Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0000072-88.2021.4.03.6318
Relator(a)
Juiz Federal CLAUDIA MANTOVANI ARRUGA
Órgão Julgador
7ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
19/07/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 22/07/2022
Ementa
E M E N T A
DISPENSADA, NA FORMA DA LEI.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
7ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000072-88.2021.4.03.6318
RELATOR:19º Juiz Federal da 7ª TR SP
RECORRENTE: WESLEY KENNEDY DOS SANTOS
Advogados do(a) RECORRENTE: PAULO SERGIO DE OLIVEIRA SOUZA - SP321511-A,
PATRICIA PINATI DE AVILA - SP309886-N, LUAN GOMES - SP347019-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000072-88.2021.4.03.6318
RELATOR:19º Juiz Federal da 7ª TR SP
RECORRENTE: WESLEY KENNEDY DOS SANTOS
Advogados do(a) RECORRENTE: PAULO SERGIO DE OLIVEIRA SOUZA - SP321511-A,
PATRICIA PINATI DE AVILA - SP309886-N, LUAN GOMES - SP347019-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
DISPENSADO, NA FORMA DA LEI.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000072-88.2021.4.03.6318
RELATOR:19º Juiz Federal da 7ª TR SP
RECORRENTE: WESLEY KENNEDY DOS SANTOS
Advogados do(a) RECORRENTE: PAULO SERGIO DE OLIVEIRA SOUZA - SP321511-A,
PATRICIA PINATI DE AVILA - SP309886-N, LUAN GOMES - SP347019-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
VOTO-EMENTA
RECURSO DO INSS. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE NO PERÍODO DE INCAPACIDADE.
DEMORA NA IMPLEMENTAÇÃO DO BENEFÍCIO. NECESSIDADE DE SUBSISTÊNCIA DO
SEGURADO. POSSIBILIDADE DE RECEBIMENTO CONJUNTO DA RENDA DO TRABALHO
E DAS PARCELAS RETROATIVAS DO BENEFÍCIO ATÉ A EFETIVA IMPLANTAÇÃO. TEMA
1013 DO STJ. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE PERMANENTE. RENDA MENSAL INICIAL.
EC 103/2019. NÃO APLICÁVEL: FATO GERADOR ANTERIOR À VIGÊNCIA. CORREÇÃO E
JUROS NOS TERMOS DO ART. 1º-F, DA LEI Nº 9.494/97. DADO PARCIAL PROVIMENTO
AO RECURSO.
1. Trata-se de recurso interposto pelo INSS em face de sentença que julgou procedente o
pedido de concessão de benefício por incapacidade.
2. Pretende o INSS a reforma do julgado. Sustenta, preliminarmente: i - falta de interesse de
agir, por ausência de pedido de perícia presencial administrativa; ii – cerceamento de defesa,
tendo em vista a necessidade de diligências para comprovar como a parte autora laborou de
04/2016 a 08/2017 e de 02/2018 a 02/09/2019. No mérito, alega a constitucionalidade na forma
de cálculo prevista para os benefícios concedidos na vigência da EC 103/2019. Impugna os
juros e correção monetária. Por fim, impugna a multa e o prazo para cumprir a tutela
antecipada.
3. Não há que se falar em falta de interesse de agir, tendo em vista que comprovado o
requerimento administrativo do benefício, em 01/09/2020, indeferido pela Autarquia Federal
(arquivo 2, fls. 30/36).
4. Verifico que não houve cerceamento de defesa. Não se reconhece cerceamento de defesa
pelo indeferimento de provas que o julgador considera irrelevantes para a formação de sua
convicção racional sobre os fatos litigiosos, uma vez que cabe a ele decidir sobre a
necessidade ou não de sua realização, haja vista que ele é o destinatário da prova.
5. O simples fato de o segurado verter contribuições no período em que constatada a
incapacidade não obsta a concessão de benefício, nos termos da Súmula 72/TNU:
“É possível o recebimento de benefício por incapacidade durante período em que houve
exercício de atividade remunerada quando comprovado que o segurado estava incapaz para as
atividades habituais na época em que trabalhou.”
6. Quanto à possibilidade de recebimento de parcelas retroativas de benefício por incapacidade
até a sua implantação, ainda que o autor tenha trabalhado nesse período para prover o seu
sustento, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), nos Recursos Especiais RESP 1.786.590/SP e
RESP 1.788.700/SP, representativos de controvérsia (63/STJ), decidiu que:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ARTS.
1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015. TEMA REPETITIVO 1.013/STJ. BENEFÍCIO POR
INCAPACIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-DOENÇA. DEMORA NA
IMPLEMENTAÇÃO DO BENEFÍCIO. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE REMUNERADA PELO
SEGURADO. NECESSIDADE DE SUBSISTÊNCIA DO SEGURADO. FUNÇÃO SUBSTITUTIVA
DA RENDA NÃO CONSUBSTANCIADA. POSSIBILIDADE DE RECEBIMENTO CONJUNTO
DA RENDA DO TRABALHO E DAS PARCELAS RETROATIVAS DO BENEFÍCIO ATÉ A
EFETIVA IMPLANTAÇÃO. TESE REPETITIVA FIXADA.
IDENTIFICAÇÃO E DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA
1. O tema repetitivo ora controvertido consiste em definir a "possibilidade de recebimento de
benefício, por incapacidade, do Regime Geral de Previdência Social, de caráter substitutivo da
renda (auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez), concedido judicialmente em período de
abrangência concomitante àquele em que o segurado estava trabalhando e aguardava o
deferimento do benefício."
2. Os fatos constatados no presente Recurso Especial consistem cronologicamente em: a) o
segurado teve indeferido benefício por incapacidade (auxílio-doença ou aposentadoria por
invalidez) na via administrativa; b) para prover seu sustento, trabalhou após o indeferimento e
entrou com ação judicial para a concessão de benefício por incapacidade; c) a ação foi julgada
procedente para conceder o benefício desde o requerimento administrativo, o que acabou por
abranger o período de tempo em que o segurado trabalhou; e d) o debate, travado ainda na
fase ordinária, consiste no entendimento do INSS de que o benefício por incapacidade
concedido judicialmente não pode ser pago no período em que o segurado estava trabalhando,
ante seu caráter substitutivo da renda e à luz dos arts. 42, 46 e 59 da Lei 8.213/1991.
3. A presente controvérsia e, consequentemente, a tese repetitiva que for fixada não abrangem
as seguintes hipóteses:
3.1. O segurado está recebendo regularmente benefício por incapacidade e passa a exercer
atividade remunerada incompatível com sua incapacidade, em que não há o caráter da
necessidade de sobrevivência como elemento que justifique a cumulação, e a função
substitutiva da renda do segurado é implementada de forma eficaz. Outro aspecto que pode ser
analisado sob perspectiva diferente é o relativo à boa-fé do segurado. Há jurisprudência das
duas Turmas da Primeira Seção que analisa essa hipótese, tendo prevalecido a compreensão
de que há incompatibilidade no recebimento conjunto das verbas. A exemplo: AgInt no REsp
1.597.369/SC, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 13.4.2018; REsp
1.454.163/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 18.12.2015; e
REsp 1.554.318/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 2.9.2016.
3.2. O INSS alega o fato impeditivo do direito (o exercício de trabalho pelo segurado) somente
na fase de cumprimento da sentença, pois há elementos de natureza processual prejudiciais à
presente tese a serem considerados, notadamente a aplicabilidade da tese repetitiva fixada no
REsp 1.253.513/AL (Rel. Ministro Castro Meira, Primeira Seção, DJe de 20.8.2012).
RESOLUÇÃO DA TESE CONTROVERTIDA
4. Alguns benefícios previdenciários possuem a função substitutiva da renda auferida pelo
segurado em decorrência do seu trabalho, como mencionado nos arts. 2º, VI, e 33 da Lei
8.213/1991. Em algumas hipóteses, a substitutividade é abrandada, como no caso de ser
possível a volta ao trabalho após a aposentadoria por tempo de contribuição (art. 18, § 2º, da
Lei 8.213/1991). Em outras, a substitutividade resulta na incompatibilidade entre as duas
situações (benefício e atividade remunerada), como ocorre com os benefícios auxílio-doença
por incapacidade e aposentadoria por invalidez.
5. Desses casos de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, é pressuposto que a
incapacidade total para o trabalho seja temporária ou definitiva, respectivamente.
6. Como consequência, o Regime Geral de Previdência Social arca com os citados benefícios
por incapacidade para consubstanciar a função substitutiva da renda, de forma que o segurado
que não pode trabalhar proveja seu sustento.
7. A cobertura previdenciária, suportada pelo regime contributivo solidário, é o provimento do
sustento do segurado enquanto estiver incapaz para o trabalho.
8. É decorrência lógica da natureza dos benefícios por incapacidade, substitutivos da renda,
que a volta ao trabalho seja, em regra, causa automática de cessação desses benefícios, como
se infere do requisito da incapacidade total previsto nos arts. 42 e 59 da Lei 8.213/1991, com
ressalva ao auxílio-doença.
9. No caso de aposentadoria por invalidez, o art. 42 da Lei de Benefícios da Previdência Social
(LBPS) estabelece como requisito a incapacidade "para o exercício de atividade que lhe
garanta a subsistência", e, assim, a volta a qualquer atividade resulta no automático
cancelamento do benefício (art. 46).
10. Já o auxílio-doença estabelece como requisito (art. 59) que o segurado esteja "incapacitado
para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual". Desse modo, a função substitutiva do
auxílio-doença é restrita às duas hipóteses, fora das quais o segurado poderá trabalhar em
atividade não limitada por sua incapacidade.
11. Alinhada a essa compreensão, já implícita desde a redação original da Lei 8.213/1991, a Lei
13.135/2015 incluiu os §§ 6º e 7º no art. 60 daquela, com a seguinte redação (grifos
acrescentados): "§ 6º O segurado que durante o gozo do auxílio-doença vier a exercer atividade
que lhe garanta subsistência poderá ter o benefício cancelado a partir do retorno à atividade. §
7º Na hipótese do § 6º, caso o segurado, durante o gozo do auxílio-doença, venha a exercer
atividade diversa daquela que gerou o benefício, deverá ser verificada a incapacidade para
cada uma das atividades exercidas."
12. Apresentado esse panorama legal sobre o tema, importa estabelecer o ponto diferencial
entre a hipótese fática dos autos e aquela tratada na lei: aqui o segurado requereu o benefício,
que lhe foi indeferido, e acabou trabalhando enquanto não obteve seu direito na via judicial; já a
lei trata da situação em que o benefício é concedido, e o segurado volta a trabalhar.
13. A presente controvérsia cuida de caso, portanto, em que falhou a função substitutiva da
renda, base da cobertura previdenciária dos benefícios auxílio-doença e aposentadoria por
invalidez.
14. O provimento do sustento do segurado não se materializou, no exato momento da
incapacidade, por falha administrativa do INSS, que indeferiu incorretamente o benefício, sendo
inexigível do segurado que aguarde a efetivação da tutela jurisdicional sem que busque, pelo
trabalho, o suprimento da sua subsistência.
15. Por culpa do INSS, resultado do equivocado indeferimento do benefício, o segurado teve de
trabalhar, incapacitado, para o provimento de suas necessidades básicas, o que doutrinária e
jurisprudencialmente convencionou-se chamar de sobre-esforço. Assim, a remuneração por
esse trabalho tem resultado inafastável da justa contraprestação pecuniária.
16. Na hipótese, o princípio da vedação do enriquecimento sem causa atua contra a autarquia
previdenciária, pois, por culpa sua – indeferimento equivocado do benefício por incapacidade –,
o segurado foi privado da efetivação da função substitutiva da renda laboral, objeto da cobertura
previdenciária, inerente aos mencionados benefícios.
17. Como tempero do elemento volitivo do segurado, constata-se objetivamente que, ao
trabalhar enquanto espera a concessão de benefício por incapacidade, está ele atuando de
boa-fé, cláusula geral hodiernamente fortalecida na regência das relações de direito.
18. Assim, enquanto a função substitutiva da renda do trabalho não for materializada pelo
efetivo pagamento do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez, é legítimo que o
segurado exerça atividade remunerada para sua subsistência, independentemente do exame
da compatibilidade dessa atividade com a incapacidade laboral.
19. No mesmo sentido do entendimento aqui defendido: AgInt no AREsp 1.415.347/SP, Rel.
Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, Je de 28.10.2019; REsp 1.745.633/PR, Rel.
Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 18.3.2019; AgInt no REsp 1.669.033/SP,
Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe de 30.8.2018; REsp
1.573.146/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe de 13.11.2017;
AgInt no AgInt no AREsp 1.170.040/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe de
10.10.2018; AgInt no REsp 1.620.697/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma,
DJe de 2.8.2018; AgInt no AREsp 1.393.909/SP, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma,
DJe de 6.6.2019; e REsp 1.724.369/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe
de 25.5.2018.
FIXAÇÃO DA TESE REPETITIVA
20. O Tema Repetitivo 1.013/STJ é assim resolvido: "No período entre o indeferimento
administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez,
mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas
do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo
benefício previdenciário pago retroativamente."
RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO
21. Ao Recurso Especial deve-se negar provimento, pois o Tribunal de origem julgou o presente
caso no mesmo sentido do entendimento aqui proposto (fl. 142-143/e-STJ): "A permanência do
segurado no exercício das atividades laborativas decorre da necessidade de prover sua
subsistência enquanto a administração ou o Judiciário não reconheça sua incapacidade, não
obstando a concessão do benefício vindicado durante a incapacidade."
22. Consubstanciado o que previsto no Enunciado Administrativo 7/STJ, o recorrente é
condenado ao pagamento de honorários advocatícios de 10% (dez por cento) sobre o valor total
da verba sucumbencial fixada nas instâncias ordinárias, com base no § 11 do art. 85 do
CPC/2015.
CONCLUSÃO
23. Recurso Especial não provido, sob o rito dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015.
(Recurso Especial nº 1.786.590/SP, Relator MINISTRO HERMAN BENJAMIN, julgado em
24/06/2020, destaques no original) (grifos nossos)
7. Assim, conforme posicionamento atual do STJ, o segurado do RGPS tem direito ao
recebimento da renda do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade
laboral, e do benefício previdenciário pago retroativamente, desde que: (i) tenha sido indeferido
o pedido de benefício por incapacidade na seara administrativa; e que (ii) decisão judicial
conceda o benefício desde o requerimento administrativo, ainda que acabe por abranger
período de tempo em que o segurado trabalhou.
A perícia médica realizada no presente feito conclui pela existência da incapacidade a partir de
03/2016.
Assim, ainda que o autor tenha trabalhado no período 04/2016 a 08/2017 e de 02/2018 a
02/09/2019, faz jus à concessão do benefício nesse período, conforme tese fixada pelo STJ
(tema 1013). Sem afastar a data do início da incapacidade, pelos motivos expostos.
8. No mérito, a concessão do benefício pretendido está condicionada ao preenchimento de três
requisitos: o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais (artigo 25, inc. I,
da Lei nº 8.213/91), a qualidade de segurado quando do surgimento da incapacidade e a
incapacidade total e permanente para o desempenho de qualquer atividade laboral no caso de
aposentadoria por invalidez e total e temporária para o desempenho de sua atividade habitual,
tratando-se de auxílio-doença.
9. A perita atestou que o autor, 39 anos, cortador de sapatos, apresenta a síndrome de Leber,
ou atrofia óptica hereditária de Lebe e incapacidade total e permanente. A data de início da
incapacidade (DII) foi fixada em 10/03/2016, conforme documentos anexados ao processo. No
laudo foi bem detalhada a manifestação/limitação do quadro (arquivo 18):
“DISCUSSÃO:
A síndrome de Leber, ou atrofia óptica hereditária de Leber, é uma doença mitocondrial de
transmissão materna com uma prevalência que varia entre 1:8500 e 1:50000. O principal
sintoma clínico é a perda da visão, bilateral e indolor, aguda ou subaguda, que ocorre
geralmente entre a adolescência e a idade adulta, afetando quatro vezes mais os homens do
que as mulheres. Após a perda de visão ocorre a atrofia dos discos ópticos e escotoma
cecocentral. Não há tratamento para essa patologia no momento.
Consta nos autos cópia do cartão do HCRP com hipótese diagnóstica de Síndrome de Leber.
Consta também relatório do Dr. André Meirelles de 10/03/2016 no qual o autor já apresentava
baixa visão nos dois olhos (0,1 em ambos os olhos).
O conceito de incapacidade leva em conta a doença e a profissão. Av isão de 0,1 incapacita
para atividade habitual de cortador. Por se tratar de doença genética, sem tratamento
disponível, não há possibilidade de melhora. O autor está, portanto, total e permanentemente
incapacitado para o trabalho.
CONCLUSÃO:
O autor apresenta baixa visão nos dois olhos irreversível devido a neuropatia ótica hereditária
de Leber. Está total e permanentemente incapacitado para o trabalho.
(...).
8. É possível determinar a data de início da incapacidade? Informar ao juízo os critérios
utilizados para a fixação desta data, esclarecendo quais exames foram apresentados pelo autor
quando examinado e em quais exames baseou-se para concluir pela incapacidade e as razões
pelas quais agiu assim.
Resp: Está incapaz desde 10/03/2016 pois tem laudo nos autos dessa data em que consta
visão de 0,1 nos dois olhos, que é a mesma visão informada no exame pericial. Essa visão
incapacita para o trabalho. Não tem documentos com datas anteriores a essa para avaliar a
condição anterior do autor.
9.Constatada incapacidade, esta impede totalmente ou parcialmente o periciando de praticar
sua atividade habitual?
Resp: Impede totalmente”.
10. Não há razões para afastar as conclusões da perita, pois foram fundamentadas nos exames
clínicos realizados na parte autora e documentos médicos constantes nos autos.
Correta, portanto, a fixação da data de início do benefício (DIB) na data de entrada do
requerimento (DER), pois a DII (03/2016) é anterior ao pedido administrativo (09/2020).
11. Superadas essas questões, passo a apreciar a fórmula de cálculo da RMI, juros e correção
monetária fixadas na sentença.
12. No caso concreto, a incapacidade foi fixada em 03/2016, quando o autor ostentava
qualidade de segurado, pois conforme o CNIS consta vínculo empregatício de 02/03/2015 a
17/05/2015 e posterior retorno em 22/04/2016 (arquivo 14, fl. 10).
Ademais, a cegueira dispensa carência, nos termos do artigo 26, inciso II e 151 da Lei nº
8213/1991.
13. O cerne da questão gravita em torno da renda mensal inicial do benefício por incapacidade
permanente, com data inicial após a entrada em vigor da EC 103/2019.
14. Com efeito, não se aplicam ao caso concreto as regras da reforma da previdência da EC
103/2019, porquanto o fato gerador do benefício em questão (incapacidade) ter ocorrido antes
da sua vigência, observado o princípio “tempos regit actum”.
15. Considerando que a EC n° 103/2019 entrou em vigor na data da sua publicação, em
13/11/2019, não deve ser aplicada ao caso concreto, tendo em vista que o termo inicial da
incapacidade é anterior a sua vigência. Desta feita, não se deve considerar a data da DER e
sim da DII.
16. Cabe salientar que é firme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que
não há direito adquirido a regime jurídico. É resguardado tão só o direito subjetivo incorporado
pelo titular em razão do implemento dos requisitos previstos na lei anterior e cujo exercício
permanece garantido em face da lei nova, o que é o caso dos autos.
17. Desta feita, sem adentrar a constitucionalidade da EC 103/2019, deve ser aplicada as
regras anteriores à sua vigência, tendo em vista os implementos para concessão do benefício
do autor, ainda que requerido posteriormente.
18. Quanto ao cálculo dos valores atrasados, apesar da declaração de inconstitucionalidade
parcial do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/2009, por
arrastamento, pelo Supremo Tribunal Federal, na ADI nº 4.357/DF que cuida da arguição de
inconstitucionalidade de disposições introduzidas no art. 100 da Constituição Federal pela
Emenda Constitucional nº 62/2009, bem como da modulação já feita no julgamento da questão
de ordem na ADI nº 4425/DF, em 25/03/2015, recentes julgados proferidos por Ministros do
STF em Reclamações, têm firmado o entendimento de que este dispositivo legal não foi
declarado inconstitucional pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal para hipóteses que não
sejam a de expedição de precatórios e que a aplicação da Lei é obrigatória. A questão
constitucional ainda pende de julgamento na repercussão geral reconhecida nos autos do RE nº
870.947/SE.
Esta relatora vinha, nos termos do decidido pela TNU no julgamento do processo nº 0014948-
62.2012.4.01.3200, entendendo pela aplicação das disposições contidas no Manual de Cálculos
do Conselho da Justiça Federal (Resolução nº 267/2013). Todavia, conforme decisões
proferidas pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal, nos autos das Reclamações nºs
20.887/DF (Carmen Lúcia, 25/5/2015), 17.673/DF (Rosa Weber, 19/5/2016), 17.783/DF (Edson
Fachin, 05/05/2016), 19.050/RS (Roberto Barroso, 29/06/2015) e 18.910 (Teori Zavascki,
10.12.2015) e, até que o STF conclua o julgamento da repercussão geral, no RE nº
870.947/SE, passo a adotar o entendimento no sentido de que a correção monetária e os juros
da mora quando devidos até a expedição da requisição de pagamento devem seguir o previsto
no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, na redação da Lei nº 11.960/2009. A incidência deste dispositivo
foi afastada pelo STF apenas após a expedição do precatório e do requisitório de pequeno
valor, para pagamentos realizados a partir de 26/03/2015.
Assim, até 29/06/2009, o cálculo dos valores atrasados será efetuado nos termos da Res. nº
267/2013, do CJF e a partir de 30/06/2009, conforme o art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, acrescido
pela Lei nº 11.960/2009.
19. Quanto à multa diária imposta em caso de descumprimento da decisão que concedeu a
tutela de urgência, há previsão legal para sua aplicação no Código de Processo Civil/2015:
Art. 536. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou
de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica
ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias
à satisfação do exequente.
§ 1o Para atender ao disposto no caput, o juiz poderá determinar, entre outras medidas, a
imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de
obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de
força policial.
§ 2o O mandado de busca e apreensão de pessoas e coisas será cumprido por 2 (dois) oficiais
de justiça, observando-se o disposto no HYPERLINK
"http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm#art846§1"art. 846, §§
1o a 4o, se houver necessidade de arrombamento.
§ 3o O executado incidirá nas penas de litigância de má-fé quando injustificadamente
descumprir a ordem judicial, sem prejuízo de sua responsabilização por crime de
desobediência.
§ 4o No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de
não fazer, aplica-se o HYPERLINK "http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-
2018/2015/Lei/L13105.htm#art525"art. 525, no que couber.
§ 5o O disposto neste artigo aplica-se, no que couber, ao cumprimento de sentença que
reconheça deveres de fazer e de não fazer de natureza não obrigacional.
Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de
conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja
suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento
do preceito.
§ 1o O juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa
vincenda ou excluí-la, caso verifique que:
I - se tornou insuficiente ou excessiva;
II - o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para
o descumprimento.
§ 2o O valor da multa será devido ao exequente.
§ 3o A decisão que fixa a multa é passível de cumprimento provisório, devendo ser depositada
em juízo, permitido o levantamento do valor após o trânsito em julgado da sentença favorável à
parte ou na pendência do agravo fundado nos HYPERLINK
"http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm#art1042ii"incisos II
ou III do art. 1.042.
§ 3º A decisão que fixa a multa é passível de cumprimento provisório, devendo ser depositada
em juízo, permitido o levantamento do valor após o trânsito em julgado da sentença favorável à
parte. HYPERLINK "http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-
2018/2016/Lei/L13256.htm#art2"(Redação dada pela Lei nº 13.256, de 2016) HYPERLINK
"http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Lei/L13256.htm#art4"(Vigência)
§ 4o A multa será devida desde o dia em que se configurar o descumprimento da decisão e
incidirá enquanto não for cumprida a decisão que a tiver cominado.
§ 5o O disposto neste artigo aplica-se, no que couber, ao cumprimento de sentença que
reconheça deveres de fazer e de não fazer de natureza não obrigacional.
20. Todavia, a multa aplicada no valor de R$ 1.000,00 por dia de atraso, em caso de
descumprimento da decisão, parece-me exorbitante e incompatível com a obrigação imposta.
21. Outrossim, o prazo concedido na sentença, de 15 (quinze) dias, não se encontra em
consonância com o estatuído no § 5º, do art. 41-A da Lei nº 8.213/91, que assim dispõe:
“Art. 41-A – (...)
§ 5o O primeiro pagamento do benefício será efetuado até quarenta e cinco dias após a data da
apresentação, pelo segurado, da documentação necessária a sua concessão”.
Ressalto que, muito embora o INSS já tenha implantado o benefício, permanece o interesse
recursal quanto ao prazo, porquanto o mesmo irá refletir no valor total da multa, caso o referido
prazo tenha sido extrapolado.
22. Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso do INSS para fixar o cálculo dos valores
atrasados, nos termos da Res. nº 267/2013, do C.J.F. até 29/06/2009 e a partir de 30/06/2009,
conforme o art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, acrescido pela Lei nº 11.960/2009, bem como
estender o prazo de implantação do benefício previdenciário para 45 (quarenta e cinco) dias,
bem como reduzir o valor da multa diária para R$ 100,00 (cem reais). Sentença parcialmente
reformada.
23. Sem condenação ao pagamento de honorários advocatícios, nos termos do art. 55 da Lei nº
9.099/95.10. É o voto.
24. Sem prejuízo, concedo a parte autora os Benefícios da Justiça Gratuita.
25. É o voto.
E M E N T A
DISPENSADA, NA FORMA DA LEI. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, deu parcial provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
