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DIREITO CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE PRODUTIVIDADE DE IMÓVEL. PRECLUSÃO DA FACULDADE PROCESSUAL DE PRODU...

Data da publicação: 09/08/2024, 03:27:36

DIREITO CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE PRODUTIVIDADE DE IMÓVEL. PRECLUSÃO DA FACULDADE PROCESSUAL DE PRODUZIR PROVA PERICIAL. PROVA TESTEMUNHAL. INIDONEIDADE PARA ALTERAR A CONVICÇÃO DO JUÍZO. QUESTÃO TÉCNICA A DEMANDAR A ANÁLISE DE DADOS PRÓPRIOS. DESNECESSIDADE DE DEPOIMENTOS. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO DO MAGISTRADO. DIREITO DE PROPRIEDADE. CARÁTER NÃO ABSOLUTO. OBRIGATORIEDADE DE OBSERVAR A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE (ART. 5º, XXIII, DA CF/1988). VISTORIA ADMINISTRATIVA DO INCRA QUE APURA ÍNDICES DE PRODUTIVIDADE INSUFICIENTES PARA A MANUTENÇÃO DA PROPRIEDADE RURAL (GUT E GEE). FALHAS METODOLÓGICAS. TRANSIÇÃO DE CULTURAS NÃO COMPUTADAS PARA FINS DE AFERIÇÃO DA PRODUTIVIDADE DO IMÓVEL. LAUDO FIRMADO POR PROFISSIONAL COMPETENTE (ENGENHEIRO AGRÔNOMO) ATESTANDO A INTENÇÃO DE SE IMPLANTAR UMA CULTURA DE CANA-DE-AÇÚCAR. PRECEDENTES DESTA CORTE REGIONAL. CONDENAÇÃO DA AUTARQUIA AGRÁRIA EM VERBA HONORÁRIA. SENTENÇA PROFERIDA SOB A ÉGIDE DO CPC/1973. INCIDÊNCIA DOS PARÂMETROS DA REVOGADA LEGISLAÇÃO PROCESSUAL CIVIL (ART. 20, PARÁGRAFOS 3º E 4º). JULGAMENTO NÃO UNÂNIME. SUBMISSÃO AO ART. 942 DO CPC/2015. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. 1. O presente feito corresponde a um recurso de apelação interposto por sociedade empresária em face de sentença que, nos autos da ação declaratória de produtividade por si ajuizada, julgou improcedente o pedido formulado, resolvendo o mérito com fulcro no então vigente art. 269, inc. I, do CPC/1973. 2. A sociedade empresária alega, em preliminar recursal, o cerceamento de defesa, ao argumento de que tanto a decisão que fixou os honorários periciais quanto a decisão que julgou preclusa a prova pericial foram alvo de agravos de instrumento, sendo certo que nos dois recursos esta Egrégia Corte Regional não teria se manifestado definitivamente acerca da questão. Por isso, entende que o juízo de primeiro grau não poderia ter sentenciado o feito, antecipando-se sobre a pertinência ou impertinência de se produzir a prova pericial, alegando a violação ao duplo grau de jurisdição. 3. Teceu considerações acerca da justa causa para não arcar com os honorários periciais, fixados em montante que, no seu entender, impedem o acesso à justiça, e sobre a necessidade de se produzir prova oral. Para além da preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de defesa, a apelante aduziu questões relacionadas ao mérito da demanda, tais como a classificação fundiária do imóvel como média propriedade produtiva; a inconsistência dos dados constantes do laudo agronômico de fiscalização elaborado pelo INCRA; a existência de efetivo pecuário e produção agrícola em patamares distintos dos apontados pela autarquia; e a modificação da exploração econômica do imóvel que importaria na preservação de sua qualificação como propriedade produtiva, conforme norma contida no art. 6º, §7º, da Lei n. 8.629/1993. 4. É certo que a parte apelante, quando do deferimento da prova pericial na instância de origem, interpôs agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo. Todavia, o pedido de efeito suspensivo foi rejeitado pelo Relator do agravo de instrumento. A decisão de rejeição do pedido de efeito suspensivo ao agravo de instrumento foi proferida em 18.10.2017, quando, então, a parte agravante-autora deveria recolher os honorários periciais que foram arbitrados pelo juízo de primeira instância. O comando judicial, contudo, não foi atendido pela autora, mesmo diante do indeferimento do pedido de efeito suspensivo ao agravo de instrumento interposto, com o que a faculdade processual em referência de fato se tornou preclusa. 5. Ao autor competia comprovar o fato constitutivo de seu direito, nos termos do art. 373, inc. I, do CPC/2015, mediante perícia judicial que demonstrasse a alegada produtividade do imóvel. Para tanto, se fazia necessário recolher os honorários periciais fixados pelo juízo de primeiro grau, mantidos em caráter provisório por esta Corte Regional quando do enfrentamento do pedido de efeito suspensivo no agravo de instrumento. Vale dizer: não havia justificativa para que o autor deixasse de pagar os honorários periciais, quando o pleito pelo seu afastamento havia sido rejeitado também pelo Tribunal ad quem, ainda que em sede de provimento liminar. 6. Note-se, aliás, que a decisão que indeferiu o pedido de efeito suspensivo ao agravo de instrumento interposto já foi confirmada pelo Colegiado desta Egrégia Primeira Turma, em sessão realizada em 20.03.2018, pelo que a alegação de que pendia discussão em grau recursal acerca da temática em apreço cai por terra. De mais a mais, também não merece prosperar o argumento preliminar na linha de que o juízo de primeiro grau não poderia ter indeferido a produção de prova testemunhal. 7. Pela sistemática processual vigente, o juiz está autorizado a julgar a demanda que lhe for apresentada de acordo com o seu livre convencimento, apreciando e valorando as provas produzidas pelas partes, assim como indeferindo as provas impertinentes, desde que motive a decisão proferida, sob pena de nulidade, nos termos dos art. 93, inc. IX, da CF/1988. Cuida-se do que a doutrina e jurisprudência pátrias convencionaram denominar de "princípio do livre convencimento motivado do juiz". Em função do princípio processual do livre convencimento motivado, ao juiz abre-se, inclusive, a possibilidade de julgar a demanda no estado em que ela se encontrar, quando compreender que as provas carreadas são suficientes ao seu pronto desfecho. 8. No caso dos autos, não há que se cogitar de qualquer nulidade, na medida em que o convencimento do magistrado não seria alterado pelo depoimento de testemunhas, mesmo que apresentados em conformidade com as alegações da parte autora. O tema em debate assume natureza eminentemente técnica, não dependendo da oitiva de testemunhas para o seu deslinde. Portanto, andou bem o juízo a quo em sentenciar desde logo a demanda, independentemente da produção de prova testemunhal, em prestígio, aliás, de uma celeridade processual que igualmente se impõe na espécie. 9. A CF/1988 garante o direito à propriedade como uma das prerrogativas fundamentais do indivíduo (artigo 5º, XXII). Como todo direito fundamental, contudo, a propriedade deve ser exercitada de acordo com outros princípios constitucionais, não assumindo, destarte, um caráter absoluto. Nesse sentido, cumpre salientar, desde logo, que o exercício do mencionado direito fundamental está condicionado ao atendimento de sua função social, conforme dispõe o art. 5º, XXIII. 10. Disciplinando o assunto em mais detalhes, o art. 184 da Constituição da República coloca como opção do Poder Público desapropriar imóveis por interesse social para fins de reforma agrária, quando o imóvel rural não estiver cumprindo a sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária (as benfeitorias úteis e necessárias são indenizadas em dinheiro). 11. Uma propriedade rural atende a sua função social quando preenche de forma cumulativa os requisitos a que alude o art. 186 da Constituição da República, ou seja, quando, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, apresenta aproveitamento racional e adequado, conta com a utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente, observa as disposições que regulam as relações de trabalho e é explorada de forma que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores. No plano infraconstitucional, a questão é disciplinada pela Lei n. 8.629/1993. 12. Dita norma legal estatuí que, na aferição da produtividade, o INCRA pode ingressar no imóvel de propriedade particular para levantamento de dados e informações, mediante prévia comunicação escrita ao proprietário, preposto ou seu representante (art. 2º, §2º). Na vistoria administrativa, a autarquia analisa o preenchimento dos requisitos técnicos para concluir pela produtividade ou improdutividade da área particular, perquirindo o GUT e o GEE. De se notar que a legislação de regência impede que o particular introduza mudanças quanto ao domínio, a dimensão e as condições de uso do imóvel dentro do prazo de seis meses após a data da comunicação para levantamento de dados e informações encaminhada pelo INCRA (art. 2º, §4º). Contudo, quando se está diante de comprovada implantação de projeto técnico, o imóvel não poderá ser alvo de desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária, à luz do que preceitua o art. 7º. 13. No caso em apreço, muito embora a produtividade não tenha sido apurada por intermédio da competente prova pericial, diante da inércia da recorrente que tornou preclusa essa faculdade processual, ainda se tem por viável aferir tal dado a partir dos demais documentos que foram carreados aos autos quando da propositura da demanda. 14. A legislação de regência conclama o proprietário a apresentar um projeto técnico para que se possibilite a transição de culturas sem o risco de o imóvel ser considerado improdutivo, consoante se percebe do art. 7º da Lei n. 8.629/1993. Tal projeto técnico deve preencher uma série de exigências colocadas pela norma infraconstitucional, em especial a de ser elaborado e subscrito por profissional legalmente habilitado e identificado, consubstanciando trabalho de envergadura considerável, porquanto especificará como se implantará a nova cultura na propriedade particular. 15. A vistoria administrativa do INCRA foi realizada entre 18.09.2007 a 20.09.2007. De outro giro, o Projeto de Investimento e Exploração Agrícola com a Cultura de Cana-de-Açúcar foi apresentado ao órgão competente em 15.10.2007. Entre a realização da vistoria administrativa sobre o imóvel e a apresentação do projeto técnico, portanto, não chegou a transcorrer nem um mês. Levando em consideração, porém, que o projeto técnico subscrito pelo engenheiro agrônomo é de patente complexidade, demandando a atuação técnica de profissional habilitado para tanto, pode-se presumir, com segurança, que a proprietária do imóvel já estava promovendo a transição de culturas mesmo antes da vistoria administrativa, porque não seria viável cogitar da elaboração e da apresentação ao órgão competente de um projeto técnico de tamanha envergadura no pouquíssimo tempo que se seguiu à realização da vistoria administrativa do INCRA. 16. O próprio INCRA admite, em seu laudo de vistoria, que o proprietário preparava a área para a implantação de cultura de cana-de-açúcar. No entanto, quando da efetiva apuração do GUT e do GEE, o perito administrativo assentou que a propriedade não cumpria a sua função social, deixando de tomar em conta a implantação da cultura de cana-de-açúcar que havia sido noticiada no próprio laudo. O perito da autarquia partiu da premissa de que apenas 25,1024 ha compreendiam área plantada com cana-de-açúcar, mesmo diante da transição que ocorria em grande extensão da propriedade, o que o levou a chegar aos equivocados percentuais de 100,00% para o GUT e somente 71,79% para o GEE. 17. Entretanto, a apuração do GEE não poderia partir apenas da área efetivamente plantada com cana-de-açúcar, quando o próprio laudo de vistoria reconhecia a circunstância de que uma considerável porção do restante da propriedade estava sendo preparada para a implantação da mesma cultura de cana-de-açúcar. Por outras palavras, impunha-se a consideração da área que estava sendo preparada para o plantio de cana-de-açúcar, mormente em razão do projeto técnico que estava em curso (TRF 3ª Região, Quinta Turma – 1ª Seção, Apelação Cível 0000020-63.2009.4.03.6108, Rel. Des. Fed. Antonio Cedenho, julgado em 07/04/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/04/2014 ). 18. Ainda que se conclua pelo descabimento do projeto técnico apresentado pela proprietária ao órgão competente, percebe-se que se o proprietário passa a cumprir a função social no curso do procedimento administrativo ou judicial, comprovando cabalmente o preenchimento dos requisitos de produtividade após a consolidação da transição, tem-se uma situação que equivale à apresentação de projeto técnico, porquanto a finalidade primordial da Lei n. 8.629/1993 é a de desapropriar por interesse social imóveis reconhecidamente improdutivos, e não imóveis que se encontrem em momento de transição para introdução de novas culturas. 19. O provimento ao apelo faz surgir, como consectário lógico, a necessidade de se condenar em verba honorária a parte apelada, cumprindo arbitrar o montante devido a tal título. A sentença apelada foi proferida em 30.03.2010, o que equivale a dizer que a sentença foi prolatada na vigência do CPC/1973, razão pela qual se devem tomar as disposições deste revogado diploma legal no momento de se fixar a verba honorária. O artigo 20, §§ 3º e 4º, do mencionado diploma legal trazia os critérios para se fixar a verba honorária. Pela disposição dos preceptivos indicados, o juiz deveria fixar a verba honorária entre o mínimo de 10% e o máximo de 20% sobre o valor da condenação. O §4º do preceptivo legal, por outro lado, estatuía que nas causas em que a Fazenda Pública restasse vencida, como a presente (estamos diante de uma autarquia), os honorários poderiam ser arbitrados por equidade. 20. Tomando-se em conta os comandos aplicáveis à espécie, tem-se que a fixação da verba honorária em R$ 20.000,00 (vinte mil reais) se revela razoável. A causa revolve tema de notável complexidade, por cuidar de assunto que demanda a exaustiva análise de documentos que foram carreados aos autos e o ingresso em questões técnicas. Além disso, o patrono da parte autora teve de atuar em diferentes ocasiões para que a tese fosse aceita nesta sede recursal, ajuizando a demanda, interpondo agravo de instrumento e movimentando o apelo, o que justifica a fixação da verba honorária neste montante. Ora, um dos critérios colocados pela legislação processual civil para delimitar a quantia devida a título de honorários advocatícios guarda relação com o zelo do causídico, e esse fator justifica, no caso concreto, a fixação dos honorários nesse patamar, na medida em que os patronos adotaram todos os expedientes necessários para que a tese jurídica da autora viesse a ser acolhida em grau recursal. 21. Apelação parcialmente provida para, reformando a sentença recorrida, reconhecer a classificação do imóvel objeto do litígio enquanto uma "média propriedade produtiva", condenando o INCRA em honorários sucumbenciais arbitrados no importe de R$ 20.000,00 (vinte mil reais). (TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0007278-64.2008.4.03.6107, Rel. Desembargador Federal HELIO EGYDIO DE MATOS NOGUEIRA, julgado em 02/09/2021, DJEN DATA: 10/09/2021)



Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP

0007278-64.2008.4.03.6107

Relator(a) para Acórdão

Desembargador Federal WILSON ZAUHY FILHO

Relator(a)

Desembargador Federal HELIO EGYDIO DE MATOS NOGUEIRA

Órgão Julgador
1ª Turma

Data do Julgamento
02/09/2021

Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 10/09/2021

Ementa


E M E N T A

DIREITO CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. AÇÃO
DECLARATÓRIA DE PRODUTIVIDADE DE IMÓVEL. PRECLUSÃO DA FACULDADE
PROCESSUAL DE PRODUZIR PROVA PERICIAL. PROVA TESTEMUNHAL. INIDONEIDADE
PARA ALTERAR A CONVICÇÃO DO JUÍZO. QUESTÃO TÉCNICA A DEMANDAR A ANÁLISE
DE DADOS PRÓPRIOS. DESNECESSIDADE DE DEPOIMENTOS. PRINCÍPIO DO LIVRE
CONVENCIMENTO MOTIVADODO MAGISTRADO. DIREITO DE PROPRIEDADE. CARÁTER
NÃO ABSOLUTO. OBRIGATORIEDADE DE OBSERVAR A FUNÇÃO SOCIAL DA
PROPRIEDADE (ART. 5º, XXIII, DA CF/1988). VISTORIA ADMINISTRATIVA DO INCRA QUE
APURA ÍNDICES DE PRODUTIVIDADE INSUFICIENTES PARA A MANUTENÇÃO DA
PROPRIEDADE RURAL (GUT E GEE). FALHAS METODOLÓGICAS. TRANSIÇÃO DE
CULTURAS NÃO COMPUTADAS PARA FINS DE AFERIÇÃO DA PRODUTIVIDADE DO
IMÓVEL. LAUDO FIRMADO POR PROFISSIONAL COMPETENTE (ENGENHEIRO
AGRÔNOMO) ATESTANDO A INTENÇÃO DE SE IMPLANTAR UMA CULTURA DE CANA-DE-
AÇÚCAR. PRECEDENTES DESTA CORTE REGIONAL. CONDENAÇÃO DA AUTARQUIA
AGRÁRIA EM VERBA HONORÁRIA. SENTENÇA PROFERIDA SOB A ÉGIDE DO CPC/1973.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos

INCIDÊNCIA DOS PARÂMETROS DA REVOGADA LEGISLAÇÃO PROCESSUAL CIVIL (ART.
20, PARÁGRAFOS 3º E 4º). JULGAMENTO NÃO UNÂNIME. SUBMISSÃO AO ART. 942 DO
CPC/2015. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
1. O presente feito corresponde a um recurso de apelação interposto por sociedade empresária
em face de sentença que, nos autos da ação declaratória de produtividade por si ajuizada, julgou
improcedente o pedido formulado, resolvendo o mérito com fulcro no então vigente art. 269, inc. I,
do CPC/1973.
2. A sociedade empresária alega, em preliminar recursal, o cerceamento de defesa, ao
argumento de que tanto a decisão que fixou os honorários periciais quanto a decisão que julgou
preclusa a prova pericial foram alvo de agravos de instrumento, sendo certo que nos dois
recursos esta Egrégia Corte Regional não teria se manifestado definitivamente acerca da
questão. Por isso, entende que o juízo de primeiro grau não poderia ter sentenciado o feito,
antecipando-se sobre a pertinência ou impertinência de se produzir a prova pericial, alegando a
violação ao duplo grau de jurisdição.
3. Teceu considerações acerca da justa causa para não arcar com os honorários periciais, fixados
em montante que, no seu entender, impedem o acesso à justiça, e sobre a necessidade de se
produzir prova oral. Para além da preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de defesa,
a apelante aduziu questões relacionadas ao mérito da demanda, tais como a classificação
fundiária do imóvel como média propriedade produtiva; a inconsistência dos dados constantes do
laudo agronômico de fiscalização elaborado pelo INCRA; a existência de efetivo pecuário e
produção agrícola em patamares distintos dos apontados pela autarquia; e a modificação da
exploração econômica do imóvel que importaria na preservação de sua qualificação como
propriedade produtiva, conforme norma contida no art. 6º, §7º, da Lei n. 8.629/1993.
4. É certo que a parte apelante, quando do deferimento da prova pericial na instância de origem,
interpôs agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo. Todavia, o pedido de efeito
suspensivo foi rejeitado pelo Relator do agravo de instrumento. A decisão de rejeição do pedido
de efeito suspensivo ao agravo de instrumento foi proferida em 18.10.2017, quando, então, a
parte agravante-autora deveria recolher os honorários periciais que foram arbitrados pelo juízo de
primeira instância. O comando judicial, contudo, não foi atendido pela autora, mesmo diante do
indeferimento do pedido de efeito suspensivo ao agravo de instrumento interposto, com o que a
faculdade processual em referência de fato se tornou preclusa.
5. Ao autor competia comprovar o fato constitutivo de seu direito, nos termos do art. 373, inc. I, do
CPC/2015, mediante perícia judicial que demonstrasse a alegada produtividade do imóvel. Para
tanto, se fazia necessário recolher os honorários periciais fixados pelo juízo de primeiro grau,
mantidos em caráter provisório por esta Corte Regional quando do enfrentamento do pedido de
efeito suspensivo no agravo de instrumento. Vale dizer: não havia justificativa para que o autor
deixasse de pagar os honorários periciais, quando o pleito pelo seu afastamento havia sido
rejeitado também pelo Tribunal ad quem, ainda que em sede de provimento liminar.
6. Note-se, aliás, que a decisão que indeferiu o pedido de efeito suspensivo ao agravo de
instrumento interposto já foi confirmada pelo Colegiado desta Egrégia Primeira Turma, em sessão
realizada em 20.03.2018, pelo que a alegação de que pendia discussão em grau recursal acerca
da temática em apreço cai por terra. De mais a mais, também não merece prosperar o argumento
preliminar na linha de que o juízo de primeiro grau não poderia ter indeferido a produção de prova
testemunhal.
7. Pela sistemática processual vigente, o juiz está autorizado a julgar a demanda que lhe for
apresentada de acordo com o seu livre convencimento, apreciando e valorando as provas
produzidas pelas partes, assim como indeferindo as provas impertinentes, desde que motive a
decisão proferida, sob pena de nulidade, nos termos dos art. 93, inc. IX, da CF/1988. Cuida-se do

que a doutrina e jurisprudência pátrias convencionaram denominar de "princípio do livre
convencimento motivado do juiz". Em função do princípio processual do livre convencimento
motivado, ao juiz abre-se, inclusive, a possibilidade de julgar a demanda no estado em que ela se
encontrar, quando compreender que as provas carreadas são suficientes ao seu pronto desfecho.
8. No caso dos autos, não há que se cogitar de qualquer nulidade, na medida em que o
convencimento do magistrado não seria alterado pelo depoimento de testemunhas, mesmo que
apresentados em conformidade com as alegações da parte autora. O tema em debate assume
natureza eminentemente técnica, não dependendo da oitiva de testemunhas para o seu deslinde.
Portanto, andou bem o juízo a quo em sentenciar desde logo a demanda, independentemente da
produção de prova testemunhal, em prestígio, aliás, de uma celeridade processual que
igualmente se impõe na espécie.
9. A CF/1988 garante o direito à propriedade como uma das prerrogativas fundamentais do
indivíduo (artigo 5º, XXII). Como todo direito fundamental, contudo, a propriedade deve ser
exercitada de acordo com outros princípios constitucionais, não assumindo, destarte, um caráter
absoluto. Nesse sentido, cumpre salientar, desde logo, que o exercício do mencionado direito
fundamental está condicionado ao atendimento de sua função social, conforme dispõe o art. 5º,
XXIII.
10. Disciplinando o assunto em mais detalhes, o art. 184 da Constituição da República coloca
como opção do Poder Público desapropriar imóveis por interesse social para fins de reforma
agrária, quando o imóvel rural não estiver cumprindo a sua função social, mediante prévia e justa
indenização em títulos da dívida agrária (as benfeitorias úteis e necessárias são indenizadas em
dinheiro).
11. Uma propriedade rural atende a sua função social quando preenche de forma cumulativa os
requisitos a que alude o art. 186 da Constituição da República, ou seja, quando, segundo critérios
e graus de exigência estabelecidos em lei, apresenta aproveitamento racional e adequado, conta
com a utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente,
observa as disposições que regulam as relações de trabalho e é explorada de forma que favoreça
o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores. No plano infraconstitucional, a questão é
disciplinada pela Lei n. 8.629/1993.
12. Dita norma legal estatuí que, na aferição da produtividade, o INCRA pode ingressar no imóvel
de propriedade particular para levantamento de dados e informações, mediante prévia
comunicação escrita ao proprietário, preposto ou seu representante (art. 2º, §2º). Na vistoria
administrativa, a autarquia analisa o preenchimento dos requisitos técnicos para concluir pela
produtividade ou improdutividade da área particular, perquirindo o GUT e o GEE. De se notar que
a legislação de regência impede que o particular introduza mudanças quanto ao domínio, a
dimensão e as condições de uso do imóvel dentro do prazo de seis meses após a data da
comunicação para levantamento de dados e informações encaminhada pelo INCRA (art. 2º, §4º).
Contudo, quando se está diante de comprovada implantação de projeto técnico, o imóvel não
poderá ser alvo de desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária, à luz do que
preceitua o art. 7º.
13. No caso em apreço, muito embora a produtividade não tenha sido apurada por intermédio da
competente prova pericial, diante da inércia da recorrente que tornou preclusa essa faculdade
processual, ainda se tem por viável aferir tal dado a partir dos demais documentos que foram
carreados aos autos quando da propositura da demanda.
14. A legislação de regência conclama o proprietário a apresentar um projeto técnico para que se
possibilite a transição de culturas sem o risco de o imóvel ser considerado improdutivo, consoante
se percebe do art. 7º da Lei n. 8.629/1993. Tal projeto técnico deve preencher uma série de
exigências colocadas pela norma infraconstitucional, em especial a de ser elaborado e subscrito

por profissional legalmente habilitado e identificado, consubstanciando trabalho de envergadura
considerável, porquanto especificará como se implantará a nova cultura na propriedade particular.
15. A vistoria administrativa do INCRA foi realizada entre 18.09.2007 a 20.09.2007. De outro giro,
o Projeto de Investimento e Exploração Agrícola com a Cultura de Cana-de-Açúcar foi
apresentado ao órgão competente em 15.10.2007. Entre a realização da vistoria administrativa
sobre o imóvel e a apresentação do projeto técnico, portanto, não chegou a transcorrer nem um
mês. Levando em consideração, porém, que o projeto técnico subscrito pelo engenheiro
agrônomo é de patente complexidade, demandando a atuação técnica de profissional habilitado
para tanto, pode-se presumir, com segurança, que a proprietária do imóvel já estava promovendo
a transição de culturas mesmo antes da vistoria administrativa, porque não seria viável cogitar da
elaboração e da apresentação ao órgão competente de um projeto técnico de tamanha
envergadura no pouquíssimo tempo que se seguiu à realização da vistoria administrativa do
INCRA.
16. O próprio INCRA admite, em seu laudo de vistoria, que o proprietário preparava a área para a
implantação de cultura de cana-de-açúcar. No entanto, quando da efetiva apuração do GUT e do
GEE, o perito administrativo assentou que a propriedade não cumpria a sua função social,
deixando de tomar em conta a implantação da cultura de cana-de-açúcar que havia sido noticiada
no próprio laudo. O perito da autarquia partiu da premissa de que apenas 25,1024 ha
compreendiam área plantada com cana-de-açúcar, mesmo diante da transição que ocorria em
grande extensão da propriedade, o que o levou a chegar aos equivocados percentuais de
100,00% para o GUT e somente 71,79% para o GEE.
17. Entretanto, a apuração do GEE não poderia partir apenas da área efetivamente plantada com
cana-de-açúcar, quando o próprio laudo de vistoria reconhecia a circunstância de que uma
considerável porção do restante da propriedade estava sendo preparada para a implantação da
mesma cultura de cana-de-açúcar. Por outras palavras, impunha-se a consideração da área que
estava sendo preparada para o plantio de cana-de-açúcar, mormente em razão do projeto técnico
que estava em curso (TRF 3ª Região, Quinta Turma – 1ª Seção, Apelação Cível 0000020-
63.2009.4.03.6108, Rel. Des. Fed. Antonio Cedenho, julgado em 07/04/2014, e-DJF3 Judicial 1
DATA:28/04/2014 ).
18. Ainda que se conclua pelo descabimento do projeto técnico apresentado pela proprietária ao
órgão competente, percebe-se que se o proprietário passa a cumprir a função social no curso do
procedimento administrativo ou judicial, comprovando cabalmente o preenchimento dos requisitos
de produtividade após a consolidação da transição, tem-se uma situação que equivale à
apresentação de projeto técnico, porquanto a finalidade primordial da Lei n. 8.629/1993 é a de
desapropriar por interesse social imóveis reconhecidamente improdutivos, e não imóveis que se
encontrem em momento de transição para introdução de novas culturas.
19. O provimento ao apelo faz surgir, como consectário lógico, a necessidade de se condenar em
verba honorária a parte apelada, cumprindo arbitrar o montante devido a tal título. A sentença
apelada foi proferida em 30.03.2010, o que equivale a dizer que a sentença foi prolatada na
vigência do CPC/1973, razão pela qual se devem tomar as disposições deste revogado diploma
legal no momento de se fixar a verba honorária. O artigo 20, §§ 3º e 4º, do mencionado diploma
legal trazia os critérios para se fixar a verba honorária. Pela disposição dos preceptivos indicados,
o juiz deveria fixar a verba honorária entre o mínimo de 10% e o máximo de 20% sobre o valor da
condenação. O §4º do preceptivo legal, por outro lado, estatuía que nas causas em que a
Fazenda Pública restasse vencida, como a presente (estamos diante de uma autarquia), os
honorários poderiam ser arbitrados por equidade.
20. Tomando-se em conta os comandos aplicáveis à espécie, tem-se que a fixação da verba
honorária em R$ 20.000,00 (vinte mil reais) se revela razoável. A causa revolve tema de notável

complexidade, por cuidar de assunto que demanda a exaustiva análise de documentos que foram
carreados aos autos e o ingresso em questões técnicas. Além disso, o patrono da parte autora
teve de atuar em diferentes ocasiões para que a tese fosse aceita nesta sede recursal, ajuizando
a demanda, interpondo agravo de instrumento e movimentando o apelo, o que justifica a fixação
da verba honorária neste montante. Ora, um dos critérios colocados pela legislação processual
civil para delimitar a quantia devida a título de honorários advocatícios guarda relação com o zelo
do causídico, e esse fator justifica, no caso concreto, a fixação dos honorários nesse patamar, na
medida em que os patronos adotaram todos os expedientes necessários para que a tese jurídica
da autora viesse a ser acolhida em grau recursal.
21. Apelação parcialmente provida para, reformando a sentença recorrida, reconhecer a
classificação do imóvel objeto do litígio enquanto uma "média propriedade produtiva",
condenando o INCRA em honorários sucumbenciais arbitrados no importe de R$ 20.000,00 (vinte
mil reais).

Acórdao

PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0007278-64.2008.4.03.6107
RELATOR:Gab. 03 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA
APELANTE: MCL EMPREENDIMENTOS E NEGOCIOS LTDA.

Advogado do(a) APELANTE: GUSTAVO BARBAROTO PARO - SP121227-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA INCRA,
INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA - INCRA

Advogados do(a) APELADO: PAULO SERGIO MIGUEZ URBANO - SP28979, RODRIGO
NASCIMENTO FIOREZI - SP201495

OUTROS PARTICIPANTES:






APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0007278-64.2008.4.03.6107
RELATOR:Gab. 03 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA
APELANTE: MCL EMPREENDIMENTOS E NEGOCIOS LTDA.
Advogado do(a) APELANTE: GUSTAVO BARBAROTO PARO - SP121227
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA INCRA
Advogados do(a) APELADO: PAULO SERGIO MIGUEZ URBANO - SP28979, RODRIGO

NASCIMENTO FIOREZI - SP201495
OUTROS PARTICIPANTES:





R E L A T Ó R I O

O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por MCL Empreendimentos e Negócios Ltda. contra a sentença
que, nos autos da ação declaratória ajuizada contra o Instituto Nacional de Colonização e
Reforma Agrária - INCRA, objetivando a declaração de que o imóvel denominado "Fazenda
Santa Terezinha", situado no Município de Nova Independência, é produtivo, cumpre a sua
função social e atinge os índices de produtividade exigidos pela Lei nº 8.629/1993, sendo
insuscetível de desapropriação, julgou improcedente o pedido, extinguiu o processo nos autos
do art. 269, I, do CPC/73 e condenou a parte autora ao pagamento de custas processuais e de
honorários advocatícios, fixados em 10% do valor dado à causa.
Em suas razões recursais, a autora suscita a ocorrência de cerceamento de defesa, pois foram
interpostos os agravos de instrumentos nºs 2009.03.00.037668-2 e 2009.03.00.044832-2 contra
as decisões que fixaram os honorários periciais em valor considerado exorbitante pela autora
(fl. 851) e que deu por preclusa a prova pericial e indeferiu a prova oral (fl. 878), de modo que a
Magistrada não poderia ter proferido sentença antes do julgamento desses agravos. Também
sustenta que a prova pericial não restou preclusa, pois os honorários foram arbitrados em valor
excessivamente elevado e levaram à violação do princípio da inafastabilidade da jurisdição.
Alega, ainda, que o indeferimento da prova pericial também ensejou cerceamento de defesa,
pois o art. 400 CPC estabelece que a prova testemunhal será sempre aceita, não sendo
necessária a sua prévia justificação pelas partes. Conclui pela nulidade da sentença.
Subsidiariamente, quanto ao mérito, sustenta que o imóvel é produtivo e deve ser classificado
como "média propriedade produtiva", pois:
(1) há inconsistências nos dados constantes no laudo agronômico de fiscalização, elaborado
pelo INCRA, como, por exemplo, as metragens das áreas de plantação - primeiro indica a área
de 73 hectares ocupados com cana-de-açúcar e depois indica a área de 25.1024 hectares e,
ainda, 121,4506 hectares - e de preservação ambiental - são indicadas três metragens distintas:
130,3106, 9,1793 e 9,1422 hectares. Defende que, diante dessas inconsistências, é
imprescindível a realização da prova pericial;
(2) o laudo omite a existência de equinos na propriedade e reduz substancialmente o volume do
efetivo pecuário existente na propriedade durante o período da apuração. Defende que as notas
fiscais de fls. 393/401 comprovam que: (2.1) no período de outubro de 2006 a setembro de
2007, o número total de cabeças de gado e equinos foi de 480,33; e (2.2) em 13/04/2006 e
18/04/2006, ingressaram na propriedade 607 cabeças de novilhos e bois, que permaneceram
no imóvel até 26/06/2007. Os laudos de vacinação indicam que, em 21/11/2006, foram

vacinadas 686 cabeças de gado e, em maio de 2007, foram vacinadas 604 cabeças de gado.
Conclui que, embora o laudo tenha considerado apenas 389,5 unidades animais na
propriedade, há prova de que durante o período de avaliação havia 480,33 unidades;
(3) o laudo não considerou a produção de milho, comprovada pelas notas fiscais de fls.
438/441. Impugna o fundamento do laudo para a desconsideração, acolhido pela sentença, de
que não é possível a colheita de milho no mês de dezembro, sob o argumento de que a
indicação do mês de dezembro refere-se à data de venda do milho, e não da colheita. Afirma,
ainda, que o milho só pode ter sido produzido nos meses anteriores do mesmo anos, caso
contrário teria se deteriorado;
(4) a autora, após adquirir o imóvel, alterou a exploração econômica do imóvel, de atividade
pecuária para atividade agrícola, sobretudo de cana-de-açúcar, e o próprio laudo constatou que
parte da área ocupada por pastagens estava sendo preparada para o plantio da cana. Defende
que não poderia ter sido desprezada a área que já estava sendo preparada para o plantio da
cana, o que afrontou o art. 2º, §4º, da Lei nº 8.629/93. Também alega que a desconsideração
dessa área violou o art. 6º, §7º, da mesma lei, que assegura a preservação da qualificação de
propriedade produtiva ao imóvel que, por conta da renovação de sua estrutura de exploração,
deixe de apresentar momentaneamente os índices de eficiência exigidos.
Assim, requer a reforma da sentença para julgar procedente o pedido.
Ainda, subsidiariamente, pugna pela redução do valor arbitrado para os honorários advocatícios
e sua fixação por equidade em razão do baixo trabalho exigido dos advogados.
Com as contrarrazões do INCRA, subiram os autos a este E. Tribunal.
O Ministério Público Federal em 2º grau opinou pelo desprovimento do apelo.
É o relatório.









VOTO VISTA

O DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY:

Pedi vista dos autos para melhor compreensão das questões fáticas e jurídicas debatidas na
lide.

Cuida-se de recurso de apelação interposto por MLC EMPREENDIMENTOS E NEGÓCIOS
LTDA. em face de sentença que, nos autos da ação declaratória de produtividade por si
ajuizada, julgou improcedente o pedido formulado, resolvendo o mérito, com fulcro no então

vigente art. 269, inc. I, do Código de Processo Civil de 1973.

Em seu recurso de apelação, a proprietária do imóvel alega, em preliminar recursal, o
cerceamento de defesa, ao argumento de que tanto a decisão que fixou os honorários periciais
em R$ 28.606,00 quanto a decisão que julgou preclusa a prova pericial foram alvo de agravos
de instrumento, autuados sob o n. 2009.03.00.037668-2 e n. 2009.03.00.044832-2, sendo certo
que nos dois recursos esta Egrégia Corte Regional não teria se manifestado definitivamente
acerca da questão. Por isso, entende que o juízo de primeiro grau não poderia ter sentenciado
o feito, antecipando-se sobre a pertinência ou impertinência de se produzir a prova pericial,
alegando a violação ao duplo grau de jurisdição.

Teceu considerações acerca da justa causa para não arcar com os honorários periciais, fixados
em montante que, no seu entender, impedem o acesso à justiça, e sobre a necessidade de se
produzir prova oral. Para além da preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de
defesa, a apelante aduziu questões relacionadas ao mérito da demanda, tais como a
classificação fundiária do imóvel como média propriedade produtiva; a inconsistência dos dados
constantes do laudo agronômico de fiscalização elaborado pelo Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária - INCRA; a existência de efetivo pecuário e produção agrícola
em patamares distintos dos apontados pela autarquia; e a modificação da exploração
econômica do imóvel que importaria na preservação de sua qualificação como propriedade
produtiva, conforme norma contida no art. 6º, §7º, da Lei n. 8.629/1993.

Nesta sede recursal, o Relator do apelo, o eminente Desembargador Federal Hélio Nogueira,
negou provimento ao recurso, afastando tanto a preliminar de nulidade da sentença em virtude
do alegado cerceamento de defesa quanto as razões de mérito invocadas pela apelante. No
que diz com a rejeição da preliminar recursal, acompanho o eminente Relator, pelos
fundamentos que passo a expor na sequência.

Como se averbou acima, a apelante pontifica que a sentença seria nula porque, em suma, a
questão relativa à produção da prova pericial ainda não havia sido enfrentada com definitividade
por esta Egrégia Corte Regional no bojo dos agravos de instrumento n. 2009.03.00.037668-2 e
n. 2009.03.00.044832-2. É certo que a parte apelante, quando do deferimento da prova pericial
na instância de origem, interpôs agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo.
Todavia, o pedido de efeito suspensivo foi rejeitado pelo Relator do agravo de instrumento, o
Des. Fed. Hélio Nogueira, conforme fls. 215/217 dos autos apensos.

A decisão de rejeição do pedido de efeito suspensivo ao agravo de instrumento n.
2009.03.00.037668-2 foi proferida em 18.10.2017, quando, então, a parte agravante-autora
deveria recolher os honorários periciais que foram arbitrados pelo juízo de primeira instância. O
comando judicial, contudo, não foi atendido pela autora, mesmo diante do indeferimento do
pedido de efeito suspensivo ao agravo de instrumento interposto, com o que a faculdade
processual em referência de fato se tornou preclusa.


Ao autor competia comprovar o fato constitutivo de seu direito, nos termos do art. 373, inc. I, do
Código de Processo Civil de 2015, mediante perícia judicial que demonstrasse a alegada
produtividade do imóvel. Para tanto, se fazia necessário recolher os honorários periciais fixados
pelo juízo de primeiro grau, mantidos em caráter provisório por esta Corte Regional quando do
enfrentamento do pedido de efeito suspensivo no agravo de instrumento. Vale dizer: não havia
justificativa para que o autor deixasse de pagar os honorários periciais, quando o pleito pelo seu
afastamento havia sido rejeitado também pelo Tribunal ad quem, ainda que em sede de
provimento liminar.

Note-se, aliás, que a decisão que indeferiu o pedido de efeito suspensivo ao agravo de
instrumento interposto já foi confirmada pelo Colegiado desta Egrégia Primeira Turma, em
sessão realizada em 20.03.2018, conforme fls. 222/227 dos autos apensos, pelo que a
alegação de que pendia discussão em grau recursal acerca da temática em apreço cai por
terra. De mais a mais, também não merece prosperar o argumento preliminar na linha de que o
juízo de primeiro grau não poderia ter indeferido a produção de prova testemunhal.

Pela sistemática processual vigente, o juiz está autorizado a julgar a demanda que lhe for
apresentada de acordo com o seu livre convencimento, apreciando e valorando as provas
produzidas pelas partes, assim como indeferindo as provas impertinentes, desde que motive a
decisão proferida, sob pena de nulidade, nos termos dos art. 93, inc. IX, da Constituição Federal
de 1988. Cuida-se do que a doutrina e jurisprudência pátrias convencionaram denominar de
"princípio do livre convencimento motivado do juiz".

Nesse sentido, cumpre destacar que o princípio em referência "regula a apreciação e avaliação
das provas existentes nos autos, indicando que o juiz deve formar livremente sua convicção.
Situa-se entre o sistema da prova legal e o julgamento 'secundum conscientiam'" (CINTRA,
Antonio Carlos de Araújo. GRINOVER. Ada Pelegrini. DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria
Geral do Processo. 24 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2008). Em função do princípio
processual do livre convencimento motivado, ao juiz abre-se, inclusive, a possibilidade de julgar
a demanda no estado em que ela se encontrar, quando compreender que as provas carreadas
são suficientes ao seu pronto desfecho.

No caso dos autos, não há que se cogitar de qualquer nulidade, na medida em que o
convencimento do magistrado não seria alterado pelo depoimento de testemunhas, mesmo que
apresentados em conformidade com as alegações da parte autora. O tema em debate assume
natureza eminentemente técnica, não dependendo da oitiva de testemunhas para o seu
deslinde. Portanto, andou bem o juízo a quo em sentenciar desde logo a demanda,
independentemente da produção de prova testemunhal, em prestígio, aliás, de uma celeridade
processual que igualmente se impõe na espécie.

Superadas as preliminares recursais, passo ao exame do mérito recursal. No que refere a esta

parte do apelo, peço vênias ao Relator para dele divergir.

A Constituição Federal de 1988 garante o direito à propriedade como uma das prerrogativas
fundamentais do indivíduo (artigo 5º, XXII). Como todo direito fundamental, contudo, a
propriedade deve ser exercitada de acordo com outros princípios constitucionais, não
assumindo, destarte, um caráter absoluto. Nesse sentido, cumpre salientar, desde logo, que o
exercício do mencionado direito fundamental está condicionado ao atendimento de sua função
social, conforme dispõe o art. 5º, XXIII.

Disciplinando o assunto em mais detalhes, o art. 184 da Constituição da República coloca como
opção do Poder Público desapropriar imóveis por interesse social para fins de reforma agrária,
quando o imóvel rural não estiver cumprindo a sua função social, mediante prévia e justa
indenização em títulos da dívida agrária (as benfeitorias úteis e necessárias são indenizadas
em dinheiro).

Uma propriedade rural atende a sua função social quando preenche de forma cumulativa os
requisitos a que alude o art. 186 da Constituição da República, ou seja, quando, segundo
critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, apresenta aproveitamento racional e
adequado, conta com a utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do
meio ambiente, observa as disposições que regulam as relações de trabalho e é explorada de
forma que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores. No plano
infraconstitucional, a questão é disciplinada pela Lei n. 8.629/1993.

Dita norma legal estatuí que, na aferição da produtividade, o INCRA pode ingressar no imóvel
de propriedade particular para levantamento de dados e informações, mediante prévia
comunicação escrita ao proprietário, preposto ou seu representante (art. 2º, §2º). Na vistoria
administrativa, a autarquia analisa o preenchimento dos requisitos técnicos para concluir pela
produtividade ou improdutividade da área particular, perquirindo o Grau de Utilização da Terra
(GUT) e o Grau de Eficiência na Exploração (GEE).

De se notar que a legislação de regência impede que o particular introduza mudanças quanto
ao domínio, a dimensão e as condições de uso do imóvel dentro do prazo de seis meses após a
data da comunicação para levantamento de dados e informações encaminhada pelo INCRA
(art. 2º, §4º). Contudo, quando se está diante de comprovada implantação de projeto técnico, o
imóvel não poderá ser alvo de desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária,
à luz do que preceitua o art. 7º.

Pois bem.

No caso em apreço, muito embora a produtividade não tenha sido apurada por intermédio da
competente prova pericial, diante da inércia da recorrente que tornou preclusa essa faculdade
processual, ainda se tem por viável aferir tal dado a partir dos demais documentos que foram

carreados aos autos quando da propositura da demanda. A propósito, constato que o eminente
Relator, a despeito de não contar com o auxílio de uma perícia judicial, efetivamente ingressou
na análise relativa à produtividade do imóvel.

Consignou o eminente Relator que não seria possível acolher a alegação da parte apelante de
que o solo estava em fase de preparação para implantação do cultivo de cana-de-açúcar, com a
retirada de gado. No entendimento de Sua Excelência, o argumento dependeria de
comprovação mediante projeto técnico devidamente aprovado pelo órgão federal competente
no mínimo seis meses antes da comunicação relativa à vistoria de fiscalização agronômica.

Partindo da premissa de que o projeto técnico não foi apresentado pela proprietária do imóvel
no prazo especificado pela legislação de regência (art. 2º, §4º, da Lei n. 8.629/1993), o
eminente Relator concluiu pela inviabilidade de se cogitar da alegada transição (substituição do
gado existente para implantação de cultura de cana-de-açúcar) e, por via de consequência,
entendeu pela improdutividade do imóvel. Eis os argumentos esposados pelo eminente Relator:

"A autora alega que estaria em fase de preparação do solo para implantação do cultivo da
cultura de cana de açúcar, havendo, em tal período, sido realizada a retirada do gado para
introdução da nova lavoura.
Efetivamente, dispõe o § 7º do art. 6º da Lei 8.629/93 que não perderá a qualificação de
propriedade produtiva o imóvel que, por razões de "renovação de pastagens tecnicamente
conduzida, devidamente comprovados pelo órgão competente, deixar de apresentar, no ano
respectivo, os graus de eficiência na exploração, exigidos para a espécie". Nesse sentido,
estabelece o inciso IV do art. 7º do mesmo diploma legal, não ser passível de desapropriação,
para fins de reforma agrária, o imóvel que comprove estar sendo objeto de implantação de
projeto técnico, devendo tal projeto, para tanto, ser aprovado pelo órgão federal competente, na
forma estabelecida em regulamento, no mínimo seis meses antes da comunicação relativa à
vistoria de fiscalização agronômica.
Depreende-se, portanto, que a existência de processo de renovação de pastagens/cultura
somente possui o condão de impedir a classificação do imóvel rural como propriedade
improdutiva se apresentada a comprovação de projeto técnico que atenda aos estritos
requisitos legais.
Nesse sentido é o entendimento do Supremo Tribunal Federal:
"CONSITUCIONAL. AGRÁRIO. DESAPROPRIAÇÃO. REFORMA AGRÁRIA. MANDADO DE
SEGURANÇA. RELATÓRIO AGRONÔMICO DE FISCALIZAÇÃO. ATRASO. AUSÊNCIA DE
NULIDADE. RECURSO SEM EFEITO SUSPENSIVO. POSSIBILIDADE DE EDIÇÃO DO
DECRETO EXPROPRIATÓRIO. OPORTUNIDADE E ALCANCE. ART. 61 DA LEI N. 9.784/99.
ART. 184, § 2º, DA CB/88. RENOVAÇÃO DE PASTAGENS. IMPEDIMENTO À
CLASSIFICAÇÃO DO IMÓVEL COMO PROPRIEDADE IMPRODUTIVA. ART. 6º, § 3º, V E §
7º, DA LEI N. 8.629/93. NECESSIDADE DE PROJETO TECNICAMENTE CONDUZIDO. ART.
7º DA LEI N. 8.629/93. AFERIÇÃO DO EFETIVO PECUÁRIO POR MEIO DE FICHAS DE
VACINAÇÃO. POSSIBILIDADE. PRODUTIVIDADE DO IMÓVEL. DILAÇÃO PROBATÓRIA.

APRECIAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A entrega
extemporânea do laudo agronômico de fiscalização não implica a nulidade do documento,
ensejando apenas a instauração de procedimento disciplinar para averiguar eventuais faltas dos
servidores responsáveis pelo atraso. 2. A ausência de efeito suspensivo no recurso
administrativo interposto contra o laudo agronômico de fiscalização não impede a edição do
decreto do Presidente da República, que apenas declara o imóvel de interesse social para fins
de reforma agrária, mera condição para a propositura da ação de desapropriação [art. 184, § 2º,
da CB/88]. A perda do direito de propriedade ocorrerá somente ao cabo da ação de
desapropriação. Precedente [MS n. 24.163, Relator o Ministro MARCO AURÉLIO, DJ
19.09.2003 e MS n. 24.484, Relator o Ministro EROS GRAU, DJ 02.06.2006]. 3. O processo de
renovação de pastagens que impede a classificação do imóvel rural como propriedade
improdutiva --- art. 6º, §§ 3º e 7º, da Lei n. 8.629/93 --- reclama a existência de projeto técnico,
que deve atender aos requisitos previstos no art. 7º daquele texto normativo. 4. Não há
ilegalidade na aferição do efetivo pecuário pelo uso exclusivo das Fichas de Vacinação - FV
caso haja irregularidades nas notas fiscais e Demonstrativos de Movimentação de Gado - DMG,
uma vez que os regulamentos expedidos pelo INCRA prevêem a utilização de ambos os
registros. 5. A impossibilidade de dilação probatória em mandado de segurança torna
insuscetível de apreciação a questão relativa à produtividade do imóvel rural. Precedente [MS n.
24.518, Relator o Ministro CARLOS VELLOSO, DJ 30.04.2004 e MS n. 25.351, Relator o
Ministro EROS GRAU, DJ 16.09.2005]. 6. Segurança denegada, prejudicado o agravo
regimental interposto".
(STF, MS nº 25.534/DF, Rel. Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, DJ 10/11/06) - g.n.
Ocorre que, no caso em exame, a parte autora, inobstante busque sustentar a qualificação do
imóvel enquanto propriedade produtiva, por meio da alegação de implantação da cultura de
cana de açúcar durante o período da vistoria administrativa da Autarquia, deixou de apresentar
o projeto técnico dentro do prazo da legislação.
Consoante se depreende dos autos, a autora somente protocolou o projeto técnico de
implantação do cultivo da cultura de cana de açúcar, assinado pela Engenheiro Agrônomo
Mario Roberto Rodrigues Marinha, em 15/10/2007 (fls. 548/561), isto é, após o encerramento da
fiscalizou que ocorreu entre 18/09/2007 e 20/09/2007.
Isso porque, como já dito, o art. 7º da Lei nº 8.629/93 estabelece requisitos para a implantação
de mudança de cultura e, dentre os requisitos, consta a aprovação do projeto técnico de
mudança de cultura pelo órgão federal competente, na forma estabelecida em regulamento, no
mínimo seis meses antes da comunicação de que tratam os §§ 2º e 3º do art. 2º. In verbis:
Art. 2º A propriedade rural que não cumprir a função social prevista no art. 9º é passível de
desapropriação, nos termos desta lei, respeitados os dispositivos constitucionais.
(Regulamento)
(...)
§2º Para os fins deste artigo, fica a União, através do órgão federal competente, autorizada a
ingressar no imóvel de propriedade particular para levantamento de dados e informações,
mediante prévia comunicação escrita ao proprietário, preposto ou seu representante. (Redação
dada pela Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

§3º Na ausência do proprietário, do preposto ou do representante, a comunicação será feita
mediante edital, a ser publicado, por três vezes consecutivas, em jornal de grande circulação na
capital do Estado de localização do imóvel. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.183-56, de
2001)
§4º Não será considerada, para os fins desta Lei, qualquer modificação, quanto ao domínio, à
dimensão e às condições de uso do imóvel, introduzida ou ocorrida até seis meses após a data
da comunicação para levantamento de dados e informações de que tratam os §§ 2º e 3º.
(Incluído pela Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)
(...)
Art. 7º Não será passível de desapropriação, para fins de reforma agrária, o imóvel que
comprove estar sendo objeto de implantação de projeto técnico que atenda aos seguintes
requisitos:
I - seja elaborado por profissional legalmente habilitado e identificado;
II - esteja cumprindo o cronograma físico-financeiro originalmente previsto, não admitidas
prorrogações dos prazos;
III - preveja que, no mínimo, 80% (oitenta por cento) da área total aproveitável do imóvel seja
efetivamente utilizada em, no máximo, 3 (três) anos para as culturas anuais e 5 (cinco) anos
para as culturas permanentes;
IV - haja sido registrado no órgão competente no mínimo 6 (seis) meses antes do decreto
declaratório de interesse social
IV - haja sido aprovado pelo órgão federal competente, na forma estabelecida em regulamento,
no mínimo seis meses antes da comunicação de que tratam os §§ 2º e 3º do art. 2o. (Redação
dada pela Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)
Parágrafo único. Os prazos previstos no inciso III deste artigo poderão ser prorrogados em até
50% (cinqüenta por cento), desde que o projeto receba, anualmente, a aprovação do órgão
competente para fiscalização e tenha sua implantação iniciada no prazo de 6 (seis) meses,
contado de sua aprovação.
Ademais, consoante exposto, os proprietários de imóvel rural devem aferir a produtividade do
próprio imóvel, incumbindo-lhes manter regularizada a documentação da propriedade e das
explorações nela realizadas, de modo a prevenir os riscos de uma desapropriação por interesse
social. Por conseguinte, a mera alegação de que o imóvel encontrava-se em processo de
implantação de nova cultura, desprovida da prova documental pertinente, não constitui
fundamento hábil a afastar, por si, a conclusão acerca do caráter improdutivo da propriedade,
fundamentadamente exarada pela autoridade competente no âmbito do ato administrativo de
vistoria."

É neste preciso ponto que divirjo do eminente Relator. Por certo que a legislação de regência
conclama o proprietário a apresentar um projeto técnico para que se possibilite a transição de
culturas sem o risco de o imóvel ser considerado improdutivo, consoante se percebe do art. 7º
da Lei n. 8.629/1993. Tal projeto técnico deve preencher uma série de exigências colocadas
pela norma infraconstitucional, em especial a de ser elaborado e subscrito por profissional
legalmente habilitado e identificado, consubstanciando trabalho de envergadura considerável,

porquanto especificará como se implantará a nova cultura na propriedade particular.

A vistoria administrativa do INCRA foi realizada entre 18 de setembro de 2007 a 20 de setembro
de 2007. De outro giro, o Projeto de Investimento e Exploração Agrícola com a Cultura de
Cana-de-Açúcar foi apresentado ao órgão competente em 15 de outubro de 2007, como se
verifica de fl. 561 dos autos. Entre a realização da vistoria administrativa sobre o imóvel e a
apresentação do projeto técnico, portanto, não chegou a transcorrer nem um mês.

Levando em consideração, porém, que o projeto técnico de fls. 541/561 subscrito pelo
engenheiro agrônomo é de patente complexidade, demandando a atuação técnica de
profissional habilitado para tanto, pode-se presumir, com segurança, que a proprietária do
imóvel já estava promovendo a transição de culturas mesmo antes da vistoria administrativa,
porque não seria viável cogitar da elaboração e da apresentação ao órgão competente de um
projeto técnico de tamanha envergadura no pouquíssimo tempo que se seguiu à realização da
vistoria administrativa do INCRA.

O próprio INCRA admite, em seu laudo de vistoria, que o proprietário preparava a área para a
implantação de cultura de cana-de-açúcar, quanto expressa o seguinte (fl. 115):

"O imóvel tem como vegetação predominante a pastagem cultivada, entretanto durante o
período de vistoria constatou-se que a área possui vegetação herbácea nativa pós culturas
anuais e pastagem natural. Atualmente grande parte da área está sendo preparada para o
plantio da cana-de-açúcar (área não informada). Atualmente existem ainda 73 ha com cana,
sendo 23 ha de 2º corte e 50 ha de 1º corte. Há também 130,3106 ha com APP." (grifei)
Em outra passagem do mesmo laudo de vistoria, o INCRA confirma a intenção do proprietário
de cultivar cana-de-açúcar (fl. 121):

"Constatamos que a maior parte do imóvel apresenta área ocupada por pastagem (341,4793
ha) visando à exploração da pecuária. Entretanto, durante o período de vistoria constatou-se
que parte da área ocupada por pastagem estava sendo preparada para o plantio de cana de
açúcar (121,4506 ha)." (grifei)
No entanto, quando da efetiva apuração do GUT e do GEE, o perito administrativo assentou
que a propriedade não cumpria a sua função social, deixando de tomar em conta a implantação
da cultura de cana-de-açúcar que havia sido noticiada no próprio laudo. O perito da autarquia
partiu da premissa de que apenas 25,1024 ha compreendiam área plantada com cana-de-
açúcar (fl. 121), mesmo diante da transição que ocorria em grande extensão da propriedade, o
que o levou a chegar aos equivocados percentuais de 100,00% para o GUT e somente 71,79%
para o GEE. Consultemos as conclusões exaradas no laudo de vistoria do INCRA (fls. 127/128):

"Com relação ao cumprimento da função social da propriedade rural, preconizada no artigo 2º e
9º da Lei 8.629/93, e artigo 184 da Constituição, pode-se dizer que o imóvel em questão não a
cumpre, uma vez que não satisfaz simultaneamente todos os aspectos que a definem. Quanto

ao aproveitamento racional e adequado da terra, foram apurados os seguintes dados: Graus de
Utilização da Terra (GUT) =100,00% e Grau de Eficiência na Exploração (GEE) = 71,79%.
Portanto, de acordo com a citada lei, e por apresentar área total equivalente a 14,83 módulos
fiscais, o imóvel classifica-se como Média Propriedade Improdutiva"
Entretanto, a apuração do GEE não poderia partir apenas da área efetivamente plantada com
cana-de-açúcar, quando o próprio laudo de vistoria reconhecia a circunstância de que uma
considerável porção do restante da propriedade estava sendo preparada para a implantação da
mesma cultura de cana-de-açúcar. Por outras palavras, impunha-se a consideração da área
que estava sendo preparada para o plantio de cana-de-açúcar, mormente em razão do projeto
técnico que estava em curso.

Sobre a necessidade de se tomar em conta a porção da propriedade particular que estava
destinada à implantação do plantio de cana-de-açúcar para apuração do GEE, ainda que a
introdução desta nova cultura venha a se consolidar posteriormente, é oportuno trazer à
colação o seguinte aresto da jurisprudência desta Egrégia Corte Regional:

"PROCESSUAL CIVIL. DIREITO ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE
SOCIAL PARA O FIM DE REFORMA AGRÁRIA. CONSTATAÇÃO DA PRODUTIVIDADE DE
IMÓVEL RURAL. GUT DE 100% E GEE DE 108%. MODERAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA
FIXADA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. MANUTENÇÃO DO MONTANTE ARBITRADO.
REMESSA OFICIAL E APELAÇÕES DESPROVIDAS.
I. A desapropriação por interesse social para o fim de reforma agrária admite um controle
judicial mais amplo do que o das modalidades tradicionais.
II. Se o imóvel apresentar exploração compatível com a legislação agrária, ambiental e
trabalhista, a pretensão do Estado será barrada, o que demonstra a atuação restrita, confinada
da União nessa modalidade de desapropriação.
III. O INCRA negligenciou a produção agrícola e o efetivo pecuário.
IV. A quantidade de 698,8741 hectares de cana-de-açúcar não surgiu repentinamente, a ponto
de ter sucedido ao período de doze meses da vistoria. A cultura estava em via de introdução,
consolidando-se posteriormente.
V. O auto de constatação lavrado por oficial de justiça e o contrato de arrendamento firmado
com Olinto Rodrigues apontam uma presença maior de gado - 219 vacas, 135 bezerros e 1.500
novilhos. A sobreposição das espécies invasoras em relação às gramíneas sinaliza atividade
pecuária.
VI. Todos esses fatores trazem uma nova configuração agrária, fazendo com que o grau de
utilização da terra atinja 100% e o de eficiência da exploração, 108%. A propriedade se
enquadra nos limites mínimos de rendimento, de acordo com o artigo 6°, §1° e §2°, da Lei n°
8.629/1993.
(...)
IX. O avanço do estado do bem no curso do procedimento administrativo ou judicial equivale à
apresentação de projeto técnico. Se o proprietário que o faz se exime da expropriação (artigo 7°
da Lei n° 8.629/1993), não há razão para ignorar a situação de quem cumpre a função social

durante o processo.
(...)
XI. Remessa oficial e apelações desprovidas." (grifei)
(TRF 3ª Região, QUINTA TURMA - 1A. SEÇÃO, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1762380 - 0000020-
63.2009.4.03.6108, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO, julgado em
07/04/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/04/2014 )

Ainda que se conclua pelo descabimento do projeto técnico apresentado pela proprietária ao
órgão competente, como o faz o eminente Relator deste apelo, ao fundamento de que foi
apresentado após o período de vistoria administrativa, percebe-se pelo julgado acima transcrito
que se o proprietário passa a cumprir a função social no curso do procedimento administrativo
ou judicial, comprovando cabalmente o preenchimento dos requisitos de produtividade após a
consolidação da transição, tem-se uma situação que equivale à apresentação de projeto
técnico, porquanto a finalidade primordial da Lei n. 8.629/1993 é a de desapropriar por interesse
social imóveis reconhecidamente improdutivos, e não imóveis que se encontrem em momento
de transição para introdução de novas culturas.

Sucede que o recurso de apelação interposto deveria ser parcialmente provido, afastando-se a
preliminar de nulidade da sentença, mas acolhendo o argumento de mérito no sentido de que a
propriedade não seria improdutiva. O provimento ao apelo faz surgir, como consectário lógico, a
necessidade de se condenar em verba honorária a parte apelada, cumprindo arbitrar o
montante devido a tal título.

A sentença apelada foi proferida em 30.03.2010, conforme fl. 950, o que equivale a dizer que a
sentença foi prolatada na vigência do Código de Processo Civil de 1973, razão pela qual se
devem tomar as disposições deste revogado diploma legal no momento de se fixar a verba
honorária.

O artigo 20, §§ 3º e 4º, do mencionado diploma legal trazia os critérios para se fixar a verba
honorária. Pela disposição dos preceptivos indicados, o juiz deveria fixar a verba honorária
entre o mínimo de 10% (dez por cento) e o máximo de 20% (vinte por cento) sobre o valor da
condenação. O §4º do preceptivo legal, por outro lado, estatuía que nas causas em que a
Fazenda Pública restasse vencida, como a presente (estamos diante de uma autarquia), os
honorários poderiam ser arbitrados por equidade.

Considerando os comandos aplicáveis à espécie, tenho que a fixação da verba honorária em
R$ 20.000,00 (vinte mil reais) se revela razoável. A causa revolve tema de notável
complexidade, por cuidar de assunto que demanda a exaustiva análise de documentos que
foram carreados aos autos e o ingresso em questões técnicas. Além disso, o patrono da parte
autora teve de atuar em diferentes ocasiões para que a tese fosse aceita neste voto, ajuizando
a demanda, interpondo agravo de instrumento e movimentando o apelo, o que justifica a fixação
da verba honorária neste montante.


Ora, um dos critérios colocados pela legislação processual civil para delimitar a quantia devida
a título de honorários advocatícios guarda relação com o zelo do causídico, e esse fator
justifica, no caso concreto, a fixação dos honorários nesse patamar, na medida em que os
patronos adotaram todos os expedientes necessários para que a tese jurídica da autora viesse
a ser acolhida pelo presente voto.

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao recurso de apelação interposto, para o fim
de reformar a sentença e reconhecer a classificação do imóvel objeto do litígio enquanto uma
"média propriedade produtiva", condenando o INCRA em honorários sucumbenciais arbitrados
no importe de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), tudo nos termos da fundamentação supra.

É como voto.


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0007278-64.2008.4.03.6107
RELATOR:Gab. 03 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA
APELANTE: MCL EMPREENDIMENTOS E NEGOCIOS LTDA.
Advogado do(a) APELANTE: GUSTAVO BARBAROTO PARO - SP121227
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA INCRA
Advogados do(a) APELADO: PAULO SERGIO MIGUEZ URBANO - SP28979, RODRIGO
NASCIMENTO FIOREZI - SP201495
OUTROS PARTICIPANTES:





V O T O



O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA (RELATOR):

Do direito intertemporal.
Segundo as regras de direito intertemporal que disciplinam o sistema jurídico brasileiro no
concernente à aplicação da lei no tempo, as inovações legislativas de caráter estritamente
processual, como é a Lei n. 13.105/2015, devem ser aplicadas, de imediato, inclusive nos
processos já em curso (art. 14).
Assim, aplica-se a lei nova aos processos pendentes, respeitados, naturalmente, os atos
consumados e seus efeitos no regime do CPC de 1973.
Nesse sentido, restou editado o Enunciado Administrativo n. 2/STJ, de teor seguinte:


"Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até
17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele
prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça".

Do cerceamento de defesa
Com relação à prova pericial, depreende-se dos autos que o juiz deferiu a produção da prova
pericial e, à fl. 848, fixou os honorários em R$ 28.606,00, determinando o pagamento pela
autora no prazo de 10 dias. A autora interpôs o agravo de instrumento nº 0037668-
68.2009.4.03.0000com pedido de antecipação da tutela recursal a fim de suspender o
recolhimento e o processo originário até o julgamento do agravo, porém este Relator indeferiu o
pedido de efeito suspensivo.
Assim, tão logo publicada a decisão deste Relator que indeferiu o pedido de concessão de
efeito suspensivo ao agravo de instrumento, a autora deveria ter efetuado o recolhimento dos
honorários periciais a fim de evitar a preclusão da prova pericial.
Ademais, é certo que, posteriormente, esta E. Primeira Turma, por unanimidade, negou
provimento ao agravo de instrumento mencionado, transitando em julgado em 23/04/2018, de
modo que a questão relativa à desarrazoabilidade do valor arbitrado para os honorários
periciais encontra-se acobertada pela eficácia preclusiva da coisa julgada e não pode ser
reapreciada pelo Poder Judiciário.
Com relação à prova testemunhas, nos termos do art. 130 do CPC/73, vigente à época dos
fatos, o juiz é o destinatário da prova e pode, em busca da apuração da verdade e da
elucidação dos fatos, determinar a sua produção bem como indeferir aquelas que julgar
impertinentes, inúteis ou protelatórias.
Por isso, deve prevalecer a prudente discrição do magistrado no exame da necessidade ou não
da realização de determinada prova, de acordo com as peculiaridades do caso concreto.
Nesse sentido, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. INDEFERIMENTO DE PRODUÇÃO DE NOVA
PROVA PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. LIVRE CONVICÇÃO DO
JUIZ. TRANSFORMAÇÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ EM APOSENTADORIA
ACIDENTÁRIA. AUSÊNCIA DE NEXO CAUSAL. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME DE
PROVAS. SÚMULA 7/STJ. 1. Conforme legislação de regência, cumpre ao magistrado,
destinatário da prova, valorar sua necessidade. Assim, tendo em vista o princípio do livre
convencimento motivado, não há cerceamento de defesa quando, em decisão fundamentada, o
juiz indefere produção de prova, seja ela testemunhal, pericial ou documental. 2. A teor da Lei n.
8.213/91, a concessão de benefício o acidentário apenas se revela possível quando
demonstrados a redução da capacidade laborativa, em decorrência da lesão, e o nexo causal.
3. No caso, o Tribunal de origem, com base no laudo pericial, concluiu que inexiste nexo causal
entre a doença incapacitante e as atividades laborativas exercidas pela parte autora, motivo
pelo qual o benefício não é devida a pretendida transformação da aposentadoria por invalidez
em aposentadoria acidentária. 4. Assim, a alteração das conclusões adotadas pela Corte de

origem, tal como colocada a questão nas razões recursais, demandaria, necessariamente, novo
exame do acervo fático-probatório constante dos autos, providência vedada em recurso
especial, conforme o óbice previsto na Súmula 7/STJ. 5. Agravo regimental a que se nega
provimento. (AGARESP 201300701616, SÉRGIO KUKINA, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE
DATA:20/04/2015).

Malgrado sustente o apelante a necessidade de produção da prova testemunhal, verifica-se que
consistindo a controvérsia na produtividade ou não do imóvel, a prova testemunhal não se
presta a comprovar a pretensão alegada pela autora.
Nestes termos, rejeito as preliminares.

Da aferição de produtividade do imóvel rural
O direito de propriedade está condicionado ao cumprimento de uma função social, a qual,
enquanto princípio norteador da ordem econômica (art. 170, inc. III, da Constituição da
República), impõe ao proprietário o dever jurídico-social de cultivar e explorar adequadamente o
imóvel, observado o respeito aos direitos trabalhistas e ambientais, em consonância com os
ditames constitucionais, sob pena de ser submetido à sanção de desapropriação por interesse
social.
A respeito do complexo normativo que rege a matéria, discorre a jurisprudência:
"O acesso à terra, a solução dos conflitos sociais, o aproveitamento racional e adequado do
imóvel rural, a utilização apropriada dos recursos naturais disponíveis e a preservação do meio
ambiente constituem elementos de realização da função social da propriedade. A
desapropriação, nesse contexto - enquanto sanção constitucional imponível ao descumprimento
da função social da propriedade - reflete importante instrumento destinado a dar consequência
aos compromissos assumidos pelo Estado na ordem econômica e social. Incumbe, ao
proprietário da terra, o dever jurídico-social de cultivá-la e de explorá-la adequadamente, sob
pena de incidir nas disposições constitucionais e legais que sancionam os senhores de imóveis
ociosos, não cultivados e/ou improdutivos, pois só se tem por atendida a função social que
condiciona o exercício do direito de propriedade, quando o titular do domínio cumprir a
obrigação (1) de favorecer o bem-estar dos que na terra labutam; (2) de manter níveis
satisfatórios de produtividade; (3) de assegurar a conservação dos recursos naturais; e (4) de
observar as disposições legais que regulam as justas relações de trabalho entre os que
possuem o domínio e aqueles que cultivam a propriedade. As prescrições constantes da MP
2.027-38/2000, reeditada, pela última vez, como MP 2.183-56/2001, precisamente porque têm
por finalidade neutralizar abusos e atos de violação possessória, praticados contra proprietários
de imóveis rurais, não se mostram eivadas de inconstitucionalidade (ao menos em juízo de
estrita delibação), pois visam, em última análise, a resguardar a integridade de valores
protegidos pela própria Constituição da República. O sistema constitucional não tolera a prática
de atos, que, concretizadores de invasões fundiárias, culminam por gerar - considerada a
própria ilicitude dessa conduta - grave situação de insegurança jurídica, de intranquilidade
social e de instabilidade da ordem pública".
(ADI 2.213 MC, Rel. Min. Celso de Mello, j. 4/4/2002, DJ 23/4/2004)

ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA. SUSPENSÃO
DO PROCESSO EXPROPRIATÓRIO. MEDIDA CAUTELAR PELO JUIZ SINGULAR.
POSSIBILIDADE. CONCEITO DE FUNÇÃO SOCIAL QUE NÃO SE RESUME À
PRODUTIVIDADE DO IMÓVEL. DESCUMPRIMENTO DA FUNÇÃO SOCIAL NÃO
RECONHECIDA PELA CORTE DE ORIGEM. MATÉRIA PROBATÓRIA. SÚMULA 7/STJ.
(...)
3. Nos moldes em que foi consagrado como um Direito Fundamental, o direito de propriedade
tem uma finalidade específica, no sentido de que não representa um fim em si mesmo, mas sim
um meio destinado a proteger o indivíduo e sua família contra as necessidades materiais.
Enquanto adstrita a essa finalidade, a propriedade consiste em um direito individual e,
iniludivelmente, cumpre a sua função individual.
4. Em situação diferente, porém, encontra-se a propriedade de bens que, pela sua importância
no campo da ordem econômica, não fica adstrita à finalidade de prover o sustento do indivíduo
e o de sua família. Tal propriedade é representada basicamente pelos bens de produção, bem
como, por aquilo que exceda o suficiente para o cumprimento da função individual.
5. Sobre essa propriedade recai o influxo de outros interesses - que não os meramente
individuais do proprietário - que a condicionam ao cumprimento de uma função social.
6. O cumprimento da função social exige do proprietário uma postura ativa. A função social
torna a propriedade em um poder-dever. Para estar em conformidade com o Direito, em estado
de licitude, o proprietário tem a obrigação de explorar a sua propriedade. É o que se observa,
por exemplo, no art. 185, II, da CF.
7. Todavia, a função social da propriedade não se resume à exploração econômica do bem. A
conduta ativa do proprietário deve operar-se de maneira racional, sustentável, em respeito aos
ditames da justiça social, e como instrumento para a realização do fim de assegurar a todos
uma existência digna.
8. Há, conforme se observa, uma nítida distinção entre a propriedade que realiza uma função
individual e aquela condicionada pela função social. Enquanto a primeira exige que o
proprietário não a utilize em prejuízo de outrem (sob pena de sofrer restrições decorrentes do
poder de polícia), a segunda, de modo inverso, impõe a exploração do bem em benefício de
terceiros.
9. Assim, nos termos dos arts. 186 da CF, e 9º da Lei n. 8.629/1993, a função social só estará
sendo cumprida quando o proprietário promover a exploração racional e adequada de sua terra
e, simultaneamente, respeitar a legislação trabalhista e ambiental, além de favorecer o bem-
estar dos trabalhadores.
(...)
(AgRg no REsp 1.138.517/MG, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, DJ 01/09/2011)

Nesse sentido, a Constituição da República estabeleceu à União a competência para realização
de desapropriação por interesse social, para fins de reforma agrária, de imóvel rural que não
cumpra sua função social (art. 184), cuja aferição deve se dar à luz dos requisitos elencados
pelo art. 186, do texto constitucional.
Em sede de regulamentação infraconstitucional, dispõe a Lei 8.629/93 que, para fins de

execução da desapropriação por interesse social, fica a União, através do órgão federal
competente, autorizada a ingressar no imóvel de propriedade particular para levantamento de
dados e informações, mediante prévia comunicação escrita ao proprietário, preposto ou seu
representante (art. 2º, § 2º). A vistoria possui como finalidade a aferição do caráter produtivo da
propriedade, em face dos graus e critérios estabelecidos pelo referido diploma normativo
(artigos 6º e 9º).
A fiscalização agronômica levada a efeito pelo INCRA consubstancia-se em atividade
administrativa vinculada, decorrente dos juízos de conveniência e oportunidade peculiares à
Administração, visando à concretização dos objetivos constitucionais que norteiam sua
atividade. Nesse contexto, cabe ao Judiciário somente o exame de legalidade e legitimidade do
ato administrativo, bem como a verificação da obediência às formalidades essenciais e aos
limites legais.
Na situação em exame, verifica-se que o INCRA, no âmbito do procedimento administrativo nº
54190.002055/2007-78, procedeu, em 18/01/2008, à notificação dos Recorridos acerca da
realização de vistoria administrativa no imóvel rural denominado Fazenda "Santa Terezinha",
localizados no município de Nova Independência/SP.
Os agentes da autarquia compareceram ao local no período compreendido entre 18/09/2007 a
20/09/2007, durante o qual produziram Relatório Agronômico de Fiscalização (RAF), que
concluiu pelo caráter improdutivo do imóvel, com referência ao período de 01/09/2006 a
31/08/2007, classificando-os como média propriedade improdutiva.
A autora, por sua vez, impugnou o laudo produzido pela autarquia, sob o argumento de que,
durante o período analisado, a propriedade encontrava-se em fase de transição de atividade
econômica, mediante projeto técnico implementado com o fim de realização de mudança de
cultura, sendo, por conseguinte, vedada a desapropriação para fins de reforma agrária, nos
termos do art. 7º, da Lei 8.629/93.
Infere-se, portanto, que a pretensão autoral visa, em suma, à desconstituição do ato
administrativo praticado pelo INCRA, consubstanciado no Relatório Agronômico de
Fiscalização, sob o argumento de sua invalidade, ante a inobservância de previsão normativa
que excepciona, no caso, a possibilidade de classificação do imóvel vistoriado como
propriedade improdutiva.
De início, cabe consignar que todos os pontos discutidos nos presentes autos constituem
questões de fato, que demandam a produção de prova a partir de conhecimento técnico e
específico.
É o perito quem, na qualidade de auxiliar do juízo, cumpre esse importante papel de analisar as
questões específicas de outras áreas e de outras ciências.
O magistrado, em regra, não possui o conhecimento técnico necessário para apreciar essas
minúcias. E, conquanto não esteja o magistrado adstrito ao laudo judicial (art. 436, do CPC/73,
com correspondência no art. 479, do CPC/2015), é possível o acolhimento das suas
conclusões, justamente porque se trata de trabalho realizado por profissionais com
conhecimentos técnicos, equidistantes das partes e que gozam da presunção de
imparcialidade, além de o laudo judicial sempre sujeitar-se ao crivo do contraditório.
Ocorre que, mesmo nos casos em que as partes não produzem as provas necessárias,

inexistindo elementos probatórios suficientes que atestem a procedência ou a improcedência do
pedido, o Judiciário não pode furtar-se a prestar a jurisdição, quando provocado, em razão dos
princípios do acesso à justiça, da inafastabilidade da jurisdição e da vedação ao non liquet,
sendo necessário encontrar uma solução, que promova a pacificação social.
A fim de solucionar essas situações o Código de Processo Civil atribui determinados ônus
probatórios às partes, nos termos do seu art. 333: de um lado, ao autor, incumbe produzir as
provas quanto aos fatos constitutivos do seu direito; de outro, ao réu, cumpre as provas quanto
à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.
Desse modo, ausentes as provas necessárias à cabal comprovação da existência do direito do
autor ou de fato impeditivo, modificativo ou extintivo, decide-se em sentido contrário à pretensão
da parte que tinha a incumbência de produzi-las e deixou de fazê-lo.
No caso dos autos, a pretensão da autora consiste na anulação do ato administrativo do
INCRA, que se funda no Laudo Agronômico de fls. 93/227. Esse laudo analisou os cultivos e
efetivos pecuários existentes, além de aspectos ambientais, calculou os índices de
produtividade na forma prevista na legislação e concluiu pela improdutividade do imóvel.
É evidente que o ônus probatório quanto à insubsistência desse laudo agronômico recai sobre a
autora, em razão do disposto no art. 333, I, do CPC/1973 e da presunção de veracidade dos
atos administrativos.
E a parte autora chegou a requerer a produção de perícia técnica a fim de comprovar os
supostos equívocos que alega haver nesse laudo, o que foi deferido pelo Magistrado, todavia,
posteriormente, deixou de recolher os honorários do perito, dando ensejo à preclusão da prova.
Assim, conclui-se que foi a desídia da própria autora que deu causa à inexistência da prova que
seria mais adequada à comprovação do seu suposto direito, descumprindo, pois, o ônus que a
lei processual atribuía-lhe.
E, à mingua de parecer de profissional com conhecimentos técnicos e equidistante das partes,
nomeado pelo Juízo, resta apenas a análise da controvérsia à luz do laudo agronômico
produzido pelo INCRA e dos documentos pré-constituídos juntados pelas partes.
Pois bem, depreende-se dos autos que o Laudo Agronômico de Fiscalização - LAF (fls. 93/132)
concluiu que o imóvel era improdutivo, confiram-se os seguintes trechos:

"(...) 6 - USO DO IMÓVEL
Constatamos que a maior parte do imóvel apresenta área ocupado por pastagens (341,4793ha)
visando à exploração da pecuária. Entretanto durante o período de vistoria constatou-se que
parte da área ocupada por pastagens estava sendo preparada para o plantio de cana-de-açúcar
(121,4506ha).
(...)
11 - CONCLUSÃO
11.1 - CUMPRIMENTO DA FUNÇÃO SOCIAL E CLASSIFICAÇÃO FUNDIÁRIA DO IMÓVEL
Com relação ao cumprimento da função social da propriedade rural, preconizada no artigo 2º e
9º da Lei 8.629/93, e artigo 184 da Constituição, pode-se dizer que o imóvel em questão não a
cumpre, uma vez que não satisfaz simultaneamente todos os aspectos que a definem. Quanto
ao aproveitamento racional e adequado da terra, foram apurados os seguintes dados: Graus de

Utilização da Terra (GUT) = 100,00% e Grau de Eficiência na Exploração (GEE) = 71.79%.
Portanto, de acordo com a citada lei, e por apresentar área total equivalente a 14,83 módulos
fiscais, o imóvel classifica-se como Média Propriedade Improdutiva.
No que concerne à utilização dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio
ambiente, verificou-se ausência de averbação de reserva legal à margem da inscrição no
Registro Público.
(...)
Aspectos ambientais
Não existe Reserva Legal averbada junto à matrícula do imóvel, sendo necessário recompor
89,8643ha para juntamente com os 13,9698ha de vegetação já existente serem averbados
como reserva legal deste imóvel, que totalizará 103,8341ha necessários.
Algumas áreas de pastagens apresentam erosão em sulcos, que se não recuperadas e
manejadas com práticas conservacionistas poderão vir a formar grandes voçorocas.
Constatou-se a ocorrência de duas grandes áreas com erosão em voçoroca.
Tendo em vista o aspecto ambiental do projeto, é possível a implantação de um projeto de
assentamento, desde que sejam observados os aspectos mencionados acima."

Observa-se, desde logo, que as análises e os cálculos apresentados pelo INCRA consideram a
natureza e especificidades das áreas vistoriadas, encontrando-se amparados em detida análise
da matéria apreciada e adequadamente fundamentados pelo fiscal.
Como se infere da análise dos autos, não restou demonstrada a infringência, pela Autarquia, no
exercício da atividade de vistoria, das normas integrantes do complexo legal de regência, de
modo a infirmar a validade do ato administrativo impugnado pela parte autora.
Contudo, considerando a vasta quantidade de questões analisadas no Laudo Agronômico do
INCRA e as impugnações formuladas pela apelante, passa-se à apreciação por meio de tópicos
a fim de facilitar a compreensão.

(i) Efetivo pecuário
Verifica-se que a autarquia, em sua vistoria, realizou a apuração do efetivo pecuário da
propriedade mês a mês, com base nas informações constantes da ficha de registro de
vacinações, apresentando, assim, os dados obtidos na tabela colacionada às fls. 123/125, em
que restou demonstrado o efetivo pecuário mensal constatado no período de novembro de 2006
a maio de 2007, acompanhado do cálculo da média respectiva.
Nota-se que os parâmetros adotados pelo INCRA para realização do cálculo seguem o método
estabelecido pelo Manual de Obtenção de Terras e Perícia Judicial (aprovado pela Norma de
Execução INCRA/DT nº 52, de 25 de outubro de 2006), o qual, em seu item 3.7.1, dispõe que o
cálculo da média ponderada do efetivo pecuário deve ser "apurado mês a mês, de acordo com
o que constar das Fichas Registro de Vacinação e Movimentação de Gado e/ou Ficha de
Serviço de Erradicação da Sarna e Piolheira dos Ovinos, obtidas junto ao órgão estadual de
controle de sanidade animal, sediado no Município, ou junto ao proprietário".
Os dados da autarquia, portanto, seguiram as normativas de regência para realização do
cálculo.

Como é cediço, no que tange ao efetivo pecuário, incumbe ao proprietário a guarda e a
disponibilização de documentos que comprovem a adequada exploração econômica, de forma
que "cabe aos proprietários rurais manter atualizada a documentação relativa aos seus imóveis
(...), de modo a espelhar a real situação de aproveitamento e exploração da terra" (TRF-4, AC
nº 2004.70.13.000554-6, 3ª Turma, Rel. Des. Fed. Vânia Hack de Almeida, DJ 19/11/2007).
No mesmo sentido:
DIREITO ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE
PRODUTIVIDADE. DEVERES DOS PROPRIETÁRIOS DE ÁREA RURA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. REDUÇÃO.
1. É indispensável que proprietários de imóveis rurais mantenham regularizada a documentação
da propriedade e das explorações nela realizadas, prevenindo riscos de uma desapropriação
por interesse social. De fato, os proprietários de imóvel rural devem aferir a produtividade do
próprio imóvel, segundo padrão do INCRA, conferindo, ainda, o Certificado de Cadastro de
Imóvel Rural; devem regularizar eventuais arrendamentos, fichas de vacinas, verificando a
situação de áreas de proteção ambiental e elaborando projeto técnico de explorações
agropecuárias, conforme a legislação. 2. Não tendo os autores assim procedido, à míngua de
prova documental contemporânea à vistoria que demonstre a produtividade alegada, se impõe
a rejeição do pedido. Sentença mantida no mérito.3. Quantum da verba honorária reduzido para
adequação aos parâmetros desta 4ª Turma, emconformidade como artigo 20 do CPC.
(TRF-4, AC 0000166-94.2008.404.7213, Rel. Des. Fed. Marga Inge Barth Tessler, Quarta
Turma, DJ 30/07/2010) - g.n.

A autarquia, a seu turno, quando da vistoria administrativa, teve acesso às fichas de vacinação
de gado correspondentes ao período analisado (que constam no Anexo X do Laudo - fls.
182/192) e procedeu à sua mensuração mês a mês, tal como determinado pelas normas de
regência.
Assim, ante a ausência de prova documental consistente, os dados apresentados pela apelante
mostram-se insuficientes a aquilatar as conclusões da fiscalização agronômica, a qual, nas
circunstâncias em tela, deve prevalecer.

(ii) preparação do solo
A autora alega que estaria em fase de preparação do solo para implantação do cultivo da
cultura de cana de açúcar, havendo, em tal período, sido realizada a retirada do gado para
introdução da nova lavoura.
Efetivamente, dispõe o § 7º do art. 6º da Lei 8.629/93 que não perderá a qualificação de
propriedade produtiva o imóvel que, por razões de "renovação de pastagens tecnicamente
conduzida, devidamente comprovados pelo órgão competente, deixar de apresentar, no ano
respectivo, os graus de eficiência na exploração, exigidos para a espécie". Nesse sentido,
estabelece o inciso IV do art. 7º do mesmo diploma legal, não ser passível de desapropriação,
para fins de reforma agrária, o imóvel que comprove estar sendo objeto de implantação de
projeto técnico, devendo tal projeto, para tanto, ser aprovado pelo órgão federal competente, na
forma estabelecida em regulamento, no mínimo seis meses antes da comunicação relativa à

vistoria de fiscalização agronômica.
Depreende-se, portanto, que a existência de processo de renovação de pastagens/cultura
somente possui o condão de impedir a classificação do imóvel rural como propriedade
improdutiva se apresentada a comprovação de projeto técnico que atenda aos estritos
requisitos legais.
Nesse sentido é o entendimento do Supremo Tribunal Federal:
"CONSITUCIONAL. AGRÁRIO. DESAPROPRIAÇÃO. REFORMA AGRÁRIA. MANDADO DE
SEGURANÇA. RELATÓRIO AGRONÔMICO DE FISCALIZAÇÃO. ATRASO. AUSÊNCIA DE
NULIDADE. RECURSO SEM EFEITO SUSPENSIVO. POSSIBILIDADE DE EDIÇÃO DO
DECRETO EXPROPRIATÓRIO. OPORTUNIDADE E ALCANCE. ART. 61 DA LEI N. 9.784/99.
ART. 184, § 2º, DA CB/88. RENOVAÇÃO DE PASTAGENS. IMPEDIMENTO À
CLASSIFICAÇÃO DO IMÓVEL COMO PROPRIEDADE IMPRODUTIVA. ART. 6º, § 3º, V E §
7º, DA LEI N. 8.629/93. NECESSIDADE DE PROJETO TECNICAMENTE CONDUZIDO. ART.
7º DA LEI N. 8.629/93. AFERIÇÃO DO EFETIVO PECUÁRIO POR MEIO DE FICHAS DE
VACINAÇÃO. POSSIBILIDADE. PRODUTIVIDADE DO IMÓVEL. DILAÇÃO PROBATÓRIA.
APRECIAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A entrega
extemporânea do laudo agronômico de fiscalização não implica a nulidade do documento,
ensejando apenas a instauração de procedimento disciplinar para averiguar eventuais faltas dos
servidores responsáveis pelo atraso. 2. A ausência de efeito suspensivo no recurso
administrativo interposto contra o laudo agronômico de fiscalização não impede a edição do
decreto do Presidente da República, que apenas declara o imóvel de interesse social para fins
de reforma agrária, mera condição para a propositura da ação de desapropriação [art. 184, § 2º,
da CB/88]. A perda do direito de propriedade ocorrerá somente ao cabo da ação de
desapropriação. Precedente [MS n. 24.163, Relator o Ministro MARCO AURÉLIO, DJ
19.09.2003 e MS n. 24.484, Relator o Ministro EROS GRAU, DJ 02.06.2006]. 3. O processo de
renovação de pastagens que impede a classificação do imóvel rural como propriedade
improdutiva --- art. 6º, §§ 3º e 7º, da Lei n. 8.629/93 --- reclama a existência de projeto técnico,
que deve atender aos requisitos previstos no art. 7º daquele texto normativo. 4. Não há
ilegalidade na aferição do efetivo pecuário pelo uso exclusivo das Fichas de Vacinação - FV
caso haja irregularidades nas notas fiscais e Demonstrativos de Movimentação de Gado - DMG,
uma vez que os regulamentos expedidos pelo INCRA prevêem a utilização de ambos os
registros. 5. A impossibilidade de dilação probatória em mandado de segurança torna
insuscetível de apreciação a questão relativa à produtividade do imóvel rural. Precedente [MS n.
24.518, Relator o Ministro CARLOS VELLOSO, DJ 30.04.2004 e MS n. 25.351, Relator o
Ministro EROS GRAU, DJ 16.09.2005]. 6. Segurança denegada, prejudicado o agravo
regimental interposto".
(STF, MS nº 25.534/DF, Rel. Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, DJ 10/11/06) - g.n.

Ocorre que, no caso em exame, a parte autora, inobstante busque sustentar a qualificação do
imóvel enquanto propriedade produtiva, por meio da alegação de implantação da cultura de
cana de açúcar durante o período da vistoria administrativa da Autarquia, deixou de apresentar
o projeto técnico dentro do prazo da legislação.

Consoante se depreende dos autos, a autora somente protocolou o projeto técnico de
implantação do cultivo da cultura de cana de açúcar, assinado pela Engenheiro Agrônomo
Mario Roberto Rodrigues Marinha, em 15/10/2007 (fls. 548/561), isto é, após o encerramento da
fiscalizou que ocorreu entre 18/09/2007 e 20/09/2007.
Isso porque, como já dito, o art. 7º da Lei nº 8.629/93 estabelece requisitos para a implantação
de mudança de cultura e, dentre os requisitos, consta a aprovação do projeto técnico de
mudança de cultura pelo órgão federal competente, na forma estabelecida em regulamento, no
mínimo seis meses antes da comunicação de que tratam os §§ 2º e 3º do art. 2º. In verbis:

Art. 2º A propriedade rural que não cumprir a função social prevista no art. 9º é passível de
desapropriação, nos termos desta lei, respeitados os dispositivos constitucionais.
(Regulamento)
(...)
§2º Para os fins deste artigo, fica a União, através do órgão federal competente, autorizada a
ingressar no imóvel de propriedade particular para levantamento de dados e informações,
mediante prévia comunicação escrita ao proprietário, preposto ou seu representante. (Redação
dada pela Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)
§3º Na ausência do proprietário, do preposto ou do representante, a comunicação será feita
mediante edital, a ser publicado, por três vezes consecutivas, em jornal de grande circulação na
capital do Estado de localização do imóvel. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.183-56, de
2001)
§4º Não será considerada, para os fins desta Lei, qualquer modificação, quanto ao domínio, à
dimensão e às condições de uso do imóvel, introduzida ou ocorrida até seis meses após a data
da comunicação para levantamento de dados e informações de que tratam os §§ 2º e 3º.
(Incluído pela Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)
(...)
Art. 7º Não será passível de desapropriação, para fins de reforma agrária, o imóvel que
comprove estar sendo objeto de implantação de projeto técnico que atenda aos seguintes
requisitos:
I - seja elaborado por profissional legalmente habilitado e identificado;
II - esteja cumprindo o cronograma físico-financeiro originalmente previsto, não admitidas
prorrogações dos prazos;
III - preveja que, no mínimo, 80% (oitenta por cento) da área total aproveitável do imóvel seja
efetivamente utilizada em, no máximo, 3 (três) anos para as culturas anuais e 5 (cinco) anos
para as culturas permanentes;
IV - haja sido registrado no órgão competente no mínimo 6 (seis) meses antes do decreto
declaratório de interesse social
IV - haja sido aprovado pelo órgão federal competente, na forma estabelecida em regulamento,
no mínimo seis meses antes da comunicação de que tratam os §§ 2º e 3º do art. 2o. (Redação
dada pela Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)
Parágrafo único. Os prazos previstos no inciso III deste artigo poderão ser prorrogados em até
50% (cinqüenta por cento), desde que o projeto receba, anualmente, a aprovação do órgão

competente para fiscalização e tenha sua implantação iniciada no prazo de 6 (seis) meses,
contado de sua aprovação.

Ademais, consoante exposto, os proprietários de imóvel rural devem aferir a produtividade do
próprio imóvel, incumbindo-lhes manter regularizada a documentação da propriedade e das
explorações nela realizadas, de modo a prevenir os riscos de uma desapropriação por interesse
social. Por conseguinte, a mera alegação de que o imóvel encontrava-se em processo de
implantação de nova cultura, desprovida da prova documental pertinente, não constitui
fundamento hábil a afastar, por si, a conclusão acerca do caráter improdutivo da propriedade,
fundamentadamente exarada pela autoridade competente no âmbito do ato administrativo de
vistoria.
Por outro lado, a mera existência de contratos de parceria agrícola não se mostra suficiente a,
isoladamente, suprir os requisitos legais necessários à comprovação da implantação de projeto
técnico, de modo a afastar a possibilidade de desapropriação para fins de reforma agrária.
Conforme entendimento jurisprudencial, tais contratos devem ser apreciados com reserva,
sendo ônus do proprietário a apresentação do projeto técnico exigido pela legislação de
regência, para que lhe sejam atribuídos os respectivos efeitos legais:
DIREITO ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO PARA REFORMA AGRÁRIA. FAZENDA
MACAÉ. GEE. ÍNDICE. PRODUTIVIDADE. PRODUÇÃO DE SEMENTE. GRAMÍNEAS
FORRAGEIRAS. REQUISITOS. FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE. EXIGÊNCIAS DO
CÓDIGO FLORESTAL.
1. Na hipótese dos autos, é cabível o recurso de embargos infringentes em caso de sentença
de mérito, pois o ponto objeto dos embargos foi reformado pela Turma julgadora, razão pela
qual devem ser conhecidos, consoante o art. 530 do CPC, com a redação conferida pela Lei n.º
10.352/01.
2. O Grau de Eficiência na Exploração - GEE diz respeito à plantação de produtos vegetais e à
exploração pecuária, sendo considerada produtiva a terra que tenha percentual igual ou
superior a 100%. Como esse índice leva em consideração a produção da propriedade, as
diferentes áreas pretendidas para sementes e para pastagem repercutirão no índice GEE, que
aumentará ou diminuirá conforme a maior ou menor produção de sementes e pasto.
3. A Fazenda Macaé situa-se no Município de Andradina, sendo-lhe aplicável a Portaria n.º 2/98
da Secretaria de Agricultura e Abastecimento, que exige a inscrição da produção de sementes
de gramíneas forrageiras em órgão do Estado de São Paulo, através da apresentação de
Projeto Técnico, para fins de acompanhamento do pré-plantio, plantio, floração e colheita.
Trata-se de ônus imposto a quem comercializa tais produtos e também a quem os produz.
4. Face à ausência de regularização da plantação no órgão estadual na hipótese dos autos, a
área utilizada de forma irregular não pode ser considerada para a aferição do GEE, sob pena de
se incentivar que o proprietário da terra haja em desconformidade com as normas jurídicas.
5. Os contratos de parcerias agrícolas firmados com a embargada devem ser apreciados com
reserva, pelo que a área destinada à produção de sementes não pode ser considerada no
cálculo do GEE mínimo.
6. O fato de a Fazenda Macaé agir em descompasso com a preservação do meio ambiente,

desrespeitando normas do Código Florestal relativas a áreas de reserva legal e de preservação
permanente trata-se de mais um fundamento para se concluir que ela descumpre sua função
social, sendo, também por este motivo, passível de desapropriação para reforma agrária.
7. Embargos infringentes providos.
(TRF-3, EI 0001104-78.2004.4.03.6107/SP, Rel. Des. Fed. José Lunardelli, Primeira Seção, DJ
14/02/2012)

(iii) metodologia do cálculo da produtividade
No que concerne ao cálculo dos índices de produtividade do imóvel, verifica-se que o INCRA
apresentou parecer calcado em razões suficientemente comprovadas pelos elementos coligidos
nos autos, encontrando-se a apuração sustentada pela autarquia robustecida por detalhada
planilha de cálculo, na qual encontram-se discriminados os elementos considerados na análise
efetuada.
O laudo apresentou o cálculo do grau de utilização da terra (GUT) e do grau de eficiência na
exploração (GEE), os quais se tratam de parâmetros imprescindíveis à aferição do caráter
produtivo da propriedade, em conformidade com a previsão do art. 6º, caput e §§ 1º e 2º, da Lei
8.629/93. A vistoria de fiscalização agronômica apurou o GUT - calculado pela razão percentual
entre a área utilizada total e a área utilizável total - de 100%, e mensurou o GEE da pecuária -
calculado pela razão percentual entre a área equivalente total e a área utilizada total - em
71,79%, estando tais índices, portanto, abaixo do mínimo legal estabelecido para áreas
produtivas (fls. 121/122 e 674/676).
A autora alega, e insiste em razões de apelação, que há divergências e contradições no laudo
do INCRA, trazendo dados distintos dos adotados pelo fiscal. Porém, não traz provas a
corroborar os dados indicados e, quando traz, estes se referem a períodos posteriores à
fiscalização.
Isso porque, como bem asseverou o MM. Magistrado a quo, o aumento da área gradeada
ocorreu após a fiscalização, devendo ser desconsiderada, assim como que as notas fiscais de
fls. 438/441 são insuficientes para comprovar a existência de plantio de milho no período
analisado pela fiscalização, tendo em vista a impugnação do INCRA no sentido de que "devido
às condições técnicas, não é possível a colheita do milho no mês de dezembro".
E, conforme já dito, contratos e outros documentos particulares não são suficientes a comprovar
áreas de plantio ou de efetivo pecuário, diante da ausência de projetos técnicos de
acompanhamento.
E ainda, conforme analisado no tópico anterior, os documentos trazidos pela autora são
insuficientes para infirmar os dados utilizados pelo perito quanto ao efetivo pecuário, já que foi
seguida a metodologia de calculo prevista na legislação e adotados os dados constantes em
fichas de vacinação.
A esse respeito, manifestou-se o Magistrado:

"6- E, atentando-se ao laudo do INCRA, pôde aferir-se que a propriedade foi classificada como
"Média Propriedade IMPRODUTIVA", apresentando GUT = 100% e GEE = 71,79%, passível,
portanto, de desapropriação por interesse social.

(...)
6.3. No que pertine ao relatório agronômico apresentado pelo engenheiro agrônomo Kleber W.
Marques, datado de 16/10/2007 (fls. 336/345), observo:
6.3.1. Que em relação à área total do imóvel, preservação permanente,
benfeitorias/inaproveitáveis e cana-de-açúcar há algumas pequenas divergências, incapazes de
invalidar o laudo. Nesse sentido seguem as áreas aferidas:
- área total: 517,1085 (autor) e 519,1704 (INCRA)
- preservação permanente: 10,3372 (autor) e 9,1422 (INCRA)
- benfeitorias/inaproveitáveis: 12,0991 (autor) e 8.0296 (INCRA)
- várzea: 23,9390 (autor) e 0 (INCRA)
- mata nativa: 0 (autor) e 13,9698 (INCRA)
- cana-de-açúcar: 25,0848 (autor) e 25,1024 (INCRA).
Sabe-se que o INCRA, para aferição da produtividade no imóvel rural, utiliza-se de
procedimentos técnicos de última geração, com equipamentos de rastreamento de satélites, de
modo que a possibilidade de incidência de erros nas medições é muito pequena. Além disso, os
profissionais que executam os trabalhos de campo e de interpretação de imagens de satélite
são devidamente treinados e habilitados para tantos.
6.3.2. Que as diferenças consideráveis referem-se às pastagens e área gradeada. Constam os
seguintes valores:
- pastagens: 162,3235 (autor) e 462,8741 (INCRA)
- área gradeada: 283,3289 (autor) e 0 (INCRA).
Ocorre que i relatório agronômico juntado pelo autor data de 16/10/2007 (fl. 345), ou seja, foi
elaborado após o período de vistoria (setembro/2006 a agosto/2007). Desse modo, prevalece o
laudo do INCRA, já que a gradeação, pelo que se nota, ocorreu após a fiscalização, tornando-a,
por lei (n. 8.629/93, artigo 2º, §4ª), passível de ser desconsiderada.
7. Também afirma o autor que, em parte da terra, havia sido plantado lavoura de milho e que
não foi computada pelo INCRA. Alega que, em dezembro/2006, foram vendidos 108.000kg de
milho. Apresenta como provas as notas fiscais de fls. 480/483.
A argumentação, a princípio, é frágil, já que o fato de ter sido vendido o milho em dezembro,
não comprova a sua produção naquele mês, nem no ano considerado para a vistoria. Além do
mais, não se mostra crível tal argumentação, conforme afirma o INCRA, "devido às condições
técnicas, não é possível a colheita do milho no mês de dezembro".
8. Segue-se, ainda, que inexiste qualquer contradição no levantamento das áreas de cana de
açúcar. A área de 25,024 hectares plantada no ano que antecedeu a comunicação foi
efetivamente considerada, segundo o Manual de Obtenção de Terras do MDA/INCRA,
aprovado pela Norma de Execução INCRA/DT/N.52, de 25.10.2006.
No entanto, o plantio recente, verificado em cerca de 50 hectares do imóvel não é atribuível ao
ano considerado, nos termos do §4º do art. 2º da Lei nº 8.629/93 supratranscrito.
Nesse sentido, bem explicitou o D. Procurador Federal em suas alegações finais:
"A consideração da produtividade do ano é medida de equilíbrio para garantir o produtor
diligente, justamente por espelhar a evolução da produtividade do imóvel em ciclo maior,
dificultando na utilização de expedientes de última hora no sentido de 'mascarar' a

improdutividade do imóvel. Foi neste exato sentido que a produção de milho cuja existência é
alegada pela Autora, não foi considerada. As notas fiscais apresentadas pela proprietária
evidenciam, com vista o ciclo de produção do cereal, que essa se deu fora do ano de
referencia, não trazendo, todavia, em sentido contrário, qualquer prova da data do plantio. Com
relação às áreas de proteção não há, tampouco, qualquer contradição. O Laudo Agronômico de
Fiscalização informa que o imóvel possui 9.1793ha de área de preservação, sendo que
7,5790ha estão sendo efetivamente preservados. Portanto, como de rigor, conclui que 1,6003ha
não estão sendo preservados em função de pastagens e exploração pecuária" (fl. 924)." (fls.
946-vº/948-vº).

É relevante destacar que, para que seja aferida a produtividade do imóvel, devem ser
consideradas as condições da vistoria no momento da fiscalização empreendida pelo INCRA,
sendo irrelevantes modificações posteriores, as quais não têm o condão de afastar os requisitos
fáticos e jurídicos de validade do Relatório Agronômico de Fiscalização. Nesse sentido:
APELAÇÃO. AÇÃO ANULATÓRIA. MATÉRIA PRELIMINAR. COISA JULGADA MATERIAL.
ÁREA DO IMÓVEL. PROPRIEDADE RURAL QUE NÃO CUMPRE SUA FUNÇÃO SOCIAL.
MOMENTO EM QUE REALIZADA A VISTORIA. TEMPO DE CULTIVO CONSIDERADO DE
FORMA PROPORCIONAL. DEGRADAÇÃO AMBIENTAL. CORREÇÃO DO VALOR DA
CAUSA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ.
1. No presente recurso aplicar-se-á o CPC/73.
2. Preliminar de cerceamento de defesa rejeitada.
3. Algumas das questões suscitadas nesta ação já foram objeto de apreciação, no seu mérito,
pelo STF (MS nº 24.486), estando acobertadas pela coisa julgada material.
4. O juízo de 1ª instância fixou a área total do imóvel em 935,9314 hectares, conforme apuração
feita pelo perito judicial. Os ora apelantes concordaram com a conclusão do perito, tornando
incontroversa a questão.
5. A sentença estabeleceu o GUT (grau de utilização da terra) em 99,75%, acima, portanto, do
percentual exigido por lei, que é de 80%, e o GEE (grau de eficiência na exploração) em
91,42%, abaixo do mínimo legal. Daí se conclui que a Fazenda Floresta não cumpria sua
função social.
6. Na aferição da produtividade devem ser levadas em conta as condições do imóvel no
momento da vistoria levada a efeito pelo INCRA, tendo em vista a possibilidade de alterações
posteriores no local.
7. Mesmo considerando todas as áreas (cana-de-açúcar, sementes e pastagens) como
efetivamente utilizadas, o imóvel permanece qualificado como grande propriedade rural
improdutiva.
8. Tanto o plantio da cana-de-açúcar quanto a produção de sementes não abrangeu todo o
período considerado na vistoria feita pelo INCRA, de sorte que é plenamente justificável o
cômputo proporcional ao tempo de efetiva utilização.
9. O Relatório Agronômico de Fiscalização (RAF) foi categórico ao reconhecer o
descumprimento da legislação ambiental, decorrente da existência de pasto em áreas de
preservação permanente.

10. Perfeitamente possível a correção do valor da causa realizada, de ofício, pelo juiz, diante da
evidente discrepância entre o valor indicado na petição inicial e o benefício econômico
postulado pelos autores. Nesse diapasão, mantida a condenação em honorários advocatícios.
11. A configuração da litigância de má-fé exige a demonstração de dolo específico,
circunstância não vislumbrada na espécie.
12. Apelação dos autores parcialmente provida apenas para afastar a condenação por litigância
de má-fé.
(TRF-3, AC 0000344-66.2003.4.03.6107/SP, Rel. Des. Fed. Nino Toldo, Décima Primeira
Turma, DJ 08/05/2017) - g.n.
IMÓVEL RURAL "FAZENDA SANTA AVÓIA - GLEBA N.º 2". APELAÇÃO. REEXAME
NECESSÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE PRODUTIVIDADE. POSSIBILIDADE. GEE.
DIVERGÊNCIA. APURAÇÃO NO MOMENTO DA VISTORIA DO INCRA. CÁLCULOS PARA O
ANO DE 1997. PREPONDERÂNCIA DA REGULAMENTAÇÃO DO INCRA. RESERVA LEGAL
NÃO AVERBADA. CONSIDERAÇÃO DA ÁREA NO CÁLCULO. IMPRODUTIVIDADE. IMÓVEL
PASSÍVEL DE DESAPROPRIAÇÃO PARA REFORMA AGRÁRIA.
(...)
4.2. Havendo a possibilidade de se aferir a produtividade do bem na época em que avaliado
administrativamente pelo INCRA, tal valor deve prevalecer para fins de sujeição à
desapropriação. Se não se leva em consideração na realização da perícia judicial também o
marco temporal utilizado na realização da perícia administrativa, há dificuldades, inclusive, de
se avaliar a adequação da Administração Pública ao comando de apenas submeter a
procedimento de desapropriação a propriedade improdutiva (CF, art. 185, II).
4.3. Deveras, toda e qualquer propriedade deve cumprir sua função social continuamente, nos
termos do art. 184 da Constituição e do art. 9º da Lei 8.629/93, sujeitando-se às vistorias da
entidade competente (especificamente o INCRA) para aferir o cumprimento desse dever de
hierarquia constitucional.
4.4. Constatada a improdutividade do imóvel no momento em que é vistoriado pelo INCRA, o
imóvel passa a sujeitar-se ao procedimento de desapropriação para fins de reforma agrária, que
pode ser anulado - uma vez provado erro, dolo ou equívoco/vício de qualquer natureza - se no
momento da vistoria o imóvel auferia a condição de produtivo. Improdutivo o imóvel à época da
vistoria, o procedimento expropriatório transcorrerá validamente, produzindo todos os efeitos
legais. De modo que eventual produtividade posterior do imóvel não terá o condão de afastar os
requisitos fáticos e jurídicos de validade ao decreto de declaração de interesse social, por
exemplo.
4.5. Posicionamento diferente pode ser adotado apenas excepcionalmente, quando, por razões
fáticas, não for possível saber com algum grau de precisão qual a produtividade do imóvel no
momento em que foi vistoriado administrativamente pelo expropriante. Esta não é a hipótese
dos autos.
4.6. Conclusão diversa acabaria por contrariar princípios autorizadores da desapropriação,
afrontando inclusive a isonomia. Com efeito, os proprietários com maiores condições
econômicas passariam a ter chances maiores de não se sujeitarem a reforma agrária,
alterando, temporariamente (durante o período de processamento da ação declaratória de

produtividade, por exemplo), as condições reais do local pelo simples arrendamento de
rebanhos ou pela instalação de culturas agrícolas, de modo a que perícia posterior constatasse
(naquele momento) o uso mínimo da terra previsto em lei. Precedentes desta aE. Corte.
(...)
(TRF-3, APEL/REEX 1395421 - 0010593-39.1999.4.03.6100, Rel. Des. Fed. José Lunardelli,
Primeira Turma, julgado em 10/12/2013, e-DJF3 Judicial 1: 15/01/2014) - g.n.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE PRODUTIVIDADE DE IMÓVEL RURAL, ANTES RECONHECIDO -
EM PROCESSO ADMINISTRATIVO DO INCRA - COMO IMPRODUTIVO PARA FINS DE
REFORMA AGRÁRIA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. MATÉRIAS PRELIMINARES
LEVANTADAS NA APELAÇÃO DO AUTOR (SUPERVENIENTE CADUCIDADE DO DECRETO
EXPROPRIATÓRIO; CERCEAMENTO DE DEFESA DIANTE DA NÃO REALIZAÇÃO DE
AUDIÊNCIAS E FALTA DE MOTIVAÇÃO DA SENTENÇA) AFASTADAS. PERÍCIA JUDICIAL
PARA AFERIÇÃO DE PRODUTIVIDADE DE IMÓVEL RURAL DEVE LEVAR EM CONTA A
MESMA ÉPOCA EM QUE O INCRA REALIZOU A SUA VISTORIA. ILEGALIDADE DA
POSTERIOR ALTERAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE APROVEITAMENTO DO IMÓVEL, FEITA
PELO DONO DA "FAZENDA COLÔMBIA", POR OFENSA AO § 4º DO ARTIGO 2º DA LEI Nº
8.629/93. RECURSO IMPROVIDO.
1. O Instituto Nacional de Reforma Agrária - INCRA com base em "Vistoria de Levantamento
Preliminar de Dados e Avaliação" efetuada em 25 de setembro de 1998, expediu ofício datado
de 09 de outubro de 1998 comunicando ao proprietário que "o imóvel foi reclassificado de
produtivo para imóvel que não atingiu o índice previsto no parágrafo 1º do artigo 6º da Lei nº
8.629 de 25 de fevereiro de 1993, alterada pela Medida Provisória nº 1577, de 11 de junho de
1998". Para essa reclassificação o levantamento do INCRA levou em consideração o ano civil
de 1997. Em 18 de novembro de 1999 foi expedido Decreto de lavra do Sr. Vice-Presidente da
República no qual declarou o interesse social, para fins de reforma agrária do referido imóvel
rural, nos termos dos arts. 18, letras "a", "b", "c" e "d" e 20, inciso VI, da Lei nº 4.504, de 30 de
novembro de 1964, e 2º da Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993.
2. Ação declaratória ajuizada com o escopo de ser declarado que o imóvel rural denominado
"Fazenda Colômbia/Fazenda Água Fria", é produtivo, afirmando a parte autora que o mesmo
não poderia ser desapropriado por interesse social para fins de reforma agrária, já que
iniludivelmente se trata de imóvel insuscetível dessa constrição.
(...)
10. Vistoria do INCRA realizada com base no ano civil de 1997, afirmando tratar-se de imóvel
improdutivo; laudo do perito judicial que qualificou a mesma área rural como "totalmente
produtiva", conforme dados coletados em vistoria feita nos meses de julho e agosto de 2001.
Prova testemunhal reveladora de que o proprietário atuou significativamente para alteração das
condições de aproveitamento da fazenda depois que o INCRA a classificou como improdutiva.
11. A aferição da produtividade do imóvel tem que guardar correlação com a data em que foi
feita a vistoria pelo INCRA, pois foi naquele momento que a "Fazenda Colômbia" foi
considerada improdutiva, ou seja, não enquadrada nos índices de produtividade exigidos pela
legislação vigente. Se na época em que foi feita a "Vistoria de Levantamento Preliminar de
Dados e Avaliação" pelos técnicos do INCRA (1997) foi constatado que o imóvel não cumpria a

sua função social, amoldando-se ao comando do artigo 184 da Constituição Federal (grande
propriedade improdutiva), a aferição feita pelo perito judicial vários anos depois (2001) não é
suficiente para fazer com que se despreze a prova técnica elaborada pela Autarquia Federal,
até porque admiti-lo seria contrariar o texto expresso da lei.
12. Tem-se em demérito do pleito inicial a conduta posterior do proprietário da área, que inovou
as condições de exploração do imóvel após a vistoria desfavorável feita pelo INCRA nos termos
do §4º do artigo 2º da Lei nº 8.629/93. Somente o imóvel que já era produtivo ao tempo da
perícia administrativa é que fica imune a expropriação-sanção; aquele que é "transformado" em
produtivo anos depois, permanece sujeito aos rigores da reforma agrária.
13. Matéria preliminar repelida; apelação improvida.
(TRF-3, AC 00149782419994036102, Des. Fed. Johonsom Di Salvo, TRF3 - Primeira Turma, e-
DJF3 Judicial 1: 10/06/2011, p. 296) - g.n.
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO - PRELIMINARES DE NULIDADE DA SENTENÇA
E NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO DE APELAÇÃO REJEITADAS - DESAPROPRIAÇÃO
- REFORMA AGRÁRIA - ÁREA DE RESERVA LEGAL NÃO AVERBADA ANTES DA VISTORIA
DO IMÓVEL PELO INCRA - ART. 2º, § 4º, DA LEI Nº 8.629/1993 (PRECEDENTES DO STF E
DO STJ) - LAUDO PERICIAL QUE NÃO GUARDA CORRELAÇÃO COM O PERÍODO EM QUE
FOI EFETIVADA A VISTORIA PELA AUTARQUIA FEDERAL - INVERSÃO DO ÔNUS DA
SUCUMBÊNCIA - MATÉRIA PRELIMINAR REJEITADA E, NO MÉRITO, APELAÇÃO E
REMESSA OFICIAL, TIDA POR OCORRIDA, PROVIDAS.
(...) 3. O laudo pericial oficial não pode ser utilizado para classificar a propriedade como
produtiva, pois não guarda correlação com o período em que foi efetivada a vistoria pelo
INCRA. (...)
7. Matéria preliminar rejeitada, apelo e remessa oficial, tida por ocorrida, providos.
(TRF-3, AC 00105942419994036100, Des. Fed. Johonsom Di Salvo, Primeira Turma, e-DJF3
Judicial 1: 08/10/2012) - g.n.

(iv) aspectos ambientais
Por fim, no que se refere ao cumprimento da legislação ambiental, foi apurado o não
cumprimento da área exigida de preservação ambiental e a ausência de averbação destas
áreas na matrícula, além da existência de erosão em sulcos, em áreas de pastagens, com duas
grandes áreas com erosão em voçoroca, diante da ausência de práticas conservacionistas (fl.
129).
A esse respeito, bem apontou o representante do Ministério Público Federal em 1º grau:

"Dessa forma, patente a magnitude da ofensa ao meio ambiente que o fato representa - além
de típico, em tese, como crime; portanto, mesmo que o LAF fosse nulo, o pedido da autora não
seria apto a impedir a desapropriação, porque o imóvel só cumpre a sua função social, se, além
de ser produtivo, respeitar o meio ambiente" (fl. 933).

Por fim, apenas para reforçar todos os argumentos expostos nesse voto, confira-se o seguinte
precedente desta E. Primeira Turma:


ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO E REMESSA NECESSÁRIA. AÇÃO
DECLARATÓRIA DE PRODUTIVIDADE DE IMÓVEL RURAL. VISTORIA ADMINISTRATIVA.
RELATÓRIO AGRONÔMICO DE FISCALIZAÇÃO. CÁLCULO DE ÍNDICES DE
PRODUTIVIDADE. PERÍCIA JUDICIAL. DIVERGÊNCIA. APURAÇÃO NO MOMENTO DA
VISTORIA DO INCRA. CÁLCULOS PARA O ANO DE 2006. PREPONDERÂNCIA DA
REGULAMENTAÇÃO DO INCRA. IMPRODUTIVIDADE. DESCUMPRIMENTO DA FUNÇÃO
SOCIAL DA PROPRIEDADE RURAL. IMÓVEL PASSÍVEL DE DESAPROPRIAÇÃO PARA
REFORMA AGRÁRIA. APELAÇÃO E REMESSA NECESSÁRIA PROVIDAS. 1. O direito de
propriedade está condicionado ao cumprimento de uma função social, a qual, enquanto
princípio norteador da ordem econômica (art. 170, inc. III, da Constituição da República), impõe
ao proprietário o dever jurídico-social de cultivar e explorar adequadamente o imóvel, observado
o respeito aos direitos trabalhistas e ambientais, em consonância com os ditames
constitucionais, sob pena de ser submetido à sanção de desapropriação por interesse social.
Precedentes. 2. Em sede de regulamentação infraconstitucional, dispõe a Lei 8.629/93 que,
para fins de execução da desapropriação por interesse social, fica a União, através do órgão
federal competente, autorizada a ingressar no imóvel de propriedade particular para
levantamento de dados e informações, mediante prévia comunicação escrita ao proprietário,
preposto ou seu representante (art. 2º, § 2º). A vistoria possui como finalidade a aferição do
caráter produtivo da propriedade, em face dos graus e critérios estabelecidos pelo referido
diploma normativo (artigos 6º e 9º). 3. A vistoria agronômica levada a efeito pelo INCRA
consubstancia-se em atividade administrativa vinculada, decorrente dos juízos de conveniência
e oportunidade peculiares à Administração, visando à concretização dos objetivos
constitucionais que norteiam sua atividade. Nesse contexto, cabe ao Judiciário somente o
exame de legalidade e legitimidade do ato administrativo, bem como a verificação da
obediência às formalidades essenciais e aos limites legais. 4. O INCRA, no âmbito do
procedimento administrativo nº 54190.004889/2006-37, procedeu, em 20/11/2006, à notificação
dos Recorridos acerca da realização de vistoria administrativa nos imóveis rurais denominados
Fazendas "Tangará II" e "Santa Lúcia", localizados no município de Agudos/SP. Os agentes da
Autarquia compareceram ao local no período compreendido entre 5 e 20 de novembro de 2006,
durante o qual produziram Relatório Agronômico de Fiscalização (RAF), que concluiu pelo
caráter improdutivo dos imóveis, com referência ao período de novembro de 2005 a outubro de
2006, classificando-os como grandes propriedades improdutivas. 5. As provas técnicas
apresentadas nos autos apresentam divergências substanciais acerca da conclusão extraída da
matéria analisada, razão pela qual impõe-se ao magistrado a apreciação dos fundamentos
expendidos em cada um dos laudos periciais, de modo a subsidiar a adoção, a partir de
ponderações de ordem técnica, da conclusão conduzida pela linha de entendimento sustentada
por um dos pareceres. A partir da análise das considerações técnicas expendidas nos laudos
de avaliação apresentados, verifica-se a existência de fundamentos suficientes a amparar o
acolhimento das conclusões do parecer divergente elaborado pela Autarquia Ré, em detrimento
daquelas sustentadas no laudo judicial. 6. A Autarquia, em sua vistoria, realizou a apuração do
efetivo pecuário da propriedade mês a mês, com base nos dados constantes da ficha de

registro de vacinações, apurando, assim, o efetivo pecuário mensal constatado no período de
novembro de 2005 a outubro de 2006, acompanhado do cálculo da média respectiva. Os
parâmetros adotados pelo INCRA para realização do cálculo seguem o método estabelecido
pelo Manual de Obtenção de Terras e Perícia Judicial (aprovado pela Norma de Execução
INCRA/DT nº 52, de 25 de outubro de 2006). O laudo judicial, por sua vez, apresentou cálculo
do efetivo pecuário apurado, notadamente, com base em notas de venda. O perito judicial
explanou que não foram utilizadas as fichas de vacinação do período em questão, por não
haverem sido disponibilizadas pelo proprietário. 7. Cumpre ao proprietário a guarda e a
disponibilização de documentos que comprovem a adequada exploração econômica, cabendo-
lhe manter atualizada a documentação relativa aos seus imóveis, de modo a espelhar a real
situação de aproveitamento e exploração da terra. Precedentes. 8. O laudo judicial indica que,
em 27/12/2005, foi firmado um contrato de parceria agrícola entre as propriedades Fazenda
Tangará II e Fazenda Santa Lúcia com a Companhia Agrícola Zillo Lorenzetti, para exploração
da cultura de cana de açúcar, tendo o contrato iniciado em 1º/1/2006, sendo que, a partir de
março de 2006, teria sido implantado o cultivo da cultura de cana de açúcar, havendo, em tal
período, sido realizada a retirada do gado para introdução da lavoura. 9. Dispõe o § 7º do art. 6º
da Lei 8.629/93 que não perderá a qualificação de propriedade produtiva o imóvel que, por
razões de "renovação de pastagens tecnicamente conduzida, devidamente comprovados pelo
órgão competente, deixar de apresentar, no ano respectivo, os graus de eficiência na
exploração, exigidos para a espécie". Estabelece o art. 7º, do mesmo diploma legal, não ser
passível de desapropriação, para fins de reforma agrária, o imóvel que comprove estar sendo
objeto de implantação de projeto técnico, devendo tal projeto, para tanto, ser aprovado pelo
órgão federal competente, na forma estabelecida em regulamento, no mínimo seis meses antes
da comunicação relativa à vistoria de fiscalização agronômica. 10. A alegação de que o imóvel
encontrava-se em processo de implantação de nova cultura, desprovida da prova documental
pertinente, não constitui fundamento hábil a afastar, por si, a conclusão acerca do caráter
improdutivo da propriedade, fundamentadamente exarada pela autoridade competente no
âmbito do ato administrativo de vistoria de fiscalização agronômica. Precedentes. 11. No que
concerne ao cálculo dos índices de produtividade do imóvel, verifica-se que o INCRA
apresentou parecer calcado em razões suficientemente comprovadas pelos elementos coligidos
nos autos, encontrando-se a apuração sustentada pela Autarquia robustecida por detalhada
planilha de cálculo, no qual encontram-se discriminados os elementos considerados na análise
efetuada. 12. Durante a vistoria realizada pelo INCRA, constatou-se a utilização indevida de
área de preservação permanente por meio de exploração pecuária, razão pela qual reduziu-se
do cálculo do efetivo pecuário o numerário relativo às unidades animais correspondentes à área
de ocupação indevida. O método adotado pela Autarquia coaduna-se com a orientação
administrativa assentada na Instrução Normativa/INCRA nº 11/2003, a qual, por sua vez,
mostra-se consentânea com os preceitos estabelecidos pela Lei 8.629/93 (art. 6º, § 3º, inc. II; e
art. 10, inc. IV). Precedentes. 13. No que se refere ao cumprimento da legislação ambiental, a
fiscalização agronômica constatou que a área total de mata preservada (cerrado e mata
atlântica) somava cerca de 54 ha., sendo, portanto, muito inferior ao mínimo legal de 20% da
área do imóvel (art. 16, § 2º, da Lei 4.771/65; e art. 12, inc. II, da Lei 12.651/2012). Tal

constatação indica o descumprimento da função social da propriedade rural, ante a
inobservância do comando legal de utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e
preservação do meio ambiente (art. 9º, inc. II, da Lei 8.629/93). 14. No que tange à verificação
das condições do imóvel em relação à observância da legislação ambiental, inexiste, no laudo
judicial, análise técnica de dados correspondentes ao período da fiscalização agronômica
impugnada, razão pela qual a referida perícia não traz, nesse ponto, conclusões hábeis a
subsidiar a pretensão autoral. 15. Para o fim de aferição de produtividade do imóvel, devem ser
consideradas as condições da vistoria no momento da fiscalização empreendida pelo INCRA,
sendo irrelevantes modificações posteriores, as quais não têm o condão de afastar os requisitos
fáticos e jurídicos de validade do Relatório Agronômico de Fiscalização. Precedentes. 16. Em
relação aos encargos de sucumbência, tratando-se de recurso interposto contra decisão
publicada anteriormente a 18/03/2016, não é possível o arbitramento de honorários
sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do CPC/2015 (Enunciado Administrativo nº
7/STJ e REsp 1.465.535/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, j. 21/6/2016, DJe
22/8/2016). 17. Em observância ao princípio da causalidade, impõe-se à parte autora o
pagamento de honorários advocatícios de sucumbência, arbitrados em 15% (quinze por cento)
do valor atribuído à causa. 18. Dado provimento à remessa necessária e ao recurso de
apelação interposto pelo INCRA, para julgar improcedente a pretensão autoral.
(ApelRemNec 0011526-07.2007.4.03.6108, DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO
NOGUEIRA, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/05/2019.)

Em vista de todas as razões expostas, deve ser mantida a sentença.

Dos honorários recursais
Interposto o recurso sob a égide do CPC/1973, deixo de aplicar o artigo 85 do Novo Código de
Processo Civil, porquanto a parte não pode ser surpreendida com a imposição de condenação
não prevista no momento em que recorreu, sob pena de afronta ao princípio da segurança
jurídica.
Ressalte-se, ainda, que, nos termos do Enunciado Administrativo nº 7, elaborado pelo Superior
Tribunal de Justiça para orientar a comunidade jurídica acerca da questão do direito
intertemporal, tratando-se de recurso interposto contra decisão publicada anteriormente a
18/03/2016, não é possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do
artigo 85, § 11, do CPC/2015:

Enunciado administrativo número 7: Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada
a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais
recursais, na forma do artigo 85, § 11, do novo CPC.

Dispositivo
Ante o exposto, nego provimento à apelação da autora.
É como voto.










E M E N T A

DIREITO CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. AÇÃO
DECLARATÓRIA DE PRODUTIVIDADE DE IMÓVEL. PRECLUSÃO DA FACULDADE
PROCESSUAL DE PRODUZIR PROVA PERICIAL. PROVA TESTEMUNHAL. INIDONEIDADE
PARA ALTERAR A CONVICÇÃO DO JUÍZO. QUESTÃO TÉCNICA A DEMANDAR A ANÁLISE
DE DADOS PRÓPRIOS. DESNECESSIDADE DE DEPOIMENTOS. PRINCÍPIO DO LIVRE
CONVENCIMENTO MOTIVADODO MAGISTRADO. DIREITO DE PROPRIEDADE. CARÁTER
NÃO ABSOLUTO. OBRIGATORIEDADE DE OBSERVAR A FUNÇÃO SOCIAL DA
PROPRIEDADE (ART. 5º, XXIII, DA CF/1988). VISTORIA ADMINISTRATIVA DO INCRA QUE
APURA ÍNDICES DE PRODUTIVIDADE INSUFICIENTES PARA A MANUTENÇÃO DA
PROPRIEDADE RURAL (GUT E GEE). FALHAS METODOLÓGICAS. TRANSIÇÃO DE
CULTURAS NÃO COMPUTADAS PARA FINS DE AFERIÇÃO DA PRODUTIVIDADE DO
IMÓVEL. LAUDO FIRMADO POR PROFISSIONAL COMPETENTE (ENGENHEIRO
AGRÔNOMO) ATESTANDO A INTENÇÃO DE SE IMPLANTAR UMA CULTURA DE CANA-DE-
AÇÚCAR. PRECEDENTES DESTA CORTE REGIONAL. CONDENAÇÃO DA AUTARQUIA
AGRÁRIA EM VERBA HONORÁRIA. SENTENÇA PROFERIDA SOB A ÉGIDE DO CPC/1973.
INCIDÊNCIA DOS PARÂMETROS DA REVOGADA LEGISLAÇÃO PROCESSUAL CIVIL (ART.
20, PARÁGRAFOS 3º E 4º). JULGAMENTO NÃO UNÂNIME. SUBMISSÃO AO ART. 942 DO
CPC/2015. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
1. O presente feito corresponde a um recurso de apelação interposto por sociedade empresária
em face de sentença que, nos autos da ação declaratória de produtividade por si ajuizada,
julgou improcedente o pedido formulado, resolvendo o mérito com fulcro no então vigente art.
269, inc. I, do CPC/1973.
2. A sociedade empresária alega, em preliminar recursal, o cerceamento de defesa, ao
argumento de que tanto a decisão que fixou os honorários periciais quanto a decisão que julgou
preclusa a prova pericial foram alvo de agravos de instrumento, sendo certo que nos dois
recursos esta Egrégia Corte Regional não teria se manifestado definitivamente acerca da
questão. Por isso, entende que o juízo de primeiro grau não poderia ter sentenciado o feito,
antecipando-se sobre a pertinência ou impertinência de se produzir a prova pericial, alegando a
violação ao duplo grau de jurisdição.
3. Teceu considerações acerca da justa causa para não arcar com os honorários periciais,
fixados em montante que, no seu entender, impedem o acesso à justiça, e sobre a necessidade

de se produzir prova oral. Para além da preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de
defesa, a apelante aduziu questões relacionadas ao mérito da demanda, tais como a
classificação fundiária do imóvel como média propriedade produtiva; a inconsistência dos dados
constantes do laudo agronômico de fiscalização elaborado pelo INCRA; a existência de efetivo
pecuário e produção agrícola em patamares distintos dos apontados pela autarquia; e a
modificação da exploração econômica do imóvel que importaria na preservação de sua
qualificação como propriedade produtiva, conforme norma contida no art. 6º, §7º, da Lei n.
8.629/1993.
4. É certo que a parte apelante, quando do deferimento da prova pericial na instância de
origem, interpôs agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo. Todavia, o pedido de
efeito suspensivo foi rejeitado pelo Relator do agravo de instrumento. A decisão de rejeição do
pedido de efeito suspensivo ao agravo de instrumento foi proferida em 18.10.2017, quando,
então, a parte agravante-autora deveria recolher os honorários periciais que foram arbitrados
pelo juízo de primeira instância. O comando judicial, contudo, não foi atendido pela autora,
mesmo diante do indeferimento do pedido de efeito suspensivo ao agravo de instrumento
interposto, com o que a faculdade processual em referência de fato se tornou preclusa.
5. Ao autor competia comprovar o fato constitutivo de seu direito, nos termos do art. 373, inc. I,
do CPC/2015, mediante perícia judicial que demonstrasse a alegada produtividade do imóvel.
Para tanto, se fazia necessário recolher os honorários periciais fixados pelo juízo de primeiro
grau, mantidos em caráter provisório por esta Corte Regional quando do enfrentamento do
pedido de efeito suspensivo no agravo de instrumento. Vale dizer: não havia justificativa para
que o autor deixasse de pagar os honorários periciais, quando o pleito pelo seu afastamento
havia sido rejeitado também pelo Tribunal ad quem, ainda que em sede de provimento liminar.
6. Note-se, aliás, que a decisão que indeferiu o pedido de efeito suspensivo ao agravo de
instrumento interposto já foi confirmada pelo Colegiado desta Egrégia Primeira Turma, em
sessão realizada em 20.03.2018, pelo que a alegação de que pendia discussão em grau
recursal acerca da temática em apreço cai por terra. De mais a mais, também não merece
prosperar o argumento preliminar na linha de que o juízo de primeiro grau não poderia ter
indeferido a produção de prova testemunhal.
7. Pela sistemática processual vigente, o juiz está autorizado a julgar a demanda que lhe for
apresentada de acordo com o seu livre convencimento, apreciando e valorando as provas
produzidas pelas partes, assim como indeferindo as provas impertinentes, desde que motive a
decisão proferida, sob pena de nulidade, nos termos dos art. 93, inc. IX, da CF/1988. Cuida-se
do que a doutrina e jurisprudência pátrias convencionaram denominar de "princípio do livre
convencimento motivado do juiz". Em função do princípio processual do livre convencimento
motivado, ao juiz abre-se, inclusive, a possibilidade de julgar a demanda no estado em que ela
se encontrar, quando compreender que as provas carreadas são suficientes ao seu pronto
desfecho.
8. No caso dos autos, não há que se cogitar de qualquer nulidade, na medida em que o
convencimento do magistrado não seria alterado pelo depoimento de testemunhas, mesmo que
apresentados em conformidade com as alegações da parte autora. O tema em debate assume
natureza eminentemente técnica, não dependendo da oitiva de testemunhas para o seu

deslinde. Portanto, andou bem o juízo a quo em sentenciar desde logo a demanda,
independentemente da produção de prova testemunhal, em prestígio, aliás, de uma celeridade
processual que igualmente se impõe na espécie.
9. A CF/1988 garante o direito à propriedade como uma das prerrogativas fundamentais do
indivíduo (artigo 5º, XXII). Como todo direito fundamental, contudo, a propriedade deve ser
exercitada de acordo com outros princípios constitucionais, não assumindo, destarte, um
caráter absoluto. Nesse sentido, cumpre salientar, desde logo, que o exercício do mencionado
direito fundamental está condicionado ao atendimento de sua função social, conforme dispõe o
art. 5º, XXIII.
10. Disciplinando o assunto em mais detalhes, o art. 184 da Constituição da República coloca
como opção do Poder Público desapropriar imóveis por interesse social para fins de reforma
agrária, quando o imóvel rural não estiver cumprindo a sua função social, mediante prévia e
justa indenização em títulos da dívida agrária (as benfeitorias úteis e necessárias são
indenizadas em dinheiro).
11. Uma propriedade rural atende a sua função social quando preenche de forma cumulativa os
requisitos a que alude o art. 186 da Constituição da República, ou seja, quando, segundo
critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, apresenta aproveitamento racional e
adequado, conta com a utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do
meio ambiente, observa as disposições que regulam as relações de trabalho e é explorada de
forma que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores. No plano
infraconstitucional, a questão é disciplinada pela Lei n. 8.629/1993.
12. Dita norma legal estatuí que, na aferição da produtividade, o INCRA pode ingressar no
imóvel de propriedade particular para levantamento de dados e informações, mediante prévia
comunicação escrita ao proprietário, preposto ou seu representante (art. 2º, §2º). Na vistoria
administrativa, a autarquia analisa o preenchimento dos requisitos técnicos para concluir pela
produtividade ou improdutividade da área particular, perquirindo o GUT e o GEE. De se notar
que a legislação de regência impede que o particular introduza mudanças quanto ao domínio, a
dimensão e as condições de uso do imóvel dentro do prazo de seis meses após a data da
comunicação para levantamento de dados e informações encaminhada pelo INCRA (art. 2º,
§4º). Contudo, quando se está diante de comprovada implantação de projeto técnico, o imóvel
não poderá ser alvo de desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária, à luz
do que preceitua o art. 7º.
13. No caso em apreço, muito embora a produtividade não tenha sido apurada por intermédio
da competente prova pericial, diante da inércia da recorrente que tornou preclusa essa
faculdade processual, ainda se tem por viável aferir tal dado a partir dos demais documentos
que foram carreados aos autos quando da propositura da demanda.
14. A legislação de regência conclama o proprietário a apresentar um projeto técnico para que
se possibilite a transição de culturas sem o risco de o imóvel ser considerado improdutivo,
consoante se percebe do art. 7º da Lei n. 8.629/1993. Tal projeto técnico deve preencher uma
série de exigências colocadas pela norma infraconstitucional, em especial a de ser elaborado e
subscrito por profissional legalmente habilitado e identificado, consubstanciando trabalho de
envergadura considerável, porquanto especificará como se implantará a nova cultura na

propriedade particular.
15. A vistoria administrativa do INCRA foi realizada entre 18.09.2007 a 20.09.2007. De outro
giro, o Projeto de Investimento e Exploração Agrícola com a Cultura de Cana-de-Açúcar foi
apresentado ao órgão competente em 15.10.2007. Entre a realização da vistoria administrativa
sobre o imóvel e a apresentação do projeto técnico, portanto, não chegou a transcorrer nem um
mês. Levando em consideração, porém, que o projeto técnico subscrito pelo engenheiro
agrônomo é de patente complexidade, demandando a atuação técnica de profissional habilitado
para tanto, pode-se presumir, com segurança, que a proprietária do imóvel já estava
promovendo a transição de culturas mesmo antes da vistoria administrativa, porque não seria
viável cogitar da elaboração e da apresentação ao órgão competente de um projeto técnico de
tamanha envergadura no pouquíssimo tempo que se seguiu à realização da vistoria
administrativa do INCRA.
16. O próprio INCRA admite, em seu laudo de vistoria, que o proprietário preparava a área para
a implantação de cultura de cana-de-açúcar. No entanto, quando da efetiva apuração do GUT e
do GEE, o perito administrativo assentou que a propriedade não cumpria a sua função social,
deixando de tomar em conta a implantação da cultura de cana-de-açúcar que havia sido
noticiada no próprio laudo. O perito da autarquia partiu da premissa de que apenas 25,1024 ha
compreendiam área plantada com cana-de-açúcar, mesmo diante da transição que ocorria em
grande extensão da propriedade, o que o levou a chegar aos equivocados percentuais de
100,00% para o GUT e somente 71,79% para o GEE.
17. Entretanto, a apuração do GEE não poderia partir apenas da área efetivamente plantada
com cana-de-açúcar, quando o próprio laudo de vistoria reconhecia a circunstância de que uma
considerável porção do restante da propriedade estava sendo preparada para a implantação da
mesma cultura de cana-de-açúcar. Por outras palavras, impunha-se a consideração da área
que estava sendo preparada para o plantio de cana-de-açúcar, mormente em razão do projeto
técnico que estava em curso (TRF 3ª Região, Quinta Turma – 1ª Seção, Apelação Cível
0000020-63.2009.4.03.6108, Rel. Des. Fed. Antonio Cedenho, julgado em 07/04/2014, e-DJF3
Judicial 1 DATA:28/04/2014 ).
18. Ainda que se conclua pelo descabimento do projeto técnico apresentado pela proprietária
ao órgão competente, percebe-se que se o proprietário passa a cumprir a função social no
curso do procedimento administrativo ou judicial, comprovando cabalmente o preenchimento
dos requisitos de produtividade após a consolidação da transição, tem-se uma situação que
equivale à apresentação de projeto técnico, porquanto a finalidade primordial da Lei n.
8.629/1993 é a de desapropriar por interesse social imóveis reconhecidamente improdutivos, e
não imóveis que se encontrem em momento de transição para introdução de novas culturas.
19. O provimento ao apelo faz surgir, como consectário lógico, a necessidade de se condenar
em verba honorária a parte apelada, cumprindo arbitrar o montante devido a tal título. A
sentença apelada foi proferida em 30.03.2010, o que equivale a dizer que a sentença foi
prolatada na vigência do CPC/1973, razão pela qual se devem tomar as disposições deste
revogado diploma legal no momento de se fixar a verba honorária. O artigo 20, §§ 3º e 4º, do
mencionado diploma legal trazia os critérios para se fixar a verba honorária. Pela disposição
dos preceptivos indicados, o juiz deveria fixar a verba honorária entre o mínimo de 10% e o

máximo de 20% sobre o valor da condenação. O §4º do preceptivo legal, por outro lado,
estatuía que nas causas em que a Fazenda Pública restasse vencida, como a presente
(estamos diante de uma autarquia), os honorários poderiam ser arbitrados por equidade.
20. Tomando-se em conta os comandos aplicáveis à espécie, tem-se que a fixação da verba
honorária em R$ 20.000,00 (vinte mil reais) se revela razoável. A causa revolve tema de notável
complexidade, por cuidar de assunto que demanda a exaustiva análise de documentos que
foram carreados aos autos e o ingresso em questões técnicas. Além disso, o patrono da parte
autora teve de atuar em diferentes ocasiões para que a tese fosse aceita nesta sede recursal,
ajuizando a demanda, interpondo agravo de instrumento e movimentando o apelo, o que
justifica a fixação da verba honorária neste montante. Ora, um dos critérios colocados pela
legislação processual civil para delimitar a quantia devida a título de honorários advocatícios
guarda relação com o zelo do causídico, e esse fator justifica, no caso concreto, a fixação dos
honorários nesse patamar, na medida em que os patronos adotaram todos os expedientes
necessários para que a tese jurídica da autora viesse a ser acolhida em grau recursal.
21. Apelação parcialmente provida para, reformando a sentença recorrida, reconhecer a
classificação do imóvel objeto do litígio enquanto uma "média propriedade produtiva",
condenando o INCRA em honorários sucumbenciais arbitrados no importe de R$ 20.000,00
(vinte mil reais). ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no
julgamento, nos termos do artigo 942 do
Código de Processo Civil, a Primeira Turma, por maioria, deu parcial provimento ao recurso de
apelação interposto, para o fim de reformar a sentença e reconhecer a classificação do imóvel
objeto do litígio enquanto uma "média propriedade produtiva", condenando o INCRA em
honorários sucumbenciais arbitrados no importe de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), nos termos
do voto do senhor Desembargador Federal Wilson Zauhy, acompanhado pelos votos dos
senhores Desembargadores Federais Valdeci dos Santos e Cotrim Guimarães; vencidos os
senhores Desembargadores Federais Helio Nogueira e Carlos Francisco, que lhe negavam
provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.


Resumo Estruturado

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