprometida. Foi sugerido que a família assuma a responsabilidade dos cuidados da paciente e a proteção da mesma (ID 149715251).
- Embora considere que os peritos médicos, devidamente registrados no respectivo Conselho de Classe (CRM), detenham conhecimentos gerais da área de atuação, suficientes ao exame e produção da prova determinada, independentemente da especialidade que tenha seguido, no caso em análise, vislumbro necessária perícia médica realizada por médico psiquiatra, a fim de que sejam examinadas, as moléstias e demais queixas trazidas aos autos pela documentação particular supramencionada.
- Assim, para verificação do preenchimento do requisito incapacidade laboral, carecem estes autos da devida instrução em primeira instância, uma vez que a r. sentença apreciou o pedido inicial sem a necessária análise de todas as moléstias apresentadas pelo autor, o que implica cerceamento de defesa e enseja a nulidade do feito.
- Impõe-se a remessa dos autos ao Juízo a quo, para regular processamento do feito, com a produção de prova pericial realizada por médico psiquiatra.
- Decretada, de ofício, a nulidade da sentença. Apelação da parte autora prejudicada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu de ofício, decretar a nulidade da sentença, determinando o retorno dos autos à Vara de origem, para regular processamento do feito, e julgar prejudicada a apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.