Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5004449-48.2019.4.03.6104
Relator(a)
Desembargador Federal MARCELO GUERRA MARTINS
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
08/06/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 18/06/2021
Ementa
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. PRESCRIÇÃO: INOCORRÊNCIA. APOSENTADORIA ESPECIAL.
ATIVIDADE ESPECIAL COMPROVADA. RUÍDO. PERCEPÇÃO DO BENEFÍCIO
INDEPENDENTEMENTE DO AFASTAMENTO DO BENEFICIÁRIO DAS ATIVIDADES
LABORAIS NOCIVAS A SUA SAÚDE. QUESTÃO A SER ANALISADA NA FASE DE
CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. REQUISITOS CUMPRIDOS. BENEFÍCIO DEFERIDO.
TERMO INICIAL: DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO.
1. Rejeito a arguição de prescrição das diferenças pretendidas, por não ter transcorrido prazo
superior a cinco anos (artigo 103, parágrafo único, da Lei Federal nº. 8.213/91) entre o
requerimento administrativo (4/01/2017 – fls. 1, ID 153861239) e a propositura da presente
demanda (7/06/2019 – ID 153860870).
2. O artigo 57 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei Federal nº. 9.032/1995: “A
aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado
que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade
física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei”.
3. No que se refere ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar
avaliação técnica, tal circunstância nunca prescindiu do laudo de avaliação das respectivas
condições ambientais.
4. Nesse sentido, o Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi
elevado para 90dB.
5. O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera
insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90
decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs
357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do
Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do
Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece
este, por ser mais favorável.
6. De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a
18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90
dB.
7. A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo
Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
8. Observa-se que o STJ, no julgamento do REsp. nº 1.398.260/PR (1ª Seção, j. 14/05/2014, DJe:
05/12/2014, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN), representativo de controvérsia, reconheceu a
impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a
18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja,
90dB.
9. Deve ser considerado como especial o período de 19/11/2003 a 04/01/2017.
10. Desse modo, computando-se os períodos de atividade especial reconhecidos nos autos,
acrescidos dos períodos reconhecidos como especiais pelo INSS (fls. 1, ID 153861239), até a
data do primeiro requerimento administrativo (DER em 04/01/2017 – fls. 1, ID 153861239),
verifica-se que a parte autora comprovou o exercício de atividades consideradas especiais por um
período de tempo superior a 25 (vinte e cinco) anos, conforme planilha de fls. 5, ID 153861270,
razão pela qual preenche os requisitos para a concessão da aposentadoria especial, nos moldes
dos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91.
11. O termo inicial deve ser mantido na data do primeiro requerimento administrativo
(04/01/2017), tendo em vista que, naquela ocasião, a parte autora já havia implementado os
requisitos necessários à concessão do benefício.
12. Portanto, cumprindo os requisitos legais, faz jus a parte autora à concessão do benefício de
aposentadoria especial desde a DER em 04/01/2017, momento em que o INSS ficou ciente da
pretensão.
13. Deve-se observar, ainda, que nas “hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e
continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do
requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo,
seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o
retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o benefício previdenciário em questão”.
(STF, Tribunal Pleno, RE 791961 – Repercussão Geral, j. 08/06/2020 DJe-206, DIVULG 18-08-
2020, PUBLIC 19-08-2020, Rel. Min. DIAS TOFFOLI). A questão deverá ser verificada na fase de
cumprimento.
14. Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios
estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal
vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do
RE 870947.
15. Apelação da parte autora provida e apelação do INSS improvida. Correção, de ofício, dos
critérios de atualização monetária.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5004449-48.2019.4.03.6104
RELATOR:Gab. 23 - JUIZ CONVOCADO MARCELO GUERRA MARTINS
APELANTE: CARLOS ALBERTO DE MELO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogado do(a) APELANTE: ILZO MARQUES TAOCES - SP229782-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, CARLOS ALBERTO DE
MELO
Advogado do(a) APELADO: ILZO MARQUES TAOCES - SP229782-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5004449-48.2019.4.03.6104
RELATOR:Gab. 23 - JUIZ CONVOCADO MARCELO GUERRA MARTINS
APELANTE: CARLOS ALBERTO DE MELO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogado do(a) APELANTE: ILZO MARQUES TAOCES - SP229782-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, CARLOS ALBERTO DE
MELO
Advogado do(a) APELADO: ILZO MARQUES TAOCES - SP229782-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Juiz Federal Convocado Marcelo Guerra:
Trata-se de ação previdenciária ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL -INSS, objetivando o reconhecimento de atividades em condições especiais, para fins
de concessão do benefício de aposentadoria especial.
A r. sentença (ID 153861275) julgou o processo extinto, sem a resolução do mérito, nos termos
do artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil, em relação ao pedido de reconhecimento
da especialidade dos períodos de 09/05/1983 a 15/03/1984, 09/06/1986 a 05/03/1997,
06/03/1997 a 18/11/2003. No mais, julgou o pedido inicial procedente, em parte, para
reconhecer a especialidade do período de 19/11/2003 a 04/01/2017, bem como conceder o
benefício da aposentadoria especial com DIB em 20/05/2020. Concedeu a tutela específica
para a implantação do benefício. Em decorrência da sucumbência recíproca, condenou o INSS
e a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o proveito
econômico obtido, a ser calculado em liquidação a partir dos valores devidos até a data da
prolação da sentença, em observância à Súmula nº. 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Nas razões de apelação, a parte autora, ora apelante (ID 153861288), objetiva a reforma da r.
sentença, com a fixação do termo inicial do benefício na data em que formulou o primeiro
requerimento do benefício ao INSS, em 4 de janeiro de 2017.
O INSS, ora apelante (ID 153693378), aponta a prescrição das parcelas vencidas no
quinquênio anterior ao ajuizamento da ação, nos termos do artigo 103, parágrafo único, da Lei
Federal nº. 8.213/91.
Alega que a parte autora não provou a exposição a agentes considerados nocivos à saúde de
maneira habitual e permanente e que legitimem o cômputo de tempo especial, nos termos da lei
e das normas técnicas de regência.
Sustenta equívoco na metodologia de medição de ruído.
Afirma a impossibilidade de percepção do benefício da aposentadoria especial na hipótese em
que o segurado permanece no exercício de atividades laborais nocivas à saúde.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5004449-48.2019.4.03.6104
RELATOR:Gab. 23 - JUIZ CONVOCADO MARCELO GUERRA MARTINS
APELANTE: CARLOS ALBERTO DE MELO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogado do(a) APELANTE: ILZO MARQUES TAOCES - SP229782-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, CARLOS ALBERTO DE
MELO
Advogado do(a) APELADO: ILZO MARQUES TAOCES - SP229782-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Juiz Federal Convocado Marcelo Guerra:
Rejeito a arguição de prescrição das diferenças pretendidas, por não ter transcorrido prazo
superior a cinco anos (artigo 103, parágrafo único, da Lei Federal nº. 8.213/91) entre o
requerimento administrativo (4/01/2017 – fls. 1, ID 153861239) e a propositura da presente
demanda (7/06/2019 – ID 153860870).
*** Aposentadoria especial ***
A aposentadoria especial foi originalmente prevista no artigo 31, da Lei Federal nº. 3.807, nos
seguintes termos: “a aposentadoria especial será concedida ao segurado que, contando no
mínimo 50 (cinqüenta) anos de idade e 15 (quinze) anos de contribuições tenha trabalhado
durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos pelo menos, conforme a atividade
profissional, em serviços, que, para êsse efeito, forem considerados penosos, insalubres ou
perigosos, por Decreto do Poder Executivo”.
Com a edição da Lei Federal nº 5.890/73, a aposentadoria especial passou a ser disciplinada
em seu artigo 9º, alterando apenas o período de carência de 15 (quinze) anos para 5 (cinco)
anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
O Poder Executivo editou o Decreto Federal nº 53.831/64, posteriormente alterado pelo Decreto
Federal nº 83.080/79, para listar as categorias profissionais que estavam sujeitas a agentes
físicos, químicos e biológicos considerados prejudiciais à saúde ou à integridade física do
segurado.
Destaca-se que os Decretos Federais nº 53.831/64 e 83.080/79 vigeram de forma simultânea,
de forma que, na hipótese de divergência entre as suas normas, deve prevalecer aquela mais
favorável ao segurado (STJ, 5ª Turma, REsp. nº 412.351, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, Rel.
Min. LAURITA VAZ).
Com a edição da Lei Federal nº 8.213/91, a aposentadoria especial passou a ser disciplinada
em seu artigo 57, segundo o qual “a aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a
carência exigida nesta lei, ao segurado que tiver trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou
25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, sujeito a condições especiais que
prejudiquem a saúde ou a integridade física”, restando assegurado, ainda, a conversão do
período trabalhado no exercício de atividades danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em razão da ausência de edição de lei que estabelecesse a relação das atividades profissionais
sujeitas a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade física, os Decretos
Federais nº 53.831/64 e 83.080/79 permaneceram em vigor, até a edição da Lei Federal nº
9.032/95 (STJ, 5ª Turma, Resp. 436.661/SC, j. 28.04.2004, DJ 02.08.2004, Rel. Min. JORGE
SCARTEZZINI).
Ou seja, até a edição da Lei Federal nº 9.032, em 28 de abril de 1995, para o reconhecimento
da condição especial da atividade exercida, bastava o seu enquadramento nos aludidos
Decretos Federais, mediante a anotação da função em CTPS.
Com a edição da Lei Federal nº 9.032, a redação do artigo 57 da Lei Federal nº 8.213/91 foi
alterada, passando a ser exigida, para a concessão do benefício, a prova de trabalho
permanente em condições especiais, bem como a efetiva exposição do segurado a agentes
nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à
integridade física, pelo período equivalente ao exigido. A prova seria feita mediante a
apresentação de informativos e formulários, como o SB-40 ou o DSS-8030.
O Decreto Federal nº 2.172, de 5 de março de 1997, previu os agentes prejudiciais à saúde
(artigo 66 e Anexo IV), bem como estabeleceu requisitos mais rigorosos para a prova da efetiva
exposição do segurado aos agentes nocivos, mediante a apresentação de laudo técnico ou
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), para a caracterização da condição especial da
atividade exercida. Por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a
partir da edição da Lei Federal nº 9.528, de 10 de dezembro de 1997.
Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente
da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos
arts. 28 da Lei Federal nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91. Aliás, com a edição da Lei nº
6.887/1980, ficou claramente explicitado na legislação a hipótese da conversão do tempo
laborado em condições especiais em tempo comum, de forma a harmonizar a adoção de dois
sistemas de aposentadoria díspares, um comum e outro especial, o que não significa que a
atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins de conversão, eis que tal
circunstância decorreria da própria lógica do sistema.
Ressalte-se que, no que diz respeito ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo
segurado e à forma da sua demonstração, deve ser observada a legislação vigente à época da
prestação do trabalho (STJ, 1ª Seção, PET nº 9.194/PR, j. 28/05/2014, DJe: 03/06/2014, Rel.
Min. ARNALDO ESTEVES LIMA). Trata-se de aplicar o vetusto princípio geral de direito do
tempus regit actum.
Nessa linha, em breve resumo, tem-se o seguinte:
a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou
pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova;
b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa;
c) a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo
técnico de condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por PPP (Perfil
Profissiográfico Previdenciário), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com
indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração
biológica, que constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
Importante ressaltar que o PPP, instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros
ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os
efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições
especiais.
Saliente-se, ainda, a teor de entendimento do TRF da 3ª Região, "a desnecessidade de que o
laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face
de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no
cenário laboral"(TRF-3, 8ª Turma, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, DJe: 15/05/2015
Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv.
0002587-92.2008.4.03.6111, j. 24/10/2016, DJe: 04/11/2016, Rel. Des. Fed. PAULO
DOMINGUES).
No que se refere ao uso de EPI (equipamento de proteção individual), verifica-se que o Plenário
do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, j. 04/12/2014, DJe:
12.02.2015, Rel. Min. LUIZ FUX, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
"(...) a primeira tese objetiva que se firma é: o direito à aposentadoria especial pressupõe a
efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for
realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à
aposentadoria especial. A Administração poderá, no exercício da fiscalização, aferir as
informações prestadas pela empresa, sem prejuízo do inafastável judicial review. Em caso de
divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa
a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da
aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar
suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se
submete";
(...)
a segunda tese fixada neste Recurso Extraordinário é a seguinte: na hipótese de exposição do
trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no
âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento
de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para
aposentadoria".
Portanto, a desqualificação em decorrência do uso de EPI requer prova da efetiva neutralização
do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento
não afastam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C.
STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que
integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
**ruído**
No que se refere ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar
avaliação técnica, tal circunstância nunca prescindiu do laudo de avaliação das respectivas
condições ambientais.
Nesse sentido, o Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em
80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi
elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera
insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90
decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos
nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do
Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do
Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece
este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a
18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90
dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo
Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que o STJ, no julgamento do REsp. nº 1.398.260/PR (1ª Seção, j. 14/05/2014, DJe:
05/12/2014, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN), representativo de controvérsia, reconheceu a
impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a
18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja,
90dB.
Saliente-se que, conforme acima declinado, a apresentação de laudos técnicos de forma
extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o
passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas.
Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado
pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
Assim, tem-se o seguinte quadro:
Período Trabalhado
Enquadramento
Limites de Tolerância
Até 05/03/1997
1. Anexo do Decreto nº 53.831/64.
2. Decretos nºs 357/91 e 611/92
80 dB
De 06/03/1997 a 18/11/2003
Anexo IV do Decreto nº 2.172/97
Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, redação original
90dB
A partir de 19/11/2003
Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, com a alteração do Decreto nº 4.882/03
85 dB
Ademais, quanto ao argumento de que o PPP não observou a metodologia correta, verifica-se
que legislação pertinente não exige que a nocividade do ambiente de trabalho seja aferida a
partir de uma determinada metodologia.
O artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91, exige que a comprovação do tempo especial seja feita por
formulário, ancorado em laudo técnico elaborado por engenheiro ou médico do trabalho, o qual,
portanto, pode se basear em qualquer metodologia científica.
Não tendo a lei determinado que a aferição somente poderia ser feita por meio de uma
metodologia específica, não se pode deixar de reconhecer o labor especial pelo fato de o
empregador ter utilizado uma técnica diversa daquela indicada em Instrução Normativa do
INSS, pois isso representaria uma extrapolação do poder regulamentar da autarquia.
Nesse sentido, a jurisprudência específica da Sétima Turma: TRF3, ApCiv 5556028-
30.2019.4.03.9999, j. 22/10/2020, e - DJF3: 03/11/2020, Rel. Des. Fed. PAULO SERGIO
DOMINGUES.
*** Caso concreto ***
No caso concreto, da análise do Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP (fls. 27/28, ID
153861233), do laudo técnico (ID 153861266) e, de acordo com a legislação previdenciária
vigente à época, a parte autora provou o exercício da atividade especial no período de
19/11/2003 a 04/01/2017 (Petróleo Brasileiro S.A), uma vez que trabalhou como técnico de
segurança I e técnico de segurança pleno, exposta de modo habitual e permanente a ruído de
85,7 dB(A), enquadrado no código 2.0.1, Anexo IV do Decreto Federal nº 3.048/99, com
redação dada pelo Decreto Federal nº 4.882/03.
Saliento que, nos termos do entendimento jurisprudencial já referido, a atividade especial
somente pode ser considerada por presunção legal até 28/04/1995, ocasião em que os artigos
57 e 58 da Lei nº 8.213/91 foram alterados pela Lei nº 9.032/95. A partir de então, o
reconhecimento da atividade especial apenas se dá caso seja demonstrada a exposição, de
forma habitual e permanente, a agentes nocivos à saúde ou à integridade física.
Registro que o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP substitui o laudo técnico, sendo
documento suficiente para aferição das atividades nocivas a que esteve sujeito o trabalhador.
Logo, deve ser considerado como especial o período de 19/11/2003 a 04/01/2017.
Sendo o requerimento do benefício posterior à Lei Federal nº 8.213/91, deve ser aplicado o
fator de conversão de 1,40, mais favorável ao segurado, como determina o artigo 70 do Decreto
Federal nº. 3048/99, com a redação dada pelo Decreto Federal nº. 4.827/03.
Os períodos registrados em CTPS são suficientes para garantir o cumprimento da carência, de
acordo com a tabela do artigo 142 da Lei Federal nº 8.213/1991.
Desse modo, computando-se os períodos de atividade especial reconhecidos nos autos,
acrescidos dos períodos reconhecidos como especiais pelo INSS (fls. 1, ID 153861239), até a
data do primeiro requerimento administrativo (DER em 04/01/2017 – fls. 1, ID 153861239),
verifica-se que a parte autora comprovou o exercício de atividades consideradas especiais por
um período de tempo superior a 25 (vinte e cinco) anos, conforme planilha de fls. 5, ID
153861270, razão pela qual preenche os requisitos para a concessão da aposentadoria
especial, nos moldes dos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91.
O termo inicial deve ser mantido na data do primeiro requerimento administrativo (04/01/2017),
tendo em vista que, naquela ocasião, a parte autora já havia implementado os requisitos
necessários à concessão do benefício.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: 1ª Turma, REsp 1791052/SP, j. 21/02/2019,
DJe 28/02/2019, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO; 2ª Turma, REsp 1833548/SE, j.
01/10/2019, DJe 11/10/2019, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN.
Portanto, cumprindo os requisitos legais, faz jus a parte autora à concessão do benefício de
aposentadoria especial desde a DER em 04/01/2017, momento em que o INSS ficou ciente da
pretensão.
Deve-se observar, ainda, que nas “hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e
continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do
requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo,
seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o
retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o benefício previdenciário em questão”.
(STF, Tribunal Pleno, RE 791961 – Repercussão Geral, j. 08/06/2020 DJe-206, DIVULG 18-08-
2020, PUBLIC 19-08-2020, Rel. Min. DIAS TOFFOLI). A questão deverá ser verificada na fase
de cumprimento.
Anote-se, na espécie, a obrigatoriedade da dedução, na fase de liquidação, dos valores
eventualmente pagos à parte autora na esfera administrativa.
Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos
pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à
época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do RE
870947.
Honorários advocatícios, a cargo do INSS, fixados em 10% da condenação até a data da
sentença, excluídas as prestações vencidas após a sua prolação nos termos da Súmula nº.
111, do Superior Tribunal de Justiça.
O INSS é isento de custas processuais, arcando com as demais despesas, inclusive honorários
periciais (Res. CJF nºs. 541 e 558/2007), além de reembolsar custas recolhidas pela parte
contrária, o que não é o caso dos autos, ante a gratuidade processual concedida (art. 4º, I e
parágrafo único, da Lei 9.289/1996, art. 24-A da Lei 9.028/1995, n.r., e art. 8º, § 1º, da Lei
8.620/1993).
Por tais fundamentos, dou provimento à apelação da parte autora e nego provimento à
apelação do INSS. Corrijo, de ofício, os critérios de atualização monetária para determinar a
observância do RE 870.947.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. PRESCRIÇÃO: INOCORRÊNCIA. APOSENTADORIA
ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL COMPROVADA. RUÍDO. PERCEPÇÃO DO BENEFÍCIO
INDEPENDENTEMENTE DO AFASTAMENTO DO BENEFICIÁRIO DAS ATIVIDADES
LABORAIS NOCIVAS A SUA SAÚDE. QUESTÃO A SER ANALISADA NA FASE DE
CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. REQUISITOS CUMPRIDOS. BENEFÍCIO DEFERIDO.
TERMO INICIAL: DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO.
1. Rejeito a arguição de prescrição das diferenças pretendidas, por não ter transcorrido prazo
superior a cinco anos (artigo 103, parágrafo único, da Lei Federal nº. 8.213/91) entre o
requerimento administrativo (4/01/2017 – fls. 1, ID 153861239) e a propositura da presente
demanda (7/06/2019 – ID 153860870).
2. O artigo 57 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei Federal nº. 9.032/1995: “A
aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao
segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a
integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser
a lei”.
3. No que se refere ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar
avaliação técnica, tal circunstância nunca prescindiu do laudo de avaliação das respectivas
condições ambientais.
4. Nesse sentido, o Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo
em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível
foi elevado para 90dB.
5. O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera
insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90
decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos
nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do
Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do
Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece
este, por ser mais favorável.
6. De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a
18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90
dB.
7. A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo
Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
8. Observa-se que o STJ, no julgamento do REsp. nº 1.398.260/PR (1ª Seção, j. 14/05/2014,
DJe: 05/12/2014, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN), representativo de controvérsia, reconheceu a
impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a
18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja,
90dB.
9. Deve ser considerado como especial o período de 19/11/2003 a 04/01/2017.
10. Desse modo, computando-se os períodos de atividade especial reconhecidos nos autos,
acrescidos dos períodos reconhecidos como especiais pelo INSS (fls. 1, ID 153861239), até a
data do primeiro requerimento administrativo (DER em 04/01/2017 – fls. 1, ID 153861239),
verifica-se que a parte autora comprovou o exercício de atividades consideradas especiais por
um período de tempo superior a 25 (vinte e cinco) anos, conforme planilha de fls. 5, ID
153861270, razão pela qual preenche os requisitos para a concessão da aposentadoria
especial, nos moldes dos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91.
11. O termo inicial deve ser mantido na data do primeiro requerimento administrativo
(04/01/2017), tendo em vista que, naquela ocasião, a parte autora já havia implementado os
requisitos necessários à concessão do benefício.
12. Portanto, cumprindo os requisitos legais, faz jus a parte autora à concessão do benefício de
aposentadoria especial desde a DER em 04/01/2017, momento em que o INSS ficou ciente da
pretensão.
13. Deve-se observar, ainda, que nas “hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e
continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do
requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo,
seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o
retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o benefício previdenciário em questão”.
(STF, Tribunal Pleno, RE 791961 – Repercussão Geral, j. 08/06/2020 DJe-206, DIVULG 18-08-
2020, PUBLIC 19-08-2020, Rel. Min. DIAS TOFFOLI). A questão deverá ser verificada na fase
de cumprimento.
14. Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios
estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça
Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos
autos do RE 870947.
15. Apelação da parte autora provida e apelação do INSS improvida. Correção, de ofício, dos
critérios de atualização monetária. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação da parte autora e negar provimento à apelação
do INSS e corrigir, de ofício, os critérios de atualização monetária para determinar a
observância do RE 870.947, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
