
9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5004171-39.2022.4.03.6105
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELIANE MARIA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: FABIO GARCIA FERREIRA - SP411651-A
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5004171-39.2022.4.03.6105
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELIANE MARIA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: FABIO GARCIA FERREIRA - SP411651-A
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício de auxílio doença e sua conversão em aposentadoria por invalidez.
A r. sentença, proferida em 12.12.2023, julgou parcialmente procedente o pedido e condenou o INSS a conceder o benefício de auxílio doença, desde a data do requerimento administrativo (11.08.2020 - NB 632.354.184-3), devendo ser mantido até o termo final apontado pelo perito judicial (31.12.2023), quando então deverá ser submetida a nova avaliação administrativa. Determinou a incidência sobre os valores atrasados, de correção monetária e de juros de mora, pelos índices constantes do Manual de Orientação para a Elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-E a partir da vigência da Lei nº 11.960/2009, e a aplicação da taxa SELIC a partir da publicação da EC 113/2021. Condenou o INSS, ainda, ao pagamento dos honorários advocatícios, fixados no percentual mínimo previsto no inciso I, do §3º, respeitada tal proporção, em eventual aplicação dos incisos II a V, a teor do §5º, todos do art. 85, do CPC/2015, cujo percentual deverá incidir sobre a condenação calculada até a data da sentença, a ser liquidado oportunamente. Isentou a autarquia federal do pagamento das custas processuais. Tutela antecipada concedida. Dispensada a remessa oficial. (ID’s 295656733/741).
Em suas razões recursais, o INSS requer, preliminarmente, o reconhecimento da coisa julgada, com a extinção do feito sem resolução de mérito.
Eventualmente, pleiteia o desconto, de eventual montante retroativo, dos valores já pagos administrativamente ou de qualquer benefício inacumulável recebido no período, a observância à prescrição quinquenal, a fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula 111 do STJ, e a isenção ao pagamento das custas processuais. Por fim, suscita o prequestionamento legal para fins de interposição de recursos. (ID 295656745).
Com contrarrazões (ID 295656749), subiram os autos a este Eg. Tribunal.
É o relatório.
dcm
9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5004171-39.2022.4.03.6105
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELIANE MARIA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: FABIO GARCIA FERREIRA - SP411651-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passo ao exame da matéria objeto de devolução.
COISA JULGADA E LITISPENDÊNCIA
A teor do disposto no art. 485, V, do Código de Processo Civil/2015, caracterizada a perempção, litispendência ou coisa julgada, o processo será extinto sem julgamento do mérito, independentemente de arguição da parte interessada, uma vez que a matéria em questão pode e deve ser conhecida de ofício pelo Juiz, em qualquer tempo e grau de jurisdição (§ 3º).
Nos termos do art. 337, §4º, do mesmo código, considera-se efeito da litispendência a impossibilidade de repropositura de um mesmo pleito, ou seja, veda-se o curso simultâneo de duas ou mais ações judiciais iguais, em que há a identidade das partes, do objeto e da causa de pedir, tanto próxima quanto remota. A rigor, a litispendência propriamente dita nada mais é do que uma ação pendente que se mantém até o trânsito em julgado da sentença de mérito.
Igualmente, a coisa julgada material impede o ajuizamento de demanda idêntica à anterior, com fundamento no já citado inciso V do art. 485, entendendo-se como tal, de acordo com o art. 502, a eficácia "que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso".
Constatada a simultaneidade de processos iguais e não havendo sentença de mérito transitada em julgado, deverá ser extinto aquele cuja citação tenha ocorrido por último. Sobrevindo, no entanto, a coisa julgada material, a extinção recairá sobre a ação em trâmite, ainda que sua citação se tenha dado primeiro, neste caso, em observância ao princípio da economia processual.
Na espécie, pugna o apelante pelo reconhecimento da coisa julgada em face da ação anteriormente ajuizada pela requerente (ação n° 0004978-45.2016.4.03.6303).
Consoante se depreende dos documentos juntados aos autos (ID’s 295656679-681), a parte autora propôs, em 01.08.2016, perante a 3ª Vara Gabinete JEF de Campinas /SP, ação previdenciária de restabelecimento do benefício de auxílio doença desde a data da cessação administrativa em 31.05.2015 (NB 607.722.030-6), ou desde a data do novo requerimento administrativo em 10.06.2015 (NB 610.804.175-5), em razão de ser portadora de problemas psiquiátricos e síndrome do intestino irritável, que foi julgada improcedente, em razão de o perito judicial não ter constatado a existência de incapacidade laborativa.
Na presente demanda, proposta em 13.04.2022, a parte autora acosta documentos médicos e requer a concessão do benefício de auxílio doença e sua conversão em aposentadoria por invalidez, desde a data dos requerimentos administrativos em 13.09.2014, ou em 10.06.2015, ou em 03.09.2015 ou, ainda, em 11.08.2020, em função de ser portadora de problemas psiquiátricos e síndrome do intestino irritável.
Apesar de se tratar das mesmas patologias indicadas na ação antecedente, vale destacar que, na presente ação, conforme conclusão pericial (ID 295656673), foi constatada a existência de incapacidade laborativa, a demonstrar o agravamento da situação clínica, em detrimento ao laudo pericial elaborado na ação anterior.
Esclareça-se que o direito não reconhecido na ação antecedente teve por base as condições de saúde da requerente no momento do seu ajuizamento e da realização da perícia médica à época.
Aponto que a natureza, muitas vezes transitória da incapacidade laborativa, permite concluir que eventuais alterações na situação de fato ao longo do tempo não podem ser desconsideradas, e naturalmente podem ser objeto de requerimentos ao Juízo.
Acresça-se que, neste feito, o requerimento administrativo é distinto do pedido administrativo da ação precedente, ressalvando-se que, na presente ação, a parte autora requer a concessão de benefício por incapacidade, entre outros, desde a data do requerimento administrativo em 11.08.2020 (ID 295656645 – pág. 02).
Assim, tem-se que o requerimento administrativo, diverso do pleiteado na ação precedente, bem como o agravamento do quadro clínico, tiveram a aptidão de inaugurar nova discussão judicial em relação ao mesmo benefício previdenciário, baseada em novo quadro fático de saúde, a contemplar a avaliação sobre a continuidade ou o agravamento da incapacidade laboral.
Desse modo, embora sejam idênticas as partes e os pedidos, a causa de pedir constante nos autos evidencia alteração na situação de fato, em razão da pretensão embasar-se em requerimento administrativo diverso do precedente e do agravamento do quadro clínico.
Assim, diante da novel situação fática declinada no presente feito, não configurada a coisa julgada, pois distintas as causas de pedir.
Nesse sentido é a lição trazida pela nota 19 ao art. 301 do Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante de Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery:
"19. Identidade de ações: caracterização. As partes devem ser as mesmas, não importando a ordem delas nos pólos das ações em análise. A causa de pedir, próxima e remota (fundamentos de fato e de direito, respectivamente), deve ser a mesma nas ações, para que se as tenha como idênticas. O pedido, imediato e mediato, deve ser o mesmo: bem da vida e tipo de sentença judicial. Somente quando os três elementos, com suas seis subdivisões, forem iguais é que as ações serão idênticas".
(Ed. Revista dos Tribunais, 9ª ed. 2006, pág. 496)
Portanto, não é o caso de extinção do feito sem resolução do mérito.
Rejeito a preliminar, e passo à análise do mérito.
DO CASO DOS AUTOS
In casu, não havendo insurgência em relação ao "meritum causae", passo a apreciação dos pontos impugnados no apelo.
COMPENSAÇÃO DOS VALORES ADMINISTRATIVOS JÁ PAGOS.
Verifica-se que o juízo “a quo” fixou a DIB sem indicar a necessidade do desconto de valores inacumuláveis.
Desse modo, determino a compensação dos valores eventualmente pagos a título de auxílio por incapacidade temporária ou outro benefício cuja cumulação seja vedada por lei (art. 124 da Lei 8.213/1991 e art. 20, § 4º, da Lei 8.742/1993) após a data de início do benefício concedido nesta ação.
PRESCRIÇÃO QUINQUENAL PARCELAS ATRASADAS
O Superior Tribunal de Justiça já pacificou a questão da prescrição das parcelas vencidas anteriormente ao ajuizamento da ação previdenciária, com a edição da Súmula 85:
"Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública - aqui incluído o INSS - figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do quinquênio anterior a propositura da ação."
Considerando o ajuizamento da ação em 13.04.2022, e a data do requerimento administrativo em 11.08.2020, verifica-se que não há parcelas atingidas pela prescrição quinquenal.
CONSECTÁRIOS
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Com o advento do novo Código de Processo Civil, foram introduzidas profundas mudanças no princípio da sucumbência, e em razão destas mudanças e sendo o caso de sentença ilíquida, a fixação do percentual da verba honorária deverá ser definida somente na liquidação do julgado, com observância ao disposto no inciso II, do § 4º c.c. § 11, ambos do artigo 85, do CPC/2015, bem como o artigo 86, do mesmo diploma legal.
Os honorários advocatícios, a teor da Súmula 111 do E. STJ incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência.
CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS
Falta de interesse recursal do INSS, pois a sentença já determinou a isenção ao pagamento das custas processuais, nos moldes pleiteados pelo requerido.
PREQUESTIONAMENTO
Por derradeiro, a sentença não ofendeu qualquer dispositivo legal, não havendo razão ao prequestionamento.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, rejeito a preliminar, e não conheço de parte da apelação e, na parte conhecida, dou parcial provimento à apelação do INSS, para determinar a compensação dos valores eventualmente pagos a título de auxílio por incapacidade temporária ou outro benefício cuja cumulação seja vedada por lei após a data de início do benefício concedido nesta ação, observados os honorários advocatícios, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA /APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE. PRELIMINAR REJEITADA. COMPENSAÇÃO DOS VALORES ADMINISTRATIVOS JÁ PAGOS. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. CONSECTÁRIOS.
- A teor do disposto no art. 485, V, do Código de Processo Civil, caracterizada a perempção, litispendência ou coisa julgada, o processo será extinto sem julgamento do mérito, independentemente de arguição da parte interessada, uma vez que a matéria em questão pode e deve ser conhecida de ofício pelo Juiz, em qualquer tempo e grau de jurisdição (§ 3º).
- In casu, o requerimento administrativo, diverso do pleiteado na ação precedente, bem como o agravamento do quadro clínico, tiveram a aptidão de inaugurar nova discussão judicial em relação ao mesmo benefício previdenciário, baseada em novo quadro fático de saúde, a contemplar a avaliação sobre a continuidade ou o agravamento da incapacidade laboral.
- Embora sejam idênticas as partes e os pedidos, a causa de pedir constante nos autos evidencia alteração na situação de fato, em razão da pretensão embasar-se em requerimento administrativo diverso do precedente e do agravamento do quadro clínico. Não configurada a coisa julgada.
- Determinada a compensação dos valores eventualmente pagos a título de auxílio por incapacidade temporária ou outro benefício cuja cumulação seja vedada por lei (art. 124 da Lei 8.213/1991 e art. 20, § 4º, da Lei 8.742/1993) após a data de início do benefício concedido nesta ação.
- Não configurada a prescrição quinquenal, pois não decorreram mais de 05 anos entre a data do requerimento administrativo e da propositura da presente ação.
- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015.
- Falta de interesse recursal do INSS no tocante ao pedido de isenção ao pagamento das custas processuais, pois a sentença já determinou tal isenção, nos moldes pleiteados pelo requerido.
- Preliminar rejeitada. Apelação do INSS não conhecida em parte e, na parte conhecida, provida em parte.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL