
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000540-04.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NADIR VIEIRA DE SOUSA
Advogado do(a) APELADO: MARTA DE FATIMA MELO - SP186582-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000540-04.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NADIR VIEIRA DE SOUSA
Advogado do(a) APELADO: MARTA DE FATIMA MELO - SP186582-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou de auxílio doença.
A r. sentença, proferida em 30.10.2019, julgou procedente o pedido e condenou o INSS a conceder a aposentadoria por invalidez, desde a data do requerimento administrativo (09.02.2015). Determinou a incidência sobre os valores atrasados, desde os respectivos vencimentos, de correção monetária, e aplicação de juros de mora, a partir da citação, de acordo com os critérios fixados no Manual de Orientação e Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal. Condenou o réu, ainda, ao pagamento de despesas processuais, observado o artigo 6° da Lei Estadual n° 11. 608/03, e de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da condenação, com observância da Súmula 111 do STJ. Dispensada a remessa oficial. (ID 150204269 – págs. 108-113)
Em suas razões recursais, o INSS requer, preliminarmente, a submissão da sentença ao reexame necessário. No mérito, pugna pela improcedência do pedido, ao argumento da ausência de carência rural para a concessão da aposentadoria por invalidez, em razão da não comprovação de atividade rural pela parte autora em ação e rescisória anteriormente propostas, sustentando, ainda, a inexistência de prova nova quanto à alegada atividade rural na presente ação. Eventualmente, pleiteia a fixação dos honorários advocatícios em fase de liquidação de sentença. Por fim, suscita o prequestionamento legal para fins de interposição de recursos. (ID 150204269 – págs. 118-121).
Com contrarrazões (ID 150204269 – págs. 123-130), subiram os autos a este Eg. Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000540-04.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NADIR VIEIRA DE SOUSA
Advogado do(a) APELADO: MARTA DE FATIMA MELO - SP186582-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passo ao exame da matéria objeto de devolução.
REEXAME NECESSÁRIO
De se observar que, de acordo com o artigo 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil/2015, não será aplicável o duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos. Na hipótese dos autos, embora a sentença seja ilíquida, resta evidente que a condenação ou o proveito econômico obtido na causa não ultrapassa o limite legal previsto, enquadrando-se perfeitamente à norma insculpida no parágrafo 3º, I, artigo 496 do NCPC, razão pela qual impõe-se o afastamento do reexame necessário.
Rejeito a preliminar, e passo à análise do mérito.
DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO - DOENÇA
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
A Lei nº 8.213/91 preconiza, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência e a condição de segurado.
Independe, porém, de carência a concessão do benefício nos casos de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social, for acometido das doenças relacionadas no art. 151 da Lei de Benefícios.
Cumpre salientar que a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social não impede a concessão do benefício na hipótese em que a incapacidade tenha decorrido de progressão ou agravamento da moléstia.
Acerca da matéria, há de se observar o disposto na seguinte ementa:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ . CARÊNCIA E QUALIDADE DE SEGURADO NÃO COMPROVAÇÃO. INCAPACIDADE PREEXISTENTE. REFILIAÇÃO.
1- Não é devida a aposentadoria por invalidez à parte Autora que não cumpriu a carência , bem como não demonstrou a manutenção da qualidade de segurado no momento em sobreveio a incapacidade para o trabalho.
2- Incapacidade constatada em perícia médica realizada pelo INSS no procedimento administrativo originado do requerimento de auxílio - doença .
3- Ainda que se considerasse a refiliação da Autora à Previdência pelo período necessário de 1/3 do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido, esta se deu posteriormente à sua incapacidade.
4- A doença preexistente não legitima o deferimento de aposentadoria por invalidez ou auxílio - doença , à exceção de quando a incapacidade laborativa resulte progressão ou agravamento do mal incapacitante.
5- A Autora quando reingressou no sistema previdenciário, logrando cumprir a carência exigida e recuperando sua qualidade de segurada, já era portadora da doença e da incapacidade, o que impede a concessão do benefício pretendido, segundo vedação expressa do art. 42, § 2º, da Lei nº 8.213/91.
6- Apelação da parte Autora improvida. Sentença mantida."
(TRF3, 9ª Turma, AC nº 2005.03.99.032325-7, Des. Fed. Rel. Santos Neves, DJU de 13/12/2007, p. 614).
É certo que o art. 43, §1º, da Lei de Benefícios disciplina que a concessão da aposentadoria depende da comprovação da incapacidade total e definitiva mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social. O entendimento jurisprudencial, no entanto, firmou-se no sentido de que também gera direito ao benefício a incapacidade parcial e definitiva para o trabalho, atestada por perícia médica, a qual inabilite o segurado de exercer sua ocupação habitual, tornando inviável a sua readaptação. Tal entendimento traduz, da melhor forma, o princípio da universalidade da cobertura e do atendimento da Seguridade Social.
É que, para efeitos previdenciários, basta a incapacidade permanente que impeça o exercício da atividade laborativa nos moldes ditados pelo mercado de trabalho, evidenciando, dessa forma, padecer o periciando de incapacidade total.
Nesse sentido, destaco acórdão desta Turma:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ . REQUISITOS: PREENCHIMENTO. NÃO VINCULAÇÃO DO JUIZ AO LAUDO PERICIAL. INVIABILIDADE DE EXERCÍCIO DAS ATIVIDADES HABITUAIS E DE READAPTAÇÃO A OUTRAS. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO.
(...)
II - O laudo pericial concluiu pela incapacidade parcial da autora. Porém, o Juiz não está adstrito unicamente às suas conclusões, devendo valer-se de outros elementos para a formação de sua convicção. No caso, corretamente considerada a falta de condições da autora para exercer suas funções habituais de cozinheira, em razão de tenossinovite no punho e problemas de coluna, que levaram-na a perder as forças das mãos, bem como sua idade avançada e as dificuldades financeiras e físicas para exercer outra profissão ou aprender novo ofício. Mantida a sentença que deferiu o benefício da aposentadoria por invalidez à autora.
(...)
IV - Apelações improvidas."
(9ª Turma, AC nº 1997.03.007667-0, Des. Fed. Rel. Marisa Santos, v.u., DJU de 04.09.2003, p. 327).
É necessário, também, para a concessão da aposentadoria por invalidez o preenchimento do requisito da qualidade de segurado. Mantém essa qualidade aquele que, mesmo sem recolher as contribuições, conserve todos os direitos perante a Previdência Social, durante um período variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de segurado e a sua situação, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios, a saber:
"Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo."
É de se observar, ainda, que o §1º do supracitado artigo prorroga por 24 meses tal período de graça aos que contribuíram por mais de 120 meses.
Em ambas as situações, restando comprovado o desemprego do segurado perante o órgão do Ministério de Trabalho ou da Previdência Social, os períodos serão acrescidos de mais 12 meses.
Convém esclarecer que, conforme disposição inserta no §4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c.c. o art. 14 do Decreto Regulamentar nº 3.048/99, com a nova redação dada pelo Decreto nº 4.032/01, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do segundo mês seguinte ao término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei nº 8.212/91 para recolhimento da contribuição, acarretando, consequentemente, a caducidade do direito pretendido.
O benefício de auxílio doença, por sua vez, é devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 contribuições mensais e for considerado temporariamente incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual, por mais de 15 dias consecutivos e possuir a condição de segurado (arts. 59 a 63 da Lei de Benefícios).
Cumpre salientar, ainda, que o benefício acima referido é um "minus" em relação à aposentadoria por invalidez, a qual sendo concedida não gera cumulação, mas sim cessação daquele.
DO CASO DOS AUTOS
Não há insurgência da autarquia federal quanto à incapacidade laborativa, razão pela qual deixo de analisar tal requisito, em respeito ao princípio da devolutividade dos recursos ou tantum devolutum quantum appellatum.
No caso concreto, para comprovar a qualidade de segurada e carência rurais, a parte autora juntou aos autos os documentos abaixo indicados:
- Certidão de casamento registrado em
20.06.1964,
na qual consta a profissão do esposo como lavrador e da autora como doméstica (ID 150204269 – pág. 10); e- Certidão de óbito do esposo na data de
13.05.1972,
na qual consta a profissão do cônjuge falecido como lavrador (ID 150204269 – pág. 11).O perito judicial não indicou o início da incapacidade laborativa, afirmando que a “Autora é portadora de lombalgia e arritmia cardíaca. Há anos sem precisar data”, bem como, que a “Autora informou estar há 1 ano sem trabalhar” (II - Características das Enfermidades Constatadas “3” e III - Limitações Incapacitantes “7” – ID 150204269 – págs. 90-91), ou seja, desde 10.2016.
O único relatório médico juntado aos autos (ID 150204269 – pág. 13) está atrelado ao quadro clínico da requerente contemporâneo ao requerimento administrativo em 09.02.2015, não sendo carreados aos autos elementos probatórios suficientes a comprovar incapacidade laboral em momento distinto ao apurado pelo perito judicial, ônus processual previsto no art. 373, I, do CPC/2015.
Neste contexto, vale destacar que, para início de prova material, foram juntados documentos com datas muitos distantes (1964/1972) do período de comprovação da alegada atividade rural (2014/2015), frise-se, aos 70 anos de idade, não trazendo convicção a prova testemunhal produzida nos autos (ID 150204269 – págs. 105-107).
Ressalte-se que as testemunhas Jairo Batista de Oliveira e João Evangelista dos Santos (ID’s 143888233/234) mostraram-se extremamente vagos em relação às datas de exercício do alegado trabalho rural, apenas afirmando genericamente o labor rural.
Nesse sentido, aponto que as testemunhas Jairo Batista de Oliveira e João Evangelista dos Santos afirmam que a requerente deixou de trabalhar há mais ou menos 05 ou 06 anos, em contradição ao depoimento da autora ao perito judicial, no sentido de que “trabalhou até aproximadamente 1 ano” (Histórico Laboral – ID 150204269 – pág. 86), ou seja, até 10.2016.
Frise-se, ainda, que não é admitida prova exclusivamente testemunhal, a teor da Súmula 149 do STJ.
Vale destacar, por fim, que a alegada atividade de trabalhadora rural também não foi demonstrada nos autos da ação antecedente, de concessão de aposentadoria por idade rural (ação n° 2005.03.99.026014-4 - ID 150204269 – págs. 32-33), e na ação rescisória (n° 0036364-63.2011.4.03.0000 – ID 150204269 – págs. 34-36), e não houve a juntada de documentos novos na presente ação, que demonstrasse a alteração dessa situação fática, limitando-se a parte autora a colacionar aos autos, como início de prova material, os mesmos documentos que já foram objeto de improcedência nos autos dos processos anteriores.
Desse modo, não comprovada a qualidade de segurada e carência rurais no período controverso, não fazendo jus a parte autora aos benefícios postulados.
Em face de todo o explanado, de rigor o decreto de improcedência da demanda, cabendo a reforma da sentença.
CONSECTÁRIOS
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios no valor de R$ 1.000,00, a teor do disposto no art. 85, §8, do CPC/2015, suspensa sua exigibilidade, por ser a parte autora beneficiária da assistência judiciária gratuita, nos termos dos §§2º e 3º do art. 98 do CPC.
PREQUESTIONAMENTO
Por derradeiro, a sentença não ofendeu qualquer dispositivo legal, não havendo razão ao prequestionamento.
DISPOSITIVO
Ante o exposto,
rejeito a preliminar
e, no mérito, dou provimento à apelação do INSS
, para julgar improcedente o pedido inicial, observados os honorários advocatícios, nos termos da fundamentação.É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AUXÍLIO - DOENÇA /APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PRELIMINAR REJEITADA. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS FIXADOSEM CONFORMIDADE COM O §8° DO ART. 85 do CPC/2015.
- De se observar que, de acordo com o artigo 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil/2015, não será aplicável o duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos.
Na hipótese dos autos, embora a sentença seja ilíquida, resta evidente que a condenação ou o proveito econômico obtido na causa não ultrapassa o limite legal previsto, enquadrando-se perfeitamente à norma insculpida no parágrafo 3º, I, artigo 496 do NCPC, razão pela qual impõe-se o afastamento do reexame necessário.
- A Lei nº 8.213/91 preconiza, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência e a condição de segurado.
- O benefício de auxílio-doença, por sua vez, é devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 contribuições mensais e for considerado temporariamente incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual, por mais de 15 dias consecutivos e possuir a condição de segurado (arts. 59 a 63 da Lei de Benefícios).
- Ausentes os requisitos indispensáveis à concessão dos benefícios de auxílio doença e/ou aposentadoria por invalidez, especialmente, a comprovação da qualidade de segurada e carência rurais no período controverso, o pedido é improcedente.
- Para início de prova material, foram juntados documentos com datas muitos distantes (1964/1972) do período de comprovação da alegada atividade rural (2014/2015), frise-se, aos 70 anos de idade, não trazendo convicção a prova testemunhal produzida nos autos.
- As testemunhas Jairo Batista de Oliveira e João Evangelista dos Santos mostraram-se extremamente vagos e contraditórios em relação às datas de exercício do alegado trabalho rural, apenas afirmando genericamente o labor rural.
- A alegada atividade de trabalhadora rural também não foi demonstrada nos autos da ação antecedente, de concessão de aposentadoria por idade rural (ação n° 2005.03.99.026014-4), e na ação rescisória (n° 0036364-63.2011.4.03.0000), e não houve a juntada de documentos novos na presente ação, que demonstrasse a alteração dessa situação fática, limitando-se a parte autora a colacionar aos autos, como início de prova material, os mesmos documentos que já foram objeto de improcedência nos autos dos processos anteriores.
- Honorários advocatícios fixados em conformidade com o §8º do art. 85 do CPC/2015, observada a gratuidade da justiça.
- Preliminar rejeitada. Apelação do INSS provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu rejeitar a preliminar e, no mérito, dar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
