Processo
AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO / SP
5004251-58.2017.4.03.0000
Relator(a)
Desembargador Federal WILSON ZAUHY FILHO
Órgão Julgador
1ª Turma
Data do Julgamento
15/08/2018
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 24/08/2018
Ementa
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. SERVIDOR PÚBLICO.
VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL PRECÁRIA,
POSTERIORMENTE REFORMADA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ.
RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Cuida-se na origem, de ação de ressarcimento ao erário de valores recebidos em razão de
decisão judicial transitada em julgado.
2. Ao enfrentar demandas que versam sobre a pretensão da administração de ressarcimento ao
erário por servidor que recebeu valores indevidamente, tenho entendido pela impossibilidade
quando caracterizada a boa-fé do recebedor e caracterizada a responsabilidade exclusiva da
administração pública.
3. Em consulta aos documentos carreados aos autos, especialmente a narrativa da agravada em
sua peça inaugural do feito matriz, constata-se que ao apreciar o ato concessivo da
aposentadoria concedida à agravada o Tribunal de Contas da União se manifestou
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
contrariamente por meio da decisão nº 203/1996 de relatoria do Ministro Átila Álvares da Silva
(Num. 535906 – Pág. 9/27).
4. Por tal razão, a agravada impetrou o mandado de segurança nº 0037557-40.1997.4.03.6100
que, não obstante tenha sido exitoso em primeira instância (“Diante do exposto, CONCEDO A
SEGURANÇA para determinar à autoridade impetrada que continue pagando à impetrante seus
proventos de aposentadoria.”), acabou por ter seu destino modificado por esta E. Corte Regional
(“Ante o exposto, CONCEDO PROVIMENTO ao recurso e à remessa oficial para reformar a
decisão de primeiro grau e julgar improcedente o pedido formulado nesta ação mandamental,
denegando a segurança.”), conforme acórdão publicado em 21.05.2007.
5. Interposto recurso especial (nº 1.449.119/SP) ao qual foi negado seguimento pelo C. STJ em
decisão publicada em 30.04.2014 e extraordinário (nº 814.341/SP) cujo pedido de desistência foi
homologado por meio de decisão publicada em 25.09.2014. Por fim, em 10.10.2014 ocorreu o
trânsito em julgado.
Traçado o histórico processual, entendo aplicável ao caso dos autos a observância ao princípio
da moralidade, inserto no artigo 37, caput da Constituição da República, mostrando-se devida a
restituição dos valores em debate, tendo em vista a impossibilidade de se conferir a decisão
judicial provisória característica de definitiva.
6. Assim, tratando-se a medida liminar de provimento jurisdicional de caráter provisório, aquele
que recebe verbas dos cofres públicos com base em tal título judicial sabe da fragilidade e
provisoriedade do provimento concedido, não havendo que se falar, portanto, em boa-fé.
7. Não obstante, o Superior Tribunal de Justiça havia se posicionado no sentido de ser incabível o
ressarcimento de verbas de natureza alimentar, como as decorrentes de benefícios
previdenciários, recebidos a título de antecipação de tutela posteriormente revogada, face ao
princípio da irrepetibilidade das prestações de caráter alimentício e em face da boa-fé da parte
que a recebeu por força de decisão judicial . (AgRg no AREsp 12.844/SC, Rel. Ministro Jorge
Mussi, DJe 2/9/2011; REsp 1255921/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 15/8/2011;
AgRg no Ag 1352339/PR, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 3/8/2011; REsp
950.382/DF, Rel. p/ Acórdão Ministro Hamilton Carvalhido, DJe 10/5/2011).
8. Entretanto, a Primeira Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.401.560/MT, realizado sob o
rito dos recursos repetitivos, alterou o entendimento anterior e a estabeleceu que, na hipótese de
pagamento por força de provimentos judiciais liminares, ainda que em se tratando de verbas
decorrentes de benefícios previdenciários, não pode o beneficiário alegar boa-fé para não
devolver os valores recebidos, tendo em vista a precariedade da medida concessiva, e, por
conseguinte, a impossibilidade de se presumir a definitividade do pagamento. Precedentes.
9. Dessa forma, apesar do caráter alimentar da verba recebida, mostra-se cabível a restituição,
em princípio, de tal importância ao Erário, pois decorrente de provimento jurisdicional de caráter
provisório, não confirmado por ocasião do julgamento do respectivo recurso por esta E. Corte.
10. Por fim, afasto a alegação de prescrição da pretensão ressarcitória. Ao se debruçar sobre o
tema, o C. STF decidiu no julgamento do Recurso Extraordinário nº 669.069 que são prescritíveis
as ações de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil. Precedentes.
11. No caso dos autos, entendo que deva ser aplicado o prazo prescricional previsto no artigo 1º
do Decreto nº 20.910/32. Com efeito, se o prazo de prescrição das dívidas passivas da União,
Estados e Municípios é, por previsão legal, de cinco anos, deve ser idêntico o prazo prescricional
para os casos em que a União é credora e não devedora, em perfeita observância ao princípio da
isonomia.
12. Contudo, o início da contagem do lustro prescricional somente teve início com o trânsito em
julgado do mandamus impetrado pela agravada, o que ocorreu em 10.10.2014, já que antes disso
não havia pronunciamento definitivo do Poder Judiciário acerca da legalidade e
inconstitucionalidade do benefício de aposentadoria debatido. Vale dizer, somente com a
imutabilidade da decisão que reconheceu ser indevida a concessão da aposentadoria é que
poderia a administração dar início ao procedimento de ressarcimento ao erário dos valores
recebidos sob este título.
13. De se ressaltar, todavia, que o servidor público não pode ser compelido a ressarcir o erário de
uma só vez, sob pena de supressão dos ganhos habituais, necessários a sua subsistência e de
sua família. O princípio da dignidade da pessoa humana impõe que o ressarcimento ao erário
ocorra de tal forma a não prejudicar outros direitos e garantias fundamentais do servidor público,
mormente aqueles de ordem alimentar. Precedentes.
14. Se de um lado, a tese apresentada pela União no sentido de que a agravada deve ser
compelida a ressarcir o Erário comporta provimento, de outro, deve-se destacar que o
ressarcimento ocorrerá por intermédio de descontos em sua folha de pagamento, no percentual
de 10% (dez por cento) da remuneração total auferida (art. 46, §§ 1º e 3º da Lei nº 8.112/90, com
redação dada pela MP 2.225-45/01).
15. Agravo de instrumento parcialmente provido.
Acórdao
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5004251-58.2017.4.03.0000
RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY
AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL
AGRAVADO: MARIA DE LOURDES PITARELLO PEIXOTO
Advogados do(a) AGRAVADO: ANTONIO JOAQUIM FERREIRA - SP270186, MARCELO
MOREIRA PITARELLO - SP250161
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5004251-58.2017.4.03.0000
RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY
AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL
AGRAVADO: MARIA DE LOURDES PITARELLO PEIXOTO
Advogados do(a) AGRAVADO: ANTONIO JOAQUIM FERREIRA - SP270186, MARCELO
MOREIRA PITARELLO - SP250161
R E L A T Ó R I O
Trata-se de agravo de instrumento interposto pela UNIÃO contra decisão que, nos autos da Ação
Ordinária ajuizada na origem, deferiu o pedido de antecipação dos efeitos da tutela.
Inconformada, a agravante aduz em síntese, sobre a impossibilidade de concessão de tutela
antecipada contra a Fazenda Pública que esgote total ou parcialmente o objeto da ação.
Argumenta que estão ausentes elementos que evidenciem a probabilidade do direito e do perigo
de dano ou risco ao resultado útil do processo e sustenta que a aposentadoria é ato complexo
que só se completa com a apreciação de sua legalidade pelo Tribunal de Contas da União.
Alega também que não está caracterizada a boa-fé objetiva, vez que o pagamento dos proventos
ocorreu por força de decisão judicial de natureza precária, devendo a agravada ser
responsabilizada pelo ressarcimento ao erário público das parcelas recebidas por força de
decisão judicial posteriormente revogada.
Afirma ser possível a cobrança de valores recebidos ao arrepio da lei e defende a necessidade de
a administração sanear situações irregulares.
Nesta sede, o pedido de efeito suspensivo restou deferido.
Devidamente intimada, nos termos do art. 1.019, II, do CPC a agravada apresentou contraminuta.
É o relatório, dispensada a revisão, nos termos regimentais.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5004251-58.2017.4.03.0000
RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY
AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL
AGRAVADO: MARIA DE LOURDES PITARELLO PEIXOTO
Advogados do(a) AGRAVADO: ANTONIO JOAQUIM FERREIRA - SP270186, MARCELO
MOREIRA PITARELLO - SP250161
V O T O
Cuida-se na origem, de ação de ressarcimento ao erário de valores recebidos em razão de
decisão judicial transitada em julgado.
Ao enfrentar demandas que versam sobre a pretensão da administração de ressarcimento ao
erário por servidor que recebeu valores indevidamente, tenho entendido pela impossibilidade
quando caracterizada a boa-fé do recebedor e caracterizada a responsabilidade exclusiva da
administração pública.
O caso ora enfrentado, contudo, foge à rotina.
Em consulta aos documentos carreados aos autos, especialmente a narrativa da agravada em
sua peça inaugural do feito matriz, constata-se que ao apreciar o ato concessivo da
aposentadoria concedida à agravada o Tribunal de Contas da União se manifestou
contrariamente por meio da decisão nº 203/1996 de relatoria do Ministro Átila Álvares da Silva
(Num. 535906 – Pág. 9/27).
Por tal razão, a agravada impetrou o mandado de segurança nº 0037557-40.1997.4.03.6100 que,
não obstante tenha sido exitoso em primeira instância (“Diante do exposto, CONCEDO A
SEGURANÇA para determinar à autoridade impetrada que continue pagando à impetrante seus
proventos de aposentadoria.”), acabou por ter seu destino modificado por esta E. Corte Regional
(“Ante o exposto, CONCEDO PROVIMENTO ao recurso e à remessa oficial para reformar a
decisão de primeiro grau e julgar improcedente o pedido formulado nesta ação mandamental,
denegando a segurança.”), conforme acórdão publicado em 21.05.2007.
Interposto recurso especial (nº 1.449.119/SP) ao qual foi negado seguimento pelo C. STJ em
decisão publicada em 30.04.2014 e extraordinário (nº 814.341/SP) cujo pedido de desistência foi
homologado por meio de decisão publicada em 25.09.2014. Por fim, em 10.10.2014 ocorreu o
trânsito em julgado.
Traçado o histórico processual, entendo aplicável ao caso dos autos a observância ao princípio
da moralidade, inserto no artigo 37, caput da Constituição da República, mostrando-se devida a
restituição dos valores em debate, tendo em vista a impossibilidade de se conferir a decisão
judicial provisória característica de definitiva.
Assim, tratando-se a medida liminar de provimento jurisdicional de caráter provisório, aquele que
recebe verbas dos cofres públicos com base em tal título judicial sabe da fragilidade e
provisoriedade do provimento concedido, não havendo que se falar, portanto, em boa-fé.
Não obstante, o Superior Tribunal de Justiça havia se posicionado no sentido de ser incabível o
ressarcimento de verbas de natureza alimentar, como as decorrentes de benefícios
previdenciários, recebidos a título de antecipação de tutela posteriormente revogada, face ao
princípio da irrepetibilidade das prestações de caráter alimentício e em face da boa-fé da parte
que a recebeu por força de decisão judicial . (AgRg no AREsp 12.844/SC, Rel. Ministro Jorge
Mussi, DJe 2/9/2011; REsp 1255921/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 15/8/2011;
AgRg no Ag 1352339/PR, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 3/8/2011; REsp
950.382/DF, Rel. p/ Acórdão Ministro Hamilton Carvalhido, DJe 10/5/2011).
Entretanto, a Primeira Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.401.560/MT, realizado sob o rito
dos recursos repetitivos, alterou o entendimento anterior e a estabeleceu que, na hipótese de
pagamento por força de provimentos judiciais liminares, ainda que em se tratando de verbas
decorrentes de benefícios previdenciários, não pode o beneficiário alegar boa-fé para não
devolver os valores recebidos, tendo em vista a precariedade da medida concessiva, e, por
conseguinte, a impossibilidade de se presumir a definitividade do pagamento.
Nesse sentido:
“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. DEVOLUÇÃO DE VALORES
RECEBIDOS A TÍTULO DE TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE REVOGADA.
CABIMENTO. JURISPRUDÊNCIA DO STJ REALINHADA. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO
1.401.560/MT. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. O STJ no julgamento do Recurso
Especial Repetitivo 1.401.560/MT fixou a tese de que é dever do titular de direito patrimonial
devolver valores recebidos por força de tutela antecipada posteriormente revogada. 2. Agravo
regimental não provido.”
(AgRg no AREsp 494.942/MT, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA
TURMA, julgado em 18/06/2014, DJe 05/08/2014)
“ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. SERVIDORA PÚBLICA. VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE
DECISÃO JUDICIAL PRECÁRIA, POSTERIORMENTE REFORMADA. RESTITUIÇÃO AO
ERÁRIO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. I.
Nos termos da jurisprudência consolidada nesta Corte, 'tendo a servidor a recebido os referidos
valores amparada por uma decisão judicial precária, não há como se admitir a existência de boa-
fé , pois a Administração em momento nenhum gerou-lhe uma falsa expectativa de definitividade
quanto ao direito pleiteado. A adoção de entendimento diverso importaria, dessa forma, no
desvirtuamento do próprio instituto da antecipação dos efeitos da tutela , haja vista que um dos
requisitos legais para sua concessão reside justamente na inexistência de perigo de
irreversibilidade, a teor do art. 273, §§ 2º e 4º, do CPC' (STJ, EREsp 1.335.962/RS, Rel. Ministro
ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 02/08/2013). No mesmo sentido: STJ,
EDcl no REsp 1.387.306/PB, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, DJe de
27/03/2015; AgRg no REsp 1.474.964/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES,
SEGUNDA TURMA, DJe de 18/11/2014; AgRg no REsp 1263480/CE, Rel. Ministro HUMBERTO
MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe 09/09/2011. II. A previsão da devolução dos valores
recebidos em decorrência de decisão judicial de natureza precária ou não definitiva, no § 3º do
art. 46 da Lei 8.112/90, veio tão somente explicitar, no âmbito do Regime Jurídico Único, tal
hipótese, bem como consignar, expressamente, a necessidade de sua devida atualização
monetária. III. Agravo Regimental improvido.”
(AgRg no AREsp 348.196/CE, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA,
julgado em 23/02/2016, DJe 09/03/2016).
Dessa forma, apesar do caráter alimentar da verba recebida, mostra-se cabível a restituição, em
princípio, de tal importância ao Erário, pois decorrente de provimento jurisdicional de caráter
provisório, não confirmado por ocasião do julgamento do respectivo recurso por esta E. Corte.
Por fim, afasto a alegação de prescrição da pretensão ressarcitória.
Ao se debruçar sobre o tema, o C. STF decidiu no julgamento do Recurso Extraordinário nº
669.069 que são prescritíveis as ações de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de
ilícito civil, sendo o julgado ementado nos seguintes termos:
“CONSTITUCIONAL E CIVIL. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. IMPRESCRITIBILIDADE.
SENTIDO E ALCANCE DO ART. 37, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO. 1. É prescritível a ação de
reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil. 2. Recurso extraordinário a que
se nega provimento.”
(Relator Ministro Teori Zavascki, publicado em 28.04.2016)
No caso dos autos, entendo que deva ser aplicado o prazo prescricional previsto no artigo 1º do
Decreto nº 20.910/32, que assim dispõe:
Art. 1º. As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer
direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza,
prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.
Com efeito, se o prazo de prescrição das dívidas passivas da União, Estados e Municípios é, por
previsão legal, de cinco anos, deve ser idêntico o prazo prescricional para os casos em que a
União é credora e não devedora, em perfeita observância ao princípio da isonomia.
Contudo, o início da contagem do lustro prescricional somente teve início com o trânsito em
julgado do mandamus impetrado pela agravada, o que ocorreu em 10.10.2014, já que antes disso
não havia pronunciamento definitivo do Poder Judiciário acerca da legalidade e
inconstitucionalidade do benefício de aposentadoria debatido. Vale dizer, somente com a
imutabilidade da decisão que reconheceu ser indevida a concessão da aposentadoria é que
poderia a administração dar início ao procedimento de ressarcimento ao erário dos valores
recebidos sob este título.
Por fim, deve-se ressaltar, todavia, que o servidor público não pode ser compelido a ressarcir o
erário de uma só vez, sob pena de supressão dos ganhos habituais, necessários a sua
subsistência e de sua família. O princípio da dignidade da pessoa humana impõe que o
ressarcimento ao erário ocorra de tal forma a não prejudicar outros direitos e garantias
fundamentais do servidor público, mormente aqueles de ordem alimentar. Nessa linha de
entendimento, é a jurisprudência consolidada desta Egrégia Primeira Turma:
"PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EFEITOS MODIFICATIVOS.
OCORRÊNCIA. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. SENTENÇA EXARADA NOS
AUTOS DO PROCESSO 00074878319964036000 QUE RATIFICA A TUTELA E DETERMINA A
INCORPORAÇÃO DO REAJUSTE DE 47,94%, CORRESPONDENTE A 50% DO IRSM.
CONFIRMAÇÃO PELA CORTE REGIONAL EM APELAÇÃO. DECISÃO REFORMADA PELO
STJ NO JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL 1008216. RESTITUIÇÃO DE VALORES
INDEVIDAMENTE RECEBIDOS. POSSIBILIDADE. RECURSO DO RÉU DESPROVIDO.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DA AGU ACOLHIDOS PARA ESSE FIM.
1- Aplica-se a Lei n. 13105/2015 aos processos pendentes, respeitados, naturalmente, os atos
consumados e seus efeitos no regime do CPC de 1973. Nesse sentido, restou editado o
Enunciado Administrativo n. 2/STJ, de teor seguinte: Aos recursos interpostos com fundamento
no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os
requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.
2- No que tange à prescrição, vale ressaltar que não assiste razão ao embargado quando
argumenta que o trânsito em julgado seria o marco do início da prescrição do fundo de direito e
não das parcelas, de modo que as parcelas estariam fulminadas pela prescrição quinquenária.
Isso porque, o termo inicial da prescrição surge com o nascimento da pretensão (actio nata),
assim considerada a possibilidade do seu exercício em juízo. No caso dos autos, tal possibilidade
surgiu com o trânsito em julgado do RE n. 606571 (fl. 87), e engloba todos os valores pagos com
base na ação judicial processo n. 00074878319964036000.
3- A jurisprudência do STJ firmou orientação no sentido de que os valores indevidamente pagos
por força de decisão judicial liminar posteriormente revogada são passíveis de devolução, sob
pena de enriquecimento ilícito por parte do servidor beneficiado. Precedente: RESP n.
1401560/MT, Rel. Min. SÉRGIO KUKINA, 1ª Seção, Redator p/ o acórdão Ministro ARI
PARGENDLER, DJE 13/10/2015, na sistemática do art. 543-C do CPC/1973.
4- À luz do princípio da dignidade da pessoa humana e levando-se em conta o dever do servidor
público de devolução dos valores recebidos por força de antecipação de tutela posteriormente
revogada, deve ser observado o limite mensal de desconto de 10% (dez por cento) da
remuneração, provento ou pensão, referido no artigo 46, § 1º, da Lei n. 8112/1990.
5- A pretensa impugnação dos valores cobrados pela AGU (R$ 169.208,53 em 07/03/2014) fica
diferida para a fase da execução, de modo a racionalizar o andamento do processo.
6- O imposto de renda é devido, nos termos da sentença, não por oportunidade da futura
requisição do pagamento/precatório, mas, sim, quando do levantamento dos valores.
7- Já no que se refere ao PSS, por ocasião do julgamento do RESP n. 1196777/RS, submetido
ao regime do art. 543-C do CPC/1973, a 1ª Seção do STJ firmou entendimento no sentido de que
constitui obrigação ex lege (art. 16-A da Lei n. 10887/2004) a retenção da contribuição ao Plano
de Seguridade Social do Servidor Público (PSS), incidente sobre valores pagos em cumprimento
de decisão judicial, sendo devida independentemente de previsão no título executivo.
8- Honorários da sucumbência tal como fixados pela sentença.
9- Embargos de declaração da AGU acolhidos, com efeito modificativo, para sanar os vícios
apontados, e negar provimento ao recurso da parte ré." (grifei)
(Embargos de Declaração em Apelação Cível n. 0001780-07.2014.4.03.6000/MS; Rel. Des. Fed.
Hélio Nogueira; Primeira Turma; Data de Julgamento: 23/01/2018).
Por conseguinte, se, de um lado, a tese apresentada pela União no sentido de que a agravada
deve ser compelida a ressarcir o Erário comporta provimento, de outro, deve-se destacar que o
ressarcimento ocorrerá por intermédio de descontos em sua folha de pagamento, no percentual
de 10% (dez por cento) da remuneração total auferida, na esteira do entendimento jurisprudencial
desta Egrégia Primeira Turma.
Diante dos fundamentos expostos, dou parcial provimento ao agravo de instrumento, para
reconhecer devida e exigível a dívida apontada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região,
referente aos proventos recebidos pela agravada a título de aposentadoria e para determinar o
ressarcimento ao erário, na forma do art. 46, §§ 1º e 3º da Lei nº 8.112/90, com redação dada
pela MP 2.225-45/01, por intermédio de descontos em folha de pagamento, no percentual de 10%
(dez por cento) da remuneração total auferida, nos termos da argumentação acima deslindada.
É como voto.
VOTO
O Desembargador Federal Hélio Nogueira:
Peço vênia ao e. Relator para divergir e negar provimento ao agravo de Instrumento.
O Supremo Tribunal Federal, em hipóteses semelhantes aos presentes autos, posteriormente ao
julgamento do REsp 1.401.560-MT pelo STJ, tem se pronunciado pela impossibilidade de
repetição de valores nas hipóteses de recebimento de benefício previdenciário em decorrência de
decisão judicial.
Nesse sentido:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM
AGRAVO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. NATUREZA ALIMENTAR. RECEBIMENTO DE BOA -
FÉ EM DECORRÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA.
DEVOLUÇÃO. (g.n.)
1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já assentou que o benefício previdenciário
recebido de boa - fé pelo segurado, em decorrência de decisão judicial, não está sujeito à
repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar . Precedentes.
2. Decisão judicial que reconhece a impossibilidade de descontos dos valores indevidamente
recebidos pelo segurado não implica declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei nº
8.213/1991. Precedentes.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(STF, ARE 734242 AgR, Relator Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em
04/08/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-175 DIVULG 04-09-2015 PUBLIC 08-09-2015).
O PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO RECEBIDO POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL.
DEVOLUÇÃO. ART. 115 DA LEI 8.213/91. IMPOSSIBILIDADE. BOA-FÉ E CARÁTER
ALIMENTAR. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DO ART. 97 DA CF. RESERVA DE PLENÁRIO:
INOCORRÊNCIA. ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 22.9.2008. A jurisprudência desta
Corte firmou-se no sentido de que o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado
em virtude de decisão judicial não está sujeito à repetição de indébito, dado o seu caráter
alimentar. Na hipótese, não importa declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei
8.213/91, o reconhecimento, pelo Tribunal de origem, da impossibilidade de desconto dos valores
indevidamente percebidos. Agravo regimental conhecido e não provido.
(ARE-AgR 734199, ROSA WEBER, STF.)
Diante desse contexto, pedindo vênia ao e. Relator, nego provimento ao Agravo de Instrumento.
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL VALDECI DOS SANTOS:
Acompanho o e. relator, para se alinhar ao entendimento firmado pelo C.STJ em sede de
recursos repetitivos, com ressalva de entendimento.
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. SERVIDOR PÚBLICO.
VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL PRECÁRIA,
POSTERIORMENTE REFORMADA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ.
RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Cuida-se na origem, de ação de ressarcimento ao erário de valores recebidos em razão de
decisão judicial transitada em julgado.
2. Ao enfrentar demandas que versam sobre a pretensão da administração de ressarcimento ao
erário por servidor que recebeu valores indevidamente, tenho entendido pela impossibilidade
quando caracterizada a boa-fé do recebedor e caracterizada a responsabilidade exclusiva da
administração pública.
3. Em consulta aos documentos carreados aos autos, especialmente a narrativa da agravada em
sua peça inaugural do feito matriz, constata-se que ao apreciar o ato concessivo da
aposentadoria concedida à agravada o Tribunal de Contas da União se manifestou
contrariamente por meio da decisão nº 203/1996 de relatoria do Ministro Átila Álvares da Silva
(Num. 535906 – Pág. 9/27).
4. Por tal razão, a agravada impetrou o mandado de segurança nº 0037557-40.1997.4.03.6100
que, não obstante tenha sido exitoso em primeira instância (“Diante do exposto, CONCEDO A
SEGURANÇA para determinar à autoridade impetrada que continue pagando à impetrante seus
proventos de aposentadoria.”), acabou por ter seu destino modificado por esta E. Corte Regional
(“Ante o exposto, CONCEDO PROVIMENTO ao recurso e à remessa oficial para reformar a
decisão de primeiro grau e julgar improcedente o pedido formulado nesta ação mandamental,
denegando a segurança.”), conforme acórdão publicado em 21.05.2007.
5. Interposto recurso especial (nº 1.449.119/SP) ao qual foi negado seguimento pelo C. STJ em
decisão publicada em 30.04.2014 e extraordinário (nº 814.341/SP) cujo pedido de desistência foi
homologado por meio de decisão publicada em 25.09.2014. Por fim, em 10.10.2014 ocorreu o
trânsito em julgado.
Traçado o histórico processual, entendo aplicável ao caso dos autos a observância ao princípio
da moralidade, inserto no artigo 37, caput da Constituição da República, mostrando-se devida a
restituição dos valores em debate, tendo em vista a impossibilidade de se conferir a decisão
judicial provisória característica de definitiva.
6. Assim, tratando-se a medida liminar de provimento jurisdicional de caráter provisório, aquele
que recebe verbas dos cofres públicos com base em tal título judicial sabe da fragilidade e
provisoriedade do provimento concedido, não havendo que se falar, portanto, em boa-fé.
7. Não obstante, o Superior Tribunal de Justiça havia se posicionado no sentido de ser incabível o
ressarcimento de verbas de natureza alimentar, como as decorrentes de benefícios
previdenciários, recebidos a título de antecipação de tutela posteriormente revogada, face ao
princípio da irrepetibilidade das prestações de caráter alimentício e em face da boa-fé da parte
que a recebeu por força de decisão judicial . (AgRg no AREsp 12.844/SC, Rel. Ministro Jorge
Mussi, DJe 2/9/2011; REsp 1255921/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 15/8/2011;
AgRg no Ag 1352339/PR, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 3/8/2011; REsp
950.382/DF, Rel. p/ Acórdão Ministro Hamilton Carvalhido, DJe 10/5/2011).
8. Entretanto, a Primeira Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.401.560/MT, realizado sob o
rito dos recursos repetitivos, alterou o entendimento anterior e a estabeleceu que, na hipótese de
pagamento por força de provimentos judiciais liminares, ainda que em se tratando de verbas
decorrentes de benefícios previdenciários, não pode o beneficiário alegar boa-fé para não
devolver os valores recebidos, tendo em vista a precariedade da medida concessiva, e, por
conseguinte, a impossibilidade de se presumir a definitividade do pagamento. Precedentes.
9. Dessa forma, apesar do caráter alimentar da verba recebida, mostra-se cabível a restituição,
em princípio, de tal importância ao Erário, pois decorrente de provimento jurisdicional de caráter
provisório, não confirmado por ocasião do julgamento do respectivo recurso por esta E. Corte.
10. Por fim, afasto a alegação de prescrição da pretensão ressarcitória. Ao se debruçar sobre o
tema, o C. STF decidiu no julgamento do Recurso Extraordinário nº 669.069 que são prescritíveis
as ações de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil. Precedentes.
11. No caso dos autos, entendo que deva ser aplicado o prazo prescricional previsto no artigo 1º
do Decreto nº 20.910/32. Com efeito, se o prazo de prescrição das dívidas passivas da União,
Estados e Municípios é, por previsão legal, de cinco anos, deve ser idêntico o prazo prescricional
para os casos em que a União é credora e não devedora, em perfeita observância ao princípio da
isonomia.
12. Contudo, o início da contagem do lustro prescricional somente teve início com o trânsito em
julgado do mandamus impetrado pela agravada, o que ocorreu em 10.10.2014, já que antes disso
não havia pronunciamento definitivo do Poder Judiciário acerca da legalidade e
inconstitucionalidade do benefício de aposentadoria debatido. Vale dizer, somente com a
imutabilidade da decisão que reconheceu ser indevida a concessão da aposentadoria é que
poderia a administração dar início ao procedimento de ressarcimento ao erário dos valores
recebidos sob este título.
13. De se ressaltar, todavia, que o servidor público não pode ser compelido a ressarcir o erário de
uma só vez, sob pena de supressão dos ganhos habituais, necessários a sua subsistência e de
sua família. O princípio da dignidade da pessoa humana impõe que o ressarcimento ao erário
ocorra de tal forma a não prejudicar outros direitos e garantias fundamentais do servidor público,
mormente aqueles de ordem alimentar. Precedentes.
14. Se de um lado, a tese apresentada pela União no sentido de que a agravada deve ser
compelida a ressarcir o Erário comporta provimento, de outro, deve-se destacar que o
ressarcimento ocorrerá por intermédio de descontos em sua folha de pagamento, no percentual
de 10% (dez por cento) da remuneração total auferida (art. 46, §§ 1º e 3º da Lei nº 8.112/90, com
redação dada pela MP 2.225-45/01).
15. Agravo de instrumento parcialmente provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, por maioria, deu parcial
provimento ao agravo de instrumento, nos termos do voto do relator, acompanhado pelo Des.
Fed. Valdeci dos Santos, com ressalva de entendimento, vencido o Des. Fed. Hélio Nogueira, que
negava provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
