
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5147653-71.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - JUIZ CONVOCADO FERNANDO MARCELO MENDES
APELANTE: NEUSA MENDES NOGUEIRA
Advogado do(a) APELANTE: AUGUSTINHO BARBOSA DA SILVA - SP159063-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5147653-71.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - JUIZ CONVOCADO FERNANDO MARCELO MENDES
APELANTE: NEUSA MENDES NOGUEIRA
Advogado do(a) APELANTE: AUGUSTINHO BARBOSA DA SILVA - SP159063-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
“Ante o exposto requer:
I – Seja concedido os benefícios da assistência judiciária gratuita visto que a autora no momento esta desempregada e não tem condições de arcar com as custas processuais sem comprometer seu sustento.
II – Preliminarmente, que na melhor forma de direito, através dos documentos em anexo que comprovam a verossimilhança das alegações e o perigo iminente da demora, preenchendo assim os requisitos da legislação pertinente, vem requerer LIMINAR DE ANTECIPAÇÃO DA TUTELA, para que o Instituto requerido pague provisoriamente o equivalente a 01 (um) (oitocentos e oitenta reais), conforme disposto no artigo 311 incisos I e IV, tendo em vista que a aposentadoria tem por fim o mínimo para a subsistência digna de caráter alimentar, agravando-se pelo fato da autora ser hipertensa e diabética.
III – Deferida a tutela, se digne Vossa Excelência em mandar citar o requerido no endereço mencionado no preambulo desta, para querendo no prazo legal, conteste a presente, sob pena de revelia e confissão.
IV - Ao final seja JULGADO TOTALMENTE PROCEDENTE o pedido, reconhecendo o direito a aposentadoria especial computando todo o período trabalhado em usinas como insalubre, sendo o Instituto condenado a pagar todos os benefícios negados desde seu pedido administrativamente, com as devidas correções legais, condenando-o ainda ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios no importe de 20% sobre o valor da condenação.
V - A designação de audiência de conciliação e ou mediação”.
Nas razões de apelação (ID 122906146), a parte autora requer, de forma subsidiária, a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
O pedido configura inovação recursal.
Não pode ser conhecido, sob pena de supressão de instância.
*** Aposentadoria especial ***
A aposentadoria especial foi originalmente prevista no artigo 31, da Lei Federal nº. 3.807, nos seguintes termos: “a aposentadoria especial será concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinqüenta ) anos de idade e 15 (quinze) anos de contribuições tenha trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos pelo menos, conforme a atividade profissional, em serviços, que, para êsse efeito, forem considerados penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo”.
Com a edição da Lei Federal nº. 5.890/73, a aposentadoria especial passou a ser disciplinada em seu artigo 9º, alterando apenas o período de carência de 15 (quinze) anos para 5 (cinco) anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
O Poder Executivo editou o Decreto Federal nº. 53.831/64, posteriormente alterado pelo Decreto Federal nº. 83.080/79, para listar as categorias profissionais que estavam sujeitas a agentes físicos, químicos e biológicos considerados prejudiciais à saúde ou à integridade física do segurado.
Destaca-se que os Decretos Federais nº. 53.831/64 e 83.080/79 vigeram de forma simultânea, de forma que, na hipótese de divergência entre as suas normas, deve prevalecer aquela mais favorável ao segurado (STJ, REsp nº 412351, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, pág. 355).
Com a edição da Lei Federal nº. 8.213/91, a aposentadoria especial passou a ser disciplinada em seu artigo 57, segundo o qual “a aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta lei, ao segurado que tiver trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física”, restando assegurada, ainda, a conversão do período trabalhado no exercício de atividades danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em razão da ausência de edição de lei que estabelecesse a relação das atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade física, os Decretos Federais nº. 53.831/64 e 83.080/79 permaneceram em vigor, até a edição da Lei Federal nº. 9.032/95 (STJ, Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482).
Ou seja, para o reconhecimento da condição especial da atividade exercida, bastava o seu enquadramento nos decretos, mediante a anotação da função em CTPS.
Com a edição da Lei Federal nº. 9.032, em 28 de abril de 1995, a redação do artigo 57 da Lei Federal nº. 8.213/91 foi alterada, passando a ser exigida, para a concessão do benefício, a prova de trabalho permanente em condições especiais, bem como a efetiva exposição do segurado a agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, pelo período equivalente ao exigido. A prova seria feita mediante a apresentação de informativos e formulários, como o SB-40 ou o DSS-8030.
O Decreto Federal nº 2.172, de 5 de março de 1997 previu os agentes prejudiciais à saúde (artigo 66 e Anexo IV), bem como estabeleceu requisitos mais rigorosos para a prova da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, mediante a apresentação de laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), para a caracterização da condição especial da atividade exercida. Por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei Federal nº. 9.528, de 10 de dezembro de 1997.
Ressalte-se que, no que diz respeito ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e à forma da sua demonstração, deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho (STJ - Pet 9.194/PR, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
Com relação ao agente nocivo ruído, até ser editado o Decreto Federal nº 2.172/97, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 dB(A) como agente nocivo à saúde.
Em seguida, o Decreto Federal nº 2.172/97, que revogou Decretos Federais nº. 53.831/64 e 83.080/79, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 dB(A) como prejudicial à saúde.
No entanto, com o Decreto Federal nº 4.882, de 18 de novembro de 2003, ocorreu nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, para considerar o nível de ruídos superior a 85 dB(A) como prejudicial à saúde (artigo 2º do Decreto Federal nº 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto Federal nº. 3.048/99).
O Superior Tribunal de Justiça, no regime de que tratava o artigo 543-C, do Código de Processo Civil de 1.973, entendeu pela impossibilidade da aplicação retroativa do Decreto Federal nº 4.882/03, de modo que o limite de tolerância para a configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6/3/1997 a 18/11/2003 (STJ, REsp 1398260/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014).
Ademais, “o fato de a empresa fornecer ao empregado o EPI - Equipamento de Proteção Individual - e, ainda que tal equipamento seja devidamente utilizado, não afasta, de per se, o direito ao benefício da aposentadoria com a contagem de tempo especial, devendo cada caso ser apreciado em suas particularidades” (STJ, REsp 584.859/ES, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 18/08/2005, DJ 05/09/2005, p. 458)
*** Caso concreto ***
No caso concreto, da análise dos Perfis Profissiográficos Previdenciários – PPPs e, de acordo com a legislação previdenciária vigente à época, a parte autora
não
provou o exercício da atividade especial nos períodos de 24/04/1979 a 01/09/1990, 26/11/2003 a 01/03/2007 e 14/02/2008 a 01/05/2012.
O período de 24/04/1979 a 01/09/1990 (Usina Alto Alegre S/A – Açúcar e Álcool) não pode ser considerado insalubre pela categoria profissional, como também a parte autora não comprovou a exposição aos agentes agressivos, nos termos da lei e das normas técnicas de regência (PPP – fls. 1/5, ID 122906127).
Quanto ao período de 26/11/2003 a 01/03/2007 (Usina Alto Alegre S/A – Açúcar e Álcool), a parte autora não provou a exposição a agentes considerados nocivos à saúde e que legitimem o cômputo de tempo especial, nos termos da lei e das normas técnicas de regência (PPP – fls. 1/5, ID 122906127).
Quanto ao período de 14/02/2008 a 01/05/2012 (Destilaria Alcidia S.A), a parte autora trabalhou no setor de laboratório, nos cargos de coordenador e supervisor de laboratório, exposta a ruídos de 62 dB (A) a 72,8 dB (A), razão pela qual não se enquadra no código 2.0.1, Anexo IV do Decreto Federal nº 3.048/99, com redação dada pelo Decreto Federal nº 4.882/03 (PPP – fls. 2, ID 122906015).
Assim, os períodos de 24/04/1979 a 01/09/1990, 26/11/2003 a 01/03/2007 e 14/02/2008 a 01/05/2012 devem ser considerados como de atividade comum.
Saliento que a atividade especial somente pode ser considerada por presunção legal até 28/04/1995, ocasião em que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 foram alterados pela Lei nº 9.032/95. A partir de então, o reconhecimento da atividade especial apenas se dá caso seja demonstrada a exposição, de forma habitual e permanente, a agentes nocivos à saúde ou à integridade física.
Registro que o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP substitui o laudo técnico, sendo documento suficiente para aferição das atividades nocivas a que esteve sujeito o trabalhador.
Sendo o requerimento do benefício posterior à Lei Federal nº 8.213/91, deve ser aplicado o fator de conversão de 1,20, mais favorável ao segurado, como determina o artigo 70 do Decreto Federal nº. 3048/99, com a redação dada pelo Decreto Federal nº. 4.827/03.
Cumpre observar ainda que, por ocasião da conversão da Medida Provisória nº 1.663/98 na Lei Federal nº 9.711/98, permaneceu em vigor o parágrafo 5º do artigo 57 da Lei Federal nº 8.213/91, razão pela qual continua sendo plenamente possível a conversão do tempo trabalhado em condições especiais em tempo de serviço comum relativamente a qualquer período, incluindo o posterior a 28 de maio de 1998 (STJ, AgRg no Resp nº 1.127.806-PR, 5ª Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 05/04/2010).
Cabe ressaltar que a extemporaneidade de documento não obsta o reconhecimento de tempo de trabalho em condições especiais, pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual à constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica.
Os períodos registrados em CTPS são suficientes para garantir o cumprimento da carência, de acordo com a tabela do artigo 142 da Lei Federal nº 8.213/1991.
Desse modo, computando-se os períodos de atividade especial reconhecidos na r. sentença, até a data do requerimento administrativo (DER em 23/10/2015 – fls. 1, ID 122906016), verifica-se que a parte autora não comprovou o exercício de atividades consideradas especiais por um período de tempo superior a 25 (vinte e cinco) anos, conforme planilha anexa, razão pela qual não preenche os requisitos para a concessão da aposentadoria especial, nos moldes dos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91.
Tendo em vista que a parte autora não preencheu os requisitos para concessão do benefício, julgo improcedente o pedido.
Considerado o trabalho adicional realizado pelos advogados, em decorrência da interposição de recurso, os honorários advocatícios, por ocasião da liquidação, deverão ser acrescidos de percentual de 1% (um por cento), nos termos do artigo 85, § 11, do Código de Processo Civil.
Por tais fundamentos, conheço, em parte, da apelação e, na parte conhecida, nego-lhe provimento.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DA APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL NÃO COMPROVADA. REQUISITOS NÃO CUMPRIDOS. BENEFÍCIO INDEFERIDO.
1. Nas razões de apelação (ID 122906146), a parte autora requer, de forma subsidiária, a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição. O pedido configura inovação recursal. Não pode ser conhecido, sob pena de supressão de instância.
2. O artigo 57 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei Federal nº. 9.032/1995: “A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei”.
3. No caso concreto, da análise dos Perfis Profissiográficos Previdenciários – PPPs e, de acordo com a legislação previdenciária vigente à época, a parte autora não provou o exercício da atividade especial nos períodos de 24/04/1979 a 01/09/1990, 26/11/2003 a 01/03/2007 e 14/02/2008 a 01/05/2012.
4. O período de 24/04/1979 a 01/09/1990 (Usina Alto Alegre S/A – Açúcar e Álcool) não pode ser considerado insalubre pela categoria profissional, como também a parte autora não comprovou a exposição aos agentes agressivos, nos termos da lei e das normas técnicas de regência (PPP – fls. 1/5, ID 122906127).
5. Quanto ao período de 26/11/2003 a 01/03/2007 (Usina Alto Alegre S/A – Açúcar e Álcool), a parte autora não provou a exposição a agentes considerados nocivos à saúde e que legitimem o cômputo de tempo especial, nos termos da lei e das normas técnicas de regência (PPP – fls. 1/5, ID 122906127).
6. Quanto ao período de 14/02/2008 a 01/05/2012 (Destilaria Alcidia S.A), a parte autora trabalhou no setor de laboratório, nos cargos de coordenador e supervisor de laboratório, exposta a ruídos de 62 dB (A) a 72,8 dB (A), razão pela qual não se enquadra no código 2.0.1, Anexo IV do Decreto Federal nº 3.048/99, com redação dada pelo Decreto Federal nº 4.882/03 (PPP – fls. 2, ID 122906015).
7. Assim, os períodos de 24/04/1979 a 01/09/1990, 26/11/2003 a 01/03/2007 e 14/02/2008 a 01/05/2012 devem ser considerados como de atividade comum.
8. Desse modo, computando-se os períodos de atividade especial reconhecidos na r. sentença, até a data do requerimento administrativo (DER em 23/10/2015 – fls. 1, ID 122906016), verifica-se que a parte autora não comprovou o exercício de atividades consideradas especiais por um período de tempo superior a 25 (vinte e cinco) anos, conforme planilha anexa, razão pela qual não preenche os requisitos para a concessão da aposentadoria especial, nos moldes dos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91.
9. Tendo em vista que a parte autora não preencheu os requisitos para concessão do benefício, julgo improcedente o pedido.
10. Apelação conhecida, em parte, e, na parte conhecida, improvida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu conhecer, em parte, da apelação e, na parte conhecida, negar-lhe provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
