
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5080647-08.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDIVANIA SOUZA SANTANA
Advogado do(a) APELADO: AIALA DELA CORT MENDES - SP261537-N
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5080647-08.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDIVANIA SOUZA SANTANA
Advogado do(a) APELADO: AIALA DELA CORT MENDES - SP261537-N
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão de aposentadoria por incapacidade permanente, com o acréscimo de 25%, ou de auxílio por incapacidade temporária ou, ainda, de auxílio acidente.
A r. sentença, proferida em 16.02.2024, julgou procedente o pedido e condenou o INSS a conceder o benefício de auxílio acidente, desde o dia seguinte ao da cessação administrativa do auxílio doença (29.06.2023). Determinou a incidência sobre os valores atrasados, de correção monetária pelo IPCA-E, e aplicação de juros de mora, segundo a remuneração da caderneta de poupança, na forma do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997 com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009. Condenou o INSS, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do montante devido, observado o teor da Súmula 111 do STJ. Isentou a autarquia federal do pagamento das custas processuais, conforme o art. 6º da Lei 11.608/03. Tutela antecipada concedida. (ID’s 294321219/298).
Em suas razões recursais, o INSS pugna pela decretação de improcedência do pedido, ao argumento do não preenchimento dos requisitos legais para a concessão do auxílio acidente, sustentando a ausência de redução da capacidade laborativa para a atividade habitual, em razão da limitação funcional não impedir o exercício da função usual da requerente.
Eventualmente, requer o desconto, de eventual montante retroativo, dos valores já pagos administrativamente ou de qualquer benefício inacumulável recebido no período, a observância à prescrição quinquenal, a incidência da correção monetária e juros de mora na forma da EC 113/2021, a fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula 111 do STJ, e a isenção ao pagamento das custas processuais. Por fim, suscita o prequestionamento legal para fins de interposição de recursos. (ID 294321282).
Sem contrarrazões, subiram os autos a este Eg. Tribunal.
É o relatório.
dcm
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5080647-08.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDIVANIA SOUZA SANTANA
Advogado do(a) APELADO: AIALA DELA CORT MENDES - SP261537-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passo ao exame da matéria objeto de devolução.
AUXÍLIO ACIDENTE
O benefício de auxílio-acidente encontra-se disciplinado pelo art. 86 da Lei nº 8.213/91, que, a partir da Lei nº 9.032/95, é devido como indenização ao segurado que sofrer redução da capacidade para o trabalho, em razão de sequelas de lesões consolidadas decorrentes de acidente de qualquer natureza. A única exceção é da perda auditiva, em que ainda persiste a necessidade de haver nexo entre o trabalho exercido e a incapacidade parcial para o mesmo, conforme disposto no §4º do referido artigo, com a alteração determinada na Lei nº 9.528/97.
Em sua redação original, o art. 86 da Lei de Benefícios contemplava três hipóteses para a concessão do auxílio-acidente, considerando a diversidade de consequências das sequelas, tal como a exigência de "maior esforço ou necessidade de adaptação para exercer a mesma atividade".
Com as alterações introduzidas pela Lei nº 9.032 de 28.04.95, o dispositivo contemplou apenas os casos em que houver efetiva redução da capacidade funcional. Com o advento da Lei nº 9.528/97, a redução deve ser para a atividade habitualmente exercida. Além disso, seja qual for a época de sua concessão, este benefício independe de carência para o seu deferimento.
O seu termo inicial é fixado no dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, independente de qualquer remuneração ou rendimento auferido pelo acidentado (art. 86, §2º, da Lei nº 8.213/91). Se não houve esta percepção anterior, nem requerimento administrativo, este deve ser na data da citação. Precedente: STJ, REsp 1.095.523/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, 3ª Seção, DJE 05/11/2009.
Por sua vez, o art. 18, §1º, da Lei nº 8.213/91, relaciona os segurados que fazem jus ao auxílio-acidente: o empregado, o trabalhador avulso e o segurado especial. Na redação original, revogada pela Lei nº 9.032 de 28.04.1995, ainda contemplava os presidiários que exercessem atividade remunerada.
Dentre as modificações de maior relevância, desde a vigência do Plano de Benefícios, destaca-se a relativa ao valor do auxílio, que, originalmente, correspondia a 30% (trinta por cento), 40% (quarenta por cento) ou 60% (sessenta por cento) do salário-de-contribuição do segurado, não podendo ser inferior a este percentual do seu salário de benefício, e, com as alterações introduzidas pela Lei nº 9.528/97, passou a 50% (cinquenta por cento) do salário de benefício.
É benefício que independe de carência, segundo o disposto no art. 26 da Lei nº 8.213/91.
DO CASO DOS AUTOS
Não há insurgência da autarquia federal quanto à qualidade de segurada, razão pela qual deixo de analisar tal requisito, em respeito ao princípio da devolutividade dos recursos ou tantum devolutum quantum appellatum.
No tocante à incapacidade laborativa, o laudo pericial, elaborado em 01.09.2023 (ID 294321203), concluiu pela existência de redução da capacidade laborativa da autora, auxiliar de serviços gerais, com 39 anos, ensino médio completo, conforme segue:
“(...)- ANAMNESE - Motivo alegado da incapacidade:
Conta que sofreu queda da bicicleta, em 08 de março de 2021 com fratura complexa de TORNOZELO ESQ. – que foi internada no HRR. submetida a 1° cirurgia, e usou fixador externo, porém, a fratura não consolidou, sendo reoperada em 18 / 03 / 2021 quando foi submetida a uma osteossintese com 19 parafusos e placas o que resultou em muita dor e dificuldade para deambular.
declarou que ficou manca da perna Esq. – com alta em março de 22,pp
-EXAME FÍSICO LIVRE:
A Pericianda (...) deu entrada caminhando por seus próprios meios, porém com claudicação na perna esq.; (...).
(...)
Membros inferiores – deambulação com claudicação - média – de perna esquerda.
EX. SEGMENTAR – PERNA/ TORNOZELO Esquerdo:
Flexão dorsal= 0° a 12° / Flexão plantar= 0° a 30°
Inversão = 0° a 10° / Eversão = 0° a 25°.
Onde:
Constata -se a perda funcional dos movimentos próprios, parcial, incompleta do Tornozelo E. em 50%.
(...)
DOENÇA CID
Fratura do perônio [fíbula] S824
Outras artroses M19
Sequelas de traumatismos do membro inferior T93
(...)
CONSIDERAÇÃO PERICIAL:
• Constata -se a perda funcional dos movimentos próprios, parcial, incompleta do Tornozelo E. em 50%. – média.
• Que implica em necessidade de esforços suplementares para a realização da mesma atividade, ou ainda necessita de ajuda para realizá-la. Tal situação enquadra a redução da capacidade laboral em valor equivalente ao déficit funcional identificado – 25%
• Portanto, após avaliação clínica detalhada do requerente, incluindo anamnese, exame clínico detalhado, avaliação dos exames complementares e análise dos demais documentos existentes nos autos, podemos concluir:
CONCLUSÃO PERICIAL:
Há redução parcial da capacidade laboral (...)”. (ID 294321203 – págs. 02, 06 e 08).
Em resposta aos quesitos apresentados, o perito judicial afirma que a autora “Apresenta uma sequela funcional e limitação funcional”, apontando, ainda, que “as sequelas geraram limitação para as atividades laborativas habituais” (RESPOSTAS AOS QUESITOS AUTOR “4” e “6” e QUESITOS “15” - ID 294321203 – págs. 09-10 e 13).
Observo que os documentos médicos juntados aos autos (ID’s 294321004-006/008-010/023/105/116/143/155/162/164/170) demonstram a existência de sequela consolidada decorrente de acidente de qualquer natureza (queda de bicicleta), causando limitação ao exercício da atividade habitual da requerente, o que se coaduna à conclusão pericial.
Conforme teor do laudo pericial, existente a redução da capacidade laboral para o exercício da atividade habitual, e essa situação fática subsume-se à previsão legal constante do art. 86 da Lei n° 8.213/1991, que garante justamente uma indenização ao segurado pela redução da capacidade laboral, tendo que realizar maior esforço para o exercício do trabalho.
Vale observar que com redação dada pela Lei n° 9.032/1995, o art. 86 da Lei n° 8.213/1991 que, em sua redação original, estabelecia o valor do benefício em porcentagens de 30%, 40%, ou 60% do salário-de-contribuição do segurado, dependendo do grau da redução da capacidade, se mínima, média ou máxima, passou a determinar a porcentagem de 50% para o valor do benefício, independente do nível do prejuízo sofrido pelo segurado.
Acrescente-se que a Terceira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.109.591/SC, processado nos moldes do art. 543-C do CPC/1973, firmou entendimento no sentido de que o nível do dano e, em consequencia, o grau do maior esforço, não interferem na concessão do benefício, o qual será devido ainda que mínima a lesão.
Em face de todo o explanado, a parte autora faz jus ao benefício de auxílio acidente, em valor a ser calculado pelo INSS na forma da legislação, nos termos da r. sentença.
COMPENSAÇÃO DOS VALORES ADMINISTRATIVOS JÁ PAGOS.
Verifica-se que o juízo “a quo” fixou a DIB sem indicar a necessidade do desconto de valores inacumuláveis.
Desse modo, determino a compensação dos valores eventualmente pagos a título de auxílio por incapacidade temporária ou outro benefício cuja cumulação seja vedada por lei (art. 124 da Lei 8.213/1991 e art. 20, § 4º, da Lei 8.742/1993) após a data de início do benefício concedido nesta ação.
PRESCRIÇÃO QUINQUENAL PARCELAS ATRASADAS
O Superior Tribunal de Justiça já pacificou a questão da prescrição das parcelas vencidas anteriormente ao ajuizamento da ação previdenciária, com a edição da Súmula 85:
"Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública - aqui incluído o INSS - figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do quinquênio anterior a propositura da ação."
Considerando o ajuizamento da ação em 27.07.2023 e a data da cessação administrativa em 29.06.2023, verifica-se que não há parcelas atingidas pela prescrição quinquenal.
CONSECTÁRIOS
CORREÇÃO MONETÁRIA
A correção monetária deve ser aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação superveniente (conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal), observados os termos da decisão final no julgamento do RE n. 870.947, Rel. Min. Luiz Fux.
JUROS DE MORA
Conforme disposição inserta no art. 219 do Código de Processo Civil 1973 (atual art. 240 Código de Processo Civil - Lei nº 13.105/2015), os juros de mora são devidos a partir da citação na ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02, após, à razão de 1% ao mês, consonante com o art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), calculados nos termos deste diploma legal.
DA APLICAÇÃO ÚNICA DA SELIC A PARTIR DA EC N° 113, DE 08/12/2021
A partir do mês de promulgação da Emenda Constitucional n° 113, de 08/12/2021, a apuração do débito se dará unicamente pela taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3°, ficando vedada a incidência da taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Com o advento do novo Código de Processo Civil, foram introduzidas profundas mudanças no princípio da sucumbência, e em razão destas mudanças e sendo o caso de sentença ilíquida, a fixação do percentual da verba honorária deverá ser definida somente na liquidação do julgado, com observância ao disposto no inciso II, do § 4º c.c. § 11, ambos do artigo 85, do CPC/2015, bem como o artigo 86, do mesmo diploma legal.
Os honorários advocatícios, a teor da Súmula 111 do E. STJ incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência.
CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS
Falta de interesse recursal do INSS, pois a sentença já determinou a isenção ao pagamento das custas processuais, nos moldes pleiteados pelo requerido.
PREQUESTIONAMENTO
Por derradeiro, a sentença não ofendeu qualquer dispositivo legal, não havendo razão ao prequestionamento.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, não conheço de parte da apelação e, na parte conhecida, dou parcial provimento à apelação do INSS, para determinar a compensação dos valores eventualmente pagos a título de auxílio por incapacidade temporária ou outro benefício cuja cumulação seja vedada por lei após a data de início do benefício concedido nesta ação, e para adequar os critérios de correção monetária e juros de mora, observados os honorários advocatícios, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AUXÍLIO ACIDENTE. PRESENÇA DOS REQUISITOS LEGAIS. COMPENSAÇÃO DOS VALORES ADMINISTRATIVOS JÁ PAGOS. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. CONSECTÁRIOS.
- O benefício de auxílio-acidente encontra-se disciplinado pelo art. 86 da Lei nº 8.213/91, que, a partir da Lei nº 9.032/95, é devido como indenização ao segurado que sofrer redução da capacidade para o trabalho, em razão de sequelas de lesões consolidadas decorrentes de acidente de qualquer natureza. A única exceção é da perda auditiva, em que ainda persiste a necessidade de haver nexo entre o trabalho exercido e a incapacidade parcial para o mesmo, conforme disposto no §4º do referido artigo, com a alteração determinada na Lei nº 9.528/97.
- Presentes os requisitos indispensáveis à concessão do benefício de auxílio acidente, especialmente a comprovação da redução da capacidade laborativa por existência de sequela consolidada decorrente de acidente de qualquer natureza, o pedido é procedente.
- Determinada a compensação dos valores eventualmente pagos a título de auxílio por incapacidade temporária ou outro benefício cuja cumulação seja vedada por lei (art. 124 da Lei 8.213/1991 e art. 20, § 4º, da Lei 8.742/1993) após a data de início do benefício concedido nesta ação.
- Não configurada a prescrição quinquenal, pois não decorreram mais de 05 anos entre a data da cessação administrativa e da propositura da presente ação.
- A correção monetária deve ser aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação superveniente (conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal), observados os termos da decisão final no julgamento do RE n. 870.947, Rel. Min. Luiz Fux.
- Conforme disposição inserta no art. 219 do Código de Processo Civil 1973 (atual art. 240 Código de Processo Civil - Lei nº 13.105/2015), os juros de mora são devidos a partir da citação na ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02, após, à razão de 1% ao mês, consonante com o art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), calculados nos termos deste diploma legal.
- A partir do mês de promulgação da Emenda Constitucional n° 113, de 08/12/2021, a apuração do débito se dará unicamente pela taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3°, ficando vedada a incidência da taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária.
- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015.
- Falta de interesse recursal do INSS no que concerne ao pedido de isenção ao pagamento das custas processuais, pois a sentença já determinou tal isenção, nos moldes pleiteados pelo requerido.
- Apelação do INSS não conhecida em parte e, na parte conhecida, provida em parte.
