Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5523021-47.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
26/07/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 31/07/2019
Ementa
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA CONDICIONAL. ANULAÇÃO.
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO ESPECIAL NÃO
COMPROVADO. DESCUMPRIMENTO DOS REQUISITOS PARA A APOSENTAÇÃO.
CONSECTÁRIOS LEGAIS.
- Na hipótese em análise, o MM. Juiz de primeiro grau reconheceu períodos especiais, tendo,
contudo, condicionado a concessão do benefício ao preenchimento dos requisitos legais.
- A sentença condicional implica negativa de prestação jurisdicional adequada, ocasionando sua
nulidade. In casu, o processo se encontra em condições de imediato julgamento, sendo possível
a apreciação do meritum causae, com fundamento no artigo 1.013, § 3º do CPC.
- Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi
convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento
jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer o artigo 201 da Constituição
Federal o direito à aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, ao
completar 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem e 30 (trinta) anos de contribuição,
se mulher.
- Entretanto, o art. 3º da referida Emenda garantiu o direito adquirido à concessão da
aposentadoria por tempo de serviço a todos aqueles que até a data da sua publicação, em 16 de
dezembro de 1998, tivessem cumprido todos os requisitos legais, com base nos critérios da
legislação então vigente.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- Ao segurado inscrito perante o Regime Geral de Previdência Social anteriormente à
promulgação da Emenda Constitucional nº 20/98, mas que, nessa data (16 de dezembro de
1998), ainda não tivesse preenchido os requisitos necessários à sua aposentação, mesmo na
forma proporcional, aplicam-se as regras de transição estabelecidas pelo art. 9º da referida norma
constitucional.
- Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados que
cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da EC
20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o mesmo
prazo; e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
- No caso dos autos, não restou comprovado o labor especial do período requerido. Somatório do
tempo de serviço que não autoriza a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de
contribuição integral ou proporcional.
- Honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa, observada a gratuidade da justiça.
- De ofício, anulada a sentença e julgado improcedente o pedido, restando prejudicadas as
apelações.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5523021-47.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: EVA DE FATIMA MOREIRA DE GODOY, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: THOMAZ ANTONIO DE MORAES - SP200524-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, EVA DE FATIMA MOREIRA
DE GODOY
Advogado do(a) APELADO: THOMAZ ANTONIO DE MORAES - SP200524-N
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5523021-47.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: EVA DE FATIMA MOREIRA DE GODOY, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: THOMAZ ANTONIO DE MORAES - SP200524-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, EVA DE FATIMA MOREIRA
DE GODOY
Advogado do(a) APELADO: THOMAZ ANTONIO DE MORAES - SP200524-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelações em ação ajuizada contra o INSS objetivando o reconhecimento de labor
especial e a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido para reconhecer a especialidade do labor
dos períodos, sem concessão de aposentadoria, nos termos do dispositivo, a seguir transcrito:
“(...) Pelo exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial, com resolução de mérito, nos termos
do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil para o fim de: Declarar que o autor exerceu
atividade especial nos períodos de 06/03/1997 a 10/02/2015; Determinar ao instituto requerido
que acresça tais tempos aos demais tempos eventualmente já reconhecidos em sede
administrativa e averbar os períodos mencionados na letra "a"; Determinar ao instituto requerido a
proceder à conversão do referido período em atividade comum, nos termos do § 2º do art. 70 do
Regulamento da Previdência Social aprovado pelo Decreto nº 3.048, de 6.5.1999; Determinar ao
instituto requerido que conceda a aposentadoria por tempo de contribuição para a autora, desde o
requerimento administrativo (10/02/2015), caso as medidas preconizadas nos itens "a", "b" e "c",
implicarem a existência de tempo mínimo relativo ao benefício; O pagamento de eventuais
parcelas/diferenças em atraso terá como data de início o dia do requerimento administrativo
(10/02/2015). Fica o polo ativo advertido da obrigatoriedade da dedução, na fase de cumprimento
de sentença, dos valores eventualmente pagos após o termo inicial assinalado à benesse
outorgada (DIB), ao mesmo título ou cuja cumulação seja vedada por lei (art. 124, da Lei nº
8.213/91, e art. 20, § 4º, da Lei º 8.742/93). Quanto à correção monetária e aos juros de mora
tem-se que "as condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se
à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à
vigência da Lei nº 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei nº 8.213/91. Quanto aos juros de
mora, no período posterior à vigência da Lei nº 11.960/2009, incidem segundo a remuneração
oficial da caderneta de poupança". (STJ 1ª Seção REsp 1.495.146-MG Relator Ministro Mauro
Campbell Marques Julgado em 22/02/2018 - Recurso Repetitivo). Assim, para efeitos da correção
monetária, que incide sobre eventuais prestações/diferenças em atraso, desde as respectivas
competências, devem ser aplicados os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça
Federal em relação ao período anterior à Lei nº 11.430/2006 de 26/12/2006. Depois desta data
deve ser observado o INPC. Quanto aos juros de mora, devidos desde a citação, de forma global
para as parcelas/diferenças anteriores a tal ato processual e de forma decrescente para as
parcelas/diferenças posteriores, e incidentes até a data da conta de liquidação que der origem ao
precatório ou à requisição de pequeno valor, são calculados à base de 1% ao mês até a vigência
da Lei nº 11.430/2006 e antes da Lei nº 11.960/2009 (art. 3º, do Decreto lei 2.322/1987). Após a
Lei nº 11.960/2009, incidirá o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do
art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação determinada pela Lei nº 11.960/2009. Ante a
sucumbência mínima do autor, condeno o instituto requerido a arcar com o pagamento de
honorários advocatícios (art. 86, parágrafo único do CPC), cujo percentual sobre o valor da
condenação, que corresponde à soma das prestações/diferenças vencidas até a data desta
sentença (Súmula 111, do STJ), será definido por ocasião da liquidação do julgado, nos termos
do artigo 85, §4º, inciso II, do Código de Processo Civil, tendo em vista tratar-se de sentença
ilíquida. O instituto requerido fica isento do pagamento de custas processuais, nos termos do art.
4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96, e do art. 6º, da Lei Estadual n.º 11.608/03. Tal isenção não
abrange as despesas processuais que houver efetuado, bem como aquelas devidas a título de
reembolso à parte contrária, por força da sucumbência. Aguarde-se o prazo para recurso
voluntário. Embora ilíquida a sentença, de pronto já se constata que não ultrapassa o limite do
teto legal, de modo que não é caso de reexame necessário nos termos do artigo 496, § 3º, inciso
I, do CPC. Após o trânsito em julgado, nada sendo requerido, arquivem-se os autos com as
cautelas de praxe. P.I.”
Em suas razões de inconformismo, a autora alega cerceamento de defesa da ausência de análise
de seu pedido de reafirmação da DER. Pede a concessão do benefício sem fator previdenciário.
O INSS também apela, oportunidade em que requer a improcedência do pedido, ao argumento de
que a autora não comprovou a especialidade almejada e pede a fixação do termo inicial na data
da citação e dos juros de mora e da correção monetária nos termos da Lei n. 11960/09.
Com contrarrazões, subiram os autos a este Eg. Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5523021-47.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: EVA DE FATIMA MOREIRA DE GODOY, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: THOMAZ ANTONIO DE MORAES - SP200524-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, EVA DE FATIMA MOREIRA
DE GODOY
Advogado do(a) APELADO: THOMAZ ANTONIO DE MORAES - SP200524-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, é importante destacar que o MM. Juiz a quo, ao julgar procedente o pedido,
reconheceu os períodos especiais indicados, tendo, contudo, condicionado a concessão do
benefício ao preenchimento dos requisitos legais, inclusive à existência de tempo necessário para
a aposentação.
A sentença condicional implica negativa de prestação jurisdicional adequada, o que impõe a
decretação de sua nulidade, conforme já decidiu o Colendo Superior Tribunal de Justiça:
"RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. VIOLAÇÃO AO
ART. 460. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. SENTENÇA CONDICIONAL. NULA.
O acórdão, ao condicionar a eficácia da decisão a evento futuro e incerto, viola o Diploma
Processual Civil, tendo em vista que a legislação processual impõe que a sentença deve ser
certa, a teor do artigo 460, parágrafo único do CPC.
Decisão condicional é nula.
Recurso conhecido e provido."
(STJ, 5ª Turma, RESP nº 648168, Min. José Arnaldo da Fonseca, j. 09/11/2004, DJU 06/12/2004,
p. 358).
Por outro lado, tendo em vista que o processo encontra-se em condições de imediato julgamento,
passo à apreciação do meritum causae, com fundamento no artigo 1.013, § 3º da Lei nº 13.105,
de 16.03.2015, in verbis:
"Art. 1.013. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.
(...)
§ 3o Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde
logo o mérito quando:
I - reformar sentença fundada no art. 485;
(...)".
1. DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/ CONTRIBUIÇÃO
O primeiro diploma legal brasileiro a dispor sobre a aposentadoria por tempo de serviço foi a Lei
Eloy Chaves, Decreto nº 4.682, de 24 de janeiro de 1923. Referido benefício era concedido
apenas aos ferroviários, possuindo como requisito a idade mínima de 50 (cinquenta) anos, tendo
sido suspensa no ano de 1940.
Somente em 1948 tal aposentadoria foi restabelecida, tendo sido mantida pela Lei nº 3.807, de 26
de agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS), que preconizava como requisito
para a concessão do benefício o limite de idade de 55 (cinquenta e cinco) anos, abolido,
posteriormente, pela Lei nº 4.130, de 28 de agosto de 1962, passando a adotar apenas o
requisito tempo de serviço.
A Constituição Federal de 1967 e sua Emenda Constitucional nº 1/69, também disciplinaram tal
benefício com salário integral, sem alterar, no entanto, a sua essência.
A atual Carta Magna manteve o benefício, disciplinando-o em seu art. 202 (redação original) da
seguinte forma:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e
comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar seus
valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior,
se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física,
definidas em lei:
(...)
§1º: É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após
vinte e cinco, à mulher."
Antes da Emenda Constitucional n. 20/98, de 15 de dezembro de 1998, preceituava a Lei nº
8.213/91, nos arts. 52 e seguintes, que o benefício de aposentadoria por tempo de serviço era
devido ao segurado que, após cumprir o período de carência constante da tabela progressiva
estabelecida pelo art. 142 do referido texto legal, completar 30 anos de serviço, se homem, ou 25,
se mulher, iniciando no percentual de 70% do salário-de-benefício até o máximo de 100% para o
tempo integral aos que completarem 30 anos de trabalho se mulher, e 35 anos de trabalho se
homem.
Na redação original do art. 29, caput, §1º, da Lei de Benefícios, o salário-de-benefício consiste na
média aritmética simples de todos os últimos salários-de-contribuição dos meses imediatamente
anteriores ao afastamento da atividade ou da data da entrada do requerimento, até o máximo de
36, apurados no período não superior a 48 meses. Ao segurado que contava com menos de 24
contribuições no período máximo estabelecido, o referido salário corresponde a 1/24 da soma dos
salários-de-contribuição.
Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi
convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento
jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer, nos arts. 201 e 202 da
Constituição Federal:
"Art. 201 A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter
contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e
atuarial, e atenderá, nos termos da lei a:
(...)
§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei,
obedecidos as seguintes condições:
I - 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem, e 30 (trinta) anos de contribuição, se
mulher;
Art. 202 O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma
autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na
constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar.
(...)"
Entretanto, o art. 3º da referida Emenda garantiu o direito adquirido à concessão da
aposentadoria por tempo de serviço a todos aqueles que até a data da sua publicação, em 16 de
dezembro de 1998, tivessem cumprido todos os requisitos legais, com base nos critérios da
legislação então vigente.
Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados que
cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da EC n.
20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o mesmo
prazo e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
2. DA CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM
2.1 DO DIREITO À CONVERSÃO ANTES DA LEI 6.887/80 E APÓS A LEI 9.711/98
A teor do julgamento do REsp 1.310.034 e do REsp 1.151.363, ambos submetidos ao regime do
art. 543-C do CPC/1973, inexiste óbice para se proceder à conversão de tempo de serviço
especial em comum, seja antes da Lei 6.887/80 seja após Lei n. 9.711/1998.
3.2 DO RECONHECIMENTO DA ATIVIDADE EXERCIDA EM ATIVIDADE ESPECIAL
Para o reconhecimento da natureza especial da atividade exercida e a conversão desse intervalo
especial em comum, cabe ao segurado demonstrar o trabalho em exposição a agentes
agressivos, nos termos da lei vigente à época da prestação do trabalho, observando-se o
princípio tempus regit actum (Pet 9.194/PR, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção,
julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
2.2.1 PERÍODO ANTERIOR À EDIÇÃO DA LEI Nº 9.032/95
No período anterior à edição da Lei nº 9.032/95, o direito à aposentadoria especial e à conversão
do tempo trabalhado em atividades especiais é reconhecido em razão da categoria profissional
exercida pelo segurado ou pela sua exposição aos agentes nocivos descritos nos Anexos dos
Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, a ser comprovada por meio da apresentação de SB 40, sem
a necessidade de apresentação de laudo técnico, exceção feita à exposição ao ruído.
2.2.2 PERÍODO POSTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.032/95 ATÉ A EDIÇÃO DO DECRETO
Nº 2.172, DE 5 DE MARÇO DE 1997
A comprovação da atividade especial exercida após a edição da Lei nº 9.032, de 29 de abril de
1995 - que promoveu a alteração do art. 57 da Lei n. 8213/91 - se dá com a demonstração da
efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, mediante a
apresentação do formulário DSS-8030 (antigo SB 40), o qual se reveste da presunção de que as
circunstâncias de trabalho ali descritas se deram em condições especiais, não sendo, portanto,
imposto que tal documento se baseie em laudo pericial, com exceção ao limite de tolerância para
nível de pressão sonora (ruído).
Anote-se que a relação dos agentes nocivos constante do Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de
março de 1964, e dos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, em vigor até
o advento do Decreto Regulamentar nº 2.172/97, de 5 de março de 1997, fora substituído pelo
Decreto nº 3.048, de 06 de maio de 1999.
Relevante consignar que, a partir da Lei nº 9.032/95, não é mais possível o reconhecimento da
atividade especial, unicamente, com fulcro no mero enquadramento da categoria profissional.
2.2.3 PERÍODO POSTERIOR À VIGÊNCIA DO DECRETO Nº 2.172, DE 5 DE MARÇO DE 1997
E DEMAIS CONSIDERAÇÕES
Com a edição do Decreto nº 2.172, de 5 de março de 1997, que regulamentou a Medida
Provisória nº 1523/96, convertida na Lei nº 9.528/97, é indispensável a apresentação de laudo
técnico para a comprovação de atividade especial.
Cabe esclarecer que a circunstância de o laudo não ser contemporâneo à atividade avaliada não
lhe retira absolutamente a força probatória, em face de inexistência de previsão legal para tanto e
desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral (AC 0022396-
76.2005.4.01.3800/MG, Rel. Desembargador Federal Candido Moraes, 2ª Turma, e-DJF1 p.198
de 18/11/2014). Súmula 68 TNU.
Além disso, é de se apontar que o rol de agentes insalubres, como também das atividades
penosas e perigosas não se esgotam no regulamento, tal como cristalizado no entendimento
jurisprudencial na Súmula/TFR n. 198:
"Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata
que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em
Regulamento."
Nesse sentido, julgados do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 395988, Rel.
Min. Hamilton Carvalhido, j. 18.11.2003, DJ 19.12.2003, p. 630; 5ª Turma, REsp nº 651516, Rel.
Min. Laurita Vaz, j. 07.10.2004, DJ 08.11.2004, p. 291.
2.3 USO DO EPI
No tocante à utilização de Equipamentos de Proteção Individual - EPI, em recente decisão, com
repercussão geral, no ARE 664.335/SC, assentou a Suprema Corte que:
"o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo
à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá
respaldo constitucional à aposentadoria especial" (grifo nosso). No caso, porém, de dúvida em
relação à efetiva neutralização da nocividade, decidiu que "a premissa a nortear a Administração
e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto
porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar
completamente a relação nociva a que o empregado se submete".
No mais, especificamente quanto à eficácia do equipamento de proteção individual - EPI ao
agente agressivo ruído, o Pretório Excelso definiu que:
"na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a
declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido
da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço
especial para aposentadoria". Isso porque, "ainda que se pudesse aceitar que o problema
causado pela exposição ao ruído relacionasse apenas à perda das funções auditivas, o que
indubitavelmente não é o caso, é certo que não se pode garantir uma eficácia real na eliminação
dos efeitos do agente nocivo ruído com a simples utilização de EPI, pois são inúmeros os fatores
que influenciam na sua efetividade, dentro dos quais muitos são impassíveis de um controle
efetivo, tanto pelas empresas, quanto pelos trabalhadores".
DO CASO DOS AUTOS
Pleiteia o requerente o reconhecimento, como especial dos períodos em que teria trabalhado
sujeito a agentes agressivos de 06.03.97 a 10.02.15 (DER), tendo juntado a documentação
abaixo discriminada:
- 06.03.97 a 07.02.06: PPP de fls. 109/111, id 52224163, função de auxiliar de cozinha, exposta a
agente agressivo calor em intensidade de 29,34 IBUTG;
- 08.02.06 a 09.02.09: PPP de fls. 109/111, id 52224163, função de auxiliar de cozinha e
cozinheira, exposta a agente agressivo calor em intensidade de 29,36 IBUTG e a agente
agressivo químico, a saber, cloricida e soda;
- 10.02.09 a 06.12.10: PPP de fls. 109/111, id 52224163, função de cozinheira, exposta a agente
agressivo calor em intensidade de 29,5 IBUTG e a agentes biológicos, vírus, bactérias e fungos;
- 07.12.10 a 02.11.11: PPP de fls. 109/111, id 52224163, função de cozinheira, exposta a agente
agressivo calor em intensidade de 30,3 IBUTG e a agentes biológicos, vírus, bactérias e fungos;
- 03.11.11 a 10.02.15 (DER): PPP de fls. 109/111, id 52224163, função de cozinheira, exposta a
agente agressivo calor em intensidade de 30,3 IBUTG e frio 5 °C.
No tocante ao agente agressivo calor, conforme previsto na NR-15, anexo 3, considerando que a
atividade da autora é leve, para o enquadramento haveria necessidade de comprovação de
exposição contínua para os valores abaixo de 30 IBUGT e em regime intermitente de 45 minutos
de trabalho e 15 minutos de descanso para os valores de 30,3IBUGT, o que não consta do PPP,
de modo a inviabilizar o reconhecimento da especialidade em função da exposição ao calor.
Quanto ao agente agressivo frio, não há possibilidade de enquadramento, por não haver relação
com a atividade, sem prova da exposição habitual e permanente de uso de câmara frigorífica;
No tocante aos agentes agressivos biológicos e químicos, não há relação da indicação da
exposição com as tarefas desempenhadas pela autora, quais sejam, auxiliar de cozinha e
cozinheira, conforme descrição das atividades, pelo que se inviável o enquadramento pretendido.
Confira-se a descrição das atividades da autora constantes PPP:
- 01.09.95 a 31.08.08: Realizar limpeza em geral, com uso de detergente para lavar utensílios,
talheres e pisos. Limpar produtos hortigranjeiros, guardar e retirar de produtos alimentícios em
câmara fria, transportar alimentos para o balcão de aquecimento.
- 01.09.08 a 06.12.10: Executar tarefas específicas típicas de sua área de atuação relacionadas
ao preparo de refeições e sobremesas, controlar a qualidade dos alimentos, atender o cardápio
estipulado, elaborar dietas individualizadas e orientar os auxiliares no pré–preparo das refeições,
zelar pela higiene nos trabalhos de cozinha, aplicar métodos corretos de manipulação, higienizar
e conservar os alimentos, providenciar a limpeza dos equipamentos. Orientar ou executar o pré-
preparo dos alimentos.
- 07.12.2010 em diante: Executar tarefas específicas típicas de sua área de atuação relacionadas
ao preparo de refeições. Operar equipamentos e aparelhos no preparo e manipulação de
alimentos. Orientar os auxiliares no pré-preparo e preparo das refeições simples: aplicar métodos
corretos de manipulação, higienização e conservação dos alimentos. Preparar dietas especiais.
Retirar e guarda alimentos na câmara fria.
Como se vê, não restou demonstrado o labor especial nos períodos em epígrafe.
É possível o cômputo do tempo de serviço trabalhado até a data do ajuizamento da ação
(25/05/18), não havendo que se falar em julgamento ultra petita neste aspecto, porquanto do
extrato CNIS e das cópias da CTPS infere-se que a autora efetivamente continuou trabalhando,
sendo certo que o reconhecimento do tempo de serviço até a data do ajuizamento da ação é
consentâneo com o novel regramento contido artigo 8º, do Código de Processo Civil de 2015, que
trata do princípio da eficiência no processo, que traz o dever de o juiz gerenciar o feito com
enfoque em sua eficiência, atingindo o máximo da finalidade com o mínimo de recursos,
interpretando e aplicando a legislação pautado na eficiência do julgado.
A providência encontrava previsão no art. 462 do CPC/73 e, atualmente, no art. 493, do
CPC/2015, vazado nos seguintes termos:
"Art. 493. Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do
direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a
requerimento da parte, no momento de proferir a decisão.
Parágrafo único. Se constatar de ofício o fato novo, o juiz ouvirá as partes sobre ele antes de
decidir."
Com efeito, na data do ajuizamento da ação, em 25/5/18, contava a autora, com 28 anos, 10
meses e 28 dias de tempo de serviço, insuficientes à concessão da aposentadoria por tempo de
contribuição integral.
Em 15 de dezembro de 1998, anteriormente à vigência da Emenda Constitucional nº 20/98, a
autora perfazia 9 anos, 5 meses e 8 dias de tempo de serviço, também insuficientes à concessão
da aposentadoria por tempo de serviço, ainda que na modalidade proporcional.
Com efeito, de rigor a improcedência do pedido de concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios no valor de 10% do valor da
causa, observada a gratuidade da justiça.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, de ofício, anulo a sentença de primeiro grau e, nos termos do artigo 1.013, §3º do
Código de Processo Civil, julgo improcedente o pedido, observando-se os honorários
advocatícios estabelecidos na forma acima fundamentada. Prejudicadas as apelações
interpostas.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA CONDICIONAL. ANULAÇÃO.
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO ESPECIAL NÃO
COMPROVADO. DESCUMPRIMENTO DOS REQUISITOS PARA A APOSENTAÇÃO.
CONSECTÁRIOS LEGAIS.
- Na hipótese em análise, o MM. Juiz de primeiro grau reconheceu períodos especiais, tendo,
contudo, condicionado a concessão do benefício ao preenchimento dos requisitos legais.
- A sentença condicional implica negativa de prestação jurisdicional adequada, ocasionando sua
nulidade. In casu, o processo se encontra em condições de imediato julgamento, sendo possível
a apreciação do meritum causae, com fundamento no artigo 1.013, § 3º do CPC.
- Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi
convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento
jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer o artigo 201 da Constituição
Federal o direito à aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, ao
completar 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem e 30 (trinta) anos de contribuição,
se mulher.
- Entretanto, o art. 3º da referida Emenda garantiu o direito adquirido à concessão da
aposentadoria por tempo de serviço a todos aqueles que até a data da sua publicação, em 16 de
dezembro de 1998, tivessem cumprido todos os requisitos legais, com base nos critérios da
legislação então vigente.
- Ao segurado inscrito perante o Regime Geral de Previdência Social anteriormente à
promulgação da Emenda Constitucional nº 20/98, mas que, nessa data (16 de dezembro de
1998), ainda não tivesse preenchido os requisitos necessários à sua aposentação, mesmo na
forma proporcional, aplicam-se as regras de transição estabelecidas pelo art. 9º da referida norma
constitucional.
- Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados que
cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da EC
20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o mesmo
prazo; e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
- No caso dos autos, não restou comprovado o labor especial do período requerido. Somatório do
tempo de serviço que não autoriza a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de
contribuição integral ou proporcional.
- Honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa, observada a gratuidade da justiça.
- De ofício, anulada a sentença e julgado improcedente o pedido, restando prejudicadas as
apelações.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu, de ofício, anular a r. sentença e, em novo julgamento, julgar improcedente
o pedido e prejudicadas as apelações, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
