Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5238873-53.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
07/08/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 13/08/2020
Ementa
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. ÓBITO EM 2017, NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 8.213/91. ESTAGIÁRIA
BOLSISTA. PENSÃO POR MORTE. FILHO ABSOLUTAMENTE INCAPAZ. AUSÊNCIA DE
INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO EM PRIMEIRA INSTÂNCIA. SENTENÇA ANULADA.
- Na seara administrativa a pensão por morte restou indeferido, ao fundamento de que, tendo sido
vertida a última contribuição previdenciária em 10/2004, a qualidade de segurada teria sido
mantida até 15/12/2005, não abrangendo a data do falecimento.
- Sustenta a parte autora que, conquanto sua genitora houvesse sido contratada pela Prefeitura
Municipal de Jaboticabal – SP como estagiária bolsista, no interregno compreendido entre
10/08/2016 e 05/02/2017, houve desvirtuamento do vínculo pela referida municipalidade,
passando a atuar como se empregada fosse, o que implicaria na obrigação de o ente
públicoverter as respectivas contribuições previdenciárias.
- Conforme salientou o Ministério Público Federal em seu parecer, não houve manifestação do
parquet em primeiro grau de jurisdição, conquanto a autora seja menor.
- Observou-se somente a determinação de intimação do Ministério Público, além da certidão de
decurso do prazo, sem que o órgão tivesse declarado ciência ou efetivamente se manifestado, o
que implicou em evidente prejuízo à parte autora.
- A intervenção do órgão ministerial nos casos previstos em lei é obrigatória e não facultativa,
devendo o Ministério Público ser intimado para acompanhar o feito em que deveria intervir, sendo
que a ausência de sua intimação acarreta a nulidade do processo a partir do momento em que o
ato deveria ter sido ultimado. Precedente do Colendo STJ e desta E. Corte.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- Sentença anulada.
- Prejudicada a apelação da parte autora.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5238873-53.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
REPRESENTANTE: REGINALDO AMARO DA SILVA
APELANTE: E. V. S. D. S.
Advogados do(a) REPRESENTANTE: DANIELA NAVARRO WADA - SP259079-N, WILLIAN
DELFINO - SP215488-N
Advogados do(a) APELANTE: DANIELA NAVARRO WADA - SP259079-N, WILLIAN DELFINO -
SP215488-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5238873-53.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
REPRESENTANTE: REGINALDO AMARO DA SILVA
APELANTE: E. V. S. D. S.
Advogados do(a) REPRESENTANTE: DANIELA NAVARRO WADA - SP259079-N, WILLIAN
DELFINO - SP215488-N
Advogados do(a) APELANTE: DANIELA NAVARRO WADA - SP259079-N, WILLIAN DELFINO -
SP215488-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada por E.V.S.S. (incapaz), representada por seu
genitor, em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a
concessão do benefício de pensão por morte, em decorrência do falecimento de sua genitora,
Luciene de Souza, ocorrido em 07 de novembro de 2017.
A r. sentença recorrida julgou improcedente o pedido, ao reputar não comprovada a qualidade de
segurada da de cujus (id 130985592 – p. 1/2).
Em suas razões recursais, pugna a parte autora pela reforma da sentença e procedência do
pedido, ao argumento de que, conquanto a genitora houvesse sido contratada pela Prefeitura
Municipal de Jaboticabal – SP, como estagiária bolsista, no interregno compreendido entre
10/08/2016 e 05/02/2017, passou a atuar como se funcionária fosse, o que implicaria na
obrigação de o ente público efetuar o recolhimento das contribuições previdenciária, de acordo
com o artigo 9º, “h”, do Decreto nº 3.048/99, assegurando-lhe a qualidade de segurada ao tempo
do falecimento (id 130985607 – p. 1/6).
Devidamente processado o recurso, subiram os autos a esta instância para decisão.
Parecer do Ministério Público Federal, em que se manifesta, preliminarmente, pela anulação da r.
sentença, tendo em vista que a ausência de atuação do parquet em primeira grau de jurisdição
resultou em prejuízo da incapaz. No mérito, manifesta-se pelo desprovimento do recurso (id
131917612 – p. 1/5).
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5238873-53.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
REPRESENTANTE: REGINALDO AMARO DA SILVA
APELANTE: E. V. S. D. S.
Advogados do(a) REPRESENTANTE: DANIELA NAVARRO WADA - SP259079-N, WILLIAN
DELFINO - SP215488-N
Advogados do(a) APELANTE: DANIELA NAVARRO WADA - SP259079-N, WILLIAN DELFINO -
SP215488-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais, passo
ao exame da matéria objeto de devolução.
DO CASO DOS AUTOS
Na seara administrativa a pensão por morte restou indeferido, ao fundamento de que, tendo sido
vertida a última contribuição previdenciária em 10/2004, a qualidade de segurada teria sido
mantida até 15/12/2005, não abrangendo a data do falecimento, ocorrido em 07/11/2017 (id
130985558 – p. 28).
Sustenta a parte autora que, conquanto sua genitora houvesse sido contratada pela Prefeitura
Municipal de Jaboticabal – SP como estagiária bolsista, no interregno compreendido entre
10/08/2016 e 05/02/2017, houve desvirtuamento do vínculo pela referida municipalidade,
passando a atuar como se empregada fosse, o que implicaria na obrigação de o ente público
verter as respectivas contribuições previdenciárias, nos moldes preconizados pelo artigo 9º, h, do
Decreto nº 3.048/99, in verbis:
“Art. 9º São segurados obrigatórios da previdência social as seguintes pessoas físicas:
(...)
h) o bolsista e o estagiário que prestam serviços a empresa, em desacordo com a Lei no 11.788,
de 25 de setembro de 2008”.
A postulante se limitou a instruir os autos com cópia do termo de adesão firmado entre a de cujus
e a Prefeitura Municipal de Jaboticabal – SP, em 09 de agosto de 2016 (id 130985548 – p. 1/3).
Por outro lado, conforme salientou o Ministério Público Federal em seu parecer, não houve
manifestação do parquet em primeiro grau de jurisdição, conquanto a autora seja menor
absolutamente incapaz.
Observou-se somente a determinação de intimação do Ministério Público, além da certidão de
decurso do prazo, sem que o órgão tivesse declarado ciência ou efetivamente se manifestado, o
que implicou em evidente prejuízo à parte autora.
A Constituição Federal de 1988, no capítulo dedicado às funções essenciais à Justiça, em seu
art. 127, caput, define:
"O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado,
incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e
individuais indisponíveis". (grifei)
Ressalta, ainda, o Texto Constitucional as funções institucionais do Parquet, abordando-as no art.
129, sendo que o inciso II destaca a essência do Ministério Público na sociedade e a sua
responsabilidade em "zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de
relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas
necessárias a sua garantia".
Como bem ensina o professor Vicente Greco Filho sobre a atividade do Ministério Público no
processo civil: "No processo civil o Ministério Público intervém na defesa de um interesse público,
elemento, aliás, que caracteriza sempre a intervenção desse órgão no cível. Sua atividade tem
sido comumente classificada em três tipos:
a) atividade como parte;
b) atividade como auxiliar da parte;
c) atividade como fiscal da lei.
Essa divisão das formas de atuação do Ministério Público no processo civil merece críticas
porque não define exatamente a razão da intervenção e a sua verdadeira posição processual.
Modernamente, procura-se buscar a distinção da atividade do Ministério Público no processo civil
segundo a natureza do interesse público que determina essa intervenção. É preciso destacar
preliminarmente que, no processo civil, a intervenção do Ministério Público tem como pressuposto
genérico necessário a existência, na lide, de um interesse público. Ora, esse interesse público
pode estar definido como ligado ao autor, como ligado ao réu, ou pode estar indefinido. Assim, é
possível classificar a atuação do Ministério Público no processo civil segundo o interesse público
que ele defende, da seguinte forma: o Ministério Público intervém no processo civil em virtude e
para defesa de um interesse público determinado, ou intervém na defesa de um interesse público
indeterminado.” (Direito Processual Civil Brasileiro, 1º Volume, 13ª ed., atualizada, Editora
Saraiva, 1998, p. 155 e 156)
A classificação tradicional quanto à intervenção do Ministério Público foi mantida pelo Código de
Processo Civil de 2015 e, como órgão interveniente, atua na modalidade de custos legis nos
processos em que haja interesses de incapazes, pois a sua presença é demandada pelo
interesse público para um maior controle na correta aplicação da lei, em virtude da
hipossuficiência de uma das partes, in verbis:
"Art. 178. O Ministério Público será intimado para, no prazo de 30 (trinta) dias, intervir como fiscal
da ordem jurídica nas hipóteses previstas em lei ou na Constituição Federal e nos processos que
envolvam:
I - interesse público ou social;
II - interesse de incapaz;
III - litígios coletivos pela posse de terra rural ou urbana.
Parágrafo único. A participação da Fazenda Pública não configura, por si só, hipótese de
intervenção do Ministério Público.
Art. 179. Nos casos de intervenção como fiscal da ordem jurídica, o Ministério Público:
I - terá vista dos autos depois das partes, sendo intimado de todos os atos do processo;
II - poderá produzir provas, requerer as medidas processuais pertinentes e recorrer." (grifei)
A intervenção do órgão ministerial nos casos previstos em lei é obrigatória e não facultativa,
devendo o Ministério Público ser intimado para acompanhar o feito em que deveria intervir, sendo
que a ausência de sua intimação acarreta a nulidade do processo a partir do momento em que o
ato deveria ter sido ultimado.
Nesse contexto o Código de Processo Civil de 2015 preconiza:
"Art. 279. É nulo o processo quando o membro do Ministério Público não for intimado a
acompanhar o feito em que deva intervir.
§ 1º Se o processo tiver tramitado sem conhecimento do membro do Ministério Público, o juiz
invalidará os atos praticados a partir do momento em que ele deveria ter sido intimado."
Cumpre salientar que a intimação do representante do Ministério Público será sempre pessoal,
não podendo ser intimado por publicação no órgão oficial, uma vez que o representante
ministerial atua junto ao juiz, bem como em virtude do interesse público a justificar a sua
intervenção destinada à preservação dos interesses básicos e fundamentais da sociedade,
aplicando-se a verdadeira isonomia substancial em se tratar igualmente os iguais e
desigualmente os desiguais.
No caso em apreço, a intervenção do Ministério Público em segundo grau de jurisdição não supre
o prejuízo suportado pela menor, em razão do decreto de improcedência do pleito pela sentença
recorrida.
Para exaurimento da matéria, trago à colação a ementa do seguinte julgado proferido pelo
Colendo Superior Tribunal de Justiça:
“PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. INCAPACIDADE.
FASE INSTRUTÓRIA. AUSÊNCIA DE PARTICIPAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PREJUÍZO.
1. A intervenção do Ministério Público na fase de instrução probatória, a fim de se constatar, ou
não, a suscitada incapacidade, é relevante para assegurar o respeito ao contraditório. No caso,
não observada a imposição legal (art. 31 da da Lei n. 8.742/1993), tanto pelo juízo de primeiro
grau quanto pelo acórdão do Tribunal de origem, configurado estaria o prejuízo.
2. Diante disso, deve-se anular os atos processuais desde o momento em que deveria ter sido
promovida a participação do órgão ministerial no primeiro grau.
3. Recurso especial provido".
(STJ, 2ª turma, REsp 1491524 SP, Relator Ministro Og Fernandes, DJe 12/06/2017)
No mesmo sentido, já decidiu esta Egrégia Corte:
“PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO DO MINISTÉRIO
PÚBLICO FEDERAL. SENTENÇA ANULADA.
1. Nos termos do artigo 127 da Constituição Federal, compete ao Ministério Público a defesa da
ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.
2. Quanto à necessidade de participação do Ministério Público especificamente no presente feito,
dispõe o art. 82, I, do Código de Processo Civil que: "Compete ao Ministério Público intervir: I -
nas causas em que há interesses de incapazes; (...)"
3. A ausência de intervenção do Ministério Público nestes autos é causa de nulidade absoluta, a
teor do disposto no artigo 246, caput, do CPC, sobretudo ao se considerar que sua não atuação
pode ter importado em prejuízo à parte autora, que teve seu pleito julgado improcedente.
Transcrevo a seguir o dispositivo em referência: Art. 246. É nulo o processo, quando o Ministério
Público não for intimado a acompanhar o feito em que deva intervir. Parágrafo único. Se o
processo tiver corrido, sem conhecimento do Ministério Público, o juiz o anulará a partir do
momento em que o órgão devia ter sido intimado.
4. Esse entendimento já se encontra pacificado na jurisprudência: TRF3 - 7ª Turma, AC 1117889,
Rel.ª Des.ª Fed.ª Eva Regina, DJF3 em 27/05/09, p. 922; TRF3, 9ª Turma, AC 1379920, Rel. Des.
Fed. Nelson Bernardes, DJF3 em 19/05/09, p. 629; TRF1, 1ª Turma Suplementar, AC
9601056904, Rel. Juiz Fed. Conv. Ricardo Machado Rabelo, DJ em 22/10/01, página 763.
5. Remessa oficial não conhecida e apelação parcialmente provida, sentença anulada.
(TRF3, 7ª Turma, AC n.º 00301286120174039999/SP, Relator Desembargador Federal Toru
Yamamoto, e-DJF3 22/02/.2018).
De rigor, portanto, impor-se a nulidade dos atos processuais, incluída a sentença, a fim de que,
baixados os autos ao juízo a quo, seja regularizada a relação processual, com a intervenção do
Ministério Público, nos termos da fundamentação.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, acolho a matéria preliminar suscitada pelo Ministério Público Federal e anulo a
sentença, determinando o retorno dos autos à Vara de origem, para a necessária intervenção
ministerial, seguindo-se a regular tramitação do feito até ulterior decisão de mérito, restando
prejudicada a apelação da parte autora.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. ÓBITO EM 2017, NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 8.213/91. ESTAGIÁRIA
BOLSISTA. PENSÃO POR MORTE. FILHO ABSOLUTAMENTE INCAPAZ. AUSÊNCIA DE
INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO EM PRIMEIRA INSTÂNCIA. SENTENÇA ANULADA.
- Na seara administrativa a pensão por morte restou indeferido, ao fundamento de que, tendo sido
vertida a última contribuição previdenciária em 10/2004, a qualidade de segurada teria sido
mantida até 15/12/2005, não abrangendo a data do falecimento.
- Sustenta a parte autora que, conquanto sua genitora houvesse sido contratada pela Prefeitura
Municipal de Jaboticabal – SP como estagiária bolsista, no interregno compreendido entre
10/08/2016 e 05/02/2017, houve desvirtuamento do vínculo pela referida municipalidade,
passando a atuar como se empregada fosse, o que implicaria na obrigação de o ente
públicoverter as respectivas contribuições previdenciárias.
- Conforme salientou o Ministério Público Federal em seu parecer, não houve manifestação do
parquet em primeiro grau de jurisdição, conquanto a autora seja menor.
- Observou-se somente a determinação de intimação do Ministério Público, além da certidão de
decurso do prazo, sem que o órgão tivesse declarado ciência ou efetivamente se manifestado, o
que implicou em evidente prejuízo à parte autora.
- A intervenção do órgão ministerial nos casos previstos em lei é obrigatória e não facultativa,
devendo o Ministério Público ser intimado para acompanhar o feito em que deveria intervir, sendo
que a ausência de sua intimação acarreta a nulidade do processo a partir do momento em que o
ato deveria ter sido ultimado. Precedente do Colendo STJ e desta E. Corte.
- Sentença anulada.
- Prejudicada a apelação da parte autora. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu acolher a matéria preliminar suscitada pelo Ministério Público Federal, a fim
de anular a sentença, restando prejudicada a apelação da parte autora, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
