Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5028860-47.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
10/09/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 20/09/2019
Ementa
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL PARCIALMENTE COMPROVADA. ATIVIDADE
ESPECIAL COMPROVADA. APELAÇÃO DO INSS IMPROVIDA. APELAÇÃO DO AUTOR
PARCIALMENTE PROVIDA. BENEFÍCIO CONCEDIDO. JUROS E CORREÇÃO. HONORÁRIOS.
1. Têm direito somente à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC
nº 20/98, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 anos, para os homens, e
30 anos, para as mulheres.
2. Entendo ficar comprovado nos autos o trabalho rural exercido pelo autor de 11/10/1978 (com
14 anos conf. informado por um dos depoentes) a 27/02/1985, devendo o período ser computado
pelo INSS como tempo de serviço, independentemente do recolhimento das respectivas
contribuições previdenciárias, exceto para efeito de carência, nos termos do artigo 55, §2º, da Lei
nº 8.213/91.
3. Por ocasião da conversão da Medida Provisória nº 1.663/98 na Lei nº 9.711/98, permaneceu
em vigor o parágrafo 5º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91, razão pela qual continua sendo
plenamente possível a conversão do tempo trabalhado em condições especiais em tempo de
serviço comum relativamente a qualquer período, incluindo o posterior a 28/05/1998.
4. Computando-se os períodos de atividade rural ora reconhecidos, somados aos períodos de
atividade especial, convertidos em tempo de serviço comum, acrescidos aos demais períodos
incontroversos homologados pelo INSS até a data do requerimento administrativo (DER
31/03/2015 id 4539015 p. 1) perfazem-se 43 (quarenta e três) anos, 02 (dois) meses e 29 (vinte e
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
nove) dias, suficientes à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição integral.
5. Cumprindo os requisitos legais, faz jus a parte autora à concessão do benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição integral desde a DER em 31/03/2015, momento em que
o INSS ficou ciente da pretensão.
6. Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos
pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à
época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do RE 870947.
7. A verba honorária de sucumbência incide no montante de 10% (dez por cento) sobre o valor da
condenação, conforme entendimento desta Turma (artigo 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo
Civil/2015), aplicada a Súmula 111 do C. Superior Tribunal de Justiça.
8. Apelação do INSS improvida. Apelação do autor parcialmente provida. Benefício concedido.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5028860-47.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: DIRCEU GOMES SOARES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: JOAO BERTO JUNIOR - SP260165-N, MARINA SVETLIC -
SP267711-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, DIRCEU GOMES SOARES
Advogados do(a) APELADO: MARINA SVETLIC - SP267711-N, JOAO BERTO JUNIOR -
SP260165-N
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5028860-47.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO (RELATOR):
Trata-se de ação previdenciária ajuizada por DIRCEU GOMES SOARES em face do INSTITUTO
NACIONAL DO SEGURO SOCIAL-INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria
por tempo de contribuição mediante o reconhecimento da atividade rural e especial.
A r. sentença julgou parcialmente procedente os pedidos e, em consequência, extinguiu a ação,
determinando que o requerido proceda a conversão dos períodos de 28/02/1985 a 16/02/1994; de
01/06/1994 a 14/12/1994; de 02/01/1995 a 01/12/1995; de 21/02/1996 a 21/12/1996; de
12/05/1997 a 13/12/1997 e a partir 28/01/2005 em que o autor trabalhou em condições especiais
como tratorista, funileiro e motorista o qual deverá ser somado com o tempo comum. Diante da
sucumbência recíproca, condenou o réu ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em
10% do valor da causa devidamente corrigido e o autor em 10% do mesmo valor (art. 85, §§ 2.º e
14 do CPC). Por ser o autor beneficiário da Justiça Gratuita, fica ressalvada, em seu favor, a
condição suspensiva da exigibilidade destas verbas, prevista no art. 98, § 3.º, do Código de
Processo Civil.
Sentença não submetida ao reexame necessário.
O autor ofertou apelação, requerendo o reconhecimento da atividade rural exercida de
12/10/1975 a 02/1985 sem o devido registro em CTPS, requer seja reformada a sentença, a fim
de reconhecer os períodos trabalhados na condição de trabalhador rural e somar aos demais já
reconhecidos, a fim de conceder ao Apelante o benefício previdenciário de Aposentadoria por
Tempo de Contribuição.
O INSS também interpôs apelação, alegando impossibilidade do reconhecimento da atividade
especial, uma vez que o PPP indica que a exposição a agentes nocivos ocorreu de modo
intermitente. Aduz ainda que inexistir enquadramento da atividade como insalubre pela categoria
profissional depois de 28/04/1995 e, quando a exposição a ruído, foi indicado nível inferior ao
exigido pelo Decreto nº 3.048/99 que é acima de 85 dB(A), requerendo a reforma da r. sentença e
improcedência do pedido. Prequestiona a matéria para fins recursais, sob pena de violação ao
artigo 57 da Lei nº 8.213/91, bem como sob pena de violação ao artigo 195, §§5º e 6º, da
Constituição Federal.
Com as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5028860-47.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: DIRCEU GOMES SOARES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: JOAO BERTO JUNIOR - SP260165-N, MARINA SVETLIC -
SP267711-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, DIRCEU GOMES SOARES
Advogados do(a) APELADO: MARINA SVETLIC - SP267711-N, JOAO BERTO JUNIOR -
SP260165-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO (RELATOR):
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado mostra-se formalmente regular,
motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação
(art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e
inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o e passo a apreciá-lo nos termos do artigo 1.011
do Código de Processo Civil.
A concessão da aposentadoria por tempo de serviço, hoje tempo de contribuição, está
condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91.
A par do tempo de serviço/contribuição, deve também o segurado comprovar o cumprimento da
carência, nos termos do artigo 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91. Aos já filiados quando do advento
da mencionada lei, vige a tabela de seu artigo 142 (norma de transição), em que, para cada ano
de implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número
de meses de contribuição inferior aos 180 (cento e oitenta) exigidos pela regra permanente do
citado artigo 25, inciso II.
Para aqueles que implementaram os requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de
serviço até a data de publicação da EC nº 20/98 (16/12/1998), fica assegurada a percepção do
benefício, na forma integral ou proporcional, conforme o caso, com base nas regras anteriores ao
referido diploma legal.
Por sua vez, para os segurados já filiados à Previdência Social, mas que não implementaram os
requisitos para a percepção da aposentadoria por tempo de serviço antes da sua entrada em
vigor, a EC nº 20/98 impôs as seguintes condições, em seu artigo 9º, incisos I e II.
Ressalte-se, contudo, que as regras de transição previstas no artigo 9º, incisos I e II, da EC nº
20/98 aplicam-se somente para a aposentadoria proporcional por tempo de serviço, e não para a
integral, uma vez que tais requisitos não foram previstos nas regras permanentes para obtenção
do referido benefício.
Desse modo, caso o segurado complete o tempo suficiente para a percepção da aposentadoria
na forma integral, faz jus ao benefício independentemente de cumprimento do requisito etário e
do período adicional de contribuição, previstos no artigo 9º da EC nº 20/98.
Por sua vez, para aqueles filiados à Previdência Social após a EC nº 20/98, não há mais
possibilidade de percepção da aposentadoria proporcional, mas apenas na forma integral, desde
que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e de
30 (trinta) anos, para as mulheres.
Portanto, atualmente vigoram as seguintes regras para a concessão de aposentadoria por tempo
de serviço/contribuição:
1) Segurados filiados à Previdência Social antes da EC nº 20/98:
a) têm direito à aposentadoria (integral ou proporcional), calculada com base nas regras
anteriores à EC nº 20/98, desde que cumprida a carência do artigo 25 c/c 142 da Lei nº 8.213/91,
e o tempo de serviço/contribuição dos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91 até 16/12/1998;
b) têm direito à aposentadoria proporcional, calculada com base nas regras posteriores à EC nº
20/98, desde que cumprida a carência do artigo 25 c/c 142 da Lei nº 8.213/91, o tempo de
serviço/contribuição dos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91, além dos requisitos adicionais do art.
9º da EC nº 20/98 (idade mínima e período adicional de contribuição de 40%);
c) têm direito à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98,
desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os
homens, e de 30 (trinta) anos, para as mulheres;
2) Segurados filiados à Previdência Social após a EC nº 20/98:
- têm direito somente à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC
nº 20/98, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para
os homens, e 30 (trinta) anos, para as mulheres.
In casu, o autor alega ter exercido atividade rural sem registro em carteira de 12/10/1975 até
02/1985 e, em atividade especial por vários períodos, afirmando ter cumprido os requisitos para
concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER.
Assim, a controvérsia nos presentes autos refere-se ao trabalho rural e especial indicados na
inicial.
Atividade Rural:
Cumpre observar que o artigo 4º da EC nº 20/98 estabelece que o tempo de serviço reconhecido
pela lei vigente é considerado tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no Regime
Geral da Previdência Social.
Por seu turno, o artigo 55 da Lei nº 8.213/91 determina que o cômputo do tempo de serviço para
o fim de obtenção de benefício previdenciário se obtém mediante a comprovação da atividade
laborativa vinculada ao Regime Geral da Previdência Social, na forma estabelecida em
Regulamento.
E, no que se refere ao tempo de serviço de trabalho rural anterior à vigência da Lei nº 8.213/91,
aplica-se a regra inserta no § 2º do artigo 55.
Cabe destacar ainda que o artigo 60, inciso X, do Decreto nº 3.048/99, admite o cômputo do
tempo de serviço rural anterior a novembro de 1991 como tempo de contribuição.
Sobre a demonstração da atividade rural, a jurisprudência dos nossos Tribunais tem assentado a
necessidade de início de prova material, corroborado por prova testemunhal. Nesse passo, em
regra, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou os conviventes,
aparecem qualificados como lavradores; o abandono da ocupação rural, por parte de quem se
irroga tal qualificação profissional, em nada interfere no deferimento da postulação desde que se
anteveja a persistência do mister campesino; mantém a qualidade de segurado o obreiro que
cessa sua atividade laboral, em consequência de moléstia; a prestação de labor urbano,
intercalado com lides rurais, de per si, não desnatura o princípio de prova documental amealhado;
durante o período de graça, a filiação e consequentes direitos, perante a Previdência Social,
ficam preservados.
Ressalte-se ser possível o reconhecimento do tempo de atividade rural prestado, já aos 12 (doze)
anos de idade, consoante precedentes dos Tribunais Superiores: STF, AI 476.950-AgR, Rel. Min.
Gilmar Mendes, DJ 11.3.2005; STJ, AR 3629/RS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, Revis.
Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, julg. 23.06.2008, DJe 09.09.2008.
Para comprovar o trabalho rural o autor juntou aos autos:
- Cópia da certidão de casamento (id 4538911 p. 1) com assento lavrado em 17/12/1985,
indicando a profissão de trabalhador braçal;
- Documentos escolares referentes ao período de estudos do autor de 1972 a 1975 indicando a
profissão de seu genitor, Guilherme Soares, como lavrador e residente na Fazenda Canela (id
4538912 p. 1/453913 p. 1/453914 p. 1/453915 p. 1);
- Cópia da CTPS do autor constando registro de trabalho braçal no período de 28/02/985 a
16/02/1994 junto à Fazenda Moema – estabelecimento agropecuário.
Por sua vez, as testemunhas ouvidas afirmam conhecer o autor (id 4539038 p. 1/6), o depoente
Osmar Cláudio afirma conhecer o autor desde 1970, pois namorava sua esposa á época e ela
residia no mesmo sítio onde o autor morava com os familiares, afirma que o autor trabalhava na
roça junto com os familiares, relata que o autor ficou no sítio por mais de 20 anos e saiu para
trabalhar na usina, afirma ter arrumado o emprego na usina para o autor, relata que o autor
começou a trabalhar na roça com 14 anos e o pai do autor também mexia com roça; a
testemunha Martins de Souza afirma conhecer o autor desde 1975, quando entrou na Fazenda
Canela e o autor já residia no local com a família, o autor ainda era criança, afirma que o autor
saiu primeiro da fazenda e ele ficou, saiu para trabalhar em uma Usina em 1989, não se
recordando a idade que o autor tinha à época, afirma que ele está na usina até hoje.
Importa anotar que não se exige que a prova material se estenda por todo o período de carência,
mas é imprescindível que a prova testemunhal amplie a eficácia probatória dos documentos.
Em apreciação pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do RESP 1.348.633/SP,
decidiu que cabe o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior
àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material,
desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea. (g.n.)
Assim, entendo ficar comprovado nos autos o trabalho rural exercido pelo autor de 11/10/1978
(com 14 anos conf. informado por um dos depoentes) a 27/02/1985 (dia anterior ao registro em
carteira), devendo o período ser computado pelo INSS como tempo de serviço,
independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias, exceto para
efeito de carência, nos termos do artigo 55, §2º, da Lei nº 8.213/91. g.n.
Atividade Especial:
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei nº 3.807/60.
Por sua vez, dispõe o artigo 57 da Lei nº 8.213/91 que a aposentadoria especial será devida, uma
vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições
especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25
(vinte e cinco) anos, conforme dispuser a Lei. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
O critério de especificação da categoria profissional com base na penosidade, insalubridade ou
periculosidade, definidas por Decreto do Poder Executivo, foi mantido até a edição da Lei nº
8.213/91, ou seja, as atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo Poder Executivo
seriam consideradas penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação por
laudo técnico, bastando, assim, a anotação da função em CTPS ou a elaboração do então
denominado informativo SB-40.
Foram baixados pelo Poder Executivo os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, relacionando os
serviços considerados penosos, insalubres ou perigosos.
Embora o artigo 57 da Lei nº 8.213/91 tenha limitado a aposentadoria especial às atividades
profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, o
critério anterior continuou ainda prevalecendo.
De notar que, da edição da Lei nº 3.807/60 até a última CLPS, que antecedeu à Lei nº 8.213/91, o
tempo de serviço especial foi sempre definido com base nas atividades que se enquadrassem no
decreto baixado pelo Poder Executivo como penosas, insalubres ou perigosas,
independentemente de comprovação por laudo técnico.
A própria Lei nº 8.213/91, em suas disposições finais e transitórias, estabeleceu, em seu artigo
152, que a relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física deverá
ser submetida à apreciação do Congresso Nacional, prevalecendo, até então, a lista constante da
legislação em vigor para aposentadoria especial.
Os agentes prejudiciais à saúde foram relacionados no Decreto nº 2.172, de 05/03/1997 (art. 66 e
Anexo IV), mas por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir
da edição da Lei n 9.528, de 10/12/1997.
Destaque-se que o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, em sua redação original, deixou de fazer alusão
a serviços considerados perigosos, insalubres ou penosos, passando a mencionar apenas
atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade
física, sendo que o artigo 58 do mesmo diploma legal, também em sua redação original,
estabelecia que a relação dessas atividades seria objeto de lei específica.
A redação original do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 foi alterada pela Lei nº 9.032/95 sem que até
então tivesse sido editada lei que estabelecesse a relação das atividades profissionais sujeitas a
condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, não havendo dúvidas até
então que continuavam em vigor os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. Nesse sentido, confira-
se a jurisprudência: STJ; Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg.
28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482.
É de se ressaltar, quanto ao nível de ruído, que a jurisprudência já reconheceu que o Decreto nº
53.831/64 e o Decreto nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, ou seja, não houve revogação
daquela legislação por esta, de forma que, constatando-se divergência entre as duas normas,
deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado (STJ - REsp. n. 412351/RS; 5ª Turma; Rel.
Min. Laurita Vaz; julgado em 21.10.2003; DJ 17.11.2003; pág. 355).
O Decreto nº 2.172/97, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a
considerar o nível de ruídos superior a 90 dB(A) como prejudicial à saúde.
Por tais razões, até ser editado o Decreto nº 2.172/97, considerava-se a exposição a ruído
superior a 80 dB(A) como agente nocivo à saúde.
Todavia, com o Decreto nº 4.882, de 18/11/2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos
tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível voltou a ser de 85 dB(A) (art. 2º do Decreto nº
4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Houve, assim, um abrandamento da norma até então vigente, a qual considerava como agente
agressivo à saúde a exposição acima de 90 dB(A), razão pela qual vinha adotando o
entendimento segundo o qual o nível de ruídos superior a 85 dB(A) a partir de 05/03/1997
caracterizava a atividade como especial.
Ocorre que o C. STJ, no julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do artigo
543-C do CPC, decidiu não ser possível a aplicação retroativa do Decreto nº 4.882/03, de modo
que no período de 06/03/1997 a 18/11/2003, em consideração ao princípio tempus regit actum, a
atividade somente será considerada especial quando o ruído for superior a 90 dB(A). (g.n.)
Nesse sentido, segue a ementa do referido julgado:
"ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E
RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA.
PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. TEMPO ESPECIAL. RUÍDO.
LIMITE DE 90DB NO PERÍODO DE 6.3.1997 A 18.11.2003. DECRETO 4.882/2003. LIMITE DE
85 DB. RETROAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE À ÉPOCA DA
PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.
Controvérsia submetida ao rito do art. 543-C do CPC
1. Está pacificado no STJ o entendimento de que a lei que rege o tempo de serviço é aquela
vigente no momento da prestação do labor. Nessa mesma linha: REsp 1.151.363/MG, Rel.
Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011; REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman
Benjamin, Primeira Seção, DJe 19.12.2012, ambos julgados sob o regime do art. 543-C do CPC.
2. O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente
ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto
2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto
4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-
LICC). Precedentes do STJ. Caso concreto
3. Na hipótese dos autos, a redução do tempo de serviço decorrente da supressão do acréscimo
da especialidade do período controvertido não prejudica a concessão da aposentadoria integral.
4. Recurso Especial parcialmente provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e
da Resolução STJ 8/2008." (STJ, REsp 1398260/PR, Primeira Seção, Rel. Min. HERMAN
BENJAMIN, DJe 05/12/2014)
Destaco, ainda, que o uso de equipamento de proteção individual não descaracteriza a natureza
especial da atividade a ser considerada, uma vez que tal tipo de equipamento não elimina os
agentes nocivos à saúde que atingem o segurado em seu ambiente de trabalho, mas somente
reduz seus efeitos. Nesse sentido, precedentes desta E. Corte (AC nº 2000.03.99.031362-0/SP;
1ª Turma; Rel. Des. Fed. André Nekatschalow; v.u; J. 19.08.2002; DJU 18.11) e do Colendo
Superior Tribunal de Justiça: REsp 584.859/ES, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta
Turma, julgado em 18/08/2005, DJ 05/09/2005 p. 458).
Cumpre observar, por fim, que, por ocasião da conversão da Medida Provisória nº 1.663/98 na
Lei nº 9.711/98, permaneceu em vigor o parágrafo 5º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91, razão pela
qual continua sendo plenamente possível a conversão do tempo trabalhado em condições
especiais em tempo de serviço comum relativamente a qualquer período, incluindo o posterior a
28/05/1998. (STJ, AgRg no Resp nº 1.127.806-PR, 5ª Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe
05/04/2010)
No presente caso, da análise do Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP e, de acordo com a
legislação previdenciária vigente à época, o autor comprovou o exercício da atividade especial
nos seguintes períodos:
- 28/02/1985 a 16/02/1994, vez que trabalhou como trabalhador braçal, efetuando corte de cana-
de-açúcar com fação, depois o empilhamento, utilizando ferramentas manuais (enxada/enxadão),
no plantio joga mudas nos sulcos, pica as canas, executa replanta e controla as pragas daninhas,
enquadrado no código 2.2.1, Anexo III do Decreto nº 53.831/64 (id 4539019 p. 87/88);
- 01/06/1994 a 14/12/1994, vez que trabalhou como funileiro, exposto de modo habitual e
permanente a ruído de 80,29 dB(A), enquadrado no código 1.1.6, Anexo III do Decreto nº
53.831/64 (id 4539018 p. 89/90);
- 02/01/1995 a 01/12/1995, vez que trabalhou como funileiro, exposto de modo habitual e
permanente a ruído de 80,29 dB(A), enquadrado no código 1.1.6, Anexo III do Decreto nº
53.831/64 (id 4539018 p. 91/92);
- 21/02/1996 a 21/12/1996, vez que trabalhou como motorista, exposto de modo habitual e
permanente a ruído de 80,29 dB(A), enquadrado no código 1.1.6, Anexo III do Decreto nº
53.831/64 (id 4539018 p. 93/94);
28/01/2005 a 31/03/2015 (DER), vez que trabalhou como mecânico, líder de oficina e mecânico
automotivo, exposto de modo habitual e permanente a agentes químicos (óleos minerais),
enquadrado no código 1.0.17, Anexo III do Decreto nº 3.048/99 (id 4539018 p. 111/113).
Sendo o requerimento do benefício posterior à Lei 8.213/91, deve ser aplicado o fator de
conversão de 1,40, mais favorável ao segurado, como determina o artigo 70 do Decreto nº
3048/99, com a redação dada pelo Decreto nº 4.827/03.
Quanto ao período de 12/05/1997 a 13/12/1997, trabalhou como tratorista, exposto a ruído de
86,82 dB(A), abaixo do exigido pelo Decreto nº 2.172/97, devendo ser computado como tempo de
serviço comum.
Desse modo, computando-se os períodos de atividade rural ora reconhecidos, somados aos
períodos de atividade especial, convertidos em tempo de serviço comum, acrescidos aos demais
períodos incontroversos homologados pelo INSS até a data do requerimento administrativo (DER
31/03/2015 id 4539015 p. 1) perfazem-se 43 (quarenta e três) anos, 02 (dois) meses e 29 (vinte e
nove) dias, conforme planilha anexa, suficientes à concessão da aposentadoria por tempo de
contribuição integral, prevista no artigo 53, inciso II da Lei nº 8.213/91, com renda mensal de
100% (cem por cento) do salário de contribuição, com valor a ser calculado nos termos do artigo
29 da Lei nº 8.213/91, com redação dada pela Lei nº 9.876/99.
Portanto, cumprindo os requisitos legais, faz jus a parte autora à concessão do benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição integral desde a DER em 31/03/2015, momento em que
o INSS ficou ciente da pretensão.
Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos
pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à
época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do RE 870947.
A verba honorária de sucumbência incide no montante de 10% (dez por cento) sobre o valor da
condenação, conforme entendimento desta Turma (artigo 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo
Civil/2015), aplicada a Súmula 111 do C. Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual os
honorários advocatícios, nas ações de cunho previdenciário, não incidem sobre o valor das
prestações vencidas após a data da prolação da sentença.
O INSS é isento de custas processuais, arcando com as demais despesas, inclusive honorários
periciais (Res. CJF nºs. 541 e 558/2007), além de reembolsar as custas recolhidas pela parte
contrária, o que não é o caso dos autos, ante a gratuidade processual concedida (art. 4º, I e
parágrafo único, da Lei nº 9.289/1996, art. 24-A da Lei nº 9.028/1995, n.r., e art. 8º, § 1º, da Lei nº
8.620/1993).
Ante o exposto, negoprovimento à apelação do INSS e dou parcial provimento à apelação da
parte autora para reconhecer a atividade rural exercida de 11/10/1978 a 27/02/1985 e lhe
conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral desde a DER, nos
termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL PARCIALMENTE COMPROVADA. ATIVIDADE
ESPECIAL COMPROVADA. APELAÇÃO DO INSS IMPROVIDA. APELAÇÃO DO AUTOR
PARCIALMENTE PROVIDA. BENEFÍCIO CONCEDIDO. JUROS E CORREÇÃO. HONORÁRIOS.
1. Têm direito somente à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC
nº 20/98, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 anos, para os homens, e
30 anos, para as mulheres.
2. Entendo ficar comprovado nos autos o trabalho rural exercido pelo autor de 11/10/1978 (com
14 anos conf. informado por um dos depoentes) a 27/02/1985, devendo o período ser computado
pelo INSS como tempo de serviço, independentemente do recolhimento das respectivas
contribuições previdenciárias, exceto para efeito de carência, nos termos do artigo 55, §2º, da Lei
nº 8.213/91.
3. Por ocasião da conversão da Medida Provisória nº 1.663/98 na Lei nº 9.711/98, permaneceu
em vigor o parágrafo 5º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91, razão pela qual continua sendo
plenamente possível a conversão do tempo trabalhado em condições especiais em tempo de
serviço comum relativamente a qualquer período, incluindo o posterior a 28/05/1998.
4. Computando-se os períodos de atividade rural ora reconhecidos, somados aos períodos de
atividade especial, convertidos em tempo de serviço comum, acrescidos aos demais períodos
incontroversos homologados pelo INSS até a data do requerimento administrativo (DER
31/03/2015 id 4539015 p. 1) perfazem-se 43 (quarenta e três) anos, 02 (dois) meses e 29 (vinte e
nove) dias, suficientes à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição integral.
5. Cumprindo os requisitos legais, faz jus a parte autora à concessão do benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição integral desde a DER em 31/03/2015, momento em que
o INSS ficou ciente da pretensão.
6. Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos
pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à
época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do RE 870947.
7. A verba honorária de sucumbência incide no montante de 10% (dez por cento) sobre o valor da
condenação, conforme entendimento desta Turma (artigo 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo
Civil/2015), aplicada a Súmula 111 do C. Superior Tribunal de Justiça.
8. Apelação do INSS improvida. Apelação do autor parcialmente provida. Benefício concedido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS e dar parcial provimento à apelação
da parte autora , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
