Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
5001039-02.2017.4.03.6120
Relator(a)
Juiz Federal RAFAEL ANDRADE DE MARGALHO
Órgão Julgador
7ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
01/12/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 03/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSO CIVIL. FERROVIÁRIO. PENSÃO POR MORTE.
COMPLEMENTAÇÃO.APOSENTADORIA DE FERROVIÁRIO DA EXTINTA FEPASA.
COMPETÊNCIA JUSTIÇA ESTADUAL. ILEGITIMIDADE DA UNIÃO FEDERAL E DO INSS.
SENTENÇA ANULADA, DE OFÍCIO, POR INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DA JUSTIÇA
FEDERAL,COM REMESSA DOS AUTOS À VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE
ARARAQUARA, NOS TERMOSDOS §§ 1º E 3º DO ART. 64 DO CPC/2015.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIO
Nº
RELATOR:
OUTROS PARTICIPANTES:
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº5001039-02.2017.4.03.6120
RELATOR:20º Juiz Federal da 7ª TR SP
RECORRENTE: ZELMIRA TONON COSTA
Advogado do(a) RECORRENTE: NELSON CAMARA - SP15751-A
RECORRIDO: UNIÃO FEDERAL, ESTADO DE SAO PAULO
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA UNIÃO DA 3ª REGIÃO, ESTADO DE SAO
PAULO
Advogado do(a) RECORRIDO: GISLAENE PLACA LOPES - SP137781-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de pedido de pagamento de diferenças de complementação de benefício no percentual
de 14% em conformidade com o determinado pelo dissídio coletivo TST — DC nº 92590/2003.
A r. sentença assim decidiu:
“Trata-se de ação de conhecimento proposta por JOSE ANTONIO COSTA, ANA LUCIA COSTA
DE SOUZA, MARIA ANGELICA COSTA PIRES, MARIA ANTONIA COSTA SECHINI, MARCIA
REGINA COSTA, na qualidade de herdeiros de ZELMIRA TONON COSTA, pensionista de
ferroviário aposentado da FEPASA, contra a FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO e a
UNIÃO FEDERAL por meio da qual a parte autora pretende a condenação das rés, de forma
solidária, ao pagamento de diferenças referentes à complementação da pensão por morte que
recebe, mediante a aplicação do índice de reajuste de 14% determinado pelo dissídio coletivo
TST — DC nº 92590/2003.
Dispensado o relatório (art. 38 da Lei 9.099/1995 c/c art. 1º da Lei 10.259/2011).
Fundamento e decido.
Inicialmente a ação foi proposta na Justiça do Trabalho de Araraquara, como reclamatória
trabalhista. Contudo, o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região reconheceu a
incompetência da Justiça do Trabalho e determinou a remessa dos autos para a Justiça
Comum, de modo que os autos foram redistribuídos à 1ª Vara Federal de Araraquara que
declinou da competência e remeteu os autos ao Juizado Especial Federal de Araraquara, que
por sua vez, determinou o desmembramento do litisconsórcio ativo facultativo e, com
fundamento no critério territorial de competência dos Juizados Especiais Federais, declinou da
competência para este Juízo.
Vê-se, portanto, que a preliminar de incompetência da Justiça do Trabalho, é questão superada.
A alegação de ausência de documentos essenciais (Carteira de Trabalho e Termo de Rescisão
do Contrato de Trabalho), apresentada pela corré União, deve ser afastada, tendo em vista que
o holerite apresentado pela parte autora demonstra que ele é pensionista em razão de óbito de
exempregado da FEPASA.
Por outro lado, a preliminar de ilegitimidade passiva, arguida pela corré União, deve ser
rejeitada, vez que a União, a partir de 22 de janeiro de 2007, sucedeu a RFFSA, na forma da
Lei 11.483/07, que, de sua vez, havia sucedido a FEPASA.
Também rejeito a preliminar de inépcia da inicial, por falta de causa de pedir, arguidas pela
corré União, vez que a petição inicial conseguiu demonstrar em que se baseava o pedido, tanto
que as rés se defenderam com eficiência.
Por fim, alegação de impossibilidade jurídica do pedido deverá ser analisada como mérito, vez
que o Código de Processo Civil de 2015, em seu art. 485, VI, manteve como causa de extinção
do processo sem resolução de mérito apenas a ausência de legitimidade ou de interesse
processual.
Reconheço, por sua vez, a prescrição no que concerne às parcelas vencidas no período
anterior ao quinquênio que precedeu o ajuizamento da presente demanda. Registro que o termo
inicial para a prescrição não é a data da redistribuição na Justiça Federal, mas sim do
ajuizamento do feito perante a Justiça do Trabalho, ou seja, 03/04/2014.
No mérito, a questão já foi examinada noutras oportunidades pela Justiça Federal, em
sentenças proferidas pelo Excelentíssimo Juiz Federal MARCIO CRISTIANO EBERT, cuja
fundamentação adoto aqui, como razão de decidir.
“Descendo para mérito propriamente dito, sustenta a parte autora que é pensionista de Iziquiel
Berto, ferroviário aposentado da extinta FEPASA, com direito à percepção de complementação
dos proventos pagos pelo INSS, de modo a manter a paridade com os funcionários da ativa.
Essa complementação vem sendo paga pela Fazenda do Estado de São Paulo, porém no
cálculo do adicional não se levou em consideração dissídio coletivo que favoreceu os
funcionários e inativos da extinta RFFSA em 2003 com o reajuste de 14% retroativo a 1998.
Salienta que a FEPASA foi sucedida pela RFFSA, que por sua vez foi extinta pela União. Dessa
cadeia de eventos decorre a responsabilidade solidária das rés, pois embora a obrigação
contratual recaia sobre a Fazenda do Estado de São Paulo, compete à União zelar pelo
adimplemento das obrigações relacionadas à extinta FEPASA.
A primeira observação que faço é que não se discute neste feito o direito à complementação da
pensão por morte deixada pelo instituidor do benefício, funcionário aposentado da FEPASA. A
paridade de vencimentos entre os ferroviários inativos com os da ativa decorre do art. 193 do
Estatuto dos Ferroviários (Decreto Estadual nº 35.530/1959) e foi reforçada pela Lei Estadual nº
9.343/1996, de onde extraio o dispositivo que segue:
Artigo 4º - Fica mantida aos ferroviários, com direito adquirido, a complementação dos
proventos das aposentadorias e pensões, nos termos da legislação estadual especifica e do
Contrato Coletivo de Trabalho 1995/1996.
§ 1º - As despesas decorrentes do disposto no "caput" deste artigo serão suportadas pela
Fazenda do Estado, mediante dotação própria consignada no orçamento da Secretaria de
Estado dos Negócios dos Transportes.
§ 2º - Os reajustes dos benefícios da complementação e pensões a que se refere o "caput"
deste artigo serão fixados, obedecendo os mesmos índices e datas, conforme acordo ou
convenção coletiva de trabalho, ou dissídio coletivo na data - base da respectiva categoria dos
ferroviários.
Tanto é assim que a complementação vem sendo paga regularmente pela Fazenda do Estado
de São Paulo, conforme demonstra o holerite (evento 01 – fl. 82). A dúvida é se a
complementação está sendo paga de forma correta ou, para ser mais preciso, se nesse cálculo
deveria ser levado em consideração os reflexos de dissidio coletivo que em 2003 concedeu aos
funcionários da RFFSA um reajuste de 14%.
O demonstrativo de pagamento da fl. 82 comprova que o instituidor da pensão estava vinculado
ao Sindicato dos Trabalhadores em Empresas Ferroviárias da Zona Araraquarense. E esse
sindicato foi um dos beneficiados no Dissídio Coletivo TST-DC-92590/2003 com o reajuste
linear de 14% aos trabalhadores ativos e inativos, a partir de maio de 2003 (evento 01 – fls.
152/173).
A relação de reajustes que incidiram sobre o salário/benefício da parte autora (evento 02 – fl.
11) revela que o aumento assegurado pelo Dissídio Coletivo TST-DC-92590/2003 não foi
aplicado ao seu benefício, infringindo, portanto, a regra legal que assegura a paridade entre o
salário dos trabalhadores ativos e inativos, implementada por meio da complementação paga
pela Fazenda do Estado de São Paulo.
Importante destacar que o dissídio esclarece que o reajuste de 14% então concedido visava
recuperar perdas salariais entre 1998 e 2003, de modo que esse aumento não se encontra
incorporado no reajuste de 10% concedido em junho de 2005 com efeitos retroativos a janeiro
de 2003 — ou seja, não há que se falar em bis in idem na concessão do reajuste.
Também não procede a alegação de que o reajuste deveria incidir primeiro sobre o benefício
previdenciário para só depois se verificar os reflexos na complementação pela Fazenda do
Estado de São Paulo.
É que no caso dos autos a pensão por morte foi instituída antes do reajuste concedido por meio
do dissídio, de modo que a questão é totalmente estranha ao INSS.
Da mesma forma, não assiste razão à parte ré quando pondera que os dissídios coletivos não
podem ser aplicados em face da Fazenda Pública. A propósito disso, transcrevo e adoto como
razão de decidir percuciente trecho de decisão da Desembargadora Heloísa do Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo exarado em feito que trata da mesma questão agitada nestes
autos (apelação nº 0028051-74.2016.8.26.0482):
Não prospera, igualmente, o argumento da apelada relacionado à vedação constitucional à
concessão de reajustes a servidores públicos mediante convenção coletiva, na medida em que
os ferroviários das antigas estradas de ferro não são servidores públicos. Nesse ponto, convém
uma digressão histórica a fim de compreender o regime jurídico de tais ferroviários.
Em primeiro lugar, não é despropositado lembrar que o sistema paulista de estradas de ferro
nasceu do esforço de empreendedores privados que, incitados pelas necessidades
infraestruturais da economia cafeeira, começaram a lançar os trilhos que, progressivamente,
cortariam o território do Estado. Desde a lendária Companhia Paulista das Estradas de Ferro,
fundada em 1868, multiplicaram-se as empresas de linhas-férreas, embaladas pela demanda
abundante por transporte de café. A despeito da riqueza da história individual de cada uma das
empresas férreas de São Paulo, suas trajetórias convergem na medida em que todas
sucumbiram ao declínio progressivo da economia paulista de café e às reiteradas greves. A
saída imaginada para a crise foi comum: a estatização das empresas, ou seja, a transferência
do controle majoritário à administração pública estadual.
Antes de estatizadas, as empresas férreas relacionavam -se com seus empregados mediante
contratos comuns de trabalho, cabendo lembrar que a CLT somente entrou em vigor a 10 de
novembro de 1943. Como as estatizações deram-se, na maior parte dos casos, a partir da
década de 1950, foi breve o intervalo em que se pode considerar que a CLT disciplinou os
vínculos entre as empresas de ferrovias e seus empregados.
Isto porque, com a passagem do controle acionário ao Estado de São Paulo, entendeu –se
conveniente e, mesmo, como resposta pragmática para inibir que os protestos trabalhistas
voltassem à cena criar o Estatuto dos Ferroviários, aprovado pelo Decreto n. 35.530/1959.
A partir de 1959, quando já se encontrava a maioria das antigas estradas de ferro como
empresas estatais (a Companhia Paulista teria suas ações desapropriadas em 1961),
encontramos os ferroviários submetidos a um regime jurídico combinado, porquanto se
aplicavam, simultaneamente, o Estatuto dos Ferroviários e a CLT. As normas do primeiro
diploma teriam relevância desde que não contrariassem as disposições da CLT (notadamente,
os artigos 236 a 247). Nesse sentido, o art. 2º do Estatuto dos Ferroviários:
“As suas disposições aplicam-se a todos os ferroviários a serviço do Estado, exceto naquilo em
que colidirem com os preceitos especiais contidos na Consolidação das Leis do Trabalho”.
O Decreto n. 35.530/1959 jamais teve o efeito de converter os ferroviários em servidores
públicos vinculados à administração direta do Estado de São Paulo, mas somente
“complementou as normas trabalhistas e regulou o funcionamento das ferrovias, o regime de
trabalho e as relações entre estas e seus empregados. Esse diploma, também conhecido por
Estatuto do Ferroviário, não interferiu na relação laboral existente entre os ferroviários e suas
empregadoras; não estabeleceu nenhum vínculo entre o Estado e os ferroviários”
(Desembargador Torres de Carvalho, Apelação nº 0016970-62.2013.8.26.0053, j. 04/08/2014).
Embora não fossem servidores estatutários no específico sentido de que não estão legalmente
investidos em cargo público (a lembrar que o artigo 2º do Estatuto dos Funcionários Públicos
Civis do Estado de São Paulo, aprovado em 1968 pela Lei nº 10.268, dispõe que “As
disposições desta lei não se aplicam aos empregados das autarquias, entidades paraestatais e
serviços públicos de natureza industrial, ressalvada a situação daqueles que, por lei anterior, já
tenham a qualidade de funcionário público”), os ferroviários que integravam as empresas
ferroviárias quando da aprovação do Estatuto dos Ferroviários não poderiam ser definidos,
simplesmente, como celetistas. Assim é pelo mero fato de terem seus direitos e obrigações
disciplinados em estatuto próprio, o qual, não por qualquer acidente, fala em provimento e
vacância de cargos (artigo 1º); “cargos isolados ou de carreira” (artigo 6º); admissão em caráter
efetivo, quando se tratar de cargo de provimento efetivo (artigo 22, I); vencimentos conforme
padrões previamente fixados por ato do governo (artigos 5º e 71); adicional por tempo de
serviço, gratificações e licença-prêmio.
Conclui-se, portanto, que os ferroviários vinculados às empresas estatais de ferrovias antes de
1971 (Lei Estadual nº 10.410, que criou a FEPASA): a) não eram servidores estatutários;
b) não eram servidores celetistas puros; c) eram submetidos a regime jurídico especial ou,
como disse o Desembargador Venicio Salles (Apelação nº 0033818-27.2013.8.26.0053), eram
“estatutários de estatuto próprio”.
Em consequência, não sendo o autor servidor público, à sua pretensão não é oponível a
vedação constitucional à concessão de reajustes a servidores públicos mediante convenção
coletiva, ao contrário do que sugere a apelada.
Melhor sorte não assiste à Fazenda Pública do Estado de São Paulo quando pondera que a
majoração da complementação implica no incremento de despesa ao arrepio de previsão legal
indicando a fonte de custeio.
Isso porque o direito à paridade de vencimentos entre o pessoal da ativa e os inativos que dá
ensejo à complementação pelo Estado decorre de lei formal, que também estabelece a fonte de
custeio do benefício, no caso dotação própria da Fazenda Estadual consignada no orçamento
da Secretaria de Estado dos Negócios dos Transportes. Ou seja, o dissídio não determina o
pagamento da complementação, mas apenas fornece elementos para a Fazenda Pública
calcular de forma correta o benefício.
Tudo somado, concluo que a parte autora tem direito à revisão da complementação da pensão,
mediante a aplicação do reajuste de 14% reconhecido no Dissídio Coletivo TST-DC-
92590/2003, bem como a receber as diferenças anteriores a cinco anos contados do
ajuizamento da ação na Justiça do Trabalho.
Passo a tratar da forma de implementação do direito reconhecido nesta sentença.
Embora a decisão que deu provimento ao agravo tenha reconhecido a legitimidade passiva da
União, no caso concreto a responsabilidade pela implementação do reajuste na
complementação — vale dizer, os efeitos financeiros — recai apenas sobre a Fazenda Pública
do Estado de São Paulo.
É que a complementação vem sendo paga pela Fazenda Pública do Estado de São Paulo
desde a instituição do benefício, sem qualquer resistência por parte desse ente ou com o aporte
de recursos por parte da União. Nessa ordem de ideias, a responsabilidade da União por força
do disposto na Lei 11.483/2007 dependeria da demonstração de que a Fazenda Pública do
Estado de São Paulo não está cumprindo essa obrigação, o que não ocorre neste caso.
Por conseguinte, em relação à União o feito deve ser julgado improcedente.”
Diante do exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado na inicial,
extinguindo o feito com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I do Código de Processo
Civil, para o fim de condenar a Fazenda Pública do Estado de São Paulo a reajustar a
complementação do benefício mediante a aplicação do reajuste de 14% reconhecido no
Dissídio Coletivo TST-DC-92590/2003, bem como a pagar as diferenças devidas posteriores a
16/08/2008, inclusive os reflexos incidentes sobre o décimo-terceiro. Quanto à União, julgo
IMPROCEDENTE o pedido. Os valores devidos deverão ser atualizados de acordo com o
critério estabelecido no art. 1º —F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei 11.960/2009
e teses fixadas pelo STF no julgamento do RE 870947. Não há condenação em custas e
honorários advocatícios nesta instância (arts. 54 e 55 da Lei 9.099/1995). Defiro o pedido de
gratuidade judiciária. Interposto recurso, intime-se a parte contrária para apresentar
contrarrazões e, decorrido o prazo legal, remetam-se os autos à Turma Recursal. Publique-se.
Sentença registrada eletronicamente. Intimem-se.”
Recorre o Estado de São Paulo, alegando, em síntese, que:
“As tabelas de reajustes, os instrumentos coletivos de trabalho e todo o quadro acima descrito,
demonstram que os ferroviários da extinta FEPASA ajuízam diversas ações, com pedidos
contraditórios e paradoxais, visando o melhor dos mundos e a majoração dos seus benefícios
de complementação em contrariedade à Lei 9.343/96, que está sendo cumprida integralmente
pela ré, desde que a folha de pagamento dos complementados daquela extinta empresa está
sob sua A pretensão é um bis in idem. Seu acolhimento teria, por consequência, o duplo
reajustamento das complementações ou a permissão de escolha de índices, sem respaldo
legal. Requer, portanto, diante diante dos documentos, da legislação vigente e da orientação
jurisprudencial reiterada, consolidada no julgamento da Assunção de Competência na apelação
nº 0011350-37.2012.8.26.0269, seja a sentença reformada e julgado totalmente improcedente o
pedido, com a condenação da autora nos ônus da sucumbência.”
Pugna pela improcedência do pedido inicial.
Com contrarrazões.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº5001039-02.2017.4.03.6120
RELATOR:20º Juiz Federal da 7ª TR SP
RECORRENTE: ZELMIRA TONON COSTA
Advogado do(a) RECORRENTE: NELSON CAMARA - SP15751-A
RECORRIDO: UNIÃO FEDERAL, ESTADO DE SAO PAULO
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA UNIÃO DA 3ª REGIÃO, ESTADO DE SAO
PAULO
Advogado do(a) RECORRIDO: GISLAENE PLACA LOPES - SP137781-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Lei estadual nº 9.343/96 garantiu aos ferroviários a complementação das aposentadorias e
pensões, determinando a responsabilidade da Fazenda do Estado pela referida despesa:
Artigo 4º - Fica mantida aos ferroviários, com direito adquirido, a complementação dos
proventos das aposentadorias e pensões, nos termos da legislação estadual específica e do
Contrato Coletivo de Trabalho 1995/1996.
§ 1º - As despesas decorrentes do disposto no "caput" deste artigo serão suportadas pela
Fazenda do Estado, mediante dotação própria consignada no orçamento da Secretaria de
Estado dos Negócios dos Transportes.
§ 2º - Os reajustes dos benefícios da complementação e pensões a que se refere o "caput"
deste artigo serão fixados, obedecendo os mesmos índices e datas, conforme acordo ou
convenção coletiva de trabalho, ou dissidio coletivo na data-base da respectiva categoria dos
ferroviários.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal já firmou entendimento de que a competência para
julgamento de ação em que se discute a complementação de aposentadoria de ferroviário da
extinta FEPASA é da Justiça Estadual:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. COMPLEMENTAÇÃO DE
APOSENTADORIA.FERROVIÁRIOSDA EXTINTAFEPASA.COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA
COMUM ESTADUAL. CONSONÂNCIA DA DECISÃO RECORRIDA COM A
JURISPRUDÊNCIA CRISTALIZADA NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RECURSO
EXTRAORDINÁRIO QUE NÃO MERECE TRÂNSITO. ANÁLISE DA LEGISLAÇÃO
INFRACONSTITUCIONAL. PROCEDIMENTO VEDADO NA INSTÂNCIA EXTRAORDINÁRIA.
ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 09.6.2008.
O entendimento adotado pela Corte de origem, nos moldes do que assinalado na decisão
agravada, não diverge da jurisprudência firmada no âmbito deste Supremo Tribunal Federal.
Entender de modo diverso demandaria a análise da legislação infraconstitucional aplicável à
espécie, o que torna oblíqua e reflexa eventual ofensa, insuscetível, portanto, de viabilizar o
conhecimento do recurso extraordinário.
As razões do agravo regimental não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que
lastrearam a decisão agravada.
Agravo regimental conhecido e não provido.
(STF, Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 859.828, Relatora MINISTRA ROSA
WEBER, publicado em 11/12/2014, Dje nº 242, destaques nossos)
No mesmo sentido:
“CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA.
EX - EMPREGADO DA FEPASA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. ALEGAÇÃO
DE DIREITO DECORRENTE DE RELAÇÃO DE TRABALHO CELETISTA. INOCORRÊNCIA.
COMPETÊNCIA FEDERAL. SUCESSÃO DA RFFSA, ADQUIRENTE DA FEPASA, PELA
UNIÃO. OBRIGAÇÃO DE PAGAMENTO DE PROVENTOS (E PENSÃO) A CARGO DA
FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO. CLÁUSULA CONTRATUAL FIRMADA NO
CONTRATO DE AQUISIÇÃO DA FEPASA PELA RFFSA. AUSÊNCIA DE INTERESSE DA
UNIÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM DO ESTADO DE SÃO PAULO.
1. Hipótese que retrata conflito negativo de competência em que é suscitante a 5ª Vara da
Fazenda Pública de São Paulo/SP e suscitado o 79ª Vara do Trabalho de São Paulo/SP, tendo
por objeto o julgamento de ação proposta contra a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos
– CPTM e a Fazenda Pública do Estado de São Paulo, na qual pensionista de ex -empregado
da Ferrovia Paulista S/A - FEPASA busca a equiparação da complementação do benefício com
os valores pagos a empregados da ativa que desempenham a mesma função então exercida
pelo ex -servidor ("monobrador"). 2. Para o juízo suscitante, como a questão cuida de eventual
direito trabalhista, decorrente de contrato de trabalho então regido pela CLT, a competência
seria da Justiça do Trabalho. Para o juízo suscitado, que invoca precedente do STF (RE
586.453), compete à Justiça Comum Estadual examinar questões que envolvam
complementação de aposentadoria por entidades de previdência privada. 3. Não se firma a
competência da Justiça do Trabalho. A discussão é de cunho previdenciário, pois trata de
complementação de pensão paga pela Fazenda Pública do Estado de São Paulo, decorrente de
lei estadual, não havendo falar -se em relação trabalho celetista, já extinta com a aposentadoria
do ex -empregado. O fato de o contrato de trabalho do empregado falecido ser regido pela CLT
não altera a compreensão da matéria, de cunho previdenciário estadual. 4. O ex -empregado do
qual a autora é pensionista, segundo a inicial, foi admitido na FEPASA - Ferrovia Paulista S/A,
em 02/1969, e aposentou-se em 02/1996, fazendo jus o benefício denominado
Complementação de Aposentadoria e Pensão, previsto nas Leis Estaduais nºs. 1.386/51,
1.974/52 e 4.819/58. 5. Não há nos autos discussão acerca da responsabilidade pelo
pagamento da pensão (e da complementação) buscada pela pensionista, encargo sempre
custeado pela Fazenda Pública do Estado de São Paulo, em razão do que a competência para
o processamento do ação de fundo é do juízo do Estado de São Paulo (suscitante). 6. A
RFFSA, ao adquirir a FEPASA do Estado de São Paulo, o fez com cláusula contratual fixando a
responsabilidade do Estado de São Paulo em relação a qualquer passivo que tenha como
causa fatos ocorridos anteriormente a dezembro de 1997, e pelo ônus financeiro relativo à
liquidação de processos judiciais promovidos, a qualquer tempo, por inativos da FEPASA e
pensionistas. 7. Antes do implemento dessa circunstância, ocorreu a aposentadoria (hoje
pensão) do empregado, custeada até hoje pela Fazenda Pública do Estado de São Paulo, uma
vez que a aposentadoria do ex-empregado se dera em fevereiro de 1996, antes, portanto, da
compra e venda das ações da FEPASA pela RFFSA. 8. A RFFSA, que havia adquirido a
FEPASA, veio a ser liquidada pela Lei n. 11.483/2007, tendo a União lhe sucedido nos direitos e
obrigações e ações judiciais em que fosse (a RFFSA) autora, ré, opoente, assistente ou terceira
interessada,conforme inciso I do art. 2º, a partir de janeiro de 2007. 9. Não há que cogitar,
portanto, de competência da Justiça Federal, na linha de precedente da 3ª Seção (EDcl no CC
105.228/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJe 06/05/2011). A Justiça
Federal não tem competência para julgar causa de complementação de pensão paga pela
Fazenda Pública Estadual, e nem haveria razão para que a União integrasse a discussão, que
não repercute na sua esfera jurídico -patrimonial. Não fora isso, a União não está (sequer
formalmente) na relação processual, diversamente do que ocorria no precedente citado. 10.
Conquanto a União haja sucedido a RFFSA em direitos e obrigações, é de se destacar que, ao
tempo em que a FEPASA fora adquirida pela RFFSA, o passivo da empresa, anterior a 1997 (a
aposentadoria, no caso, ocorreu em 02/1996), não integrou o negócio, de tal sorte que não
poderia a União, ao tempo que a sucedeu a RFFSA, assumir esse passivo, de há muito da
responsabilidade da Fazenda do Estado de São Paulo. 11. Não se trata de sobrepor a cláusula
contratual à Lei 11.483/2007, senão de aplicá-la a uma base empírica correta.
As cláusulas contratuais anteriores terão que ser respeitadas, a menos que a lei dissesse o
contrário. No tempo da lei, esse passivo, em virtude de contrato, não mais era da RFFSA, que
não estava obrigada a tais pagamentos. Não pode a União sucedê-la em uma obrigação
inexistente. 12. Conflito de competência conhecido, para declarar competente a 5ª Vara da
Fazenda Pública de São Paulo/SP, juízo suscitante." (CC 136.786/SP, Rel. Ministro OLINDO
MENEZES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO), PRIMEIRA SEÇÃO,
julgado em 26/08/2015, DJe 14/09/2015)
A matéria foi objeto de julgamento pela Turma Regional de Uniformização de Interpretação de
Lei Federal (processo n. 0000021-89.2020.4.03.9300, Relator Juiz Federal David Rocha Lima
de Magalhães e Silva, julgado em 17/08/2020, publicado em 31/08/2020), em que foi firmada a
seguinte tese:
União é parte ilegítima para figurar no polo passivo das demandas intentadas por aposentados
ou pensionistas da extinta Ferrovia Paulista S/A. - FEPASA, absorvidos pela também extinta
Rede Ferroviária Federal S/A. - RFFSA, que envolvam a complementação de proventos de
aposentadorias ou pensões arrimadas nas Leis Federais 8.186/91 e 10.478/02, na Lei do
Estado de São Paulo 9.343/96, e especialmente no Dissídio Coletivo 92590/2003-000-00-00.0.,
que trata do reajuste salarial de 14% para os ex-ferroviários da Rede Ferroviária Federal S/A. -
RFFSA.
Posto isso, declaro, de ofício, a ilegitimidade da União Federal, determinando a sua exclusão do
polo passivo, bem como anulo a sentença, por incompetência absoluta da Justiça Federal,
declarando prejudicado o recurso interposto pela Fazenda do Estado de São Paulo e
determinando a remessa dos autos à Vara da Fazenda Pública da Comarca de Araraquara/SP,
nos termos dos §§1º e 3º do art. 64 do CPC/2015.
Sem honorários advocatícios (artigo 55, caput, da Lei nº 9.099/95).
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSO CIVIL. FERROVIÁRIO. PENSÃO POR MORTE.
COMPLEMENTAÇÃO.APOSENTADORIA DE FERROVIÁRIO DA EXTINTA FEPASA.
COMPETÊNCIA JUSTIÇA ESTADUAL. ILEGITIMIDADE DA UNIÃO FEDERAL E DO INSS.
SENTENÇA ANULADA, DE OFÍCIO, POR INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DA JUSTIÇA
FEDERAL,COM REMESSA DOS AUTOS À VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE
ARARAQUARA, NOS TERMOSDOS §§ 1º E 3º DO ART. 64 DO CPC/2015.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma decidiu,
por unanimidade, anular a sentença, por incompetência absoluta da Justiça Federal, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA