
3ª Seção
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5028923-57.2022.4.03.0000
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
AUTOR: ATEVALDO GONCALVES SANTOS
Advogado do(a) AUTOR: JOSE CARLOS GOMES PEREIRA MARQUES CARVALHEIRA - SP139855-N
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
3ª Seção
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5028923-57.2022.4.03.0000
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
AUTOR: ATEVALDO GONCALVES SANTOS
Advogado do(a) AUTOR: JOSE CARLOS GOMES PEREIRA MARQUES CARVALHEIRA - SP139855-N
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL JEAN MARCOS (RELATOR):
Trata-se de agravo interno contra decisão (ID 283100508) que indeferiu a inicial e julgou extinto o processo, sem resolução de mérito, por ausência de interesse de agir para impugnar pela presente via decisão recorrível em processo em tramitação, sem trânsito em julgado, nos termos dos artigos 330, III, c/c 485, I, e 966, todos do Código de Processo Civil.
A parte autora, ora agravante, requer a reforma da decisão monocrática por este Colegiado, alegando que a decisão rescindenda contém vício processual que vulnera os artigos 141 e 492 do CPC, tornando-a passível de desconstituição, uma vez que comprovou ter laborado em atividade especial no período de 06/10/2000 a 14/05/2002, merecendo a conversão em período de tempo comum (com o acréscimo de 40%), o que teria sido alvo de pedido expresso nos autos da decisão impugnada (ID 284651921).
Sem resposta.
Parecer do Ministério Público Federal, em que manifesta ciência da interposição do agravo, sem interesse em recorrer (ID 300104565).
É o relatório.
3ª Seção
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5028923-57.2022.4.03.0000
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
AUTOR: ATEVALDO GONCALVES SANTOS
Advogado do(a) AUTOR: JOSE CARLOS GOMES PEREIRA MARQUES CARVALHEIRA - SP139855-N
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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DECLARAÇÃO DE VOTO
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL ERIK GRAMSTRUP:
O eminente Desembargador Federal JEAN MARCOS apresentou judicioso voto, no qual Sua Excelência negou provimento ao agravo interno a fim de manter a r. decisão proferida no ID 283100508, que indeferiu a inicial a ação rescisória sob o fundamento de falta de interesse de agir, vez que não foi objeto de análise na ação subjacente a alegada especialidade na atividade exercida no período de 06/10/2000 a 14/05/2002, inexistindo, por conseguinte, coisa julgada sobre referido ponto. Diante disso, concluiu pela inadmissibilidade da presente ação rescisória.
Consignou o eminente Relator:
“Ocorre que, no presente caso, a controvérsia posta nos autos cinge-se à possibilidade de rescindir a decisão prolatada na ação nº 6074409- 29.2019.4.03.9999, sob o fundamento de manifesta violação à norma jurídica, porque a decisão que se pretende rescindir omitiu-se em relação à especialidade da atividade exercida entre 06/10/2000 e 16/05/2002, negando o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição ao autor (ID 265730193 – pág. 5 - 24).
Entretanto, reitero o entendimento da i. presentante do Parquet Federal nestes autos, segundo a qual “por conta da inexistência de decisão a respeito do período de 06/10/2000 a 16/05/2002, é possível a repropositura da ação em relação ao pedido não examinado, pois não há coisa julgada em relação ao que não foi decidido. (...) Logo, se a sentença foi omissa em relação a um pedido, a questão principal não foi expressamente decidida, não ocorrendo a coisa julgada. E por inexistir coisa julgada, não é possível o ajuizamento de ação rescisória” (ID 274472373).
Desse modo, verifico que não há, a rigor, interesse de agir da parte autora para impugnar pela presente via decisão recorrível em processo em trâmite, sem trânsito em julgado. Assim, impõe-se a extinção do feito sem resolução de mérito, ante ausência de uma das condições da ação legalmente previstas, qual seja, a existência de decisão de mérito ou sem mérito desde que impeça (i) nova propositura da demanda ou (ii) admissibilidade do recurso correspondente, em qualquer caso com trânsito em julgado (art. 966, caput, c/c §2o, do CPC).
Por tais fundamentos, indefiro a inicial e julgo a ação rescisória extinta, sem a resolução do mérito, por ausência de interesse de agir, nos termos dos artigos 330, III, c/c 485, I, art. 966, todos do Código de Processo Civil.”
A eminente Desembargadora Federal LOUISE FILGUEIRAS apresentou voto divergente, no qual reconheceu a existência de interesse de agir da parte autora com fundamento no artigo 966, inciso V, do CPC, em razão de possível violação manifesta ao artigo 492 do CPC, fato que deverá ser oportunamente analisado por esta E. Corte Regional quando do julgamento da ação rescisória.
Com a devida venia do eminente Relator, entendo haver indícios de violação manifesta de norma jurídica decorrente de possível decisão que deixou de apreciar a integralidade dos pedidos formulados, contrariando o disposto no artigo 492 do CPC, motivo pelo qual acompanho a bem lançada divergência inaugurada pela e. Desembargadora Federal LOUISE FILGUEIRAS.
Inicialmente, verifico que o prazo para ajuizamento da rescisória, estabelecido no artigo 975 do Código de Processo Civil, foi observado. A ação subjacente transitou em julgado em 06/10/2021 (certidão - ID 265730197, p. 2) e a presente rescisória foi ajuizada em 23/10/2022.
Nos autos da ação subjacente deixou de ser apreciado o pedido no tocante ao reconhecimento da especialidade na atividade exercida no período de 06/10/2000 a 14/05/2002, apesar de haver requerimento expresso na exordial. Dessa forma, constata-se manifesta violação ao disposto no artigo 492 do Código de Processo Civil, evidenciando julgamento proferido aquém dos limites da lide.
Com o propósito de fundamentar a interpretação adotada, reproduzo o teor do artigo 492 do Código de Processo Civil:
“Art. 492. É vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.
Parágrafo único. A decisão deve ser certa, ainda que resolva relação jurídica condicional”.
Nesse sentido, trago o seguinte precedente deste Tribunal:
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. PERÍODOS DE ATIVIDADE ESPECIAL E DE ATIVIDADE COMUM RECONHECIDOS JUDICIALMENTE. AUSÊNCIA DE CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO. ERRO DE FATO NÃO CARACTERIZADO. INTERPRETAÇÃO DA PRETENSÃO RECURSAL. CONJUNTO DAS POSTULAÇÕES. JULGAMENTO CITRA PETITA. VIOLAÇÃO À NORMA JURÍDICA CONFIGURADA. CUMPRIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO SUPERIOR A 35 (TRINTA E CINCO) ANOS. CONCESSÃO. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR IDADE CONCEDIDO NA ESFERA ADMINISTRATIVA. OPÇÃO PELO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO.
I - Para que ocorra a rescisão respaldada no art. 966, inciso VIII, do CPC, deve ser demonstrada a conjugação dos seguintes fatores, a saber: a) o erro de fato deve ser determinante para a decisão de mérito; b) sobre o erro de fato suscitado não pode ter havido controvérsia entre as partes; c) sobre o erro de fato não pode ter havido pronunciamento judicial, d) o erro de fato deve ser apurável mediante simples exame das peças do processo originário.
II - A 7ª Turma Julgadora prolatou o v. acórdão rescindendo para reconhecer os períodos de atividade especial exercidos de 28.11.1973 a 30.11.1978 e de 01.11.1983 a 30.05.1988, convertendo-os em atividade comum, mantendo a sentença quanto ao não reconhecimento dos períodos de 01.07.1982 a 30.10.1982 e deixando de apreciar relativamente ao cômputo do período de 01.09.1988 a 31.07.1989, ante a ausência de interesse de agir.
III - O v. acórdão rescindendo restringiu-se ao debate acerca da configuração ou não de condições especiais quanto aos períodos de 28.11.1973 a 30.11.1978 e de 01.11.1983 a 30.05.1988 e da existência ou não de atividade comum nos períodos de 01.07.1982 a 30.10.1982 e de 01.09.1988 a 31.07.1989, inexistindo qualquer alusão ao cômputo total de tempo de serviço para fins de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, não apresentando planilha demonstrando a contagem do tempo de serviço.
IV - Não se evidencia na r. decisão rescindenda qualquer equívoco que possa ser reputado como erro de fato, posto que houve a apreciação integral dos períodos vindicados como especiais, bem como daqueles em atividade comum, inexistindo, por outro giro, qualquer procedimento contemplando a somatória dos períodos reconhecidos na esferas administrativa e judicial, não sendo possível identificar incorreção que implicasse a admissão de fato inexistente ou a consideração por inexistente de fato efetivamente ocorrido.
V - Para que ocorra a rescisão respaldada no inciso V do art. 966 do CPC deve ser demonstrada a violação à lei perpetrada pela r. decisão de mérito, consistente na inadequação dos fatos deduzidos na inicial à figura jurídica construída pela decisão rescindenda, decorrente de interpretação absolutamente errônea da norma regente.
VI - A possibilidade de se eleger mais de uma interpretação à norma regente, em que uma das vias eleitas viabiliza o devido enquadramento dos fatos à hipótese legal descrita, desautoriza a propositura da ação rescisória. Tal situação se configura quando há interpretação controvertida nos tribunais acerca da norma tida como violada. Súmula n. 343 do e. STF.
VII - Não obstante a parte autora não tenha sido explícita quanto ao pleito pela consecução do benefício, é possível inferir, a partir do conjunto da postulação e do trecho da peça recursal, no qual restou assinalado que a apelação visava a reforma da sentença para "...determinar a condenação em juros moratórios a base de 1% ao mês, desde a data do requerimento administrativo (27.01.2003)...", que a pretensão recursal abrangia efetivamente a concessão do benefício em questão. Portanto, o v. acórdão rescindendo, ao deixar de apreciar o pleito pela concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço, incorreu em julgamento citra petita, de modo a violar o preceito inserto no art. 492 do CPC.
VIII - Não se olvide da existência de entendimento no sentido de que não há formação de coisa julgada material em decisão citra petita relativamente ao pedido que não foi resolvido (no caso, a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição), o que, em tese, obstaria o manejo de ação rescisória, ensejando a propositura de uma nova demanda.
IX - Embora a r. decisão rescindenda não tenha enfrentado a questão de mérito que fora levada pelo pedido ignorado, penso que mesmo assim há interesse de agir a embasar o ajuizamento da presente ação rescisória, uma vez que tal remédio processual foi engendrado para extirpar do mundo jurídico decisões contendo vícios, como ocorre no caso vertente.
X - O objeto da rescisória restringe-se à desconstituição do julgado em relação à ausência de contagem do tempo de serviço total, mantendo-se íntegra a aludida decisão quanto aos períodos reconhecidos como de atividade especial e de atividade comum. Com efeito, na dicção do art. 966, §3º, do CPC, é admissível o ajuizamento contra apenas um capítulo da decisão, cumprindo ressaltar que mesmo antes do advento do CPC-2015, havia entendimento de que não era absoluto o conceito de indivisibilidade da sentença/acórdão (Precedentes: STF - Pleno, AR. 1.699 - AgRg, rel. Min. Marco Aurélio, j. 23.06.2005; negaram provimento, v.u., DJU 9.9.05, p. 34).
XI - Tendo em vista os períodos de atividade especial e de atividade comum reconhecidos, tanto na esfera administrativa quanto na judicial ora em debate, adoto a planilha a formulada pela parte autora (id. 123628886 – pág. 01), cujos dados lançados estão em consonância com o título judicial, com a contagem administrativa (id. 123628907 – pág. 07-11) e que aponta o total de tempo de serviço, após as devidas conversões, no importe de 35 (trinta e cinco) anos, 01 (um) mês e 19 (dezenove) dias até 27.01.2003, data de entrada do requerimento administrativo, fazendo jus o ora autor ao benefício de aposentadoria integral de tempo de contribuição, nos termos do art. 201, §7º, inciso I, da Constituição da República de 1988.
XII - O valor do benefício deve ser apurado segundo o disposto no art. 29, I, da Lei n. 8.213-91, com a redação dada pela Lei n. 9.876-99.
XIII - O termo inicial deve ser fixado na data da firmada pelo autor na inicial da presente ação rescisória (17.12.2003), posterior à data de entrada do requerimento administrativo (27.01.2003).
XIV - A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de regência, observando-se as teses firmadas pelo E. STF no julgamento do RE 870.947. Quanto aos juros de mora, estes incidem a partir da citação e não na forma sustentada pelo autor, aplicando-se o índice de remuneração da caderneta de poupança a partir de 30.06.2009. Ressalto que não se exige o trânsito em julgado do acórdão paradigma para aplicação da tese firmada pelo E. STF aos processos em curso, mormente em se tratando de tema com repercussão geral reconhecida.
XV - A base de cálculo dos honorários advocatícios corresponde ao valor do débito até a data do presente julgamento, nos termos da Súmula 111 do E. STJ, fixando-se o percentual em 10%, a teor do art. 85, §2º, do CPC.
XVI - Poderá o autor optar pelo benefício mais vantajoso, de forma que, se optar pelo benefício concedido na esfera judicial, deverão ser compensadas as prestações recebidas a título de auxílio-doença e de aposentadoria por idade. Se, porém, optar pelo benefício administrativo, a pretensão à execução das prestações decorrentes do benefício judicial, anteriores à DIB do benefício administrativo, deverá ser apreciado pelo Juízo da Execução, de acordo com a futura deliberação do tema n. 1.018 pelo E. STJ.
XVII - Ação rescisória cujo pedido se julga parcialmente procedente. Ação subjacente cujo pedido se julga parcialmente procedente.
(TRF 3ª Região, 3ª Seção, AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 5002435-36.2020.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL SERGIO DO NASCIMENTO, julgado em 28/09/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 01/10/2020)
Verifica-se que a presente ação rescisória se amolda à hipótese da rescisória acima mencionada, pois o período compreendido entre 06/10/2000 e 14/05/2002 não foi objeto de apreciação. Não obstante o referido interregno tenha sido expressamente requerido na inicial da demanda originária (ID 265730185, fls. 17/18). Tal omissão configura, em tese, decisão infra petita, a ensejar a violação manifesta de norma jurídica, nos termos do art. 966, inciso V, do Código de Processo Civil, em razão da afronta ao disposto no art. 492 do CPC.
Assim, entendo presente o interesse de agir do autor, nos termos do artigo 966, inciso V, do CPC, por haver indício de manifesta violação ao artigo 492 do CPC, questão que, evidentemente, será oportunamente apreciada por este Egrégio Tribunal no julgamento da presente ação rescisória.
Diante do exposto, com renovada vênia ao eminente Relator, acompanho a divergência inaugurada pela Exma. Desembargadora Federal Louise Filgueiras, para dar provimento ao agravo interno, a fim de determinar o regular prosseguimento da presente ação rescisória.
É o voto.
3ª Seção
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5028923-57.2022.4.03.0000
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
AUTOR: ATEVALDO GONCALVES SANTOS
Advogado do(a) AUTOR: JOSE CARLOS GOMES PEREIRA MARQUES CARVALHEIRA - SP139855-N
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL JEAN MARCOS (RELATOR):
Inicialmente, conheço do agravo, eis que observados os pressupostos processuais de admissibilidade recursal.
O julgamento monocrático, previsto no artigo 932 do Código de Processo Civil, atende aos princípios da celeridade processual e da observância aos precedentes judiciais, ambos contemplados na sistemática da lei processual civil. Observa-se, ademais, se tratar de decisão passível de controle por meio de agravo interno, nos termos do artigo 1.021 do Código de Processo Civil, atendendo ao princípio da colegialidade.
É o caso dos autos, em que a solução da demanda depende tão somente da subsunção dos fatos às normas jurídicas aplicáveis, conforme jurisprudência deste Tribunal e dos tribunais superiores.
Acresça-se, ainda, que em suas razões recursais o agravante não se insurge quanto ao julgamento monocrático, mas, sim, contra o entendimento adotado na decisão agravada.
Examino o recurso.
Trata-se de ação rescisória proposta por Atevaldo Gonçalves Santos contra o INSS, objetivando a rescisão do acórdão da 10ª Turma deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região, prolatado nos autos da ação previdenciária nº 6074409-29.2019.4.03.9999, o qual deu parcial provimento à remessa necessária e à apelação da Autarquia ré para limitar o reconhecimento do trabalho em atividade especial, negando a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição ao autor.
Ocorre que, previamente à análise do mérito, verifica-se questão prejudicial incidente, qual seja, a inexistência do início do decurso do prazo bienal decadencial previsto no art. 975, caput, do CPC, segundo o qual “O direito à rescisão se extingue em 2 (dois) anos contados do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo” (grifei). O trecho ora negritado refere-se ao termo inicial a partir do qual passa a transcorrer o prazo decadencial para o ajuizamento de ação rescisória.
No caso, a controvérsia posta nos autos cinge-se à possibilidade de rescindir a decisão prolatada na ação nº 6074409- 29.2019.4.03.9999, sob o fundamento de manifesta violação à norma jurídica, porque a decisão que se pretende rescindir omitiu-se em relação à especialidade da atividade exercida entre 06/10/2000 e 16/05/2002, negando o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição ao autor (ID 265730193 – pág. 5 - 24).
A decisão monocrática ora recorrida baseou-se no entendimento da eminente representante do Parquet Federal nestes autos, do qual se transcreve o seguinte trecho: “(...) por conta da inexistência de decisão a respeito do período de 06/10/2000 a 16/05/2002, é possível a repropositura da ação em relação ao pedido não examinado, pois não há coisa julgada em relação ao que não foi decidido. (...) Logo, se a sentença foi omissa em relação a um pedido, a questão principal não foi expressamente decidida, não ocorrendo a coisa julgada. E por inexistir coisa julgada, não é possível o ajuizamento de ação rescisória” (ID 274472373).
Ratifica-se, portanto, a decisão interlocutória ora recorrida, prolatada nos termos da Súmula 401 da Corte Especial do C. STJ, segundo a qual "o prazo decadencial da ação rescisória só se inicia quando não for cabível qualquer recurso do último pronunciamento judicial”.
Nesse sentido, transcrevo o seguinte precedente da Corte da Cidadania:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. PRORROGAÇÃO DO TERMO FINAL DO PRAZO PARA AJUIZAMENTO DA AÇÃO RESCISÓRIA. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
(...) Preliminarmente, tendo em vista que o art. 495 do CPC dispõe que "o direito de propor ação rescisória se extingue em dois anos, contados do trânsito em julgado da decisão", cabe examinar a data do trânsito em julgado da decisão, a partir da qual se dá o termo inicial do prazo para a proposição da ação rescisória. Essa análise se faz necessária, pois se observa a existência de divergência acerca da definição do termo inicial do biênio decadencial (se do dia do trânsito em julgado ou do dia seguinte ao trânsito em julgado), que ocorre, principalmente, em razão da imprecisão ao se definir o exato dia do trânsito em julgado. A teor do disposto no § 3.º do art. 6.º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro, "chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba mais recurso", bem assim no art. 467 do CPC: "denomina-se coisa julgada material a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário". Em uma linha: só há trânsito em julgado quando não mais couber recurso, ou seja, há trânsito em julgado no dia imediatamente subsequente ao último dia do prazo para o recurso em tese cabível contra a última decisão proferida na causa. Assim, em que pese a existência de precedentes em sentido contrário, o termo inicial para o ajuizamento da ação rescisória coincide com a data do trânsito em julgado da decisão rescindenda (STF, AR 1.412-SC, Tribunal Pleno, DJe 26/6/2009; AR 1.472-DF, Tribunal Pleno, DJe 7/12/2007; e STJ, AR 4.374-MA, Segunda Seção, DJe 5/6/2012) (...). (Informativo de jurisprudência n. 553 do STJ. Brasília, 11 de fevereiro de 2015).
Nesse mesmo sentido é o entendimento reiterado pelas Seções desta Corte:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AÇÃO RESCISÓRIA. DECADÊNCIA DO DIREITO DE AÇÃO. TERMO INICIAL. SÚMULA Nº 401 DO STJ. OMISSÃO. NÍTIDO CARÁTER INFRINGENTE. Nos termos do art. 1.022 do Código de Processo Civil, os embargos de declaração são cabíveis para esclarecer obscuridade, eliminar contradição, suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento, bem assim corrigir erro material, ainda que interpostos com a finalidade de prequestionamento, pois não se prestam, por si só, a viabilizar o ingresso na instância superior. O artigo 975 do CPC prevê que o prazo decadencial para propositura de ação rescisória é de 2 anos contados do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo, que se aperfeiçoa com o exaurimento dos recursos cabíveis ou com o transcurso do prazo recursal (Súmula nº 401 do STJ). O recurso intempestivo a par de inadmissível, também é incapaz de protelar o tempo para a formação da coisa julgada, uma vez que esta já se encontra formada. Entender diferentemente seria ampliar indefinidamente o período para o exercício do direito processual. Não olvide que a rescisória é uma ação desconstitutiva cujo prazo para o seu exercício é previsto em lei e decadencial, ou seja, não se suspende nem se interrompe. Portanto, forçoso concluir que não restou desconsiderada a jurisprudência do e. Superior Tribunal de Justiça cristalizada na Súmula nº 401, ao contrário, deu-se ênfase à orientação jurisprudencial de que a referida súmula comporta mitigação ou ressalva quando caracterizada flagrante intempestividade ou má-fé da parte. (...). (TRF3 - 2ª Seção. AÇÃO RESCISÓRIA ..SIGLA_CLASSE: AR 5019163-89.2019.4.03.0000, Desembargador Federal MARLI MARQUES FERREIRA, DJEN DATA: 12/04/2023).
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. AGRAVO INTERNO. DECISÃO MONOCRÁTICA. ARTIGO 1.021 E §§ DO CPC. RECURSO MANIFESTAMENTE INADMISSÍVEL. ERRO GROSSEIRO. DECADÊNCIA. EXTINÇÃO DO PROCESSO COM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. - Agravo interno disposto no artigo 1.021 e §§ do Código de Processo Civil conhecido, por estarem presentes os requisitos de admissibilidade. - O prazo decadencial para ajuizamento da ação rescisória inicia-se com o trânsito em julgado da decisão proferida no último recurso interposto, ainda que dele não se tenha conhecido, salvo se identificada hipótese de flagrante intempestividade, erro grosseiro ou má-fé, conforme jurisprudência assente no Superior Tribunal de Justiça. - Hipótese em que o prazo decadencial deve ser contado a partir da data em que ocorreu o trânsito em julgado da decisão que negou seguimento ao recurso especial, pois o agravo interno contra ela interposto foi tido por manifestamente inadmissível, ante o patente erro grosseiro ocorrido. (...) (TRF3 - 3ª Seção. AÇÃO RESCISÓRIA. AR 5027313-25.2020.4.03.0000; Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA, DJEN DATA: 30/09/2022).
Convém realçar que o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, em reiteradas decisões, entendem satisfeita a exigência constitucional da fundamentação das decisões judiciais quando os Juízes se utilizam da motivação referenciada ou “per relationem”, vale dizer, quando a decisão judicial faz remissão a outras manifestações ou peças processuais existentes nos autos. Conferir os seguintes julgados do STF: ARE-AgR - AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO, 2ª Turma, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, por unanimidade, Sessão Virtual de 6.9.2019 a 12.9.2019; HC-AgR - AG.REG. NO HABEAS CORPUS, 1ª Turma, Sessão Virtual de 29.5.2020 a 5.6.2020, Relatora Ministra Rosa Weber. Nesse mesmo sentido: STJ, REsp 1.206.805/PR, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 21/10/2014, DJe 7/11/2014; STJ, AgInt nos EDcl no AREsp 1067603/RS, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/05/2018, DJe 25/05/2018.
Nesse passo, tenho que o recurso deve ser desprovido, eis que a decisão monocrática ora agravada está em total sintonia com a jurisprudência deste Colegiado e dos Tribunais Superiores.
Por tais fundamentos, exerço o juízo de retratação negativo, e VOTO por NEGAR PROVIMENTO ao agravo interno.
É o voto.
DECLARAÇÃO DE VOTO
A EXCELENTÍSSIMA DESEMBARGADORA FEDERAL LOUISE FILGUEIRAS:
Peço vênia para divergir do eminente Relator, dando-se provimento ao agravo interno a fim de determinar o processamento da presente ação rescisória.
Consoante se verifica da r. decisão de ID 283100508, o eminente Relator indeferiu a inicial desta ação rescisória sob o argumento de que a especialidade do período de 06/10/2000 a 14/05/2002 não foi analisada na ação subjacente, não havendo, portanto, coisa julgada quanto ao ponto, e, assim, concluiu ser incabível ação rescisória.
Asseverou sua Excelência, “verbis”:
“[...] Entretanto, reitero o entendimento da i. presentante do Parquet Federal nestes autos, segundo a qual “por conta da inexistência de decisão a respeito do período de 06/10/2000 a 16/05/2002, é possível a repropositura da ação em relação ao pedido não examinado, pois não há coisa julgada em relação ao que não foi decidido. (...) Logo, se a sentença foi omissa em relação a um pedido, a questão principal não foi expressamente decidida, não ocorrendo a coisa julgada. E por inexistir coisa julgada, não é possível o ajuizamento de ação rescisória” (ID 274472373).
Desse modo, verifico que não há, a rigor, interesse de agir da parte autora para impugnar pela presente via decisão recorrível em processo em trâmite, sem trânsito em julgado. Assim, impõe-se a extinção do feito sem resolução de mérito, ante ausência de uma das condições da ação legalmente previstas, qual seja, a existência de decisão de mérito ou sem mérito desde que impeça (i) nova propositura da demanda ou (ii) admissibilidade do recurso correspondente, em qualquer caso com trânsito em julgado (art. 966, caput, c/c §2o, do CPC).
Por tais fundamentos, indefiro a inicial e julgo a ação rescisória extinta, sem a resolução do mérito, por ausência de interesse de agir, nos termos dos artigos 330, III, c/c 485, I, art. 966, todos do Código de Processo Civil”.
Contudo, pedindo vênia ao entendimento esposado pelo eminente Relator, entendo que como o julgado rescindendo não analisou a especialidade do período de 06/10/2000 a 14/05/2002, mesmo havendo pedido expresso na inicial da ação subjacente, houve manifesta violação da norma prevista no artigo 492 do CPC, tratando-se de julgamento “infra petita”.
Transcrevo o artigo 492 do CPC a fim de melhor ilustrar meu entendimento:
“Art. 492. É vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.
Parágrafo único. A decisão deve ser certa, ainda que resolva relação jurídica condicional”.
No tocante a essa mesma matéria, lembro que nos autos da ação rescisória nº 5020570-91.2023.4.03.0000, de minha Relatoria, essa E. Terceira Seção, por unanimidade de votos, em julgamento realizado em 28.08.2025, entendeu nesse mesmo sentido, reconhecendo tratar-se de julgamento “infra petita”, determinando a rescisão do V. Acórdão rescindendo, cujo voto transcrevo na parte que aqui interessa:
“[...] No tocante, porém, aos períodos posteriores a 11.10.2016, isto é, entre 12.10.2016 a 12.07.2019, o V. Acórdão, de fato, omitiu-se, tendo deixado de analisá-lo mesmo havendo apelação do INSS expressamente pleiteando o afastamento da especialidade de todos os períodos reconhecidos pela r. sentença, fato que causou prejuízo ao ora requerente, já que referido período não apenas deixou de ser analisado, como também não foi computado no cálculo do tempo de contribuição, com reflexo na análise do direito à aposentadoria especial.
Quanto ao ponto, o V. Acórdão assim se pronunciou:
[...]
Verifica-se, portanto, que não foi analisado por este Tribunal o período posterior a 11.10.2016, não obstante tenha sido expressamente pleiteado na inicial da ação originária - ID 277521433, fl. 03, item 12 da inicial e tabela de fl. 07 - e reconhecido pela r. sentença, tratando-se, pois, de decisão "infra petita", com violação manifesta ao artigo 492 do CPC, "verbis":
"Art. 492. É vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.
Parágrafo único. A decisão deve ser certa, ainda que resolva relação jurídica condicional".
Nesse sentido, cito precedente deste Tribunal:
DIREITO TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. SALÁRIO-MATERNIDADE. AVISO PRÉVIO INDENIZADO. PRIMEIROS QUINZE DIAS DE AUXÍLIO-DOENÇA. NATUREZA INDENIZATÓRIA. INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA INDEVIDA. JULGAMENTO CITRA PETITA. NULIDADE DECLARADA. RECURSO PREJUDICADO.
I. CASO EM EXAME
Apelação interposta por A.L.B. Comércio de Alimentos Ltda. contra sentença proferida em mandado de segurança que reconheceu o direito à exclusão do salário-maternidade da base de cálculo das contribuições previdenciárias, com direito à compensação dos valores pagos indevidamente. A impetrante requereu o afastamento da incidência também sobre os valores pagos a título de aviso prévio indenizado e dos primeiros quinze dias de afastamento por auxílio-doença, com direito à compensação tributária dos valores recolhidos indevidamente nos cinco anos anteriores à impetração.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
Há duas questões em discussão: (i) reconhecer a nulidade da sentença por julgamento citra petita quanto ao aviso prévio indenizado e aos primeiros quinze dias de auxílio-doença; (ii) definir se incidem contribuições previdenciárias e destinadas a terceiros sobre os valores pagos a título de salário-maternidade, aviso prévio indenizado e primeiros quinze dias de afastamento por auxílio-doença.
III. RAZÕES DE DECIDIR
A omissão da sentença quanto aos pedidos relativos ao aviso prévio indenizado e aos primeiros quinze dias de afastamento por auxílio-doença caracteriza julgamento citra petita, nulidade absoluta reconhecível de ofício, nos termos do art. 492 do CPC.
As verbas referentes ao salário-maternidade, ao aviso prévio indenizado e aos primeiros quinze dias de afastamento não possuem natureza remuneratória, conforme entendimento consolidado do STF (Tema 72) e do STJ (Temas 478 e 738), sendo indevida a incidência de contribuições previdenciárias e a terceiros.
A compensação tributária dos valores recolhidos indevidamente deve observar: (i) a regra do art. 26-A da Lei 11.457/2007 quanto à utilização do eSocial; (ii) a prescrição quinquenal; (iii) o trânsito em julgado, conforme art. 170-A do CTN.
Os valores a serem compensados devem ser corrigidos pela Taxa Selic, acumulada mensalmente a partir de cada recolhimento indevido, nos termos do art. 39, § 4º, da Lei 9.250/95, sendo vedada a cumulação com juros e outra correção monetária a partir da EC nº 113/2021, nos moldes do julgamento do STF no RE nº 870.947.
IV. DISPOSITIVO E TESE
Sentença declarada nula. Nos termos do artigo 1.013 do CPC, houve a concessão da ordem para o reconhecimento da inexigibilidade das contribuições discutidas. Apelo prejudicado.
Tese de julgamento:
O julgamento citra petita configura nulidade absoluta e deve ser reconhecido de ofício.
(TRF 3ª Região, 5007496-66.2024.4.03.6100, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA, 1ª Turma, Relator(a): Desembargador Federal ANTONIO MORIMOTO JUNIOR, Julgamento: 26/06/2025).
Dessa forma, concluo pela parcial procedência desta ação rescisória, devendo o V. Acórdão ser parcialmente rescindido, exclusivamente quanto ao período entre 12.10.2016 a 12.07.2019, por violação manifesta ao artigo 492 do CPC, nos termos do artigo 966, inciso V, do CPC” - grifei.
Portanto, o caso desta ação rescisória enquadra-se exatamente na mesma hipótese da ação rescisória supracitada, de maneira que, verificando-se que não foi analisado tanto em primeiro grau quanto por este Tribunal o período de 06/10/2000 a 14/05/2002, não obstante tenha sido expressamente pleiteado na inicial da ação originária - ID 265730185, fls. 17/18 da inicial -, reconheço haver indícios de violação manifesta de norma jurídica em razão de possível decisão "infra petita", com violação ao artigo 492 do CPC, já transcrito.
Dessa forma, concluo pela existência de interesse de agir autoral com fundamento no artigo 966, inciso V, do CPC, em razão de possível violação manifesta ao artigo 492 do CPC, fato que evidentemente deverá ser oportunamente analisado por esta E. Corte Regional quando do julgamento desta ação rescisória.
Por todas essas razões, peço vênia para divergir do eminente Relator, a fim de dar provimento ao agravo interno para possibilitar o prosseguimento e julgamento desta ação rescisória.
É o voto.
D E C L A R A Ç Ã O D E V O T O
A EXCELENTÍSSIMA DESEMBARGADORA FEDERAL CRISTINA MELO: Com o devido respeito ao entendimento perfilhado por i. Relator, acompanho a divergência apresentada pela i. Desembargadora Federal Louise Filgueiras, no sentido de dar provimento ao agravo interno da parte autora, para assegurar o processamento da presente ação rescisória.
Com efeito, conforme se depreende da r. decisão de ID 283100508, a inicial da ação rescisória foi indeferida sob o fundamento de que a especialidade do período compreendido entre 06/10/2000 a 14/05/2002 não foi objeto de análise no processo originário, inexistindo, portanto, coisa julgada sobre o ponto, reconhecendo-se, portanto, a inviabilidade da via rescisória.
Entendeu o i. Relator que restou configurada a ausência de interesse de agir, julgando extinto o feito sem resolução de mérito, com fulcro nos artigos 330, III, e 485, I, do CPC, em conjugação com o artigo 966, caput, e § 2º, do mesmo diploma legal.
Com a devida vênia, entendo que a situação merece reanálise.
Verifica-se que o julgado rescindendo efetivamente deixou de se manifestar sobre a especialidade do período de 06/10/2000 a 14/05/2002, embora este tenha sido objeto de pedido expresso na petição inicial da ação subjacente. Tal omissão caracteriza, em tese, julgamento citra petita, em afronta direta ao disposto no artigo 492 do Código de Processo Civil, verbis:
“Art. 492. É vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.
Parágrafo único. A decisão deve ser certa, ainda que resolva relação jurídica condicional.”
Ressalto que, além do decidido nos autos da Ação Rescisória nº 5020570-91.2023.4.03.0000, de relatoria da eminente Desembargadora Federal Louise Filgueiras, esta Egrégia Terceira Seção já reconheceu, em outros precedentes, situações análogas de julgamento citra petita, notadamente em razão da omissão quanto à análise de período expressamente requerido na ação originária, ocasião em que se reconheceu violação manifesta ao artigo 492 do Código de Processo Civil e se procedeu à rescisão parcial do v. acórdão.
Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. ART. 966 DO CPC. DECISÃO RESCINDENDA INEXISTENTE. PRINCÍPIO DA CONGRUÊNCIA. ACOLHIMENTO DA HIPÓTESE DE ERRO DE FATO.
- Não há falar na caracterização de decadência do direito de ação, proposta dentro do prazo bienal legal, apesar de a parte ter promovido a emenda da petição inicial, trazendo, dentro do prazo para tanto conferido, a documentação objeto do despacho prolatado.
- Induvidoso que, no feito originário, o pedido do autor não englobara o período de 6/3/1997 a 18/11/2003, objeto do presente debate, exatamente como alegou na inicial desta rescisória. A decisão em 1.º grau proferida na ação subjacente a este feito avançou em aspecto que não deveria, ao não se ater aos termos em que posta a pretensão do segurado naquela demanda, e o julgado rescindendo, igualmente, não se atentou para o fato de que o aludido intervalo temporal não integrava a lide, ganhando contornos de verdadeira decisão inexistente, porquanto analisada controvérsia não trazida a juízo, circunstância que, a rigor, impede mesmo a formação de coisa julgada quanto ao ponto, não se desconhecendo cuidar-se de questão discutida em doutrina e jurisprudência.
- Esta Seção especializada já se pronunciou a respeito da possibilidade de se reconhecer vício de inexistência no âmbito de ação rescisória, que, no caso dos autos, contamina a sentença e a decisão monocrática desta Corte por serem extra petita, no que desborda o pedido inicial.
- Presente o alegado equívoco na forma do inciso VIII do art. 966 do CPC, ao ignorar, na apreciação do recurso de apelação do INSS, que se tratava de interregno de trabalho não contemplado na pretensão inicialmente formulada, cujo destino, juridicamente, só poderia ser a extinção do processo sem resolução meritória, e não a análise pelo mérito.
- Conquanto usualmente, em situações com os pressupostos fáticos acima retratados, os julgados venham reportando aceitável a propositura da rescisória havendo a veiculação do pedido de desconstituição com fulcro na ocorrência de violação ao princípio da congruência (STJ, AR n. 4.982/GO, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Seção, julgado em 10/2/2021, DJe de 2/3/2021), a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça a admite também sob o fundamento da ocorrência de erro de fato.
- Acolhida a rescisória – de que decorre a declaração de inexistência tanto do correspondente capítulo da sentença, remanescendo hígidos os demais lapsos temporais nela reconhecidos; quanto do julgado prolatado nesta Corte, já que a apelação interposta pelo INSS insurgia-se apenas acerca do intervalo sob discussão –, despiciendas as análises quer seja da alegada existência de prova nova, igualmente veiculada na petição inicial; quer seja, por idênticas razões, ante os contornos a ele conferidos, do pedido de rejulgamento da causa, comportando seguimento no juízo de origem. Precedente.
- No que concerne à pretensão autoral de que novo juízo seja feito em relação ao período laboral em tela, sob o enfoque da existência do formulário PPP retificador do documento apresentado na ação primeva, outra demanda autônoma deverá ser proposta, justamente porque as balizas objetivas do processo ensejador desta rescisória não admitem qualquer tipo de incursão nesta seara, ausente na origem, como visto, pedido a esse propósito.
(AR 5012352-11.2022.4.03.0000, Rel. Des. Federal THEREZINHA CAZERTA, julgado em 14/03/2023, DJEN DATA: 17/03/2023)
PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. INCISOS V E VIII, DO ART. 966, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA ESPECIAL. MANIFESTA VIOLAÇÃO À NORMA JURÍDICA E ERRO DE FATO CONFIGURADOS. PEDIDO DE RESCISÃO PROCEDENTE. TEMPO ESPECIAL RECONHECIDO. PRESENÇA DOS REQUISITOS LEGAIS À APOSENTAÇÃO ESPECIAL NA DATA DO AJUIZAMENTO DA AÇÃO. CONSECTÁRIOS.
(...)
- O artigo 966 do Código de Processo Civil elenca, de modo taxativo, as hipóteses de cabimento da ação rescisória, dentre as quais, os incisos V e VIII dispõem sobre a possibilidade de desconstituição do julgado na hipótese de violação de norma jurídica e erro de fato.
- As decisões judiciais devem, por meio de interpretação teleológica, escorar-se no ordenamento jurídico e atender aos fins sociais, exigindo-se a devida fundamentação e observação dos precedentes jurisprudenciais sobre a matéria.
- Na ação subjacente, o julgado rescindendo julgou procedente o pedido de reconhecimento de labor especial, com a concessão de aposentadoria especial, não obstante o segurado não computar tempo suficiente à jubilação.
(...)
- A situação descrita pelo autor na causa de pedir amolda-se à hipótese de prevista no art. 966, inc. V, do CPC e também ao inciso VIII, do mesmo artigo, na medida em que se deixou de examinar situação fática que conduziu o julgador à convicção equivocada, o que se reconhece de ofício, mediante a aplicação do princípio jura novit curia.
- Ainda, o julgado rescindendo incorreu em julgamento citra petita, o que viola os artigos 141 e 492 do CPC/2015 e se reconhece de ofício também com esteio no princípio de que o juiz conhece o direito.
- Nesse contexto, a rescisão do julgado é medida que se impõe por erro de fato e ofensa aos artigos 57 e 58, ambos da Lei 8213/91 e 141 e 492 do CPC/2015, com arrimo no art. 966, incisos V e VIII, do Código de Processo Civil.
- Em juízo rescisório, a Lei nº 8.213/91 preconiza, nos arts. 57 e 58, que o benefício previdenciário da aposentadoria especial será devido, uma vez cumprida a carência exigida, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei.
- Insuficiente o total de tempo especial na data do requerimento administrativo e comprovado nos autos que o segurado continuou trabalhando e estava exposto a agentes nocivos até a data do ajuizamento da ação, oportunidade em que completara tempo suficiente à aposentação, com esteio no art. 493 do CPC, de rigor o reconhecimento do direito do segurado à jubilação, na forma do art. 57, da Lei nº 8.213/91.
- Contabilizado tempo de contribuição após o requerimento administrativo e antes do ajuizamento da ação, o termo inicial do benefício deve ser fixado na data da citação na ação subjacente.
(...)
- Condenação das partes ao pagamento de honorários advocatícios, fixados nos termos do art. 85, §8º, do CPC/2015, conforme a sucumbência proporcional.
- Pedido, em juízo rescindente, julgado procedente para desconstituir a decisão prolatada na ação n. 1000864-71.2017.8.26.0407, que tramitou perante 2ª Vara Cível da Comarca de Osvaldo Cruz/SP e, em juízo rescisório, julgado parcialmente procedente o pedido deduzido na ação subjacente.
(AR 5025642-64.2020.4.03.0000, Rel. Des. Federal GILBERTO JORDAN, julgado em 26/08/2022, DJEN DATA: 31/08/2022)
O mesmo raciocínio se aplica ao caso em exame. Consta dos autos que o período de 06/10/2000 a 14/05/2002 foi expressamente indicado na inicial da ação originária (ID 265730185, fls. 17/18), sendo, portanto, elemento integrante da causa de pedir. A ausência de sua análise, tanto na sentença quanto no acórdão recorrido, configura omissão relevante e potencial violação ao princípio da congruência, nos termos do artigo 492 do CPC.
O vício de julgamento citra petita, ainda que implique ausência de coisa julgada material sobre o ponto omitido, não impede, por si só, a utilização da via rescisória. Pelo contrário, pode ensejar o manejo da ação rescisória com fundamento no inciso V do artigo 966 do CPC, quando a omissão configurar violação manifesta a norma jurídica, como é o caso do artigo 492 supracitado.
Assim, à luz dos precedentes citados, entendo presente o interesse de agir do autor, na medida em que a inicial descreve situação que, em tese, amolda-se à hipótese prevista no artigo 966, inciso V, do CPC. A verificação do efetivo cabimento da rescisória deverá ser feita no momento oportuno, quando do julgamento de mérito da ação, e não na fase inaugural.
Portanto, reconheço que se impõe o prosseguimento da presente ação rescisória, diante da presença dos requisitos mínimos exigidos para sua admissibilidade.
Diante do exposto, peço vênia ao eminente Relator, para acompanhar a divergência inaugurada pela i. Desembargadora Federal Louise Filgueiras, para dar provimento ao agravo interno, a fim de determinar o regular processamento da presente ação rescisória.
É como voto.
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. AGRAVO INTERNO. PRAZO DECADENCIAL. OMISSÃO QUANTO A PEDIDO EXPRESSO NA AÇÃO ORIGINÁRIA. JULGAMENTO INFRA PETITA. VIOLAÇÃO MANIFESTA À NOMRMA JURÍDICA. ARTIGOS 492 E 966, INCISO V, DO CPC. PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO RESCISÓRIA.
- O julgamento monocrático é cabível quando presentes os requisitos do CPC/2015, arts. 1º a 12 e 932, bem como da Súmula 568 do STJ, sendo passível de controle pelo agravo interno, o que preserva o princípio da colegialidade.
- O agravo interno preenche os requisitos de admissibilidade previstos no art. 1.021 do CPC/2015.
- Inicialmente, verifico que o prazo para ajuizamento da rescisória, estabelecido no artigo 975 do Código de Processo Civil, foi observado.
- Na ação subjacente houve omissão quanto à análise do pedido de reconhecimento da especialidade da atividade exercida entre 06/10/2000 e 14/05/2002, apesar de expresso requerimento a petição inicial. Tal omissão configura julgamento infra petita, em afronta ao disposto no artigo 492 do CPC, caracterizando, em tese, violação manifesta de norma jurídica nos termos do artigo 966, inciso V, do mesmo diploma legal.
- Reconhecido o interesse de agir do autor, impõe-se o regular prosseguimento da ação rescisória para oportuna apreciação por esta Corte Regional.
- Agravo interno provido.
ACÓRDÃO
Desembargador Federal
