
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005440-87.2020.4.03.6104
RELATOR: Gab. 28 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ADAILSON SANTOS DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: SERGIO RODRIGUES DIEGUES - SP169755-A
OUTROS PARTICIPANTES:
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005440-87.2020.4.03.6104
RELATOR: Gab. 28 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ADAILSON SANTOS DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: SERGIO RODRIGUES DIEGUES - SP169755-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO (RELATOR):
Trata-se de ação previdenciária ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão de aposentadoria especial mediante o reconhecimento de tempo de trabalho especial exercido junto às empresas FERTILIZANTES MITSUI S/A INDÚSTRIA E COMÉRCIO LTDA e VALE CUBATÃO FERTILIZANTES LTDA (YARA BRASIL FERTILIZANTES S.A.), nos períodos de 08/02/1991 a 05/06/1996 e de 21/02/1997 a 08/05/2018, respectivamente.
A r. sentença julgou “PROCEDENTE a pretensão deduzida pelo autor para reconhecer o caráter especial dos períodos de 08/02/1991 a 05/06/1996 e 21/02/1997 a 08/05/2018, e determinar a concessão de APOSENTADORIA ESPECIAL (NB 183.946.710-7) desde a DER 28/02/2019, nos termos da fundamentação supra.”.
Sentença não submetida ao reexame de ofício.
Irresignada, a Autarquia ofertou apelação, requerendo a submissão do feito ao reexame necessário. No mérito, postulou, em apertada síntese, a reforma da r. sentença quanto ao reconhecimento do caráter especial das atividades exercidas pelo demandante nos períodos de 01/03/2001 a 18/11/2003 e 01/12/2011 a 07/04/2015, motivando as razões de sua insurgência. Na eventualidade, formulou pedidos subsidiários.
Apresentadas as contrarrazões, subiram os autos a esta. E. Corte.
É o relatório.
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005440-87.2020.4.03.6104
RELATOR: Gab. 28 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ADAILSON SANTOS DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: SERGIO RODRIGUES DIEGUES - SP169755-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO (RELATOR):
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado mostra-se formalmente regular, motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação (art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o e passo a apreciá-lo nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
Em sede preliminar, embora a sentença tenha sido desfavorável ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, não se encontra condicionada ao reexame necessário, pois é evidente que o montante devido não excederá 1000 (mil) salários mínimos (art. 496, §3º, I, do NCPC, CPC/2015), em caso de manutenção da decisão guerreada. Rejeito, assim, a preliminar. Rejeito, assim, a preliminar.
A concessão da aposentadoria por tempo de serviço, hoje tempo de contribuição, está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91.
A par do tempo de serviço/contribuição, deve também o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos do artigo 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91. Aos já filiados quando do advento da mencionada lei, vige a tabela de seu artigo 142 (norma de transição), em que, para cada ano de implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de meses de contribuição inferior aos 180 (cento e oitenta) exigidos pela regra permanente do citado artigo 25, inciso II.
Para aqueles que implementaram os requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de serviço até a data de publicação da EC nº 20/98 (16/12/1998), fica assegurada a percepção do benefício, na forma integral ou proporcional, conforme o caso, com base nas regras anteriores ao referido diploma legal.
Por sua vez, para os segurados já filiados à Previdência Social, mas que não implementaram os requisitos para a percepção da aposentadoria por tempo de serviço antes da sua entrada em vigor, a EC nº 20/98 impôs as seguintes condições, em seu artigo 9º, incisos I e II.
Ressalte-se, contudo, que as regras de transição previstas no artigo 9º, incisos I e II, da EC nº 20/98 aplicam-se somente para a aposentadoria proporcional por tempo de serviço, e não para a integral, uma vez que tais requisitos não foram previstos nas regras permanentes para obtenção do referido benefício.
Desse modo, caso o segurado complete o tempo suficiente para a percepção da aposentadoria na forma integral, faz jus ao benefício independentemente de cumprimento do requisito etário e do período adicional de contribuição, previstos no artigo 9º da EC nº 20/98.
Por sua vez, para aqueles filiados à Previdência Social após a EC nº 20/98, não há mais possibilidade de percepção da aposentadoria proporcional, mas apenas na forma integral, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e de 30 (trinta) anos, para as mulheres.
Portanto, e antes da vigência da EC 103/19, vigoravam as seguintes regras para a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição:
1) Segurados filiados à Previdência Social antes da EC nº 20/98:
a) têm direito à aposentadoria (integral ou proporcional), calculada com base nas regras anteriores à EC nº 20/98, desde que cumprida a carência do artigo 25 c/c 142 da Lei nº 8.213/91, e o tempo de serviço/contribuição dos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91 até 16/12/1998;
b) têm direito à aposentadoria proporcional, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que cumprida a carência do artigo 25 c/c 142 da Lei nº 8.213/91, o tempo de serviço/contribuição dos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91, além dos requisitos adicionais do art. 9º da EC nº 20/98 (idade mínima e período adicional de contribuição de 40%);
c) têm direito à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e de 30 (trinta) anos, para as mulheres;
2) Segurados filiados à Previdência Social após a EC nº 20/98:
- têm direito somente à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e 30 (trinta) anos, para as mulheres.
Atividade especial:
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei nº 3.807/60.
Dispõe o artigo 57 da Lei nº 8.213/91 que a aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a Lei. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995).
O critério de especificação da categoria profissional com base na penosidade, insalubridade ou periculosidade, definidas por Decreto do Poder Executivo, foi mantido até a edição da Lei nº 8.213/91, ou seja, as atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo Poder Executivo seriam consideradas penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação por laudo técnico, bastando, assim, a anotação da função em CTPS ou a elaboração do então denominado informativo SB-40.
O Poder Executivo baixou os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, relacionando os serviços considerados penosos, insalubres ou perigosos.
Embora o artigo 57 da Lei nº 8.213/91 tenha limitado a aposentadoria especial às atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, o critério anterior continuou ainda prevalecendo.
De notar que, da edição da Lei nº 3.807/60 até a última CLPS, que antecedeu à Lei nº 8.213/91, o tempo de serviço especial foi sempre definido com base nas atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo Poder Executivo, como penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação por laudo técnico.
A própria Lei nº 8.213/91, em suas disposições finais e transitórias, estabeleceu, em seu artigo 152, que a relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física deverá ser submetida à apreciação do Congresso Nacional, prevalecendo, até então, a lista constante da legislação em vigor para aposentadoria especial.
Os agentes prejudiciais à saúde foram relacionados no Decreto nº 2.172, de 05/03/1997 (art. 66 e Anexo IV), mas por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei n 9.528, de 10/12/1997.
Destaque-se que o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, em sua redação original, deixou de fazer alusão a serviços considerados perigosos, insalubres ou penosos, passando a mencionar apenas atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, sendo que o artigo 58 do mesmo diploma legal, também em sua redação original, estabelecia que a relação dessas atividades seria objeto de lei específica.
A redação original do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 foi alterada pela Lei nº 9.032/95 sem que até então tivesse sido editada lei que estabelecesse a relação das atividades profissionais sujeitas às condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, não havendo dúvidas até então que continuavam em vigor os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. Nesse sentido, confira-se a jurisprudência: STJ; Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482.
A atividade especial somente pode ser considerada por presunção legal até 28/04/1995, ocasião em que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 foram alterados pela Lei nº 9.032/95. A partir de então, o reconhecimento da atividade especial apenas se dá caso seja demonstrada a exposição, de forma habitual e permanente, a agentes nocivos à saúde ou à integridade física, sendo que após 10/12/1997 - data da vigência da Lei nº 9.528/97 - passou a ser necessária a apresentação de laudo técnico para comprovação à exposição a agentes nocivos à saúde.
Registro que o Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP substitui o laudo técnico, sendo documento suficiente para aferição das atividades nocivas a que esteve sujeito o trabalhador. E também não obsta o reconhecimento de tempo de trabalho em condições especiais à extemporaneidade de documento, pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual à constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica.
O artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91, exige que a comprovação do tempo especial seja feita por formulário, ancorado em laudo técnico elaborado por engenheiro ou médico do trabalho, o qual, portanto, pode se basear em qualquer metodologia científica. Não tendo a lei determinado que a aferição só poderia ser feita por meio de uma metodologia específica, não se pode deixar de reconhecer o labor especial pelo fato de o empregador ter utilizado uma técnica diversa daquela indicada na Instrução Normativa do INSS, pois isso representaria uma extrapolação do poder regulamentar da autarquia.
É de se ressaltar, quanto ao nível de ruído, que a jurisprudência já reconheceu que o Decreto nº 53.831/64 e o Decreto nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, ou seja, não houve revogação daquela legislação por esta, de forma que, constatando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado (STJ - REsp. n. 412351/RS; 5ª Turma; Rel. Min. Laurita Vaz; julgado em 21.10.2003; DJ 17.11.2003; pág. 355).
O Decreto nº 2.172/97, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 dB(A) como prejudicial à saúde.
Por tais razões, até ser editado o Decreto nº 2.172/97, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 dB(A) como agente nocivo à saúde.
Todavia, com o Decreto nº 4.882, de 18/11/2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível voltou a ser de 85 dB(A) (art. 2º do Decreto nº 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Houve, assim, um abrandamento da norma até então vigente, a qual considerava como agente agressivo à saúde a exposição acima de 90 dB(A), razão pela qual vinha adotando o entendimento segundo o qual o nível de ruídos superior a 85 dB(A) a partir de 05/03/1997 caracterizava a atividade como especial.
Ocorre que o C. STJ, no julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do artigo 543-C do CPC, decidiu não ser possível a aplicação retroativa do Decreto nº 4.882/03, de modo que no período de 06/03/1997 a 18/11/2003, em consideração ao princípio tempus regit actum, a atividade somente será considerada especial quando o ruído for superior a 90 dB(A) (STJ, REsp 1398260/PR, Primeira Seção, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 05/12/2014).
Quanto à eficácia do EPI, vale dizer que, por ocasião do julgamento do ARE 664335, o E. STF assentou as seguintes teses: a) “o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial"; b) "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
Contudo, cabe ressaltar que, para descaracterização da atividade especial em razão do uso de EPI, há necessidade de prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado.
Destaco, ainda, que inexiste vinculação do ato de reconhecimento de tempo de atividade perigosa, ou nociva ao eventual pagamento de encargos tributários com alíquotas diferenciadas, eis que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 não demandam tal exigência, que constituiria encargo para o empregador, não podendo o empregado ser por isso prejudicado.
Por seu turno, o recebimento de adicional de insalubridade ou de pagamento da taxa SAT (com indicação de IEAN no CNIS) não implica necessariamente no reconhecimento de exercício de atividade especial, que tem que ser comprovada pelos meios estabelecidos na legislação vigente.
Quanto à possibilidade da contagem do tempo em gozo de auxílio-doença como atividade especial, o julgamento proferido em sede de repetitivo (Tema repetitivo n. 998), fixou da seguinte tese: “O Segurado que exerce atividades em condições especiais, quando em gozo de auxílio-doença, seja acidentário ou previdenciário, faz jus ao cômputo desse mesmo período como tempo de serviço especial”.
Efetuadas tais considerações, vejo que assim restou analisado o processo em primeiro grau em relação aos períodos controversos:
“(...)
Na hipótese em apreço, o autor requereu, administrativamente, a concessão de aposentadoria especial, sendo indeferido o pedido.
Relativamente ao período de 08/02/1991 a 05/06/1996 durante o qual o requerente trabalhou na empresa Fertilizantes Mitsui Ind. e Com. Ltda., o PPP juntado aos autos demonstra que no exercício do cargo de Auxiliar de Produção, no setor Produção, esteve exposto a ruído de 94dB, acima do limite de tolerância (id 39963692 – pag. 6).
De acordo com a perícia médica do INSS o período não foi enquadrado porque: “não foi utilizada a metodologia adequada (NR 15 / NEM / NHO), não foi caracterizada a fonte geradora do ruído e não há LTCAT com registros ambientais do período.”
Com efeito o PPP apresentado aponta como técnica utilizada o decibelímetro, confundindo-se a técnica com o aparelho de medição, ou seja, não há notícia da metodologia empregada para sua aferição. Cumpre ressaltar terem sido usadas duas metodologias para a mensuração dos níveis de ruído, que foram regidas por legislações diferentes: a) para períodos anteriores a 18/11/2003, véspera da vigência do Decreto nº 4.882/2003, admitia-se a medição do ruído por meio de decibelímetro conforme a NR-15/MTE (Anexo I, item 6); b) a partir de 19/11/2003, vigência do Decreto nº 4.882/2003, que incluiu o 11 no art. 68 do Decreto 3.048/99 , a medição do ruído deve-se dar em conformidade com que preconiza a NHO 01 (itens. 6.4 a 6.4.3) da Fundacentro (órgão do Ministério do Trabalho), por meio de dosímetro de ruído (técnica dosimetria - item 5.1.1.1 da NHO-01).
A metodologia de aferição aplicável ao caso concreto deve estar descrita nos formulários PPP e LTCAT elaborados por profissionais qualificados. Não obstante, é de responsabilidade da empresa o preenchimento dos referidos documentos conforme a norma pertinente e compete à Autarquia Previdenciária fiscalizar o atendimento das obrigações impostas pela legislação previdenciária, nos termos do artigo 125-A da Lei n. 8.213, de 24/07/1991.
Daí porque, havendo omissão quanto à metodologia, expediu-se ofício à empregadora para apresentar o correspondente laudo técnico, sem sucesso, porém, em virtude da não preservação do documento produzido em longa data.
De outro lado, observo que oPPP apresentado foi devidamente preenchido com base em laudo ambiental contendo o nome do profissional responsável pelos registros ambientais, a assinatura do representante legal da empresa, a quantidade de decibéis a que o segurado esteve exposto e, embora não indicada a metodologia, se NR 15 ou NHO 01, indicou como técnica o decibelímetro, utilizado à data do labor e quando vigente a NR 15.
Por conseguinte, havendo indicação de medição (decibelímetro), deve-se presumir que foi observada a NR 15 e o valor informado reflete a dose diária, devidamente normalizada para uma jornada de trabalho padrão de oito horas.
Assim, entendo deva ser reconhecida a especialidade.
Já em relação ao período de 21/02/1997 a 08/05/2018 laborado junto à empresa Vale Cubatão Fertilizantes Ltda., acostou o segurado PPP (id 39963692 – pag. 8/10) do qual se verifica que durante o exercício de diversos cargos de Operador e Auxiliar de Processos Químicos, esteve exposto a ruído de 91dB até 28/02/2001, 86dB entre 01/03/2001 a 30/11/2011 e 08/04/2015 a 08/05/2018 e 85dB entre 01/12/2011 a 07/04/2015.
Diante da argumentação do autor de que referido documento é omisso quanto aos agentes químicos a que esteve exposto durante todo labor e de que o nível de ruído informado no PPP não representaria a realidade das condições ambientais, pois sempre esteve exposto a níveis acima dos limites de tolerância, foi deferida a produção de prova pericial.
Realizada perícia no local do trabalho, confirmou o Sr. Perito (id 293552416) que no período laboral de 21/02/1997 a 08/05/2018 o autor exerceu atividades nos setores de Ensaque e Produção da empresa Yara Brasil Fertilizantes S.A., a qual produz fertilizantes, sólidos ou líquidos, contendo matérias primas como: nitrogênio, enxofre, fósforo, potássio e toda a gama de micronutrientes para nutrição de plantas. Explicou que o setor de Ensaque, recebe matéria prima e o setor de Produção possui duas linhas de produção: Linha de Produção nº 1: produção de ácido nítrico; amônia líquida; nitrato de amônia líquido e sólido; e Linha de Produção nº 2: produção de ácido fosfórico (matéria prima rocha fosfática e ácido sulfúrico); ácido sulfúrico (matéria prima enxofre); e MAP – Mono-Amônio-Fosfato (Fertilizante fosfatado possui na sua constituição entre 10% a 12% de N-amoniacal e 50% a 54% de P2O5 (fósforo)). Dentre seus produtos destacou a produção de fertilizantes fosforados e organofosforados, compostos orgânicos degradáveis contendo ligações carbono–fósforo na forma liquida.
Após descrever as atividades desenvolvidas pelo autor em cada setor, afirmou o Expert que no período avaliado de 21/02/1997 a 08/05/2018 até a data da perícia em 24/01/2023 foram feitas diversas alterações e modernizações nas linhas de produção nº 2 e na Central de Motores Elétricos e Subestação Elétrica. Locais nos quais foram realizadas várias adequações e modernizações dos equipamentos e novas instalações, com outros motores elétricos e sistemas para produção de ácidos e fertilizantes.
Confirmou-se assim que “as medições de ruído apresentadas no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) de Num. 39963692 – Pág. 8 do Autor, representam o nível de pressão sonora, dosimetria, dos locais de trabalho onde o Autor exercia atividades nos períodos avaliados, sendo que até 31/12/2003 foi apresentado o nível equivalente (NE) de pressão sonora com q=5, a partir de 01/01/2004 o nível de exposição normalizado (NEN), com metodologia e procedimentos da NHO-01 (q=3) da FUNDACENTRO e limite de tolerância da NR-15”.
Desta forma, o perito considerou as avaliações de ruído apresentadas no PPP e concluiu que há nocividade pelo agente físico ruído no ambiente laboral onde o Autor exerceu suas atividades de modo rotineiro, habitual (diário) e permanente, durante os períodos laborais de 21/02/1997 a 05/03/997, 06/03/1997 a 31/05/1997, 01/06/1997 a 28/02/2001, 01/01/2004 a 30/11/2011, e de 08/04/2015 a 08/05/2018 quando os limites de tolerância foram ultrapassados.
Portanto, deve ser reconhecida a especialidade dos aludidos interregnos por exposição do trabalhador ao agente ruído.
No tocante aos agentes químicos, asseverou o Perito que o autor mantinha contato dermal e respiratório com ácidos e fertilizantes, dentre eles os fosforados e organofosforados, compostos orgânicos degradáveis contendo ligações carbono–fósforo na forma liquida, conforme item 1.2.6 do Decreto 53.831/64 e 1.0.12 do Decreto nº 2.172/97:
- Código: 1.2.6 - FÓSFORO Operações com fósforo e a seus compostos. – Fabricação de produtos fosforados asfixiantes, tóxicos, incendiários ou explosivos
- Código: 1.0.12 – Fósforo e seus compostos tóxicos: fabricação e aplicação de produtos fosforados e organofosforados (sínteses orgânicas, fertilizantes e praguicidas) –
O Autor também mantinha contato dermal e respiratório com ácidos, tais como: ácido nítrico, ácido sulfúrico e ácido fosfórico.
Tipificada pela legislação vigente como insalubre, o expert confirmou a presença do agente químico fósforo na fabricação de defensivos fosforados e organofosforados existentes durante todo o período laboral de 06/03/1997 a 08/05/2018, próprios das atividades realizadas pelo Autor e inerentes aos cargos que exerceu de modo rotineiro, habitual (diário) e permanente, havendo contato dermal e respiratório, sem a devida proteção.
Constatou, ainda, durante o mesmo período e do mesmo modo, a presença dos agentes químicos ácido nítrico, ácido sulfúrico e ácido fosfórico.
Não há, por outro lado, comprovação de que o autor tenha sido treinado para uso de EPIs, tampouco que os tenha recebido de forma regular e eficaz (dotados de certificado de aprovação) para que fosse elidida a nocividade dos agentes nocivos identificados.
O Fósforo está inserto no Anexo XII da NR 15, além de ser agente cancerígeno com previsão na LINACH (Lista Nacional de Agentes Cancerígenos) para Humanos, sendo suficiente a comprovação da efetiva exposição do trabalhador.
Diante das considerações acima e considerando que as atividades do autor eram desenvolvidas de modo habitual e permanente, reconheço como laborado em condições especiais todo intervalo de 06/03/1997 a 08/05/2018 também por exposição a agente químico.
Reconhecido o caráter especial dos períodos de 08/02/1991 a 05/06/1996 e 21/02/1997 a 08/05/2018, tem-se o total de 26 anos, 6 meses e 16 dias, conforme tabela abaixo:
(...)”
Pois bem.
No presente caso, da análise da documentação colacionada no processado, em especial o laudo pericial produzido judicialmente (ID 293434972), considerando que a insurgência recursal se restringe ao reconhecimento de atividade especial do demandante nos períodos de 01/03/2001 a 18/11/2003 e de 01/12/2011 a 07/04/2015 por exposição a agentes nocivos químicos, observo que o expert indicou expressamente que “Há presença do agente químico Fósforo, na fabricação de defensivos fosforados e organofosforados existentes durante todo o período laboral de 06.03.1997 a 08.05.2018, proveniente das atividades realizadas pelo Autor, inerentes aos cargos exercidos de modo rotineiro, habitual (diário) e permanente, em contato dermal e respiratório com o agente químico Fósforo, na fabricação de defensivos fosforados e organofosforados, tipificada pela legislação vigente como insalubre, sem a devida proteção dermal e respiratória. Há presença dos agentes químicos ácido nítrico, ácido sulfúrico e ácido fosfórico existentes durante todo o período laboral de 06.03.1997 a 08.05.2018, proveniente das atividades realizadas pelo Autor, inerentes aos cargos que exerceu, de modo rotineiro, habitual (diário) e permanente, em contato dermal e respiratório com os agentes químicos ácido nítrico, ácido sulfúrico e ácido fosfórico, tipificados pela legislação vigente como insalubre, sem a devida proteção dermal e respiratória. Não há comprovação de que o Autor tenha sido treinado para uso de EPIs e recebido EPIs de forma regular e eficazes (dotados de certificado de aprovação) para elidir os agentes nocivos identificados.”, de modo que ser integralmente mantida a especialidade reconhecida em primeiro grau em relação aos períodos ainda controversos, pelos escorreitos motivos já expostos.
Nesses termos, também devem ser mantidos os demais termos da r. sentença que concedeu ao postulante aposentadoria especial, a partir da DER, segundo observado na tabela elaborada em primeiro grau, uma vez que, mesmo antes de 13/11/2019 (data da Reforma - EC nº 103/19), o segurado já possuía direito à aposentadoria especial, pois cumpriu o tempo mínimo de 25 anos sujeito a condições prejudiciais à saúde ou à integridade física.
No tocante às demais insurgências recursais do INSS e em consonância com o posicionamento adotado por esta E. Turma e em nome do princípio da economia processual, considerando que os PPP’s respectivos foram apresentados na seara administrativa (o que demonstra o interesse de agir do demandante), mas que o direito à benesse vindicada só restou comprovado em sede judicial (mediante a elaboração de laudo pericial conclusivo), determino que o termo inicial dos efeitos financeiros do benefício concedido seja fixado pelo Juízo da Execução de acordo com a tese a ser fixada no Superior Tribunal de Justiça no Tema n.º 1.124: “Caso superada a ausência do interesse de agir, definir o termo inicial dos efeitos financeiros dos benefícios previdenciários concedidos ou revisados judicialmente, por meio de prova não submetida ao crivo administrativo do INSS, se a contar da data do requerimento administrativo ou da citação da autarquia previdenciária.”.
Cumpre observar que o C. STF, por ocasião do julgamento do Tema nº 709 no RE 791.961, firmou a seguinte tese: “(i) [é] constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não; (ii) nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros; efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o benefício previdenciário em questão.
Segue abaixo a ementa do referido julgado:
“Direito Previdenciário e Constitucional. Constitucionalidade do art. 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91. Percepção do benefício de aposentadoria especial independentemente do afastamento do beneficiário das atividades laborais nocivas a sua saúde. Impossibilidade. Recurso extraordinário parcialmente provido.
1. O art. 57,§ 8º, da Lei nº 8.213/91 é constitucional, inexistindo qualquer tipo de conflito entre ele e os arts. 5º, inciso XIII; 7º, inciso XXXIII; e 201,§ 1º, da Lei Fundamental. A norma se presta, de forma razoável e proporcional, para homenagear o princípio da dignidade da pessoa humana, bem como os direitos à saúde, à vida, ao ambiente de trabalho equilibrado e à redução dos riscos inerentes ao trabalho.
2. É vedada a simultaneidade entre a percepção da aposentadoria especial e o exercício de atividade especial, seja essa última aquela que deu causa à aposentação precoce ou não. A concomitância entre a aposentadoria e o labor especial acarreta a suspensão do pagamento do benefício previdenciário.
3. O tema da data de início da aposentadoria especial é regulado pelo art. 57, § 2º, da Lei nº 8.213/91, que, por sua vez, remete ao art. 49 do mesmo diploma normativo. O art. 57,§ 8º, da Lei de Planos e Benefícios da Previdência Social cuida de assunto distinto e, inexistindo incompatibilidade absoluta entre esse dispositivo e aqueles anteriormente citados, os quais também não são inconstitucionais, não há que se falar em fixação da DIB na data de afastamento da atividade, sob pena de violência à vontade e à prerrogativa do legislador, bem como de afronta à separação de Poderes.
4. Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral: “(i) [é] constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não; (ii) nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros; efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o benefício previdenciário em questão.
5. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento.
(RE 791961, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 08/06/2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-206 DIVULG 18-08-2020 PUBLIC 19-08-2020)
Diante disso, deve ser observado o quanto decidido pelo C. STF por ocasião do julgamento do Tema nº 709 no RE 791.961, se for o caso.
Por fim, a intimação da parte autora para firmar e apresentar autodeclaração é providência de cunho administrativo, sendo despicienda a intervenção judicial para esse fim. Frise-se, ademais, que a observância da Súmula 111/STJ no tocante à verba honorária fixada já restou determinada pela decisão de primeiro grau.
O INSS é isento de custas processuais, mas deve arcar com as demais despesas, inclusive honorários periciais (Res. CJF nºs. 541 e 558/2007), além de reembolsar as custas eventualmente recolhidas pela parte contrária.
Anote-se, na espécie, e se for o caso, a obrigatoriedade da dedução, na fase de liquidação, dos valores eventualmente pagos à parte autora após o termo inicial assinalado à benesse outorgada, ao mesmo título ou cuja cumulação seja vedada por lei (art. 124 da Lei nº 8.213/1991 e art. 20, § 4º, da Lei 8.742/1993.
Do exposto, enfrentadas as questões pertinentes à matéria em debate, rejeito a preliminar e dou parcial provimento à apelação autárquica, nos termos desta fundamentação.
É como voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. PRELIMINAR REJEITADA. APOSENTADORIA ESPECIAL. RECONHECIMENTO ESPECIALIDADE MANTIDO. TEMA 1124/STJ. APELAÇÃO INSS PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Em sede preliminar, embora a sentença tenha sido desfavorável ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, não se encontra condicionada ao reexame necessário, pois é evidente que o montante devido não excederá 1000 (mil) salários mínimos (art. 496, §3º, I, do NCPC, CPC/2015), em caso de manutenção da decisão guerreada. Rejeito, assim, a preliminar.
2. A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei nº 3.807/60.
3. No presente caso, da análise da documentação colacionada no processado, em especial o laudo pericial produzido judicialmente (ID 293434972), considerando que a insurgência recursal se restringe ao reconhecimento de atividade especial do demandante nos períodos de 01/03/2001 a 18/11/2003 e de 01/12/2011 a 07/04/2015 por exposição a agentes nocivos químicos, observo que o expert indicou expressamente que “Há presença do agente químico Fósforo, na fabricação de defensivos fosforados e organofosforados existentes durante todo o período laboral de 06.03.1997 a 08.05.2018, proveniente das atividades realizadas pelo Autor, inerentes aos cargos exercidos de modo rotineiro, habitual (diário) e permanente, em contato dermal e respiratório com o agente químico Fósforo, na fabricação de defensivos fosforados e organofosforados, tipificada pela legislação vigente como insalubre, sem a devida proteção dermal e respiratória. Há presença dos agentes químicos ácido nítrico, ácido sulfúrico e ácido fosfórico existentes durante todo o período laboral de 06.03.1997 a 08.05.2018, proveniente das atividades realizadas pelo Autor, inerentes aos cargos que exerceu, de modo rotineiro, habitual (diário) e permanente, em contato dermal e respiratório com os agentes químicos ácido nítrico, ácido sulfúrico e ácido fosfórico, tipificados pela legislação vigente como insalubre, sem a devida proteção dermal e respiratória. Não há comprovação de que o Autor tenha sido treinado para uso de EPIs e recebido EPIs de forma regular e eficazes (dotados de certificado de aprovação) para elidir os agentes nocivos identificados.”, de modo que ser integralmente mantida a especialidade reconhecida em primeiro grau em relação aos períodos ainda controversos, pelos escorreitos motivos já expostos.
4. Nesses termos, também devem ser mantidos os demais termos da r. sentença que concedeu ao postulante aposentadoria especial, a partir da DER, segundo observado na tabela elaborada em primeiro grau, uma vez que, mesmo antes de 13/11/2019 (data da Reforma - EC nº 103/19), o segurado já possuía direito à aposentadoria especial, pois cumpriu o tempo mínimo de 25 anos sujeito a condições prejudiciais à saúde ou à integridade física.
5. No tocante às demais insurgências recursais do INSS e em consonância com o posicionamento adotado por esta E. Turma e em nome do princípio da economia processual, considerando que os PPP’s respectivos foram apresentados na seara administrativa (o que demonstra o interesse de agir do demandante), mas que o direito à benesse vindicada só restou comprovado em sede judicial (mediante a elaboração de laudo pericial conclusivo), determino que o termo inicial dos efeitos financeiros do benefício concedido seja fixado pelo Juízo da Execução de acordo com a tese a ser fixada no Superior Tribunal de Justiça no Tema n.º 1.124: “Caso superada a ausência do interesse de agir, definir o termo inicial dos efeitos financeiros dos benefícios previdenciários concedidos ou revisados judicialmente, por meio de prova não submetida ao crivo administrativo do INSS, se a contar da data do requerimento administrativo ou da citação da autarquia previdenciária.”.
6. Preliminar rejeitada. Apelação do INSS parcialmente provida.
