Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5166082-52.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
02/12/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 09/12/2021
Ementa
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
SERVIÇO. ATIVIDADE ESPECIAL PARCIALMENTE RECONHECIDA. CORTE DE CANA.
AGENTES QUÍMICOS. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
PELAS REGRAS DE TRANSIÇÃO PREVISTAS NA EC Nº 103/2019 COM REAFIRMAÇÃO DA
DER. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
I - Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi
convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento
jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer o artigo 201 da Constituição
Federal o direito à aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, ao
completar 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem e 30 (trinta) anos de contribuição,
se mulher.
II - A concessão do benefício de aposentadoria, a partir de 13/11/2019, data de vigência da EC nº
103/2019, passou a exigir dois requisitos: idade mínima (65 anos para homens e 62 anos para
mulheres) e tempo de contribuição mínimo (20 anos para homens e 15 anos para mulheres).
III - Para os segurados filiados ao Regime Geral de Previdência até a edição da Emenda
Constitucional, são asseguradas cinco regras de transição.
IV - No caso dos autos, restou parcialmente comprovado o exercício de labor em condições
insalubres.
V - A somatória do tempo de serviço laborado pela parte autora, até 28/10/2020, autoriza a
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição com reafirmação da DER,
pelas regras de transição previstas no art. 17 da EC nº 103/2019, ante o preenchimento dos
requisitos legais.
VI - In casu, em virtude da somatória do tempo de contribuição após a data do requerimento
administrativo e ao ajuizamento da ação, o termo inicial do benefício deve ser fixado na data do
cumprimento do requisito temporal exigido.
VII - A correção monetária deve ser aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação
superveniente (conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal), observados os termos da
decisão final no julgamento do RE n. 870.947, Rel. Min. Luiz Fux.
VIII - Os juros de mora são devidos a partir da citação na ordem de 6% (seis por cento) ao ano,
até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02, após, à razão de 1% ao mês, consonante com o art.
406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997),
calculados nos termos deste diploma legal.
IX - Tendo por base decisão do C. STJ, apenas quarenta e cinco dias, contados da publicação
desta decisão, após o INSS não efetivar a implantação do benefício é que deve ter início a
incidência dos juros de mora, na forma acima disposta.
X - Inviável a condenação do INSS ao pagamento dos honorários advocatícios, nos termos do
julgado do C. STJ acerca da reafirmação da DER.
XI - Apelo do INSS parcialmente provido e apelação da autora provida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5166082-52.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: SONIA APARECIDA DIAS GALHARDI, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: VAGNER ALEXANDRE CORREA - SP240429-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, SONIA APARECIDA DIAS
GALHARDI
Advogado do(a) APELADO: VAGNER ALEXANDRE CORREA - SP240429-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5166082-52.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: SONIA APARECIDA DIAS GALHARDI, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
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GALHARDI
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelações em ação ajuizada contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço.
A r. sentença de nº 201436399-01/09 julgou o pedido nos seguintes termos:
“Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos da autora, nos termos
do art. 487, I, do CPC, para condenar a requerida a: i) reconhecer, averbar e computar os
períodos de 13/06/1983 a 06/12/1983; de 27/05/1985 a 03/06/1985; de 16/07/1985 a
03/09/1985; de 08/05/1991 a 08/11/1991; de 17/02/1992 a 08/05/1992; de 30/05/1992 a
14/10/1997; de 04/05/1998 a 11/12/1998; de 01/03/1999 a 11/11/1999; de 28/02/2000 a
07/11/2000; de 22/01/2001 a 15/01/2002 como laborados em condições especiais; ii) a acrescer
os períodos constantes nesta sentença aos demais já reconhecidos em sede administrativa,
conforme os dados constantes dos autos administrativos e do CNIS. Ante a sucumbência
recíproca, condeno o INSS ao pagamento de metade das despesas processuais, e ao
pagamento da verba honorária, a qual, com fulcro no art. 85, § 3º, inciso I, e § 4º, inciso I, do
Código de Processo Civil, arbitro em 10% (dez por cento) calculados sobre metade do valor da
causa. Condeno também o autor ao pagamento de metade das custas e despesas processuais,
bem como ao pagamento de honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre metade do
valor da causa. Ressalto, todavia, ser o autor beneficiário da gratuidade de justiça (fl. 103).
Indevida condenação em custas em relação ao INSS, face ao teor do artigo 6º da Lei Estadual
nº 11.608/03. Não é caso de reexame necessário, nos termos do artigo 496, §3º, I, do CPC,
pois embora a presente sentença seja ilíquida, percebe-se que os meses vencidos a serem
recebidos não ultrapassará o valor de 1.000 (um mil) salários mínimos. Publique-se. Intimem-
se. Cumpra-se.”
Em razões recursais de nº 201436405-01/12, requer a autora a concessão do benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição com reafirmação da DER.
Igualmente inconformado, em apelação de nº 201436411-01/17, pugna o INSS pela reforma da
sentença, ao fundamento de que não restou demonstrada a especialidade do labor com a
documentação apresentada, além de se insurgir no tocante aos honorários advocatícios. Por
fim, prequestiona a matéria para fins recursais.
É o sucinto relato.
NN
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5166082-52.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: SONIA APARECIDA DIAS GALHARDI, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: VAGNER ALEXANDRE CORREA - SP240429-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, SONIA APARECIDA DIAS
GALHARDI
Advogado do(a) APELADO: VAGNER ALEXANDRE CORREA - SP240429-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivos os recursos e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais,
passo ao exame da matéria objeto de devolução.
1. DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
O primeiro diploma legal brasileiro a dispor sobre a aposentadoria por tempo de serviço foi a Lei
Eloy Chaves, Decreto nº 4.682, de 24 de janeiro de 1923. Referido benefício era concedido
apenas aos ferroviários, possuindo como requisito a idade mínima de 50 (cinquenta) anos,
tendo sido suspensa no ano de 1940.
Somente em 1948 tal aposentadoria foi restabelecida, tendo sido mantida pela Lei nº 3.807, de
26 de agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS), que preconizava como
requisito para a concessão do benefício o limite de idade de 55 (cinquenta e cinco) anos,
abolido, posteriormente, pela Lei nº 4.130, de 28 de agosto de 1962, passando a adotar apenas
o requisito tempo de serviço.
A Constituição Federal de 1967 e sua Emenda Constitucional nº 1/69, também disciplinaram tal
benefício com salário integral, sem alterar, no entanto, a sua essência.
A atual Carta Magna manteve o benefício, disciplinando-o em seu art. 202 (redação original) da
seguinte forma:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês,
e comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar
seus valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo
inferior, se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a
integridade física, definidas em lei:
(...)
§1º: É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após
vinte e cinco, à mulher."
Antes da Emenda Constitucional n. 20/98, de 15 de dezembro de 1998, preceituava a Lei nº
8.213/91, nos arts. 52 e seguintes, que o benefício de aposentadoria por tempo de serviço era
devido ao segurado que, após cumprir o período de carência constante da tabela progressiva
estabelecida pelo art. 142 do referido texto legal, completar 30 anos de serviço, se homem, ou
25, se mulher, iniciando no percentual de 70% do salário-de-benefício até o máximo de 100%
para o tempo integral aos que completarem 30 anos de trabalho se mulher, e 35 anos de
trabalho se homem.
Na redação original do art. 29, caput, §1º, da Lei de Benefícios, o salário-de-benefício consiste
na média aritmética simples de todos os últimos salários-de-contribuição dos meses
imediatamente anteriores ao afastamento da atividade ou da data da entrada do requerimento,
até o máximo de 36, apurados no período não superior a 48 meses. Ao segurado que contava
com menos de 24 contribuições no período máximo estabelecido, o referido salário corresponde
a 1/24 da soma dos salários-de-contribuição.
Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi
convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento
jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer, nos arts. 201 e 202 da
Constituição Federal:
"Art. 201 A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter
contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro
e atuarial, e atenderá, nos termos da lei a:
(...)
§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei,
obedecidos as seguintes condições:
I - 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem, e 30 (trinta) anos de contribuição, se
mulher;
Art. 202 O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma
autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na
constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar.
(...)"
Entretanto, o art. 3º da referida Emenda garantiu o direito adquirido à concessão da
aposentadoria por tempo de serviço a todos aqueles que até a data da sua publicação, em 16
de dezembro de 1998, tivessem cumprido todos os requisitos legais, com base nos critérios da
legislação então vigente.
Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados
que cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da
EC n. 20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o
mesmo prazo e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
2. ALTERAÇÕES LEGISLATIVAS TRAZIDAS COM A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº
103/2019
A concessão do benefício de aposentadoria, a partir de 13/11/2019, data de vigência da EC nº
103/2019, passou a exigir dois requisitos: idade mínima (65 anos para homens e 62 anos para
mulheres) e tempo de contribuição mínimo (20 anos para homens e 15 anos para mulheres).
Para os segurados filiados ao Regime Geral de Previdência até a edição da Emenda
Constitucional, são asseguradas cinco regras de transição, quais sejam:
a) Por pontos:
“Art. 15 (...)
I - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se
homem; e
II - somatório da idade e do tempo de contribuição, incluídas as frações, equivalente a 86
(oitenta e seis) pontos, se mulher, e 96 (noventa e seis) pontos, se homem, observado o
disposto nos §§ 1º e 2º.
§ 1º A partir de 1º de janeiro de 2020, a pontuação a que se refere o inciso II do caput será
acrescida a cada ano de 1 (um) ponto, até atingir o limite de 100 (cem) pontos, se mulher, e de
105 (cento e cinco) pontos, se homem.
(...)”
(b) Por tempo de contribuição e idade mínima:
“Art. 16 (...)
I - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se
homem; e
II - idade de 56 (cinquenta e seis) anos, se mulher, e 61 (sessenta e um) anos, se homem.
§ 1º A partir de 1º de janeiro de 2020, a idade a que se refere o inciso II do caput será acrescida
de 6 (seis) meses a cada ano, até atingir 62 (sessenta e dois) anos de idade, se mulher, e 65
(sessenta e cinco) anos de idade, se homem.
(...)”
(c) Com pedágio de 50% e fator previdenciário:
“Art. 17. Ao segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em
vigor desta Emenda Constitucional e que na referida data contar com mais de 28 (vinte e oito)
anos de contribuição, se mulher, e 33 (trinta e três) anos de contribuição, se homem, fica
assegurado o direito à aposentadoria quando preencher, cumulativamente, os seguintes
requisitos:
I - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se
homem; e
II - cumprimento de período adicional correspondente a 50% (cinquenta por cento) do tempo
que, na data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, faltaria para atingir 30 (trinta)
anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem.
(...)”
(d) Com pedágio de 100% e idade mínima:
“Art. 20 (...)
I - 57 (cinquenta e sete) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem;
II - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se
homem;
(...)
IV - período adicional de contribuição correspondente ao tempo que, na data de entrada em
vigor desta Emenda Constitucional, faltaria para atingir o tempo mínimo de contribuição referido
no inciso II.
(...)”
(e) Por idade:
“Art. 18 (...)
I - 60 (sessenta) anos de idade, se mulher, e 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem; e
II - 15 (quinze) anos de contribuição, para ambos os sexos.
§ 1º A partir de 1º de janeiro de 2020, a idade de 60 (sessenta) anos da mulher, prevista no
inciso I do caput, será acrescida em 6 (seis) meses a cada ano, até atingir 62 (sessenta e dois)
anos de idade.
(...)”
3. DA CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM
3.1 DO DIREITO À CONVERSÃO ANTES DA LEI 6.887/80 E APÓS A LEI 9.711/98
A teor do julgamento do REsp 1.310.034 e do REsp 1.151.363, ambos submetidos ao regime
do art. 543-C do CPC, inexiste óbice para se proceder à conversão de tempo de serviço
especial em comum, seja antes da Lei 6.887/80 seja após Lei n. 9.711/1998.
3.2 DO RECONHECIMENTO DA ATIVIDADE EXERCIDA EM ATIVIDADE ESPECIAL
Para o reconhecimento da natureza especial da atividade exercida e a conversão desse
intervalo especial em comum, cabe ao segurado demonstrar o trabalho em exposição a agentes
agressivos, nos termos da lei vigente à época da prestação do trabalho, observando-se o
princípio tempus regit actum (Pet 9.194/PR, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira
Seção, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
3.2.1 PERÍODO ANTERIOR À EDIÇÃO DA LEI Nº 9.032/95
No período anterior à edição da Lei nº 9.032/95, o direito à aposentadoria especial e à
conversão do tempo trabalhado em atividades especiais é reconhecido em razão da categoria
profissional exercida pelo segurado ou pela sua exposição aos agentes nocivos descritos nos
Anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, a ser comprovada por meio da apresentação
de SB 40, sem a necessidade de apresentação de laudo técnico, exceção feita à exposição ao
ruído.
3.2.2 PERÍODO POSTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.032/95 ATÉ A EDIÇÃO DO DECRETO
Nº 2.172, DE 5 DE MARÇO DE 1997
A comprovação da atividade especial exercida após a edição da Lei nº 9.032, de 29 de abril de
1995 - que promoveu a alteração do art. 57 da Lei n. 8213/91 - se dá com a demonstração da
efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, mediante a
apresentação do formulário DSS-8030 (antigo SB 40), o qual se reveste da presunção de que
as circunstâncias de trabalho ali descritas se deram em condições especiais, não sendo,
portanto, imposto que tal documento se baseie em laudo pericial, com exceção ao limite de
tolerância para nível de pressão sonora (ruído).
Anote-se que a relação dos agentes nocivos constante do Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
de março de 1964, e dos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, em vigor
até o advento do Decreto Regulamentar nº 2.172/97, de 5 de março de 1997, fora substituído
pelo Decreto nº 3.048, de 06 de maio de 1999.
Relevante consignar que, a partir da Lei nº 9.032/95, não é mais possível o reconhecimento da
atividade especial, unicamente, com fulcro no mero enquadramento da categoria profissional.
3.2.3 PERÍODO POSTERIOR À VIGÊNCIA DO DECRETO Nº 2.172, DE 5 DE MARÇO DE
1997 E DEMAIS CONSIDERAÇÕES
Com a edição do Decreto nº 2.172, de 5 de março de 1997, que regulamentou a Medida
Provisória nº 1523/96, convertida na Lei nº 9.528/97, é indispensável a apresentação de laudo
técnico para a comprovação de atividade especial.
Cabe esclarecer que a circunstância de o laudo não ser contemporâneo à atividade avaliada
não lhe retira absolutamente a força probatória, em face de inexistência de previsão legal para
tanto e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral (AC 0022396-
76.2005.4.01.3800/MG, Rel. Desembargador Federal Candido Moraes, 2ª Turma, e-DJF1 p.198
de 18/11/2014). Súmula 68 TNU.
Além disso, é de se apontar que o rol de agentes insalubres, como também das atividades
penosas e perigosas não se esgotam no regulamento, tal como cristalizado no entendimento
jurisprudencial na Súmula/TFR n. 198:
"Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata
que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita
em Regulamento."
Nesse sentido, julgados do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 395988,
Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 18.11.2003, DJ 19.12.2003, p. 630; 5ª Turma, REsp nº 651516,
Rel. Min. Laurita Vaz, j. 07.10.2004, DJ 08.11.2004, p. 291.
3.3 USO DO EPI
No tocante à utilização de Equipamentos de Proteção Individual - EPI, em recente decisão, com
repercussão geral, no ARE 664.335/SC, assentou a Suprema Corte que:
"o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente
nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não
haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial" (grifo nosso). No caso, porém, de
dúvida em relação à efetiva neutralização da nocividade, decidiu que "a premissa a nortear a
Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria
especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para
descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete".
No mais, especificamente quanto à eficácia do equipamento de proteção individual - EPI ao
agente agressivo ruído, o Pretório Excelso definiu que:
"na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a
declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido
da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço
especial para aposentadoria". Isso porque, "ainda que se pudesse aceitar que o problema
causado pela exposição ao ruído relacionasse apenas à perda das funções auditivas, o que
indubitavelmente não é o caso, é certo que não se pode garantir uma eficácia real na
eliminação dos efeitos do agente nocivo ruído com a simples utilização de EPI, pois são
inúmeros os fatores que influenciam na sua efetividade, dentro dos quais muitos são
impassíveis de um controle efetivo, tanto pelas empresas, quanto pelos trabalhadores".
4. AGENTES INSALUBRES
CORTE DE CANA
Com relação à atividade desempenhada no corte de cana, entendo que, considerando a sua
natureza extremamente penosa, caracteriza-se como insalubre e, portanto, passível de
conversão.
Confira-se o seguinte precedente:
"CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO.
RURÍCOLA. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. ATIVIDADE
COMPROVADA. CORTE DE CANA. ATIVIDADE ESPECIAL. DIREITO À CONVERSÃO DO
TEMPO ESPECIAL EM COMUM. CARÊNCIA. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. CORREÇÃO
MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS E DESPESAS
PROCESSUAIS.
1 - A concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço é devida, nos termos do
art. 202, §1º, da Constituição Federal (redação original) e dos arts. 52 e seguintes da Lei nº
8.213/91, ao segurado que preencheu os requisitos necessários antes da Emenda
Constitucional nº 20/98.
2 - A qualificação de lavrador do autor constante dos atos de registro civil constitui início
razoável de prova material do exercício de atividade rural, conforme entendimento consagrado
pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça.
3 - A prova testemunhal, acrescida de início razoável de prova material, é meio hábil à
comprovação da atividade rurícola.
4 - O art. 55, §2º, da Lei nº 8.213/91 estabelece que será computado o tempo de serviço rural
independentemente do recolhimento das contribuições correspondente ao período respectivo,
razão pela qual não há necessidade da parte autora indenizar a Autarquia Previdenciária.
5 - A atividade rural exercida no corte de cana é de ser considerada como exercida em
condições especiais à saúde ou integridade física do trabalhador.
(...)
11 - Apelação e remessa oficial parcialmente providas. Tutela específica concedida."
(TRF3, 9ª Turma, AC nº 2006.03.99.013743-0/SP, Rel. Des. Fed. Marisa Santos, Rel. p/
Acórdão: Des. Fed. Nelson Bernardes, j. 08/02/2010, D.E. 12/3/2010).
5. DO CASO DOS AUTOS
Pleiteia a requerente o reconhecimento, como especial e sua respectiva conversão para
comum, dos períodos em que teria trabalhado sujeita a agentes agressivos, tendo juntado a
documentação abaixo discriminada:
- 13/06/1983 a 06/12/1983, 27/05/1985 a 03/06/1985 e 16/07/1985 a 03/09/1985: Laudo pericial
judicial (nº 201436390-01/23) - trabalhadora rural - exercia atividades relacionadas à cultura de
cana-de-açúcar: enquadramento em razão do desempenho de atividade penosa;
- 08/05/1991 a 08/11/1991, 17/02/1992 a 08/05/1992, 04/05/1998 a 11/12/1998, 01/03/1999 a
11/11/1999, 28/02/2000 a 07/11/2000 e 22/01/2001 a 15/01/2002: Perfil Profissiográfico
Previdenciário (nº 201436326-02/11 e 201436336-01/07) - trabalhadora rural - exercia
atividades relacionadas à cultura de cana-de-açúcar: enquadramento em razão do desempenho
de atividade penosa;
- 30/05/1992 a 14/10/1997: Laudo pericial judicial (nº 201436390-01/23) - exposição a agente
químico álcalis cáustico: enquadramento do lapso de 30/05/1992 a 05/03/1997 com base no
código 1.2.9 do Decreto nº 53.831/64, não sendo possível o reconhecimento do intervalo
posterior em razão da ausência de previsão deste agente químico no decreto aplicável ao caso
em apreço (Decreto nº 2.172/97).
Como se vê, restou comprovado o labor em condições especiais nos interregnos
compreendidos entre 13/06/1983 e 06/12/1983, 27/05/1985 e 03/06/1985, 16/07/1985 e
03/09/1985, 08/05/1991 e 08/11/1991, 17/02/1992 e 08/05/1992, 30/05/1992 e 05/03/1997,
04/05/1998 e 11/12/1998, 01/03/1999 e 11/11/1999, 28/02/2000 e 07/11/2000 e 22/01/2001 e
15/01/2002.
No tocante à concessão do benefício com reafirmação da DER, destaco que o Superior Tribunal
de Justiça ao julgar o Recurso Especial nº 1.727.064 - SP, em que se discutia o Tema 995,
assegurou a possibilidade de reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o
momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso
se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas
instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de
pedir.
Desse modo, em consonância com o entendimento esposado, somando-se os períodos de
contribuição até 28/10/2020, a parte autora contava com 30 anos, 03 meses e 29 dias de tempo
de serviço, preenchendo, portanto, os requisitos exigidos à concessão do benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição pelas regras de transição previstas no art. 17, da
Emenda Constitucional nº 103/2019, em valor a ser devidamente calculado pelo Instituto
Previdenciário.
Também restou amplamente comprovada pelo conjunto probatório acostado aos autos, a
carência prevista na tabela do art. 142 da Lei de Benefícios.
6. CONSECTÁRIOS
TERMO INICIAL
In casu, em virtude da somatória do tempo de contribuição após a data do requerimento
administrativo e ao ajuizamento da ação, o termo inicial do benefício deve ser fixado na data do
cumprimento do requisito temporal exigido (28/10/2020).
CORREÇÃO MONETÁRIA
A correção monetária deve ser aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação
superveniente (conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal), observados os termos da
decisão final no julgamento do RE n. 870.947, Rel. Min. Luiz Fux.
JUROS DE MORA
Conforme disposição inserta no art. 219 do Código de Processo Civil 1973 (atual art. 240
Código de Processo Civil - Lei nº 13.105/2015), os juros de mora são devidos a partir da citação
na ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02, após, à
razão de 1% ao mês, consonante com o art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº
11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), calculados nos termos deste diploma legal.
Neste ponto, insta ressaltar que, nos termos do julgado do C. STJ, apenas quarenta e cinco
dias, contados da publicação desta decisão, após o INSS não efetivar a implantação do
benefício é que deve ter início a incidência dos juros de mora, na forma acima disposta.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Da mesma forma, com base neste julgado do C. STJ, inviável a condenação do INSS ao
pagamento dos honorários advocatícios.
CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS
A teor do disposto no art. 4º, I, da Lei Federal nº 9.289/96, as Autarquias são isentas do
pagamento de custas na Justiça Federal.
De outro lado, o art. 1º, §1º, deste diploma legal, delega à legislação estadual normatizar sobre
a respectiva cobrança nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual no exercício da
competência delegada.
Assim, o INSS está isento do pagamento de custas processuais nas ações de natureza
previdenciária ajuizadas nesta Justiça Federal e naquelas aforadas na Justiça do Estado de
São Paulo, por força da Lei Estadual/SP nº 11.608/03 (art. 6º).
Contudo, a legislação do Estado de Mato Grosso do Sul que dispunha sobre a isenção referida
(Leis nº 1.135/91 e 1.936/98) fora revogada a partir da edição da Lei nº 3.779/09 (art. 24, §§1º e
2º), razão pela qual é de se atribuir ao INSS o ônus do pagamento das custas processuais nos
feitos que tramitam naquela unidade da Federação.
De qualquer sorte, é de se ressaltar que, em observância ao disposto no art. 27 do Código de
Processo Civil, o recolhimento somente deve ser exigido ao final da demanda, se sucumbente.
A isenção referida não abrange as despesas processuais, bem como aquelas devidas a título
de reembolso à parte contrária, por força da sucumbência.
7. PREQUESTIONAMENTO
Por derradeiro, cumpre salientar que, diante de todo o explanado, a r. sentença de primeiro
grau não ofendeu qualquer dispositivo legal, não havendo razão ao prequestionamento
apresentado pelo INSS em seu apelo.
8. DISPOSITIVO
Ante o exposto, dou parcial provimento ao apelo do INSS, reformando a r. sentença de primeiro
grau para deixar de reconhecer, como especial, o período de 06/03/1997 a 14/10/1997e dou
provimento à apelação da autora, para determinar a concessão do benefício de aposentadoria
por tempo de contribuição com reafirmação da DER, na forma acima fundamentada.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
SERVIÇO. ATIVIDADE ESPECIAL PARCIALMENTE RECONHECIDA. CORTE DE CANA.
AGENTES QUÍMICOS. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO PELAS REGRAS DE TRANSIÇÃO PREVISTAS NA EC Nº 103/2019 COM
REAFIRMAÇÃO DA DER. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
I - Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi
convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento
jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer o artigo 201 da Constituição
Federal o direito à aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, ao
completar 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem e 30 (trinta) anos de contribuição,
se mulher.
II - A concessão do benefício de aposentadoria, a partir de 13/11/2019, data de vigência da EC
nº 103/2019, passou a exigir dois requisitos: idade mínima (65 anos para homens e 62 anos
para mulheres) e tempo de contribuição mínimo (20 anos para homens e 15 anos para
mulheres).
III - Para os segurados filiados ao Regime Geral de Previdência até a edição da Emenda
Constitucional, são asseguradas cinco regras de transição.
IV - No caso dos autos, restou parcialmente comprovado o exercício de labor em condições
insalubres.
V - A somatória do tempo de serviço laborado pela parte autora, até 28/10/2020, autoriza a
concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição com reafirmação da DER,
pelas regras de transição previstas no art. 17 da EC nº 103/2019, ante o preenchimento dos
requisitos legais.
VI - In casu, em virtude da somatória do tempo de contribuição após a data do requerimento
administrativo e ao ajuizamento da ação, o termo inicial do benefício deve ser fixado na data do
cumprimento do requisito temporal exigido.
VII - A correção monetária deve ser aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e
legislação superveniente (conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal), observados os
termos da decisão final no julgamento do RE n. 870.947, Rel. Min. Luiz Fux.
VIII - Os juros de mora são devidos a partir da citação na ordem de 6% (seis por cento) ao ano,
até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02, após, à razão de 1% ao mês, consonante com o art.
406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997),
calculados nos termos deste diploma legal.
IX - Tendo por base decisão do C. STJ, apenas quarenta e cinco dias, contados da publicação
desta decisão, após o INSS não efetivar a implantação do benefício é que deve ter início a
incidência dos juros de mora, na forma acima disposta.
X - Inviável a condenação do INSS ao pagamento dos honorários advocatícios, nos termos do
julgado do C. STJ acerca da reafirmação da DER.
XI - Apelo do INSS parcialmente provido e apelação da autora provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento ao apelo do INSS e dar provimento à apelação da
autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA