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PREVIDENCIÁRIO E CIVIL. COBRANÇA DE VALORES ATRASADOS CORRESPONDENTES À BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO SUSPENSO PELO INSS. SEGURADO FALECIDO ABSOLUTAMENTE INCAP...

Data da publicação: 17/07/2020, 12:35:52

PREVIDENCIÁRIO E CIVIL. COBRANÇA DE VALORES ATRASADOS CORRESPONDENTES À BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO SUSPENSO PELO INSS. SEGURADO FALECIDO ABSOLUTAMENTE INCAPAZ. AÇÃO DE INTERDIÇÃO. INCAPACIDADE ANTERIOR. SENTENÇA DECLARATIVA. FATO IMPEDITIVO DA CONTAGEM DO PRAZO DE PRESCRIÇÃO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL AFASTADA. BENEFÍCIO DEVIDO DESDE A DATA DE SUA SUSPENSÃO. 1. O Código Civil/2002 (CC/2002), em seu art. 198, I, dispõe não correr prazo de prescrição contra os absolutamente incapazes do exercício dos atos da vida civil. Tal dispositivo, claramente, visa à proteção dos direitos daqueles classificados pelo ordenamento jurídico como inaptos para manifestação de vontade livre, informada e consciente. 2. Em seu art. 1773, antes da alteração promovida pela Lei nº 13.105/2015, o CC/2002 firmou que a sentença que declara a interdição produz efeitos desde logo, embora sujeita a recurso. Nesse contexto, a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça, interpretando o artigo supracitado, assentou a natureza constitutiva da sentença de interdição, motivo por que a produção dos seus efeitos não alcançam atos pretéritos a sua prolação 3. Entretanto, a suspensão do prazo prescricional, para as pessoas absolutamente incapazes, ocorre no momento em que se constata a incapacidade, sendo a sentença de interdição, para o fim em apreço, meramente declaratória. 4. Apesar de a sentença de interdição do filho da requerente ter sido posterior à data do início do prazo prescricional, firmado quando o ex-segurado deixou de retirar os valores depositados a título de aposentadoria por invalidez de sua conta bancária, seguramente a sua incapacidade absoluta para o exercício pessoal dos atos da vida civil se deu em data pretérita. 5. Destarte, a parte autora faz jus aos valores devidos ao seu falecido filho (Adauto dos Santos Silva), a título de aposentadoria por invalidez, entre 11.08.1992 a 26.03.2004. 6. Apelação provida. Fixados, de ofício, os consectários legais. (TRF 3ª Região, DÉCIMA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2079739 - 0005883-64.2013.4.03.6106, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NELSON PORFIRIO, julgado em 26/02/2019, e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/03/2019 )


Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 11/03/2019
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0005883-64.2013.4.03.6106/SP
2013.61.06.005883-0/SP
RELATOR:Desembargador Federal NELSON PORFIRIO
APELANTE:IVONE DOS SANTOS INACIO SILVA (= ou > de 65 anos)
ADVOGADO:SP144561 ANA PAULA CORREA LOPES ALCANTRA e outro(a)
APELADO(A):Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
PROCURADOR:SP228284 LUIS PAULO SUZIGAN MANO e outro(a)
ADVOGADO:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
No. ORIG.:00058836420134036106 1 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO E CIVIL. COBRANÇA DE VALORES ATRASADOS CORRESPONDENTES À BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO SUSPENSO PELO INSS. SEGURADO FALECIDO ABSOLUTAMENTE INCAPAZ. AÇÃO DE INTERDIÇÃO. INCAPACIDADE ANTERIOR. SENTENÇA DECLARATIVA. FATO IMPEDITIVO DA CONTAGEM DO PRAZO DE PRESCRIÇÃO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL AFASTADA. BENEFÍCIO DEVIDO DESDE A DATA DE SUA SUSPENSÃO.
1. O Código Civil/2002 (CC/2002), em seu art. 198, I, dispõe não correr prazo de prescrição contra os absolutamente incapazes do exercício dos atos da vida civil. Tal dispositivo, claramente, visa à proteção dos direitos daqueles classificados pelo ordenamento jurídico como inaptos para manifestação de vontade livre, informada e consciente.
2. Em seu art. 1773, antes da alteração promovida pela Lei nº 13.105/2015, o CC/2002 firmou que a sentença que declara a interdição produz efeitos desde logo, embora sujeita a recurso. Nesse contexto, a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça, interpretando o artigo supracitado, assentou a natureza constitutiva da sentença de interdição, motivo por que a produção dos seus efeitos não alcançam atos pretéritos a sua prolação
3. Entretanto, a suspensão do prazo prescricional, para as pessoas absolutamente incapazes, ocorre no momento em que se constata a incapacidade, sendo a sentença de interdição, para o fim em apreço, meramente declaratória.
4. Apesar de a sentença de interdição do filho da requerente ter sido posterior à data do início do prazo prescricional, firmado quando o ex-segurado deixou de retirar os valores depositados a título de aposentadoria por invalidez de sua conta bancária, seguramente a sua incapacidade absoluta para o exercício pessoal dos atos da vida civil se deu em data pretérita.
5. Destarte, a parte autora faz jus aos valores devidos ao seu falecido filho (Adauto dos Santos Silva), a título de aposentadoria por invalidez, entre 11.08.1992 a 26.03.2004.
6. Apelação provida. Fixados, de ofício, os consectários legais.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, e fixar, de ofício, os consectários legais, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 26 de fevereiro de 2019.
NELSON PORFIRIO
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR:10081
Nº de Série do Certificado: 11DE180529616199
Data e Hora: 26/02/2019 17:11:02



APELAÇÃO CÍVEL Nº 0005883-64.2013.4.03.6106/SP
2013.61.06.005883-0/SP
RELATOR:Desembargador Federal NELSON PORFIRIO
APELANTE:IVONE DOS SANTOS INACIO SILVA (= ou > de 65 anos)
ADVOGADO:SP144561 ANA PAULA CORREA LOPES ALCANTRA e outro(a)
APELADO(A):Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
PROCURADOR:SP228284 LUIS PAULO SUZIGAN MANO e outro(a)
ADVOGADO:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
No. ORIG.:00058836420134036106 1 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

RELATÓRIO

O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação ordinária formulada por Ivone dos Santos Inacio Silva em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, na qual objetiva o recebimento de valores devidos ao seu falecido filho, Adauto dos Santos Silva - beneficiário de aposentadoria por invalidez -, entre 11.08.1992 a 26.03.2004.

Procuração e documentos juntados às fls. 05/27.

Contestação do INSS às fls. 33/36, na qual sustenta, em sede preliminar, a ilegitimidade da autora. Argumenta que, por pender procedimento de inventário, caberia ao espólio do falecido figurar no polo ativo da demanda. No mérito, sustenta estarem prescritas as parcelas cobradas pela requerente.

Cópias do processo administrativo anexadas às fls. 67/85, 100/249 e 252/254.

Houve réplica (fls. 88/90).

O Ministério Público Federal opinou pela desnecessidade de sua intervenção no feito (fls. 92/93).

Foram encartados aos autos cópias do processo de interdição do falecido filho da parte autora (fls. 259/311).

As partes apresentaram alegações finais às fls. 313/313v e 316.

Sentença às fls. 317/318v, pela improcedência do pedido.

Apelação da parte autora às fls. 323/325, em que alega a não ocorrência de prescrição, em vista da incapacidade absoluta do seu falecido filho, razão por que lhe é devido a totalidade dos valores, desde a data da suspensão do benefício até o seu restabelecimento.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte (fls. 330/333).

É o relatório.

VOTO

O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende a parte autora, nascida em 02.06.1940, o recebimento de valores originariamente devidos ao seu falecido filho (Sr. Adauto dos Santos Silva), beneficiário de aposentadoria por invalidez, durante o período de 11.08.1992 a 26.03.2004, cujo pagamento foi suspenso pela autarquia previdenciária após a não retirada dos proventos por diversos meses.

O INSS, por sua vez, opõe-se ao pedido argumentando estarem prescritas as parcelas eventualmente devidas. Aduz que a interdição judicial do ex-segurado se deu apenas em 09.03.2010, não sendo possível afirmar a existência de incapacidade absoluta em período pretérito. Dessa forma, entende serem devidos, apenas, os valores referentes aos últimos 5 (cinco) anos a partir da data do requerimento para o restabelecimento do benefício previdenciário.

Ao analisar detidamente os autos, depreende-se que o Sr. Adauto dos Santos Silva, filho da parte autora, após se desligar da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT, para a qual prestou serviços, no município de Rio Verde - GO, entre os anos de 15.08.1978 a 23.09.1983, requereu auxílio-doença, concedido em 09.10.1983 (fls. 67/75). O benefício, entretanto, foi cessado em 07.10.1985, após perícia realizada na cidade de Goiânia - GO, em que se apurou a sua capacidade para o trabalho (fl. 76). Após recurso em sede administrativa, decidiu-se pela prorrogação do benefício previdenciário e, após nova perícia médica, sendo verificada a incapacidade total e permanente para atividades laborativas, decorrente de problemas neurológicos e psiquiátricos, foi concedida ao autor a aposentadoria por invalidez (D.I.B. 01.02.1986; fls. 77/85).

Ocorre que em 01.12.1989, segundo relatou a parte autora ao INSS (fl. 130), o Sr. Adauto dos Santos Silva deixou a sua cidade de origem em direção à São Paulo. Neste momento, houve o total rompimento dos vínculos familiares, não se tendo, desde então, quaisquer notícias do ex-segurado. Após, aproximadamente, 20 (vinte) anos, um cidadão da cidade de São Paulo, identificado como Cesar Pescuma Carlos, entrou em contato com a Prefeitura Municipal de São Simão (20.09.2008; fl. 10), relatando o seguinte:

"Sou morador em São Paulo e próximo do meu trabalho há um morador de rua que se diz perdido em SP. Percebe-se que esse cidadão teve um lapso de memória e se perdeu, mas hoje consegue lembrar do nome e de seus familiares. Todos são de São Simão. O nome dele é Adal[u]to dos Santos Silva e este dá como endereço residencial a Rua 13, casa nº 5, Setor do Imprégio. Solicito a gentileza de entrar em contato para que possamos ajudar essa pessoa a retornar para a sua casa e família. Aguardo retorno. Grato Cesar.".

Após tomar conhecimento do fato, a parte autora viabilizou a transferência do seu filho para a cidade natal, a fim de que pudesse ser realizado o devido tratamento.

Em razão da falta de saques dos proventos da aposentadoria por invalidez, esta foi suspensa em 11.08.1992, vindo a ser reativada apenas em 27.03.2009, após parecer médico (fls. 160/162), quando a genitora do segurado se apresentou à Agência da Previdência Social de São Simão - GO (fls. 130/131) para prestar esclarecimentos.

Ressalta-se que a avaliação médica, realizada em 18.08.2009, diagnosticou o filho da requerente com bipolaridade e esquizofrenia (código F.20). Importante consignar que o filho do Sr. Adauto, Welliton Luis dos Santos Silva, recebeu benefício assistencial destinado à pessoa com deficiência (fl. 63), falecendo em 31.01.2000, aos 19 (dezenove) anos de idade, sendo a causa de sua morte apontada como "morte súbita, epilepsia" (fl. 24). Destaca-se, ainda, que a ex-esposa do segurado, mãe de Welliton, a Sra. Helena Marta dos Santos, faleceu em 09.02.2009, aos 45 (quarenta cinco) anos, em razão de "infarto agudo do miocárdio" (fl. 227).

No interregno entre o restabelecimento do benefício previdenciário e o seu requerimento, a parte autora ingressou com processo de interdição do seu filho, vindo a ser nomeada sua curadora (fls. 12/21 e 176/177).

O filho da requerente, pouco tempo depois do início do processo de interdição (03.09.2009; fl. 15), aos 52 (cinquenta e dois) anos de idade, veio a falecer, vítima de "septicemia, broncopneumonia, diabetes mellitus, hipertensão arterial" (10.02.2010; fl. 23).

Ao fim do processo administrativo instaurado junto ao INSS (fls. 208/249 e 252/254), foi reconhecido ao filho da autora o direito sobre valores referentes às parcelas de 27.03.2004 a 10.02.2010, em virtude de ser aplicada a prescrição quinquenal, tendo como origem a data do pedido de reativação do benefício previdenciário (27.03.2009).

Como única herdeira do seu filho, busca a parte autora o recebimento dos valores relativos à aposentadoria por invalidez que entende lhe sejam devidos, de 11.08.1992 (início da suspensão) até 26.03.2004, argumentando não correr prazo prescricional contra o absolutamente incapaz.

Desse modo, a controvérsia instaurada nos autos delimita-se a decidir se a sentença proferida no processo de interdição do filho da autora possui natureza declaratória ou constitutiva, ou melhor, se no momento em que o ex-segurado deixou de receber o seu benefício previdenciário, ficando desaparecido por cerca de 20 (vinte) anos, já era possível constatar a sua incapacidade civil absoluta. No caso do não reconhecimento da incapacidade absoluta desde o seu desaparecimento, afirma-se que esta surgiu apenas a partir da decisão judicial, sendo de rigor a aplicação da prescrição quinquenal em relação aos valores que lhe são devidos a título de benefício de aposentadoria por invalidez. Por sua vez, entendendo pela natureza declaratória da sentença, assenta-se que a incapacidade total para os atos da vida civil são pretéritos, portanto, não correndo a prescrição durante o seu desaparecimento.

Inicialmente, cumpre apontar, ainda que de forma genérica, alguns traços do transtorno mental atribuído ao filho da requerente.

Sobre os aspectos gerais da esquizofrenia, Ana Paula Wenerck de Castro, em Tese de Doutorado apresentada à Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo ("Uso de antipsicóticos e prevenção de re-hospitalização em pacientes com esquizofrenia", p. 10), aponta que:

"A esquizofrenia é um transtorno mental relativamente frequente e, talvez, o mais grave transtorno psiquiátrico. Revisões sistemáticas mostram que apesar da incidência da esquizofrenia ser relativamente baixa - 15,2 em cada 100.000 pessoas -, a prevalência de esquizofrenia é relativamente alta - 7,2 em cada 1.000 pessoas - por ser um transtorno que, tipicamente, começa cedo na idade adulta ou tardiamente na adolescência e se torna crônico (McGrath et al.2004).".

Em relação, especificamente, à fase da vida na qual o transtorno comumente se manifesta, o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, produzido pela American Psychiatric Association, em sua quinta edição (DSM-5), afirma:

"As características psicóticas da esquizofrenia costumam surgir entre o fim da adolescência e meados dos 30 anos; início antes da adolescência é raro. A idade de pico do início do primeiro episódio psicótico é entre o início e a metade da faixa dos 20 anos para o sexo masculino e fim dos 20 anos para o feminino. O início pode ser abrupto ou insidioso, mas a maioria dos indivíduos manifesta um desenvolvimento lento e gradativo de uma variedade de sinais e sintomas clinicamente importantes. Metade dessas pessoas queixa-se de sintomas depressivos. Idade mais precoce de início é tradicionalmente vista como preditor de pior prognóstico. O efeito da idade de início do transtorno, todavia, possivelmente tem relação com o gênero, com os indivíduos do sexo masculino apresentando adaptação pré-mórbida pior, rendimento escolar mais baixo, sintomas negativos e prejuízo cognitivo mais proeminentes, além de, em geral, terem um prognóstico pior. Prejuízo cognitivo é comum, e alterações na cognição estão presentes durante o desenvolvimento, antecedendo o aparecimento de psicose e assumindo a forma de prejuízos cognitivos estáveis na vida adulta. Prejuízos cognitivos podem persistir quando outros sintomas estão em remissão, contribuindo para a incapacidade relacionada à doença."

O Código Civil/2002 (CC/2002), em seu art. 198, I, dispõe não correr prazo de prescrição contra os absolutamente incapazes do exercício dos atos da vida civil. Tal dispositivo, claramente, visa à proteção dos direitos daqueles classificados pelo ordenamento jurídico como inaptos para manifestação de vontade livre, informada e consciente.

Não se olvida que a Lei nº 13.146/2015 ("Estatuto da Pessoa com Deficiência") promoveu importantes alterações no Código Civil brasileiro, tais como a retirada das pessoas com deficiência do rol dos incapazes para o exercício pessoal dos atos civis.

Entretanto, de acordo com a legislação de vigência à época dos fatos discutidos nos autos, ainda constam como absolutamente incapazes "os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática dos atos da civil".

Assim, pode-se concluir que os prazos de prescrição não corriam contra os absolutamente incapazes que, por deficiência mental, não tivessem o necessário discernimento para a realização pessoal dos atos da vida civil.

Por sua vez, ao tratar do instituto da curatela, o CC/2002, em sua redação original, elencou como sujeitos de interdição, no art. 1767, I, II, III e IV:

"I - aqueles que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para os atos da vida civil;
II - aqueles que, por outra causa duradoura, não puderem exprimir a sua vontade;
III - os deficientes mentais, os ébrios habituais e os viciados em tóxicos;
IV - os excepcionais sem completo desenvolvimento mental [...]"

Em seu art. 1773, antes da alteração promovida pela Lei nº 13.105/2015, o CC/2002 firmou que a sentença que declara a interdição produz efeitos desde logo, embora sujeita a recurso.

Nesse contexto, a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça, interpretando o artigo supracitado, assentou a natureza constitutiva da sentença de interdição, motivo por que a produção dos seus efeitos não alcançam atos pretéritos a sua prolação:

"RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INTERDIÇÃO. EFEITOS DA SENTENÇA DE INTERDIÇÃO SOBRE AS PROCURAÇÕES OUTORGADAS PELO INTERDITANDO A SEUS ADVOGADOS NO PRÓPRIO PROCESSO. NEGATIVA DE SEGUIMENTO À APELAÇÃO APRESENTADA PELOS ADVOGADOS CONSTITUÍDOS PELO INTERDITANDO. NÃO OCORRÊNCIA DA EXTINÇÃO DO MANDATO. A SENTENÇA DE INTERDIÇÃO POSSUI NATUREZA CONSTITUTIVA. EFEITOS EX NUNC. INAPLICABILIDADE DO DISPOSTO NO ART. 682, II, DO CC AO MANDATO CONCEDIDO PARA DEFESA JUDICIAL NA PRÓPRIA AÇÃO DE INTERDIÇÃO. NECESSIDADE DE SE GARANTIR O DIREITO DE DEFESA DO INTERDITANDO. RENÚNCIA AO DIREITO DE RECORRER APRESENTADA PELO INTERDITANDO. ATO PROCESSUAL QUE EXIGE CAPACIDADE POSTULATÓRIA. NEGÓCIO JURÍDICO REALIZADO APÓS A SENTENÇA DE INTERDIÇÃO. NULIDADE. ATOS PROCESSUAIS REALIZADOS ANTES DA NEGATIVA DE SEGUIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO. PRECLUSÃO.
1. A sentença de interdição tem natureza constitutiva, pois não se limita a declarar uma incapacidade preexistente, mas também a constituir uma nova situação jurídica de sujeição do interdito à curatela, com efeitos ex nunc.
2. Outorga de poderes aos advogados subscritores do recurso de apelação que permanece hígida, enquanto não for objeto de ação específica na qual fique cabalmente demonstrada sua nulidade pela incapacidade do mandante à época da realização do negócio jurídico de outorga do mandato.
3. Interdição do mandante que acarreta automaticamente a extinção do mandato, inclusive o judicial, nos termos do art. 682, II, do CC.
4. Inaplicabilidade do referido dispositivo legal ao mandato outorgado pelo interditando para atuação de seus advogados na ação de interdição, sob pena de cerceamento de seu direito de defesa no processo de interdição.
5. A renúncia ao direito de recorrer configura ato processual que exige capacidade postulatória, devendo ser praticado por advogado.
6. Nulidade do negócio jurídico realizado pelo interdito após a sentença de interdição.
7. Preclusão da matéria relativa aos atos processuais realizados antes da negativa de seguimento ao recurso de apelação.
8. Doutrina e jurisprudência acerca do tema.
9. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO." (REsp 1251728/PE, Terceira Turma, Relator Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data do Julgamento: 14/05/2013, DJe: 23/05/2013).

Entretanto, a suspensão do prazo prescricional, para as pessoas absolutamente incapazes, ocorre no momento em que se constata a incapacidade, sendo a sentença de interdição, para o fim em apreço, meramente declaratória:

"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. PENSÃO POR MORTE. ABSOLUTAMENTE INCAPAZ. INTERDITADO. SUSPENSÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO: DATA DO ÓBITO DO INSTITUIDOR DA PENSÃO. SENTENÇA DE INTERDIÇÃO: EFEITOS DECLARATÓRIOS. RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. A pessoa absolutamente incapaz para os atos da vida civil, submetida à curatela, tem direito ao benefício de pensão por morte desde o óbito do Segurado, ainda que não postulado administrativamente no prazo de trinta dias, uma vez que não se sujeita aos prazos prescricionais.
2. É firme o entendimento desta Corte de que a suspensão do prazo de prescrição para tais indivíduos ocorre no momento em que se manifesta a sua incapacidade, sendo a sentença de interdição, para esse fim específico, meramente declaratória.
3. Recurso Especial do INSS a que se nega provimento." (STJ, REsp 1429309/SC, Primeira Turma, Relator Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Data do Julgamento: 26/06/2018, DJe: 08/08/2018).

No caso dos autos, em que pese a sentença de interdição do filho da requerente ter sido posterior à data do início do prazo prescricional, firmado quando o ex-segurado deixou de retirar os valores depositados a título de aposentadoria por invalidez de sua conta bancária, pode-se extrair dos autos que a sua incapacidade absoluta para o exercício pessoal dos atos da vida civil seguramente se iniciou em data pretérita.

Com efeito, desde o início da década de 1980 o filho da parte autora apresentou indícios de transtorno mental, futuramente confirmado como sendo esquizofrenia paranoide. Por volta dos 30 (trinta) anos de idade - fase da vida em que a doença costuma se manifestar, segundo a ciência médica - foi afastado do seu trabalho por problemas, à época, identificados como neurológicos e psiquiátricos.

O fato de o filho da autora ter sido dado por desaparecido por quase 20 (vinte) anos, vindo a ser encontrado em um outro estado, vivendo em situação de rua, corrobora a presença da doença - e da incapacidade - em momento bastante anterior à sentença de sua interdição. Nesse sentido, aponta-se que não houve qualquer impugnação do INSS em relação à situação narrada nos autos.

Além disso, a segunda perícia médica, acolhida pela autarquia previdenciária, pela qual passou o curatelado para o restabelecimento do seu benefício previdenciário, atestou a incapacidade total para os atos da vida (fl. 166), mostrando-se este "apático, com juízo crítico severamente comprometido, alheio ao ambiente que o cerca". (fl. 292).

Outrossim, levando em consideração que "[...] as características psicóticas da esquizofrenia costumam surgir entre o fim da adolescência e meados dos 30 anos; início antes da adolescência é raro [...], bem como, na maioria dos indivíduos a doença manifestar [...] um desenvolvimento lento e gradativo de uma variedade de sinais e sintomas clinicamente importantes (DSM-5), dúvidas não restam sobre a incapacidade civil total do filho da requerente a partir de 09.10.1983 (fls. 67/75), quando lhe foi concedido o benefício de auxílio-doença.

Finalmente, vale ressaltar que o E. STJ, no julgamento do REsp 1101324/RJ, reconheceu a responsabilidade civil de genitora, por ato praticado por seu filho - maior e não interditado - que gerou dano a terceiro:

"PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. AGRESSÃO FÍSICA. DANOS MORAIS. MAIOR ESQUIZOFRÊNICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DA GENITORA. LEGITIMIDADE PASSIVA. OMISSÕES NÃO VERIFICADAS. INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. NULIDADE. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. RECONVENÇÃO. ENUNCIADOS N. 283 E 284 DA SÚMULA DO STF. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADO.
1. Omissões não verificadas, tendo em vista que o Tribunal de origem enfrentou as questões de mérito apresentadas pelas partes, fundamentando-se suficientemente em dispositivos legais e nos fatos da causa e nas provas.
2. Não impugnado no recurso especial o fundamento adotado em segunda instância de que a nulidade não pode ser requerida pela parte que lhe deu causa (art. 243 do CPC), incide a vedação contida no enunciado n. 283 do STF.
3. Na linha da jurisprudência desta Corte, descabe reconhecer a nulidade do processo por ausência de intervenção do Ministério Público quando inexistir efetivo prejuízo ao incapaz. No caso concreto, além de os recorrentes, corréus, nem mesmo indicarem qual o dano sofrido em sua defesa, tal requisito, indispensável ao reconhecimento da nulidade, não está caracterizado.
4. "Exemplo de doença mental que se manifesta periodicamente no paciente é a esquizofrenia, conhecida como doença do 'espírito dividido' (denominação vinda do grego, e formada das palavras skizo, que significa divisão, e phrenos, com a tradução de espírito). Durante seus surtos, que podem durar um mês, o paciente é assaltado por delírios e alucinações, ouvindo vozes e vendo seres imaginários,
sofrendo ideias de perseguição e possessões de espíritos estranhos. Sem dúvida, traz distúrbios mentais, o que enquadra a doença no rol das incapacitantes" (RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família. 9ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 916).
5. O art. 1.590 do CC/2002 estende ao incapaz - absoluta ou relativamente - as normas pertinentes à guarda dos filhos menores. Nesse enfoque, é importante destacar que a guarda representa mais que um direito dos pais em ter os filhos próximos. Revela-se, sobretudo, como um dever de cuidar, de vigiar e de proteger os filhos, em todos os sentidos, enquanto necessária tal proteção.
6. Consta do acórdão recorrido que o primeiro réu, apesar de maior, é portador de esquizofrenia paranoide, mora sozinho, tem surtos periódicos e agride transeuntes. Sua genitora (segunda ré), plenamente ciente da situação e omissa no cumprimento de suas obrigações em relação ao filho incapaz e na adoção de medidas com o propósito de evitar a repetição de tais fatos, deve ser responsabilizada civilmente pelos danos morais sofridos pela autora, decorrentes de lesões provocadas pelo deficiente.
7. Acerca da reconvenção proposta pela segunda ré, os recorrentes não impugnaram os fundamentos contidos no acórdão recorrido nem indicaram dispositivos legais eventualmente afrontados. Incidência dos enunciados n. 283 e 284 da Súmula do STF.
8. Divergência jurisprudencial não caracterizada relativamente à fixação do quantum a título de danos morais. O Superior Tribunal de Justiça permite a revisão de tal valor em recurso especial somente quando for possível constatar primo ictu oculi que tal importância é exorbitante ou ínfima. Ausentes essas hipóteses, como no presente caso, incide a vedação contida no enunciado n. 7 da Súmula do STJ.
9. Recurso especial parcialmente conhecido e desprovido." (Resp 1101324/RJ, Quarta Turma, Relator Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Data do Julgamento: 13/10/2015, DJe: 12/11/2015).

Destaco a seguinte passagem do julgado supracitado, em que foi dada precedência aos fatos jurídicos comprovados nos autos, para reconhecer a incapacidade civil de pessoa com esquizofrenia, independente de processo de interdição:

"Sem dúvida, o esquizofrênico que, reincidentemente, há tempos, sofre surtos psicóticos e/ou pratica atos de agressividade - como nestes autos - é, de fato, incapacitado, total ou parcialmente, para a prática de atos da vida civil, mesmo não oficialmente interditado, demandando cuidados especiais por parte daqueles que estão cientes do problema psiquiátrico, cuja obrigação decorre da lei e da relação de parentesco - genitores, cônjuge, companheiro, filhos etc. -, tudo para proteger o doente e terceiros.".

Sendo assim, por não correr prazo prescricional contra absolutamente incapazes, descabido falar, no caso em tela, de prescrição quinquenal.

Destarte, a parte autora faz jus aos valores devidos ao seu falecido filho (Adauto dos Santos Silva), a título de aposentadoria por invalidez, entre 11.08.1992 a 26.03.2004.

A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013, do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.

Com relação aos honorários advocatícios, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, § 3º, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, todos do CPC/2015, e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão que reconheceu o direito ao benefício (Súmula 111 do STJ).

Embora o INSS seja isento do pagamento de custas processuais, deverá reembolsar as despesas judiciais feitas pela parte vencedora e que estejam devidamente comprovadas nos autos (Lei nº 9.289/96, artigo 4º, inciso I e parágrafo único).

As verbas acessórias e as prestações em atraso também deverão ser calculadas na forma acima estabelecida, em fase de liquidação de sentença.

Diante do exposto, dou provimento à apelação, para, fixando, de oficio, os consectários legais, julgar procedente o pedido e condenar o réu a conceder-lhe os valores relativos a benefício de aposentadoria por invalidez, devidos ao seu falecido filho, Sr. Adauto dos Santos Silva, entre 11.08.1992 a 26.03.2004, tudo na forma acima explicitada.

É como voto.

NELSON PORFIRIO
Desembargador Federal


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