
Nº
RELATOR:
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000018-74.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VILMA APARECIDA DOMINGOS SCARDUA
Advogado do(a) APELADO: MILTON ALAINE UZUN - SP225313-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de pedido de aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência ajuizado por Vilma Aparecida Domingos Scardua em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Concedido o direito à gratuidade da justiça.
Contestação do INSS, na qual sustenta não ter a parte autora comprovado os requisitos necessários à concessão da aposentadoria pleiteada.
Laudo pericial anexado aos autos, com seguidas complementações.
Sentença pela parcial procedência do pedido, “[...] para condenar o réu a implementar em favor da autora aposentadoria disciplinada na Lei Complementar 142/2013. a partir da data do laudo pericial (fia. 65- 15/4/15).” (ID 123617403 – pág. 63).
Inconformado, o INSS interpôs recurso de apelação, pugnando, preliminarmente, pela nulidade da sentença, a fim de que, “[...] seja determinado o retorno dos autos à origem para reabertura da instrução processual, e intimação do Expert para esclarecimento das questões reiteradas na manifestação de fls. 246/248.” (ID 123617403 – pág. 71). No mérito, argumenta pela improcedência do pedido.
A parta autora apresentou petição em que pleiteia a concessão da tutela provisória de urgência.
Com as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
Em decisão monocrática, o julgamento foi convertido em diligência, para que fosse realizada nova perícia, nos termos da Portaria Interministerial AGU/MPS/MF/SEDH/MP n. 01/2014, bem como indeferi a tutela provisória de urgência requerida.
Segundo laudo pericial foi realizado.
Com o retorno dos autos, determinei expedição de ofício ao Juízo de origem, “[...] a fim de que solicite, com a maior brevidade possível, os esclarecimentos ao sr. perito judicial, notadamente quanto: a) existência ou não de variação no grau de deficiência; e se positivo, b) a indicação dos respectivos períodos em cada grau.” (ID 259030104 – pág. 1).
Esclarecimentos realizados pelo perito judicial, retornaram os autos conclusos.
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000018-74.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VILMA APARECIDA DOMINGOS SCARDUA
Advogado do(a) APELADO: MILTON ALAINE UZUN - SP225313-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende a parte autora, nascida em 05.08.1968, o reconhecimento de sua condição de pessoa com deficiência grave, e a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência, a partir da data do requerimento administrativo (DER 04.02.2014).
Da aposentadoria por tempo de contribuição à pessoa com deficiência.
Inicialmente, aponta-se que a CRFB/88, em seu §1º, art. 201, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 47, de 2005, autorizou a instituição de critério diferenciado de aposentadoria às pessoas com deficiência, filiadas ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS:
"É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar."
Após oito anos, a Lei Complementar nº 142, de 08 de maio de 2013, estabeleceu os requisitos e critérios especiais para a concessão de aposentadoria à pessoa com deficiência. Conceituou-se, para efeitos previdenciários, a pessoa com deficiência como "aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas." (art. 2º).
Ficou estabelecido pelo texto normativo (art. 3º) ser devida aposentadoria por tempo de contribuição ao segurado com deficiência que comprove os seguintes requisitos: a) 25 (vinte e cinco) anos de tempo de contribuição, se homem, e 20 (vinte), se mulher, no caso de segurado com deficiência grave; b) 29 (vinte e nove) anos de tempo de contribuição, se homem, e 24 (vinte e quatro), se mulher, no caso de segurado com deficiência moderada; c) 33 (vinte e três) anos de tempo de contribuição, se homem, e 28 (vinte e oito), se mulher, no caso de segurado com deficiência leve.
Ainda, no mesmo artigo, foi criada a aposentadoria por idade ao segurado com deficiência que tenha 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, independentemente do grau de deficiência, desde que cumprido tempo mínimo de contribuição de 15 (quinze) anos e comprovada a existência de deficiência durante igual período.
No que diz respeito ao grau da deficiência, o art. 5º da Lei Complementar nº 142/2013 assim consignou: "O grau de deficiência será atestado por perícia própria do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, por meio de instrumentos desenvolvidos para esse fim.". Além disso, o texto legal (parágrafo único do art. 3º e art. 4) remeteu a sua regulamentação em diversos aspectos para o Poder Executivo, que expediu o Decreto nº 8.145, de 03 de dezembro de 2013, alterando o Regulamento Geral da Previdência Social - RPS (Decreto nº 3.048, de 06 de maio de 1999), para dispor nos seguintes termos:
"Art. 70-D. Para efeito de concessão da aposentadoria da pessoa com deficiência, compete à perícia própria do INSS, nos termos de ato conjunto do Ministro de Estado Chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, dos Ministros de Estado da Previdência Social, da Fazenda, do Planejamento, Orçamento e Gestão e do Advogado-Geral da União:
I - avaliar o segurado e fixar a data provável do início da deficiência e o seu grau; e
II - identificar a ocorrência de variação no grau de deficiência e indicar os respectivos períodos em cada grau.
§ 1o A comprovação da deficiência anterior à data da vigência da Lei Complementar no 142, de 8 de maio de 2013, será instruída por documentos que subsidiem a avaliação médica e funcional, vedada a prova exclusivamente testemunhal.
§ 2o A avaliação da pessoa com deficiência será realizada para fazer prova dessa condição exclusivamente para fins previdenciários.
§ 3o Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
§ 4o Ato conjunto do Ministro de Estado Chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, dos Ministros de Estado da Previdência Social, da Fazenda, do Planejamento, Orçamento e Gestão e do Advogado-Geral da União definirá impedimento de longo prazo para os efeitos deste Decreto".
NO CASO DOS AUTOS, observa-se que a própria autarquia previdenciária, em sede administrativa, reconheceu ser a parte autora “[...] pessoa com deficiência com grau leve, no período de 21 06.2001 a 04.02.14 [...]” (ID 123617413 – pág. 15). Assim, dúvidas não restam acerca da condição da segurada como pessoa com deficiência, sendo apenas necessário definir a natureza desta, bem como a sua origem e eventuais variações.
Pois bem.
Não obstante a posição firmada pelo INSS, o conjunto probatório carreado aos autos define ser a parte autora pessoa com deficiência de natureza grave.
Inicialmente, a demandante apresentou relatório médico no qual descreve a sua doença, assim como o impacto dela na capacidade laborativa:
“A paciente acima citada é portadora de doença neurológica hereditária motora e sensorial (Doença de Charcot-Marie-Tooth), que a impede de exercer qualquer atividade laboral. Esta moléstia é degenerativa, progressiva e incurável, sendo que a partir de Dezembro de 2006, houve uma piora significativa no quadro clinico da paciente.” (ID 123617413 – pág. 19 - destaquei).
No mesmo sentido, após eletroneuromiografia, concluiu-se que “[...] as alterações eletrofisiológicas acima descritas corroboram o diagnóstico de Polineuropatia Desmielinizante Hereditária Sensitivo-Motora ou Doença de Charcot-Marie-Tooth, ainda apresentando leves sinais de atividade desnervatória em curso.” (ID 123617413 – pág. 21).
Em 2014, relatório médico afirmou ser a parte portadora de doença hereditária grave, que afeta ambos os pés, não havendo previsão de alta ambulatorial, o que confirma o seu estado clínico (ID 123617413 – pág. 22).
No ano de 2015, por sua vez, o primeiro laudo pericial realizado em Juízo afirmou:
“A AUTORA DE 46 ANOS DE IDADE, PORTADORA DE ALTERAÇÕES NEUROLÓGICAS COM Diminuição DA FORÇA MUSCULAR EM MEMBROS SUPERIORES E MEMBROS INFERIORES, DIMINUIÇÃO DA SENSIBILIDADE, AMBOS OS PÉS APRESENTAM-SE CAÍDOS, COM IMPOSSIBILIDADE DE FLEXÃO E EXTENSÃO, DÉFICIT A DEAMBULAÇÃO, DÉFICIT DE SENSIBILIDADE LOCAL DEVIDO A DOENÇA DE CHARCOT-MARIE-TOOTH, DOENÇA GENÉTICA, DEGENERATIVA, PROGRESSIVA E INCURÁVEL; cujos males globalmente a impossibilita desempenhar atividades laborativas de toda a natureza. não tendo condições de lograr êxito em um emprego, onde a remuneração é necessária para a sua subsistência. APRESENTA-SE INCAPACITADA DE FORMA TOTAL E PERMANENTE PARA O TRABALHO. Deve-se ressaltar que a Autora está trabalhando no momento, com dificuldades. (ID 123617413 – pág. 65 - destaquei).
Ademais, houve o detalhamento pelo perito judicial acerca das limitações mais graves que afetem a vida da parte autora (ID 123617403 – págs. 6/13).
Dessa forma, encontram-se prejudicados diversos aspectos da vida da segurada, em face de barreiras urbanísticas, arquitetônicas, nos transportes, atitudinais e tecnológicas existentes em seu contexto social, especificamente para pessoas com dificuldade de locomoção. Dessa maneira, os domínios mobilidade, cuidados pessoais, educação, trabalho e vida econômica, socialização e vida comunitária, todos utilizados pelo IF-BrA, encaminham-se para pontuação relacionada à realização de atividades com o auxílio de terceiros ou de forma adaptada, sendo possível, ainda, indicar a não realização de algumas atividades, ou a sua realização com total dependência de terceiros, pela natureza de sua doença (degenerativa, progressiva e incurável), tais como o exercício de trabalho remunerado e a participação em eventos sociais.
Por fim, o segundo laudo pericial produzido em Juízo corroborou ser a segurada pessoa com deficiência grave, com indicação de incapacidade total e permanente para o trabalho. Ressaltou o perito judicial:
“Ao exame físico atual apresenta alterações neuromotoras significativas, que determinam déficit e limitação funcionais de membros inferiores e superiores que impingem a requerente incapacidades laborativas.” (ID 256387563 – pág. 14).
Embora não se confundam os conceitos de “doença”, “incapacidade para o trabalho” e “deficiência”, não se pode ignorar, no presente caso, a proximidade de tais categorias. A parte autora é acometida de doença de Charcot-Marie-Tooth tipo I, “[...] polineuropatia genética que cursa com intensa fraqueza, desequilíbrio e perda de sensibilidade, com elevada dificuldade de deambulação, sem condições laborativas para qualquer atividade [...]” (ID 256387563 – pág. 3). Nessa direção, a condição de pessoa com deficiência da autora se relaciona com a doença de Charcot, ainda que o aspecto físico, isoladamente, não seja suficiente para caracterização de tal estado. Ademais, a natureza gradual, progressiva e incurável da doença acarretou a incapacidade total e permanente para o trabalho, não podendo se afastar, portanto, a classificação da segurada como pessoa com deficiência grave. Se a evolução da doença, em pouco anos, afastou a possibilidade do exercício de atividade laborativa, não se pode enquadrar a deficiência a ela associada como leve ou moderada.
Ocorre, todavia, que a condição de pessoa com deficiência grave da parte autora, baseada nas provas coligidas aos autos, apenas pode ser fixada a partir de 21.06.2001, quando a autarquia previdenciária reconheceu tal condição, ainda que em grau diverso. Nessa toada, mesmo sendo razoável, dada a progressividade da doença, e, por conseguinte, o impacto na deficiência, presumir-se uma evolução do estado leve para moderado e, por fim, grave, inexistem elementos concretos para o estabelecimento desses marcos.
Dessa maneira, não comprovou a parte autora o tempo contributivo correspondente a 20 (vinte) anos, na condição de pessoa com deficiência grave, tendo em vista as conversões previstas no art. 70-E do Decreto n. 3.048/99, incluído pelo Decreto n. 8.145/2013.
Destarte, a autora não faz jus à aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência.
Entretanto, pelo princípio da fungibilidade das prestações previdenciárias (STJ, AgRg no REsp 1305049/RJ, Segunda Turma, Relator Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 08/05/2012), passo a analisar a possibilidade de concessão do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente.
O benefício da aposentadoria por incapacidade permanente está previsto no art. 42 e seguintes da Lei nº 8.213/91, pelo qual:
"[...] A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
§ 1º A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de incapacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança [...]".
Por sua vez, o benefício de auxílio por incapacidade temporária consta do art. 59 e seguintes do referido diploma legal, a saber:
"[...] será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos [...]".
Os requisitos do benefício são, portanto, a incapacidade laboral, a qualidade de segurado e a carência, esta fixada em 12 contribuições mensais, nos termos do art. 25 e seguintes da Lei nº 8.213/91. Deve ser observado ainda, o estabelecido no art. 26, inciso II e art. 151, da Lei 8.213/1991, quanto aos casos que independem do cumprimento da carência; bem como o disposto no art. 27-A, da Lei 8.213/1991.
"Art. 24. Período de carência é o número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício, consideradas a partir do transcurso do primeiro dia dos meses de suas competências.
Art. 27-A. Na hipótese de perda da qualidade de segurado, para fins da concessão dos benefícios de auxílio-doença, de aposentadoria por invalidez, de salário-maternidade e de auxílio-reclusão, o segurado deverá contar, a partir da data da nova filiação à Previdência Social, com metade dos períodos previstos nos incisos I, III e IV do caput do art. 25 desta Lei.”
Quanto à qualidade de segurado, estabelece o art. 15 da Lei nº 8.213/91, que mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições: (...) II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração.
O prazo mencionado será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já houver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
Havendo perda da qualidade de segurado, as contribuições anteriores a essa data só serão computadas para efeito de carência depois que o segurado contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com uma parcela do mínimo legal de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido. Inicialmente, esse mínimo correspondia a 1/3 (um terço) do tempo previsto para a carência originária, conforme constava do parágrafo único do art. 24 da Lei 8.213/1991, sendo atualmente elevado para metade, na forma do disposto no art. 27-A da Lei de Benefícios, incluído pela Lei 13.457 de 26.06.2017.
Assim, podemos concluir que são requisitos do benefício postulado a incapacidade laboral, a qualidade de segurado e a carência, esta fixada em 12 contribuições mensais, nos termos do art. 25 e seguintes da Lei nº 8.213/91.
No caso dos autos, restaram incontroversos o período de carência e a qualidade de segurado, eis que não impugnados pelo INSS.
No tocante à incapacidade, conforme já explicitado quando da análise da deficiência, ficou estabelecido em laudo pericial que a parte autora é:
“[...] PORTADORA DE ALTERAÇÕES NEUROLÓGICAS COM Diminuição DA FORÇA MUSCULAR EM MEMBROS SUPERIORES E MEMBROS INFERIORES, DIMINUIÇÃO DA SENSIBILIDADE, AMBOS OS PÉS APRESENTAM-SE CAÍDOS, COM IMPOSSIBILIDADE DE FLEXÃO E EXTENSÃO, DÉFICIT A DEAMBULAÇÃO, DÉFICIT DE SENSIBILIDADE LOCAL DEVIDO A DOENÇA DE CHACOT-MARIE-TOOTH, DOENÇA GENÉTICA, DEGENERATIVA, PROGRESSIVA E INCURÁVEL; cujos males globalmente a impossibilita desempenhar atividades laborativas de toda a natureza. não tendo condições de lograr êxito em um emprego, onde a remuneração é necessária para a sua subsistência. APRESENTA-SE INCAPACITADA DE FORMA TOTAL E PERMANENTE PARA O TRABALHO [...]” (ID 123617413 – pág. 65 - destaquei).
De acordo com os artigos 42 e seguintes da Lei nº 8.213/91, o benefício de aposentadoria por incapacidade permanente é devido ao segurado que ficar incapacitado total e permanentemente para o exercício de suas atividades profissionais habituais.
Tendo em vista que o sr. perito não estabeleceu o marco originário da incapacidade total e permanente para o trabalho, o início do benefício deve ser fixado na data do laudo pericial (15.04.2015 – ID 123617413 – pág. 67).
Deste modo, e diante do exame acurado do conjunto probatório, a parte autora faz jus ao benefício de aposentadoria por incapacidade permanente, a partir da data do laudo pericial (15.04.2015).
Embora o INSS seja isento do pagamento de custas processuais, deverá reembolsar as despesas judiciais feitas pela parte vencedora e que estejam devidamente comprovadas nos autos (Lei nº 9.289/96, artigo 4º, inciso I e parágrafo único).
Quanto à possibilidade de cumulação do recebimento do benefício por incapacidade e o salário no mesmo período, anoto que o C. Superior Tribunal de Justiça, ao analisar o Tema Repetitivo 1.013, fixou a seguinte tese: "No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente" (Julgado em 24.06.2020, Publicado no DJ Eletrônico em 01.07.2020).
Assim, revendo entendimento anterior, acompanho o posicionamento da Corte Superior.
Por outro lado, devem ser descontados das parcelas vencidas, quando da liquidação da sentença, os benefícios inacumuláveis, eventualmente recebidos, e as parcelas pagas a título de antecipação de tutela.
A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 784/2022 (que já contempla a aplicação da Selic, nos termos do artigo 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021), do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a devida expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.
Com relação aos honorários advocatícios, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, § 3º, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, todos do CPC, e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão que reconheceu o direito ao benefício (Súmula 111 do STJ).
O INSS é isento das custas processuais (artigo 4º, inciso I da Lei nº 9.289/96), porém deve reembolsar, quando vencido, as despesas judiciais feitas pela parte vencedora (artigo 4º, parágrafo único).
Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação, para afastar o reconhecimento da aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência concedida pela r. sentença, e, de ofício, pelo princípio da fungibilidade das prestações previdenciárias, julgo parcialmente procedente o pedido da parte autora, a fim de condenar o INSS a conceder-lhe o benefício de aposentadoria por incapacidade permanente, a partir de 16.01.2015 (data do laudo pericial), fixando, também de ofício, os consectários legais, tudo na forma acima explicitada.
Determino que, independentemente do trânsito em julgado, comunique-se ao INSS (Gerência Executiva/Unidade Administrativa), instruído com os devidos documentos da parte autora VILMA APARECIDA DOMINGOS SCARDUA, a fim de serem adotadas as providências cabíveis para que seja implantado de imediato o benefício de APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE, com D.I.B. em 16.01.2015 e R.M.I. a ser calculada pelo INSS, nos termos da presente decisão, tendo em vista o art. 497 do novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/15).
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. DEFICIÊNCIA GRAVE PARCIALMENTE CONFIRMADA. NATUREZA DA DEFICIÊNCIA. VARIAÇÕES. TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO NÃO PREENCHIDO. BENEFÍCIO INDEVIDO. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE. REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS. CONSECTÁRIOS LEGAIS FIXADOS DE OFÍCIO.
1. É devida aposentadoria por tempo de contribuição ao segurado com deficiência que comprove os seguintes requisitos: a) 25 (vinte e cinco) anos de tempo de contribuição, se homem, e 20 (vinte), se mulher, no caso de segurado com deficiência grave; b) 29 (vinte e nove) anos de tempo de contribuição, se homem, e 24 (vinte e quatro), se mulher, no caso de segurado com deficiência moderada; c) 33 (vinte e três) anos de tempo de contribuição, se homem, e 28 (vinte e oito), se mulher, no caso de segurado com deficiência leve.
2. Embora não se confundam os conceitos de “doença”, “incapacidade para o trabalho” e “deficiência”, não se pode ignorar, no presente caso, a proximidade de tais categorias. A parte autora é acometida de doença de Charcot-Marie-Tooth tipo I, “[...] polineuropatia genética que cursa com intensa fraqueza, desequilíbrio e perda de sensibilidade, com elevada dificuldade de deambulação, sem condições laborativas para qualquer atividade [...]” (ID 256387563 – pág. 3). Nessa direção, a condição de pessoa da com deficiência da autora se relaciona com a doença de Charcot, ainda que o aspecto físico, isoladamente, não seja suficiente para caracterização de tal estado. Ademais, a natureza gradual, progressiva e incurável da doença, acarretou a incapacidade total e permanente para o trabalho, não podendo se afastar, portanto, a classificação da segurada como pessoa com deficiência grave. Se a evolução da doença, em pouco anos, afastou a possibilidade do exercício de atividade laborativa, não se pode enquadrar a deficiência a ela associada como leve ou moderada.
3. Ocorre, todavia, que a condição de pessoa com deficiência grave da parte autora, baseada nas provas coligidas aos autos, apenas pode ser fixada a partir de 21.06.2001, quando a autarquia previdenciária reconheceu tal condição, ainda que em grau diverso. Nessa toada, mesmo sendo razoável, dada a progressividade da doença, e, por conseguinte, o impacto na deficiência, presumir-se uma evolução do estado leve para moderado e, por fim, grave, inexistem elementos concretos para o estabelecimento desses marcos.
4. Dessa maneira, não comprovou a parte autora o tempo contributivo correspondente a 20 (vinte) anos, na condição de pessoa com deficiência grave, tendo em vista as conversões previstas no art. 70-E do Decreto n. 3.048/99, incluído pelo Decreto n. 8.145/2013.
5. Destarte, a autora não faz jus à aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência.
6. Entretanto, pelo princípio da fungibilidade das prestações previdenciárias (STJ, AgRg no REsp 1305049/RJ, Segunda Turma, Relator Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 08/05/2012), faz-se necessário analisar a possibilidade de concessão do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente.
7. São requisitos do benefício a incapacidade laboral total e permanente, a qualidade de segurado e a carência, esta fixada em 12 contribuições mensais, nos termos do art. 25 e seguintes da Lei nº 8.213/91.
8. No caso dos autos, restaram incontroversos o período de carência e a qualidade de segurado, eis que não impugnados pelo INSS. No tocante à incapacidade, ficou estabelecido em laudo pericial que a parte autora é: “[...] PORTADORA DE ALTERAÇÕES NEUROLÓGICAS COM Diminuição DA FORÇA MUSCULAR EM MEMBROS SUPERIORES E MEMBROS INFERIORES, DIMINUIÇÃO DA SENSIBILIDADE, AMBOS OS PÉS APRESENTAM-SE CAÍDOS, COM IMPOSSIBILIDADE DE FLEXÃO E EXTENSÃO, DÉFICIT A DEAMBULAÇÃO, DÉFICIT DE SENSIBILIDADE LOCAL DEVIDO A DOENÇA DE CHACOT-MARIE-TOOTH, DOENÇA GENÉTICA, DEGENERATIVA, PROGRESSIVA E INCURÁVEL; cujos males globalmente a impossibilita desempenhar atividades laborativas de toda a natureza. não tendo condições de lograr êxito em um emprego, onde a remuneração é necessária para a sua subsistência. APRESENTA-SE INCAPACITADA DE FORMA TOTAL E PERMANENTE PARA O TRABALHO [...]” (ID 123617413 – pág. 65).
9. Desse modo, diante do conjunto probatório e considerando o parecer elaborado pela perícia judicial, a parte autora faz jus à concessão do benefício aposentadoria por incapacidade permanente.
10. Tendo em vista que o sr. perito não estabeleceu o marco originário da incapacidade total e permanente para o trabalho, o início do benefício deve ser fixado na data do laudo pericial (15.04.2015 – ID 123617413 – pág. 67).
11. A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 784/2022 (que já contempla a aplicação da Selic, nos termos do artigo 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021), do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a devida expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.
12. Com relação aos honorários advocatícios, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, § 3º, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, todos do CPC/2015, e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão que reconheceu o direito ao benefício (Súmula 111 do STJ).
13. Apelação parcialmente provida. Princípio da fungibilidade das prestações previdenciárias. Aposentadoria por incapacidade permanente concedida. Consectários legais fixados de ofício.
