APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007168-21.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: LUCINEDE DE SANTANA SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: LUCIANO ANGELO ESPARAPANI - SP185295-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007168-21.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: LUCINEDE DE SANTANA SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: LUCIANO ANGELO ESPARAPANI - SP185295-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o restabelecimento de auxílio doença ou a concessão de aposentadoria por invalidez.
A r. sentença, proferida em 10.02.2020, indeferiu a petição inicial, e julgou extinto o feito sem resolução do mérito, nos termos dos artigos 485, I, e 321, ambos do CPC/2015. Condenou a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais, suspendendo a exigibilidade da execução em razão do benefício da justiça gratuita concedida. Deixou de condenar ao pagamento dos honorários advocatícios devido a não angularização da lide. (ID 150089459 – págs. 17-20).
Em suas razões recursais, a parte autora requer a nulidade da sentença, e a determinação de retorno dos autos à vara de origem a fim de dar prosseguimento ao feito, ao argumento de que cumpriu a determinação do magistrado “a quo” de comprovação de endereço. (ID 150089459 – págs. 23-27).
Sem contrarrazões, subiram os autos a este Eg. Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007168-21.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: LUCINEDE DE SANTANA SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: LUCIANO ANGELO ESPARAPANI - SP185295-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso, e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais, passo ao exame da matéria objeto de devolução.
In casu, ao receber o pleito autoral, o juízo de origem determinou que a inicial fosse emendada, a fim de que a autora juntasse aos autos comprovante de residência atualizado em seu nome, sob pena de indeferimento da inicial.
Afirmando não possuir documento comprobatório do endereço residencial em seu nome, a requerente trouxe aos autos declaração de próprio punho asseverando a residência em endereço em nome de terceiro (ID 150089458 – pág. 21 e ID 150089459 – págs. 15-16).
Contudo, entendendo o magistrado “a quo” que não foi cumprida a determinação de emenda à inicial, extinguiu o feito sem resolução do mérito.
Neste contexto, destaco o que dispõe o art. 319, II, Código de Processo Civil/2015:
“Art. 319. A petição inicial indicará:
(…)
II - os nomes, os prenomes, o estado civil, a existência de união estável, a profissão, o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas ou no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica, o endereço eletrônico, o domicílio e a residência do autor e do réu;
(…)
§ 1o Caso não disponha das informações previstas no inciso II, poderá o autor, na petição inicial, requerer ao juiz diligências necessárias a sua obtenção.
§ 2o A petição inicial não será indeferida se, a despeito da falta de informações a que se refere o inciso II, for possível a citação do réu.
§ 3o A petição inicial não será indeferida pelo não atendimento ao disposto no inciso II deste artigo se a obtenção de tais informações tornar impossível ou excessivamente oneroso o acesso à justiça.
Ainda, o art. 320 do CPC/2015 estabelece que a petição inicial será instruída com os documentos indispensáveis à propositura da ação, exigindo que a parte reúna, juntamente com a exordial, todos os documentos indispensáveis à perfeita desenvoltura da lide, o que significa, exatamente os documentos relacionados com o fato e com os fundamentos jurídicos do pedido, ou seja, as provas através das quais a autora pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados.
Vale apontar que há sensível diferença entre os conceitos de "documentos indispensáveis à propositura da ação" e de "documentos essenciais à prova do direito alegado". Somente a ausência dos primeiros autoriza a conclusão acerca da inépcia da petição inicial. A ausência dos demais não configura qualquer deficiência a viciar a demanda desde sua propositura, mas tão-somente uma deficiência probatória que pode ser sanada no decorrer do trâmite processual.
Transcrevo trecho do entendimento de Cândido Rangel Dinamarco sobre a matéria: "São documentos indispensáveis à propositura da demanda somente aqueles sem os quais o mérito da causa não possa ser julgado, como a certidão de casamento na ação de separação judicial, a escritura pública e registro nas demandas fundadas em direito de propriedade, o instrumento do contrato cuja anulação se vem pedir etc. Não se incluem na exigência do art. 283 do Código de Processo Civil os demais possíveis documentos que o autor traria ou trará ao processo depois, ainda que importantes para que, no mérito, sua demanda seja julgada procedente." (DINAMARCO, Cândido Rangel. "Instituições de Direito Processual Civil", Vol. III, 5ª ed., São Paulo: Malheiros Editores, 2005, pp. 381/382).
Por fim observe-se que o art. 330 do CPC/2015 elenca as hipotéses de indeferimento da petição inicial, conforme segue:
“
Art. 330. A petição inicial será indeferida quando:I - for inepta;
II - a parte for manifestamente ilegítima;
III - o autor carecer de interesse processual;
IV – não atendidas as prescrições dos arts. 106 e 321.
§ 1o Considera-se inepta a petição inicial quando:
I - lhe faltar pedido ou causa de pedir;
II - o pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se permite o pedido genérico;
III - da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão;
IV – contiver pedidos incompatíveis entre si.”
Da leitura dos mencionados artigos, é possível verificar que a ausência de comprovante de residência em nome próprio não é caso de indeferimento da inicial, porquanto a necessária apresentação do referido comprovante não se insere nos requisitos do art. 319, II, do CPC/2015, tampouco se enquadra na exigência prevista no art. 320 do mesmo diploma legal.
Frise-se que os requisitos constantes dos arts. 319 e 320 do CPC/2015 devem ser interpretados restritivamente, sem ampliação, principalmente em prejuízo das partes ou do andamento célere e regular do processo.
Ora, a mera indicação do endereço da parte autora na petição inicial é suficiente para preencher o requisito relativo à informação de domicílio/residência, presumindo-se verdadeiros os dados pessoais ali inseridos.
Neste aspecto, em especial, valoriza-se a boa-fé que rege o processo, sendo a parte autora a principal interessada na prestação jurisdicional, de modo que, em casos em que não dispõe de documento indicativo de residência em nome próprio, válida a declaração complementar de endereço de próprio punho.
In casu, considerando que os preceitos legais de regência não exigem o documento pretendido pelo juízo a quo, consistente no comprovante de residência em nome próprio da autora, nota-se que não ocorreu nenhuma das hipotéses caracterizadoras da inépcia da inicial, nos termos do art. 330 do CPC/2015.
Assim, deve ser desconstituída a sentença que extinguiu o feito, devendo retornar os autos à origem para que seja dado regular andamento ao processo.
Ante o exposto, dou provimento à apelação da parte autora, para declarar nula a r. sentença, determinando o retorno dos autos à Vara de origem, para regular processamento, na forma acima fundamentada.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. AUSÊNCIA DE COMPROVANTE DE RESIDÊNCIA EM NOME PRÓPRIO. DESNECESSIDADE. NULIDADE.
- A necessária apresentação do comprovante de residência em nome próprio não se insere nos requisitos do art. 319, II, do CPC/2015, tampouco se enquadra na exigência prevista no art. 320 do mesmo diploma legal.
- A mera indicação do endereço da parte autora na petição inicial é suficiente para preencher o requisito relativo à informação de domicílio/residência, presumindo-se verdadeiros os dados pessoais ali inseridos, não sendo o comprovante de residência em nome próprio do postulante documento indispensável à propositura da demanda.
- Considerando que os preceitos legais de regência não exigem o documento pretendido pelo juízo a quo, consistente no comprovante de residência em nome próprio da autora, não houve ocorrência de nenhuma das hipotéses caracterizadoras da inépcia da inicial, nos termos do art. 330 do CPC/2015.
- Sentença anulada, e determinado o retorno dos autos à origem para regular andamento ao processo.
-Apelação da parte autora provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação da parte autora, para declarar nula a r. sentença, determinando o retorno dos autos à Vara de origem, para regular processamento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.