Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5030105-93.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
29/07/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 31/07/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO RETIDO NÃO CONHECIDO.
CERCEAMENTO DE DEFESA. JULGAMENTO CONFORME O ESTADO. DESNECESSIDADE
DE MAIS PROVAS. REVISÃO DA RMI DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE
SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. LABOR EM
LAVOURA CANAVIEIRA. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. JUROS E CORREÇÃO
MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. SUCUMBÊNCIA MÍNIMA DO
INSS.
1. Agravo retido não conhecido, nos termos do artigo 523, § 1º, do CPC/73, vigente à época da
interposição.
2. Alegação de cerceamento de defesa afastada. Documentos hábeis à comprovação das
condições de trabalho.
3. São requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com
os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições, ressaltando-se
que o tempo de serviço prestado anteriormente à Emenda Constitucional 20/98 equivale a tempo
de contribuição, a teor do seu art. 4º.
4. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o
reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua
demonstração.
5. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da
atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico previdenciário (a
partir de 11/12/97).
6. A atividade do trabalhador rural na cultura de cana-de-açúcar encontra enquadramento no
código 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64. É do senso comum que o plantio e a colheita de cana-de-
açúcar, assim como o trato posterior, requerem intensa atividade física do rurícola, que está
associada a riscos ergonômicos e a riscos de acidentes na operação de equipamentos, bem
como na manipulação de insumos, além da factível exposição habitual e permanente a agentes
químicos (pesticidas, herbicidas e inseticidas).
7. A jurisprudência se consolidou no sentido de que a exposição à intempéries da natureza não
tem o condão de caracterizar a atividade agropecuária como insalubre.
8. Reconhecidas as atividades especiais, deve o INSS proceder ao recálculo da renda mensal
inicial (RMI) do benefício da parte autora.
9. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a
elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-
se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa
Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947,
tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
10. Sucumbência mínima do INSS. Condenação da parte autora ao pagamento de honorários.
Aplicação da regra do parágrafo único do artigo 86 do Código de Processo Civil/2015.
11. Agravo retido não conhecido. Preliminar rejeitada e, no mérito, apelação da parte autora
parcialmente provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5030105-93.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: MARIA DERCI MIGUEL MARCHESINI
Advogados do(a) APELANTE: JOSE DARIO DA SILVA - SP142170-A, DARIO ZANI DA SILVA -
SP236769-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5030105-93.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: MARIA DERCI MIGUEL MARCHESINI
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SP236769-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação em que se pleiteia a conversão da aposentadoria por tempo de
serviço/contribuição em aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de período(s)
laborado(s) em atividades especiais (01.04.79 a 28.05.79, 03.03.80 a 30.06.81, 01.04.82 a
30.04.82, 16.02.83 a 08.08.92, 10.08.92 a 10.12.2007 e de 21.01.2008 a 27.12.2008), com
pedido subsidiário de revisão da RMI do benefício.
O MM. Juiz a quo deferiu o pedido de realização da prova pericial, decisão contra a qual o INSS
interpôs agravo retido (ID 4642148), tendo o perito nomeado declinado de sua nomeação (ID
4642158).
Conclusos os autos para sentença, o MM. Juiz a quo reconsiderou a decisão anteriormente
exarada para entender desnecessária a produção da prova pericial, diante da documentação
colacionada aos autos, e julgou improcedente o pedido, condenando a parte autora ao
pagamento de honorários de advogado, fixados em R$ 973,00 (novecentos e setenta e três
reais), observada a concessão da gratuidade.
Apela a parte autora requerendo, preliminarmente, o conhecimento do agravo retido e arguindo
cerceamento de defesa, ante a necessidade da realização da perícia. No mérito, pugna pela
reforma da sentença e pelo acolhimento integral do pedido exordial.
Sem contrarrazões.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5030105-93.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: MARIA DERCI MIGUEL MARCHESINI
Advogados do(a) APELANTE: JOSE DARIO DA SILVA - SP142170-A, DARIO ZANI DA SILVA -
SP236769-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
De pronto, não conheço do agravo retido interposto pelo INSS, nos termos do artigo 523, § 1º, do
CPC/73, vigente à época da interposição. A propósito, equivoca-se a apelante ao sustentar ter
interposto recurso de agravo retido.
Preliminarmente, afasto a alegação de cerceamento de defesa, posto que, no caso dos autos, os
documentos acostados são, em tese, hábeis à comprovação das condições de trabalho do autor
na época pretendida.
O documento contemporâneo ao contrato de trabalho demonstra quais eram os eventuais fatores
de riscos ambientais a que estava exposto o autor e, atualmente, a realização de perícia ou outra
prova não seria capaz de contradizê-lo ou demonstrar com tanta fidedignidade quais eram as
condições de trabalho àquela época.
A propósito, registre-se que a especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero
enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de
informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil
profissiográfico previdenciário (a partir de 11/12/97).
Consoante dispõe o art. 373, I, do CPC/2015, o ônus probatório quanto aos fatos alegados cabe à
parte autora, de modo que no caso, cabe ao autor diligenciar visando à obtenção dos documentos
necessários, comprobatórios da especialidade alegada, ante a negativa da empresa no seu
fornecimento, valendo-se, inclusive, se considerar necessário/conveniente, de ação autônoma
para tanto.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do(s) recurso(s) de apelação.
Passo ao exame do mérito.
Aposentadoria Especial
A aposentadoria por tempo de serviço especial teve assento primeiro no artigo 31 da Lei nº 3.807,
de 26 de agosto de 1960, Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS, que estabeleceu que seria
concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinquenta) anos de idade e 15 (quinze)
anos de contribuições, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco)
anos, conforme a atividade profissional, em serviços que, para esse efeito, fossem considerados
penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo.
Prevê ainda, o mencionado diploma legal, no art. 162, o reconhecimento de atividade especial
prestada em data anterior à sua edição, na hipótese de seu cômputo ser mais benéfico ao
segurado.
Como assentado pelas Cortes Superiores "tal hipótese, apesar de similar, não se confunde com a
questão da legislação aplicável ao caso de concessão de aposentadoria, tampouco com aquela
que diz respeito à possibilidade de aplicação retroativa da lei nova que estabeleça restrição ao
cômputo do tempo de serviço. (...) Interpretação diversa levaria à conclusão de que o segurado,
sujeito a condições insalubres de trabalho, só teria direito à aposentadoria especial após 15, 20 e
25 anos de trabalho exercida depois da Lei nº 3.807/60, desconsiderando, portanto, todo o
período de labor, também exercido em tal situação, porém em data anterior à lei de regência" (Ag
Rg no REsp nº 1015694, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza Assis de Moura, DJe 01/02/2011)
Essa norma foi expressamente revogada pela Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973, que passou a
discipliná-la no artigo 9º, alterando, em efeitos práticos, apenas o período de carência de 15
(quinze) anos para 5 (cinco) anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
Sobreveio, então, o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, reclassificando as atividades
profissionais segundo os agentes nocivos e os grupos profissionais tidos por perigosos,
insalubres ou penosos, com os respectivos tempos mínimos de trabalho.
Importante ressaltar que os Decretos nºs. 53.831/64 e 83.080/79 tiveram vigências simultâneas,
de modo que, conforme reiteradamente decidido pelo C. STJ, havendo colisão entre as
mencionadas normas, prevalece a mais favorável ao segurado. (REsp nº 412351, 5ª Turma, Rel.
Min. Laurita Vaz, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, pág. 355).
As atividades insalubres previstas nas aludidas normas são meramente exemplificativas, podendo
outras funções ser assim reconhecidas, desde que haja similitude em relação àquelas legalmente
estatuídas ou, ainda, mediante laudo técnico-pericial demonstrativo da nocividade da ocupação
exercida. Nesse sentido, o verbete 198 da Súmula do TFR.
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, a matéria passou a ser prevista no inciso II
do artigo 202 e disciplinada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação original previa que o
benefício de aposentadoria especial seria devido ao segurado que, após cumprir a carência
exigida, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a
atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade
física, restando assegurada, ainda, a conversão do período trabalhado no exercício de atividades
danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em seguida, foi editada a Lei nº 9.032/95, alterando o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, dispondo que
a partir desse momento não basta mais o mero enquadramento da atividade exercida pelo
segurado na categoria profissional considerada especial, passando a ser exigida a demonstração
da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, que poderá
se dar por meio da apresentação de informativos e formulários, tais como o SB-40 ou o DSS-
8030.
Posteriormente, com a edição do Decreto n.º 2.172, de 05/03/1997, que estabeleceu requisitos
mais rigorosos para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos,
passou-se a exigir-se a apresentação de laudo técnico para a caracterização da condição
especial da atividade exercida. Todavia, por se tratar de matéria reservada à lei, tal exigência
apenas tem eficácia a partir da edição da Lei n.º 9.528, de 10/12/1997.
Cumpre observar que a Lei nº 9528/97 também passou a aceitar o Perfil Profissiográfico
Previdenciário, documento que busca retratar as características de cada emprego do segurado,
de forma a facilitar a futura concessão de aposentadoria especial. Assim, identificado no
documento o perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, é possível a sua
utilização para comprovação da atividade especial em substituição ao laudo pericial.
Ressalto que no tocante ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e à
forma da sua demonstração, deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do
trabalho, conforme jurisprudência pacificada da matéria (STJ - Pet 9.194/PR, Rel. Ministro
ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
A extemporaneidade do documento comprobatório das condições especiais de trabalho não
prejudica o seu reconhecimento como tal, "pois a situação em época remota era pior ou ao
menos igual a constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do
ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica." (Des. Fed. Fausto De Sanctis,
AC nº 2012.61.04.004291-4, j. 07/05/2014)
Especificamente em relação ao ruído, o Decreto nº 53.831/64 considerava insalubre o labor
desempenhado com exposição permanente a ruído acima de 80 dB; já o Decreto nº 83.080/79
fixava a pressão sonora em 90 dB. Na medida em que as normas tiveram vigência simultânea,
prevalece disposição mais favorável ao segurado (80 dB).
Com a edição do Decreto nº 2.172/97, a intensidade de ruído considerada para fins de
reconhecimento de insalubridade foi elevada para 90 dB, mas, em 2003, essa medida foi reduzida
para 85 dB, por meio do Decreto nº 4.882, de 18 de novembro de 2003.
Até 09 de outubro de 2013, os Tribunais adotavam o enunciado pela Súmula nº 32 da TNU.
Contudo, esta Súmula foi cancelada em decorrência do julgamento da PET 9059 pelo Superior
Tribunal de Justiça (Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJe
09/09/2013) cujo entendimento foi sufragado no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Ministro
Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), sob a sistemática dos
recursos repetitivos.
Em relação ao agente ruído, vigora o princípio do tempus regit actum. Considera-se especial a
atividade desenvolvida acima do limite de 80dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº
2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90dB
até 18/11/2003, quando foi editado o Decreto nº 4882/2003. A partir de 19/11/2003 o limite
passou a ser de 85 dB.
Saliente-se que a especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento
legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou
formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico
previdenciário (a partir de 11/12/97).
É corrente em nossos tribunais a tese de que sempre se exigiu laudo técnico para comprovar a
exposição do trabalhador aos agentes físicos ruído e calor em níveis superiores aos limites
máximos de tolerância. Entretanto, no tocante às atividades profissionais exercidas até 10/12/97 -
quando ainda não havia a exigência legal de laudo técnico -, essa afirmação deve ser
compreendida, não na literalidade, mas no sentido de ser necessário o atesto efetivo e seguro
dos níveis de intensidade dos agentes nocivos a que o trabalhador esteve exposto durante sua
jornada laboral.
Logo, para as atividades profissionais exercidas até 10/12/97, é suficiente que os documentos
apresentados façam expressa menção aos níveis de intensidade dos agentes nocivos.
Uso de equipamento de proteção individual - EPI, como fator de descaracterização do tempo de
serviço especial
A questão foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do ARE nº 664335, da
relatoria do E. Ministro Luiz Fux, com reconhecimento de repercussão geral, na data de
04.12.2014, em que restou decidido que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva
exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente
capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional ao reconhecimento das
atividades especiais.
Restou assentado também que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico
Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não
descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
O fato de a empresa fornecer equipamento de proteção individual - EPI para neutralização dos
agentes agressivos não afasta, por si só, a contagem do tempo especial, pois cada caso deve ser
examinado em suas peculiaridades, comprovando-se a real efetividade do aparelho e o uso
permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. Precedentes do Superior Tribunal de
Justiça (REsp 1428183/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 25/02/2014,
DJe 06/03/2014).
Ainda, conforme a jurisprudência citada, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído,
desde que em níveis acima dos limites legais, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de
Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até
no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao
organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas.
Caso concreto - elementos probatórios
Pleiteia a parte autora por meio desta ação a conversão da aposentadoria por tempo de
serviço/contribuição em aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de período(s)
laborado(s) em atividades especiais (01.04.79 a 28.05.79, 03.03.80 a 30.06.81, 01.04.82 a
30.04.82, 16.02.83 a 08.08.92, 10.08.92 a 10.12.2007 e de 21.01.2008 a 27.12.2008), com
pedido subsidiário de revisão da RMI do benefício.
De início, verifica-se que a controvérsia cinge-se à especialidade das atividades trabalhadas no(s)
período(s) de 01.04.79 a 28.05.79, 03.03.80 a 30.06.81, 01.04.82 a 30.04.82, 16.02.83 a
08.08.92, 10.08.92 a 10.12.2007 e de 21.01.2008 a 27.12.2008 (objeto de impugnação no apelo
da parte autora).
Com relação ao(s) período(s) de 01.04.79 a 28.05.79, laborado na função de trabalhador
rural/agrícola, junto à Valentim Gazole (ID 4642137/6), 03.03.80 a 30.06.81, laborado na função
de trabalhador rural/serviços rurais, junto à Emp. Gregio S/C Ltda. (ID 4642137/6), 01.04.82 a
30.04.82, laborado na função de trabalhador rural/serviços rurais, junto à Emp. Manfrinato Ltda.
(ID 4642137/6) e de 16.02.83 a 08.08.92, laborado na função de trabalhador rural/mão de obra
rural, junto à SERV – Serviços Agrícolas S/C Ltda. (ID 4642137/6), inviável o reconhecimento
como especiais, por enquadramento pela categoria profissional, ante a ausência de previsão legal
da(s) ocupação(ões) na legislação de regência da matéria (Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79),
bem assim por não restar comprovada a exposição habitual e permanente a quaisquer agentes
nocivos, inexistindo sequer descrição nos autos acerca das atividades efetivamente exercidas
pela parte autora, sendo a(s) anotação(ões) em CTPS documento(s) insuficiente(s) à
comprovação do labor em condições especiais.
Com relação ao período de 10.08.92 a 28.04.95, laborado na função de trabalhador rural/serviços
agrícolas, junto à Ag. Aquidaban Ltda., o documento (PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário
) (ID 4642137/8-9) comprova o labor exercido em lavoura canavieira.
No julgamento do Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei n.º 452/PE, o Superior
Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de não ser possível equiparar a categoria
profissional de agropecuária, constante no item 2.2.1 do Anexo ao Decreto n.º 53.831/1964, à
atividade exercida pelo empregado rural na lavoura da cana-de-açúcar:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE
ESPECIAL. EMPREGADO RURAL. LAVOURA DA CANA-DE-AÇÚCAR. EQUIPARAÇÃO.
CATEGORIA PROFISSIONAL. ATIVIDADE AGROPECUÁRIA. DECRETO 53.831/1964.
IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES.
1. Trata-se, na origem, de Ação de Concessão de Aposentadoria por Tempo de Contribuição em
que a parte requerida pleiteia a conversão de tempo especial em comum de período em que
trabalhou na Usina Bom Jesus (18.8.1975 a 27.4.1995) na lavoura da cana-de-açúcar como
empregado rural.
2. O ponto controvertido da presente análise é se o trabalhador rural da lavoura da cana-de-
açúcar empregado rural poderia ou não ser enquadrado na categoria profissional de trabalhador
da agropecuária constante no item 2.2.1 do Decreto 53.831/1964 vigente à época da prestação
dos serviços.
3. Está pacificado no STJ o entendimento de que a lei que rege o tempo de serviço é aquela
vigente no momento da prestação do labor. Nessa mesma linha: REsp 1.151.363/MG, Rel.
Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011; REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman
Benjamin, Primeira Seção, DJe 19.12.2012, ambos julgados sob o regime do art. 543-C do CPC
(Tema 694 - REsp 1398260/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 5/12/2014).
4. O STJ possui precedentes no sentido de que o trabalhador rural (seja empregado rural ou
segurado especial) que não demonstre o exercício de seu labor na agropecuária, nos termos do
enquadramento por categoria profissional vigente até a edição da Lei 9.032/1995, não possui o
direito subjetivo à conversão ou contagem como tempo especial para fins de aposentadoria por
tempo de serviço/contribuição ou aposentadoria especial, respectivamente. A propósito: AgInt no
AREsp 928.224/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 8/11/2016; AgInt no
AREsp 860.631/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 16/6/2016;
REsp 1.309.245/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 22/10/2015; AgRg no
REsp 1.084.268/SP, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJe 13/3/2013; AgRg no
REsp 1.217.756/RS, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, DJe 26/9/2012; AgRg nos EDcl no
AREsp 8.138/RS, Rel. Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, DJe 9/11/2011; AgRg no REsp
1.208.587/RS, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 13/10/2011; AgRg no REsp
909.036/SP, Rel. Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, DJ 12/11/2007, p. 329; REsp 291. 404/SP,
Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJ 2/8/2004, p. 576.
5. Pedido de Uniformização de Jurisprudência de Lei procedente para não equiparar a categoria
profissional de agropecuária à atividade exercida pelo empregado rural na lavoura da cana-de-
açúcar."
(STJ, 1ª Seção, PUIL 452, relator Ministro Herman Benjamin, j. 08.05.2019, DJe 14.06.2019)
Assim, incabível o reconhecimento da atividade especial do trabalhador da lavoura de cana com
base exclusivamente na categoria profissional.
Contudo, ainda é possível o reconhecimento da especialidade do trabalho na lavoura de cana de
açúcar, em se verificando a condição insalubre do trabalho na cultura canavieira.
Essa atividade, descrita no Código 6221-10 da Classificação Brasileira de Ocupações, engloba
tarefas diversificadas e extenuantes. E é do senso comum que o plantio e a colheita de cana-de-
açúcar, assim como o trato posterior, requerem intensa atividade física do rurícola, que está
associada a riscos ergonômicos e a riscos de acidentes na operação de equipamentos, bem
como na manipulação de insumos, além da factível exposição habitual e permanente a agentes
químicos (pesticidas, herbicidas e inseticidas), o que autoriza o enquadramento no código 1.2.11
do Decreto nº 53.831/64.
Reconheço, assim a especialidade do(s) período(s) compreendido(s) entre 10.08.92 a 28.04.95.
No pertinente ao período de 29.04.95 a 10.12.2007, laborado na função de trabalhador
rural/serviços agrícolas, junto à Ag. Aquidaban Ltda., inviável o reconhecimento como especial,
porquanto embora o documento (PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário) (ID 4642137/8-9)
aponte a exposição à radiação solar, a jurisprudência se consolidou no sentido de que a
exposição às intempéries da natureza (sol, frio, chuva, vento, poeira) não tem o condão de
caracterizar a atividade agropecuária como insalubre.
Verifica-se igualmente a inviabilidade do reconhecimento como especial(is) do período de
21.01.2008 a 27.12.2008, laborado na função de trabalhador rural, junto à COSAN S/A, tendo em
vista a necessidade de aferição da intensidade efetiva da exposição ao agente nocivo calor, a que
a parte autora estava sujeita, não bastando a simples menção ao agente “calor", constante do
documento (PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário) (ID 4642178).
Verifica-se que a soma do período especial aqui reconhecido (10.08.92 a 28.04.95) não redunda
no total de mais de 25 anos de tempo de serviço especial, o que impede a conversão da
aposentadoria por tempo de serviço/contribuição em aposentadoria especial, nos termos do art.
57 da Lei nº 8.213/91.
Assim, deve o INSS proceder ao recálculo da renda mensal inicial (RMI) do benefício da parte
autora (NB nº 42/149.655.560-8), considerando-se o reconhecimento da especialidade das
atividades exercidas no(s) período(s) de 10.08.92 a 28.04.95.
São devidas as diferenças decorrentes do recálculo de sua RMI desde a data do requerimento
administrativo em 01.07.2010, uma vez que a parte autora demonstrou que já havia preenchido
os requisitos necessários ao reconhecimento das atividades especiais desde então.
Acresça-se, no pertinente à fixação do termo inicial do benefício, jurisprudência consolidada do
Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que “[...] o termo inicial dos efeitos financeiros da
revisão de benefício previdenciário deve retroagir à data da concessão do benefício, uma vez que
o deferimento da ação revisional representa o reconhecimento tardio de um direito já incorporado
ao patrimônio jurídico do segurado” (REsp nº 1.732.289/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin,
Segunda Turma, julgado em 24/4/2018, DJe 21/11/2018). No mesmo sentido: REsp nº
1745509/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 11/06/2019,
DJe 14/06/2019.
Ressalte-se a inocorrência da prescrição quinquenal (artigo 103, §único, da Lei n° 8.213/91), à
vista da concessão do benefício em 16.09.2010 (ID 4642137/10) e da propositura da presente
ação em 2014.
As parcelas vencidas deverão ser corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos
índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal
vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a
aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário
do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em
20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
Nesse passo, acresço que os embargos de declaração opostos perante o STF contra tal julgado
tem por objetivo único a modulação dos seus efeitos para atribuição de eficácia prospectiva, pelo
que o excepcional efeito suspensivo concedido por meio da decisão proferida em 24.09.2018 e
publicada no DJE de 25.09.2018, surtirá efeitos apenas no tocante à definição do termo inicial da
incidência do IPCA-e, que deverá ser observado quando da liquidação do julgado.
Nesse passo, no que tange aos honorários de advogado, verifico que o INSS sucumbiu em parte
mínima do pedido.
Assim, com fulcro no parágrafo único do artigo 86 do Código de Processo Civil/2015, condeno a
parte autora ao pagamento de honorários de advogado ao INSS, que ora fixo em R$ 1.000,00
(um mil reais), de acordo com o §8º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, cuja
exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à
hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
Ante o exposto, não conheço do agravo retido, rejeito a preliminar de cerceamento de defesa e,
no mérito, dou parcial provimento à apelação da parte autora, para reconhecer o labor em
condições especiais no período de 10.08.92 a 28.04.95 e determinar ao INSS a revisão da RMI
de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição e o pagamento das diferenças decorrentes
do recálculo desde a data do requerimento administrativo, fixando os consectários legais nos
termos explicitados.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO RETIDO NÃO CONHECIDO.
CERCEAMENTO DE DEFESA. JULGAMENTO CONFORME O ESTADO. DESNECESSIDADE
DE MAIS PROVAS. REVISÃO DA RMI DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE
SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. LABOR EM
LAVOURA CANAVIEIRA. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. JUROS E CORREÇÃO
MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. SUCUMBÊNCIA MÍNIMA DO
INSS.
1. Agravo retido não conhecido, nos termos do artigo 523, § 1º, do CPC/73, vigente à época da
interposição.
2. Alegação de cerceamento de defesa afastada. Documentos hábeis à comprovação das
condições de trabalho.
3. São requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com
os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições, ressaltando-se
que o tempo de serviço prestado anteriormente à Emenda Constitucional 20/98 equivale a tempo
de contribuição, a teor do seu art. 4º.
4. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o
reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua
demonstração.
5. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da
atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no
período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico previdenciário (a
partir de 11/12/97).
6. A atividade do trabalhador rural na cultura de cana-de-açúcar encontra enquadramento no
código 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64. É do senso comum que o plantio e a colheita de cana-de-
açúcar, assim como o trato posterior, requerem intensa atividade física do rurícola, que está
associada a riscos ergonômicos e a riscos de acidentes na operação de equipamentos, bem
como na manipulação de insumos, além da factível exposição habitual e permanente a agentes
químicos (pesticidas, herbicidas e inseticidas).
7. A jurisprudência se consolidou no sentido de que a exposição à intempéries da natureza não
tem o condão de caracterizar a atividade agropecuária como insalubre.
8. Reconhecidas as atividades especiais, deve o INSS proceder ao recálculo da renda mensal
inicial (RMI) do benefício da parte autora.
9. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a
elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-
se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa
Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947,
tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
10. Sucumbência mínima do INSS. Condenação da parte autora ao pagamento de honorários.
Aplicação da regra do parágrafo único do artigo 86 do Código de Processo Civil/2015.
11. Agravo retido não conhecido. Preliminar rejeitada e, no mérito, apelação da parte autora
parcialmente provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu não conhecer do agravo retido, rejeitar a preliminar de cerceamento de
defesa e, no mérito, dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
