Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5027069-43.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
04/06/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 09/06/2020
Ementa
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-DOENÇA. AUSÊNCIA DOS
REQUISITOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA.
- É certo que o art. 43, §1º, da Lei de Benefícios disciplina que a concessão da aposentadoria
depende da comprovação da incapacidade total e definitiva mediante exame médico-pericial a
cargo da Previdência Social. O entendimento jurisprudencial, no entanto, firmou-se no sentido de
que também gera direito ao benefício a incapacidade parcial e definitiva para o trabalho, atestada
por perícia médica, a qual inabilite o segurado de exercer sua ocupação habitual, tornando
inviável a sua readaptação. Tal entendimento traduz, da melhor forma, o princípio da
universalidade da cobertura e do atendimento da Seguridade Social.
- É requisito indispensável a comprovação da incapacidade laborativa da parte autora para a
concessão do benefício de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, sob pena de
improcedência do pedido.
- Honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa. No entanto, suspendo a
exigibilidade, por se tratar de beneficiária da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no
art. 98, § 3º, do CPC.
- Apelo provido.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5027069-43.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANA CLAUDIA LIBORIO DE SA
Advogado do(a) APELADO: FABIO EDUARDO DE LAURENTIZ - SP170930-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5027069-43.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANA CLAUDIA LIBORIO DE SA
Advogado do(a) APELADO: FABIO EDUARDO DE LAURENTIZ - SP170930-N
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO
SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o restabelecimento do benefício de auxílio-doença e sua
conversão em aposentadoria por invalidez.
A r. sentença de id 4344028 julgou procedente o pedido, para condenar o INSS a conceder à
parte autora o benefício de auxílio-doença, desde a propositura da presente ação (23/11/2016),
com juros de mora e correção monetária de acordo com os índices estipulados pelo Conselho da
Justiça Federal e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação. Com
tutela antecipada.
Em razões recursais de id 4344036, requer o INSS a reforma da r. sentença, por entender não
preenchidos os requisitos necessários à concessão do benefício.
Com contrarrazões da parte autora.
Autos convertidos em diligência (id 110262807), para a realização de perícia médica com
especialista em ortopedia.
Cumprida a diligência, vieram-me os autos conclusos.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5027069-43.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANA CLAUDIA LIBORIO DE SA
Advogado do(a) APELADO: FABIO EDUARDO DE LAURENTIZ - SP170930-N
V O T O
Inicialmente, tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade
recursais, passo ao exame da matéria objeto de devolução.
DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-DOENÇA
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da
Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
A Lei nº 8.213/91 preconiza, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria
por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12
(doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado
incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a
subsistência e a condição de segurado.
Independe, porém, de carência a concessão do benefício nos casos de acidente de qualquer
natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após
filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social, for acometido das doenças relacionadas no art.
151 da Lei de Benefícios.
Cumpre salientar que a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime
Geral da Previdência Social não impede a concessão do benefício na hipótese em que a
incapacidade tenha decorrido de progressão ou agravamento da moléstia.
Acerca da matéria, há de se observar o disposto na seguinte ementa:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ . CARÊNCIA E QUALIDADE DE
SEGURADO NÃO COMPROVAÇÃO. INCAPACIDADE PREEXISTENTE. REFILIAÇÃO.
1- Não é devida a aposentadoria por invalidez à parte Autora que não cumpriu a carência, bem
como não demonstrou a manutenção da qualidade de segurado no momento em sobreveio a
incapacidade para o trabalho.
2- Incapacidade constatada em perícia médica realizada pelo INSS no procedimento
administrativo originado do requerimento de auxílio-doença.
3- Ainda que se considerasse a refiliação da Autora à Previdência pelo período necessário de 1/3
do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a
ser requerido, esta se deu posteriormente à sua incapacidade.
4- A doença preexistente não legitima o deferimento de aposentadoria por invalidez ou auxílio-
doença, à exceção de quando a incapacidade laborativa resulte progressão ou agravamento do
mal incapacitante.
5- A Autora quando reingressou no sistema previdenciário, logrando cumprir a carência exigida e
recuperando sua qualidade de segurada, já era portadora da doença e da incapacidade, o que
impede a concessão do benefício pretendido, segundo vedação expressa do art. 42, § 2º, da Lei
nº 8.213/91.
6- Apelação da parte Autora improvida. Sentença mantida."
(TRF3, 9ª Turma, AC nº 2005.03.99.032325-7, Des. Fed. Rel. Santos Neves, DJU de 13/12/2007,
p. 614).
É certo que o art. 43, §1º, da Lei de Benefícios disciplina que a concessão da aposentadoria
depende da comprovação da incapacidade total e definitiva mediante exame médico-pericial a
cargo da Previdência Social. O entendimento jurisprudencial, no entanto, firmou-se no sentido de
que também gera direito ao benefício a incapacidade parcial e definitiva para o trabalho, atestada
por perícia médica, a qual inabilite o segurado de exercer sua ocupação habitual, tornando
inviável a sua readaptação. Tal entendimento traduz, da melhor forma, o princípio da
universalidade da cobertura e do atendimento da Seguridade Social.
É que, para efeitos previdenciários, basta a incapacidade permanente que impeça o exercício da
atividade laborativa nos moldes ditados pelo mercado de trabalho, evidenciando, dessa forma,
padecer o periciando de incapacidade total.
Nesse sentido, destaco acórdão desta Turma:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ . REQUISITOS: PREENCHIMENTO.
NÃO VINCULAÇÃO DO JUIZ AO LAUDO PERICIAL. INVIABILIDADE DE EXERCÍCIO DAS
ATIVIDADES HABITUAIS E DE READAPTAÇÃO A OUTRAS. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO.
(...)
II - O laudo pericial concluiu pela incapacidade parcial da autora. Porém, o Juiz não está adstrito
unicamente às suas conclusões, devendo valer-se de outros elementos para a formação de sua
convicção. No caso, corretamente considerada a falta de condições da autora para exercer suas
funções habituais de cozinheira, em razão de tenossinovite no punho e problemas de coluna, que
levaram-na a perder as forças das mãos, bem como sua idade avançada e as dificuldades
financeiras e físicas para exercer outra profissão ou aprender novo ofício. Mantida a sentença que
deferiu o benefício da aposentadoria por invalidez à autora.
(...)
IV - Apelações improvidas."
(9ª Turma, AC nº 1997.03.007667-0, Des. Fed. Rel. Marisa Santos, v.u., DJU de 04.09.2003, p.
327).
É necessário, também, para a concessão da aposentadoria por invalidez o preenchimento do
requisito da qualidade de segurado. Mantém essa qualidade aquele que, mesmo sem recolher as
contribuições, conserve todos os direitos perante a Previdência Social, durante um período
variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de segurado e a sua
situação, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios, a saber:
"Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo."
É de se observar, ainda, que o §1º do supracitado artigo prorroga por 24 meses tal período de
graça aos que contribuíram por mais de 120 meses.
Em ambas as situações, restando comprovado o desemprego do segurado perante o órgão do
Ministério de Trabalho ou da Previdência Social, os períodos serão acrescidos de mais 12 meses.
Convém esclarecer que, conforme disposição inserta no §4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c.c. o
art. 14 do Decreto Regulamentar nº 3.048/99, com a nova redação dada pelo Decreto nº
4.032/01, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do segundo mês seguinte ao
término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei nº 8.212/91 para recolhimento da contribuição,
acarretando, consequentemente, a caducidade do direito pretendido.
O benefício de auxílio-doença, por sua vez, é devido ao segurado que tiver cumprido o período de
carência exigido de 12 contribuições mensais e for considerado temporariamente incapacitado
para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual, por mais de 15 dias consecutivos e possuir a
condição de segurado (arts. 59 a 63 da Lei de Benefícios).
Cumpre salientar, ainda, que o benefício acima referido é um "minus" em relação à aposentadoria
por invalidez, a qual sendo concedida não gera cumulação, mas sim cessação daquele.
DO CASO DOS AUTOS
O laudo pericial (id 4344016), de 06/06/2017, concluiu que a parte autora, com “status pós-
acidente automobilístico com politraumatismo”, é portadora de “trombose venosa crônica
bilateral”, “insuficiência venosa crônica periférica”, “varizes dos membros inferiores sem úlcera ou
inflamação”, “status pós-fratura de ramo púbico bilateral e fratura de acetábulo esquerdo com
evolução para pseudoartrose de sacroilíaca direita”, “desidratação dos discos intervertebrais de
L4-L5 e L5-S1”, “discreta protrusão difusa do disco intervertebral de L5-S1” e “obesidade grau I”
ostentando “restrições às atividades laborativas remuneradas que exijam intensos esforços”, o
que impedem o labor “em funções que exijam percorrer grandes distâncias continuamente; subir
e descer escadas e rampas íngremes, com ou sem peso, constantemente; agachar ou levantar
sucessivas vezes; carregar objetos e cargas pesados, frequentemente, etc”.
Observo que o senhor perito, na conclusão do laudo, frisou que as “condições clínicas atuais” da
parte autora “conferem capacidades, laborativa residual e cognitiva treinável, para trabalhar em
algumas atividades com menor risco destes acidentes para sua subsistência, sempre com
equipamentos de proteção individual adequados para ambiente e função, inclusive na função
alegada, não comprovada, de cabeleireira, além de recepcionista, atendente, telefonista,
telemarketing, etc.” (grifei).
No tocante à moléstia relacionada ao quadril da parte autora, sugeriu o senhor perito a realização
de perícia com especialista em ortopedia.
Sentenciado o feito com base no laudo que, expressamente, sugeriu a realização de perícia com
especialista em ortopedia, converti o feito em diligência (id 110262807), para a realização de
perícia médica em tal especialidade.
Realizada perícia judicial com especialista em ortopedia (id 128605705) em 21/12/2018, o experto
concluiu que a requerente é “portador (a) de status pós-tratamento de fratura do quadril, bacia,
membro superior e inferior. Cid: T149”, entretanto, “o quadro apresentado não causa
incapacidade para as atividades anteriormente desenvolvidas” (grifei).
Assim sendo, diante das novas e complementares informações colhidas na nova perícia, verifico
que as moléstias que acometem a parte autora não geram incapacidade para sua atividade
laborativa atual, sendo de rigor o decreto de improcedência do pedido inicial.
Saliento que a mera existência de moléstias não se traduz, necessariamente, em incapacidade.
Apesar do juiz não estar adstrito às conclusões ou informações de tais documentos, não há como
aplicar o preceito contido no art. 479 do Código de Processo Civil/2015, à míngua de informações
que conduzam à convicção da incapacidade laboral da postulante.
No que concerne especificamente ao laudo pericial, transcrevo, por oportuno, lição de De Plácido
e Silva:
"Embora peça de relevância no processo judicial, não está o juiz adstrito às conclusões ou
informações do laudo, desde que tenha suas razões para o julgar longe da verdade ou
incongruente em face de outras provas. Mas, quando se trate de questões técnicas, e não possua
o julgador outros elementos probatórios do fato ou dos fatos constantes do laudo e nele
evidenciados, não deve o juiz desprezá-lo ou se afastar de suas conclusões. Somente motivos
fortes e ponderáveis, em tal caso, poderiam anular uma prova parcial de tal natureza."
(Vocabulário Jurídico. 22ª ed. revista e atualizada, Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 819).
Para exaurimento da matéria trago a colação o seguinte julgado:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA. AUSÊNCIA
DE INCAPACIDADE LABORATIVA.
(...)
3 - A prova pericial acostada aos autos revela que as doenças diagnosticadas não causam na
apelante qualquer incapacidade para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
4 - Não preenchidos os requisitos legais para obtenção dos benefícios de aposentadoria por
invalidez nem de auxílio-doença, correta a sentença que os indeferiu.
5 - Agravos retidos não conhecidos e recurso improvido."
(TRF 3ª Região, 2ª Turma, AC n.º 2002.03.99.026865-8, Des. Fed. Rel. Marisa Santos, v.u., DJU
de 04.02.2003, p. 486).
Desta feita, para obter aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, é requisito indispensável a
incapacidade laborativa da parte autora, a qual não restou comprovada nos autos, não fazendo
jus aos benefícios postulados.
Por derradeiro, em face da inversão do resultado da lide, condeno a parte autora ao pagamento
de honorários advocatícios no valor de 10% do valor da causa. No entanto, suspendo a
exigibilidade, por se tratar de beneficiária da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no
art. 98, § 3º, do CPC.
Ante o exposto, dou provimento à apelação do INSS, para julgar improcedente o pedido da parte
autora, observando-se no que tange à verba honorária os critérios estabelecidos na presente
decisão. Casso a tutela antecipada. Informe-se ao INSS.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-DOENÇA. AUSÊNCIA DOS
REQUISITOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA.
- É certo que o art. 43, §1º, da Lei de Benefícios disciplina que a concessão da aposentadoria
depende da comprovação da incapacidade total e definitiva mediante exame médico-pericial a
cargo da Previdência Social. O entendimento jurisprudencial, no entanto, firmou-se no sentido de
que também gera direito ao benefício a incapacidade parcial e definitiva para o trabalho, atestada
por perícia médica, a qual inabilite o segurado de exercer sua ocupação habitual, tornando
inviável a sua readaptação. Tal entendimento traduz, da melhor forma, o princípio da
universalidade da cobertura e do atendimento da Seguridade Social.
- É requisito indispensável a comprovação da incapacidade laborativa da parte autora para a
concessão do benefício de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, sob pena de
improcedência do pedido.
- Honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa. No entanto, suspendo a
exigibilidade, por se tratar de beneficiária da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no
art. 98, § 3º, do CPC.
- Apelo provido. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
