
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000896-70.2022.4.03.6109
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VALERIA LUPETTI
Advogado do(a) APELADO: PRISCILA ADRIANA LAFRATA DA SILVA - SP328277-A
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000896-70.2022.4.03.6109
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VALERIA LUPETTI
Advogado do(a) APELADO: PRISCILA ADRIANA LAFRATA DA SILVA - SP328277-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada por VALÉRIA LUPETTI em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a revisão da renda mensal inicial do benefício previdenciário de pensão por morte (NB 21/ 142.358.618-0), além da cobrança das parcelas vencidas entre a data do falecimento do cônjuge (11/10/2006) e o início do pagamento na esfera administrativa (22/02/2007).
A r. sentença julgou parcialmente procedente o pedido, nos seguintes termos: “ julgo parcialmente procedente o pedido com resolução de mérito, com fulcro no artigo 487, inciso I do Código de Processo Civil, para determinar ao Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, que revise o benefício de pensão por morte da autora VALERIA LUPETTI (NB nº 21/ 142.358.618-0), corrigindo a DER para 11.10.2006, recalcule o salário de benefício, considerando a média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo - PBC, na forma estabelecida pelo art. 29, II, da Lei nº 8.213/91, com reflexos na RMI e proceda ao pagamento das parcelas atrasadas do benefício desde 11.10.2006, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora a partir da citação, de acordo com o preceituado na Resolução do Conselho da Justiça Federal ora vigente (...)”.
Em razões recursais, a Autarquia Federal pleiteia, preliminarmente, a improcedência do pedido, arguindo que o processo administrativo não interrompe a decadência do direito à revisão, a teor do disposto no art. 207 do Código Civil. Alternativamente, requer a anulação da sentença, por ter incidido em julgamento extra petita. Subsidiariamente, pugna pelo reconhecimento da prescrição quinquenal. Suscita, por fim, o prequestionamento legal, para efeito de interposição de recursos (id. 292529635 – p. 1/5).
Contrarrazões (id. 292529638 – p. 1/4).
Devidamente processado o recurso, subiram os autos a esta instância para decisão.
É o relatório.
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9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000896-70.2022.4.03.6109
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VALERIA LUPETTI
Advogado do(a) APELADO: PRISCILA ADRIANA LAFRATA DA SILVA - SP328277-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais, passo ao exame da matéria objeto de devolução.
PRELIMINAR DE DECADÊNCIA DO DIREITO À REVISÃO
O art. 103 da Lei nº 8.213/91, em sua redação original, não previa o instituto da decadência, mas tão-somente a prescrição das quantias não abrangidas pelo quinquênio anterior ao ajuizamento da ação.
A Lei nº 9.528/97, por sua vez, alterou o referido dispositivo, passando a estabelecer em seu caput:
"Art. 103. É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo"
Na sequência, adveio a Lei nº 9.711/98, a qual determinou a redução do prazo decadencial para cinco anos, o qual foi novamente fixado em dez anos pela Medida Provisória n.º 138, de 19 de novembro de 2003, convertida na Lei n.º 10.839, de 05 de fevereiro de 2004.
A 1ª Seção do C. STJ, no julgamento do Resp nº 1.303.988 (DJE 21.03.2012) sedimentou o entendimento de que a perda do direito de pleitear a revisão do ato de concessão do benefício no prazo de 10 anos, a contar da Medida Provisória nº 1523-9/97, publicada em 28 de junho de 1997, norma predecessora da Lei nº 9.528/97, na hipótese de a ação versar acerca de fatos anteriores a sua vigência.
No caso dos autos, verifica-se da carta de concessão ser a parte autora titular do benefício previdenciário de pensão por morte (NB 21/142.358.618-0), com termo inicial fixado em 22 de fevereiro de 2007 (id. 292529435 – p. 40).
É certo que, nos moldes preconizados pelo art. 207 do Código Civil, não se aplicam à decadência as normas que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição.
É de ser observar, no entanto, que enquanto esteve na pendência de julgamento do recurso administrativo, o prazo decadencial sequer teve início.
Esta interpretação está em consonância com o disposto no art. 103 da Lei de Benefícios, no sentido de que a contagem do prazo decadencial tem início no dia em que o beneficiário tomar conhecimento da decisão definitiva no âmbito administrativo.
O recurso administrativo da parte autora, o qual questionava a data de início da pensão e o valor da renda mensal inicial do benefício somente teve seu desfecho em 01 de julho de 2013 (id. 292529441 – p. 26).
Considerando que a presente demanda foi ajuizada em 22 de março de 2022, resta afastada a decadência suscita pelo INSS.
CARACTERIZAÇÃO DE JULGAMENTO EXTRA PETITA
Na exordial, a parte autora pleiteou a retroação do termo inicial da pensão por morte a contar da data do óbito (11/10/2006), arguindo ter havido requerimento administrativo no prazo de trinta dias, nos termos do art. 74, I da Lei nº 8.213/91, com a redação vigente ao tempo do óbito. Pleiteou a condenação do INSS, ao pagamento das parcelas vencidas entre 11 de outubro de 2006 e 22 de fevereiro de 2007, data de início do pagamento na esfera administrativa.
O segundo pedido consistiu no recálculo da pensão por morte, através da exclusão das contribuições correspondentes ao interregno de abril de 2003 a junho de 2006, para que houvesse a majoração do valor da renda mensal inicial do benefício de auxílio-doença do qual o de cujus era titular, com reflexos no valor da pensão por morte.
Argui não terem sido vertidas contribuições previdenciárias pelo de cujus, no interregno de abril de 2003 a junho de 2006, conforme havia sido reconhecido inicialmente pelo INSS, por ocasião do deferimento do auxílio-doença, o qual foi objeto de revisão administrativa posterior, com redução do valor da pensão por morte.
A sentença, no entanto, esteve pautada nos seguintes termos:
“(...)
Ainda sobre a pretensão cumpre consignar que conforme a Lei nº. 9.876, de 26 de novembro de 1999, que alterou o artigo 29, da Lei nº. 8.213/91, o salário de benefício consiste, para os benefícios de que tratam as alíneas a, d, e, h do inciso I do art. 18, na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo.
No entanto, ao regulamentar a nova lei, os Decretos nº 3.265, de 29 de novembro de 1999 e nº 5.399 de 24 de março de 2005 inovaram e alteraram a forma de calcular o salário de benefício do auxílio-doença, da aposentadoria por invalidez e da pensão por morte, estabelecendo que o divisor considerado no cálculo da média aritmética do salário de benefício não poderia ser inferior a sessenta por cento do período contributivo - PBC.
Porém, ao analisar a Lei nº 9.876/99, nota-se essa exigência mínima de contribuições aplica-se apenas às aposentadorias por idade, por tempo de contribuição e especial. Assim, as limitações impostas pelos Decretos 3.265/99 e 5.545/05, não encontraram respaldo legal.
“Os referidos decretos inovaram na ordem jurídica, o que é vedado pelo nosso sistema. Desse modo, todos os benefícios de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e as pensões deles decorrentes que foram concedidos com base nos Decretos 3.265/99 e 5.545/05 devem ser revistos para terem a renda mensal inicial calculada nos termos do Decreto nº 3.048/99, com redação dada pelo Decreto nº 6.939/2009” (AR 5010024-11.2022.4.03.0000, Desembargador Federal NILSON MARTINS LOPES JUNIOR, DJEN DATA: 05/09/2023)”.
Destaco que o valor da renda mensal inicial da pensão por morte é apurado de acordo com o disposto no art. 75 da Lei nº 8.213/91, com a redação vigente ao tempo do falecimento, in verbis:
“Art. 75. O valor mensal da pensão por morte será de cem por cento do valor da aposentadoria que o segurado recebia ou daquela a que teria direito se estivesse aposentado por invalidez na data de seu falecimento, observado o disposto no art. 33 desta lei”. grifei
No cálculo da renda mensal do benefício de auxílio-doença (NB 31/517963302-0) foram considerados os salários-de-contribuição constantes nos extratos do Sistema Único de Benefícios – DATAPREV, no interregno compreendido entre julho de 1994 e maio de 2006, em que Nelson Carlos Lupetti havia laborado como empregado.
Os salários-de-contribuição do período básico de cálculo, considerados a partir de julho de 1994, obedeceu ao disposto no art. 3º da Lei nº 9.876/99 (id. 292529436 – p. 31/33).
Observo da carta de concessão do auxílio-doença (NB 31/517596302-0) que o salário de benefício foi apurado, inicialmente, no montante de R$ 2.319,65. Sobre referido valor incidiu o percentual de 91% (noventa e um por cento), o qual corresponde ao salário de benefício do auxílio-doença, a teor do disposto no art. 61 da Lei nº 8.213/91, ficando estabelecido em R$ 2.110,88 (id. 292529435 - p. 38).
O valor de eventual aposentadoria por invalidez e, consequentemente, da pensão por morte, seria de R$ 2.319,65, o qual corresponde a 100% (cem por cento) do salário de benefício, nos moldes preconizados pelo art. 75 da Le de Benefícios.
O INSS, posteriormente, procedeu à revisão administrativa da renda mensal inicial do auxílio-doença, fazendo incluir no período básico de cálculo contribuições vertidas como contribuinte individual, entre abril de 2003 e junho de 2006, com salários-de-contribuição correspondentes a um salário-mínimo, o que reduziu sobremaneira o valor do auxílio-doença e, consequentemente, da pensão por morte da qual a parte autora já era titular.
A sentença não apreciou um dos pedidos da exordial, o qual consistia na exclusão do período básico de cálculo dos salários-de-contribuições atinentes ao interregno de abril de 2003 a junho de 2006, no qual, segundo a alegação da parte autora, não teriam sido vertidas contribuições como contribuinte individual pela falecido esposo (id. 292529632 - p. 1/2).
Uma vez fixados os limites da lide pelo autor em sua petição inicial (art. 141 do CPC), veda-se ao juiz decidir além (ultra petita), aquém (citra petita ) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante o art. 492 do CPC, do mesmo modo que não se permite ao primeiro inová-lo na extensão ou na substância, por influxo dos princípios dispositivo e da congruência.
Constatado o julgamento extra petita, impõe-se seu reconhecimento para declarar a nulidade da sentença em sua plenitude, não se restringindo apenas à parte que contemplou matéria diversa. Precedentes TRF3: 9ª Turma, AC nº 2007.03.99.042869-6, Rel. Des. Fed. Nelson Bernardes, j. 04/08/2008, DJF3 03/09/2008; 7ª Turma, REO nº 2006.03.99.041234-9, Rel. Des. Eva Regina, j. 26/01/2009, DJF3 04/03/2009.
O art. 1.013, § 3º do CPC (questão exclusivamente de direito e processo em condições de imediato julgamento) permite, em tese, do conhecimento da pretensão originária para decidir a lide, a contento dos princípios da celeridade e da economia processual. Precedentes TRF3: 7ª Turma, AC nº 1999.03.99.010197-0, Rel. Des. Fed. Eva Regina, j. 07/05/2007, DJU 31/05/2007, p. 513; 9ª Turma, AC nº 2002.03.99.009542-9, j. 02/04/2007, DJU 31/05/2007, p. 680.
No entanto, a matéria suscitada depende de dilação probatória, com a realização de perícia contábil, para que se apure qual seria o valor correto da renda mensal inicial do auxílio-doença (NB 31/517.596.302-0) auferido pelo de cujus, inclusive na hipótese de serem abstraídos os salários-de-contribuições vertidos como contribuinte individual, no interregno compreendido entre abril de 2003 e junho de 2006, com reflexos no valor da pensão por morte da qual a autora é titular (NB 21/142.358.618-0).
DISPOSITIVO
Ante o exposto, rejeito a preliminar de decadência e acolho a preliminar de julgamento extra petita, a fim de dar parcial provimento à apelação do INSS, com a anulação da sentença, determinando a remessa dos autos ao juízo de origem, para que tenha seu regular processamento, com a realização de perícia contábil, necessária ao deslinde da causa, na forma da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. REVISÃO DA RENDA MENSAL INICIAL. DECADÊNCIA NÃO CONFIGURADA. JULGAMENTO EXTRA PETITA. CARACTERIZAÇÃO. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. PERÍCIA CONTÁBIL. NÃO INCIDÊNCIA DO ART. 1.013, §3º DO CPC. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
- Decadência do direito de revisão não configurada, uma vez que a ação foi ajuizada no período de dez anos, a contar do conhecimento pelo beneficiário da decisão definitiva no âmbito administrativo, a teor do disposto no art. 103 da Lei nº 8.213/91.
- Uma vez fixados os limites da lide pelo autor em sua petição inicial (art. 141 do CPC), veda-se ao juiz decidir além (ultra petita), aquém (citra petita ) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante o art. 492 do CPC, do mesmo modo que não se permite ao primeiro inová-lo na extensão ou na substância, por influxo dos princípios dispositivo e da congruência.
- Constatado o julgamento extra petita, impõe-se seu reconhecimento, para declarar a nulidade da sentença em sua plenitude, não se restringindo apenas à parte que contemplou matéria diversa.
- Impossibilidade de aplicação do disposto no art. 1.013, § 3º do CPC (questão exclusivamente de direito e processo em condições de imediato julgamento), já que o julgamento da lide depende de dilação probatória, com a realização de perícia contábil, para que se apure qual o valor correto da renda mensal inicial do auxílio-doença auferido pelo de cujus, com reflexos no valor da pensão por morte da qual a autora é titular.
- Matéria preliminar acolhida. Sentença anulada.
- Apelação do INSS provida parcialmente.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
