
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000150-30.2021.4.03.6113
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: ANDREA MENDONCA GOMES TENTONI
Advogados do(a) APELANTE: ADONIS AUGUSTO OLIVEIRA CALEIRO - SP338515-A, JOSE CARLOS THEO MAIA CORDEIRO - SP74491-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000150-30.2021.4.03.6113
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: ANDREA MENDONCA GOMES TENTONI
Advogados do(a) APELANTE: ADONIS AUGUSTO OLIVEIRA CALEIRO - SP338515-A, JOSE CARLOS THEO MAIA CORDEIRO - SP74491-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Trata-se de ação ordinária em que se objetiva a concessão de aposentadoria especial ou subsidiariamente aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante o reconhecimento de período(s) trabalhado(s) na qualidade de aluno aprendiz (18.01.93 a 22.12.95), estagiário (03.01.96 a 28.06.96) e em atividades especiais (01.01.86 a 24.07.89, 01.08.89 a 14.06.93, 27.10.93 a 28.12.95, 19.07.96 a 01.08.97, 01.10.97 a 20.04.98, 08.06.98 a 10.06.98, 01.07.98 a 10.07.99, 03.01.2000 a 16.12.2003, 05.01.2004 a 06.04.2004, 03.05.2004 a 09.04.2012, 16.04.2012 a 26.03.2013, 22.10.2013 a 05.11.2015, 02.02.2016 a 14.04.2016, 30.11.2016 a 06.09.2017, 13.11.2017 a 11.07.2018 e de 12.07.2018 a 12.08.2022).
Noticiado nos autos o falecimento do autor (ID 278366937), foi homologada a habilitação da herdeira viúva (ID 2278367015).
A sentença extinguiu o processo sem resolução do mérito com relação aos períodos de 01.01.86 a 24.07.89, 27.10.93 a 28.12.95, 19.07.96 a 01.08.97, 01.10.97 a 20.04.98, 08.06.98 a 10.06.98, 01.07.98 a 10.07.99, 02.02.2016 a 14.04.2016, 30.11.2016 a 06.09.2017 e de 12.07.2018 a 12.08.2022, objeto de avaliação em perícia técnica, ao fundamento de que a prova pericial não teria sido submetida ao crivo administrativo do INSS e violaria a exigência de prévio requerimento administrativo, na forma estabelecida no julgamento do tema 350/STF; julgou improcedente o pedido quanto aos demais períodos (01.08.89 a 14.06.93, 03.01.2000 a 16.12.2003, 05.01.2004 a 06.04.2004, 03.05.2004 a 09.04.2012, 16.04.2012 a 26.03.2013, 22.10.2013 a 05.11.2015, 13.11.2017 a 11.07.2018), inclusive àqueles laborados como aluno aprendiz e estagiário. Consignou a insuficiência de tempo a viabilizar a concessão da aposentadoria especial, tampouco da integral e dos benefícios previstos nas regras de transição da EC 103/2019 e condenou a parte autora ao pagamento de honorários de advogado, fixados em 10% do valor atualizado da causa, observada a concessão da gratuidade. Não houve condenação em custas.
Apela a parte autora arguindo, preliminarmente, cerceamento de defesa. Sustenta não ter sido redesignada a audiência anteriormente marcada, com vistas ao reconhecimento de períodos laborados como aluno aprendiz e estagiário; a prova pericial não pode ser desconsiderada, sobretudo considerando-se a demonstração nos autos acerca do encerramento das atividades de várias das empresas integrantes do polo calçadista de Franca, nas quais laborou o autor. No mérito, pugna pelo reconhecimento do labor em condições especiais, assim como aluno aprendiz e estagiário no(s) período(s) pleiteados e acolhimento integral do pedido exordial.
Sem contrarrazões (ID 278367037).
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000150-30.2021.4.03.6113
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: ANDREA MENDONCA GOMES TENTONI
Advogados do(a) APELANTE: ADONIS AUGUSTO OLIVEIRA CALEIRO - SP338515-A, JOSE CARLOS THEO MAIA CORDEIRO - SP74491-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: No julgamento pelo E. STF do RE 631.240/MG (tema 350/STF), foi firmada a seguinte tese: “I - A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas; II – A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado; III – Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo – salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração –, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão;” (...)
Destarte, apresentado o prévio requerimento administrativo antes da propositura da ação judicial, presente o interesse processual. Neste sentido: “Inexiste falta de interesse de agir em razão da apresentação de documento novo na demanda.” (ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0001695-18.2016.4.03.6140, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 03/02/2022, DJEN DATA: 08/02/2022)
Outrossim, a apresentação de contestação de mérito à pretensão deduzida em juízo configura resistência ao provimento jurisdicional pleiteado, apta a afastar a alegação de falta de interesse de agir.
No mesmo sentido, cito os seguintes precedentes jurisprudenciais desta Corte: 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0000629-48.2016.4.03.6125, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 17/11/2023, DJEN DATA: 22/11/2023; ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0005098-08.2019.4.03.6328, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 17/11/2023, DJEN DATA: 21/11/2023; ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000980-14.2021.4.03.6107, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 25/10/2023, DJEN DATA: 06/11/2023; 8ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5002041-15.2023.4.03.6114, Rel. Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA, julgado em 03/10/2023, DJEN DATA: 09/10/2023.
Destarte, não vislumbro a falta de interesse de agir. Improcede o argumento no sentido de que a realização de prova pericial em primeiro grau, cujo laudo não teria sido submetido ao crivo administrativo do INSS, corresponderia à ausência de prévio requerimento administrativo e violação da tese firmada no julgamento do tema 350/STF.
Ao revés, a produção de provas visa à formação do convencimento do magistrado, a quem compete, consoante o art. 370 do CPC, "de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito”.
Embora o pedido de reconhecimento de labor exercido em condições especiais seja analisado, via de regra, mediante informações contidas em formulários e laudos técnicos elaborados pelo empregador, inexiste óbice a que o conjunto probatório seja suprido por perícia técnica judicial.
Acresça-se que, no caso, há prova da apresentação de requerimento administrativo de concessão de benefício (NB 42/195.486.097-5), indeferido em 07.01.2020 (ID 278366801/92-95), o que motivou a propositura em 02.02.2021 da presente demanda. Reputo demonstrado o interesse processual e afasto, por conseguinte, a extinção do processo sem resolução do mérito com relação aos períodos de 01.01.86 a 24.07.89, 27.10.93 a 28.12.95, 19.07.96 a 01.08.97, 01.10.97 a 20.04.98, 08.06.98 a 10.06.98, 01.07.98 a 10.07.99, 02.02.2016 a 14.04.2016, 30.11.2016 a 06.09.2017 e de 12.07.2018 a 12.08.2022.
Entretanto, estando o processo em condições de imediato julgamento, instruído com a documentação juntada aos autos pelo autor, bem como laudo pericial, conjunto probatório produzido sob contraditório das partes, aplico a regra do art. 1.013, § 3º, III, da norma processual.
Infere-se dos autos que foi designada audiência, inicialmente para 04.04.2022, com vistas à comprovação de períodos laborados como aluno aprendiz (18.01.93 a 22.12.95) e estagiário (03.01.96 a 28.06.96) (ID 278366871), a qual foi remarcada para outras datas em reiteradas oportunidades (ID 278366885, 278366894, 278366895, 278366901).
Por decisão de 28.06.2022 (ID 278366928), o MM. Juiz a quo cancelou a realização da audiência e suspendeu o processo por 60 dias, diante do relatório médico apresentado nos autos acerca da internação do autor em hospital, da qual a parte autora manifestou ciência, comprometendo-se a informar o juízo sobre sua recuperação (ID 278366930).
Noticiado nos autos o falecimento do autor (ID 278366932), foi homologada a habilitação da herdeira viúva, tendo o MM. Juiz a quo consignado, na decisão de ID 278367015, que “ (...) Para comprovação do trabalho como aluno aprendiz e estagiário, juntou o autor, no procedimento administrativo, os seguintes documentos: certidão emitida pela ETEC Dr. Júlio Cardoso, certidão de estágio emitida pela empresa Furnas Centrais Elétricas S.A. e cópia do contrato de estágio de complementação educacional, com a empresa Furna Centrais Elétricas S.A.”.
A parte autora manifestou em 29.03.2023, de forma expressa, ciência da decisão de ID 278367015 (ID 278367018), pugnando tão somente pelo prosseguimento do feito, deixando de requerer a produção da prova oral, a qual restou preclusa. Não se cogita, assim, de cerceamento de defesa.
Passo ao exame do mérito.
Aposentadoria por tempo de serviço/contribuição – requisitos
A aposentadoria por tempo de serviço, atualmente denominada aposentadoria por tempo de contribuição, admitia a forma proporcional e a integral antes do advento da Emenda Constitucional 20/98, fazendo jus à sua percepção aqueles que comprovem tempo de serviço (25 anos para a mulher e 30 anos para o homem na forma proporcional, 30 anos para a mulher e 35 anos para o homem na forma integral) desenvolvido totalmente sob a égide do ordenamento anterior, respeitando-se, assim, o direito adquirido.
Aqueles segurados que já estavam no sistema e não preencheram o requisito temporal à época da Emenda Constitucional 20 de 15 de dezembro de 1998, fazem jus à aposentadoria por tempo de serviço proporcional desde que atendam às regras de transição expressas em seu art. 9º, caso em que se conjugam o requisito etário (48 anos de idade para a mulher e 53 anos de idade para o homem) e o requisito contributivo (pedágio de 40% de contribuições faltantes para completar 25 anos, no caso da mulher e para completar 30 anos, no caso do homem).
Assim, até a edição da EC 103/2019, eram requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições (30 anos para a mulher e 35 anos para o homem), ressaltando-se que o tempo de serviço prestado anteriormente à referida Emenda equivale a tempo de contribuição, a teor do art. 4º da Emenda Constitucional 20/98.
Cômputo do tempo de serviço prestado como aluno-aprendiz
De acordo com a Súmula nº 96 do TCU, o tempo de atividade como aluno-aprendiz, em escola técnica profissional, remunerado pela União mediante auxílios financeiros que se revertiam em forma de alimentação, fardamento e material escolar, deve ser computado para fins previdenciários:
"Conta-se para todos os efeitos, como tempo de serviço público, o período de trabalho prestado na qualidade de aluno-aprendiz, em Escola Pública Profissional, desde que comprovada retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida como execução de encomenda para terceiros."
No mesmo sentido, o STJ já decidiu no REsp. 202.525 PR, Min. Felix Fischer; REsp. 203.296 SP, Min. Edson Vidigal; REsp. 200.989 PR, Min. Gilson Dipp; REsp. 182.281 SP, Min. Hamilton Carvalhido.
Ressalto, ainda, que a contagem do tempo de serviço prestado nas escolas técnicas com base no Decreto-lei n. 4.073, de 30.01.42, está prevista no inciso XXI do art. 58 do Regulamento de Benefícios da Previdência Social, aprovado pelo D. 611, de 21.07.92. A respeito do tema, STJ, AGRESP nº 636591/RN - 200302343497, Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, 5ª Turma, J. 05/12/2006, DJ. 05/02/2007, Pág: 330; APELREEX 5001902-29.2019.4.03.6106, DESEMBARGADORA FEDERAL THEREZINHA CAZERTA, TRF3 - OITAVA TURMA, Int Via Sist: 01/02/2023
Aposentadoria Especial
A aposentadoria por tempo de serviço especial teve assento primeiro no artigo 31 da Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960, Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS, que estabeleceu que seria concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinquenta) anos de idade e 15 (quinze) anos de contribuições, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, em serviços que, para esse efeito, fossem considerados penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo.
Prevê ainda o artigo 162 da LOPS o reconhecimento de atividade especial prestada em data anterior à sua edição, na hipótese de seu cômputo ser mais benéfico ao segurado.
Como assentado pelas Cortes Superiores "tal hipótese, apesar de similar, não se confunde com a questão da legislação aplicável ao caso de concessão de aposentadoria, tampouco com aquela que diz respeito à possibilidade de aplicação retroativa da lei nova que estabeleça restrição ao cômputo do tempo de serviço. (...) Interpretação diversa levaria à conclusão de que o segurado, sujeito a condições insalubres de trabalho, só teria direito à aposentadoria especial após 15, 20 e 25 anos de trabalho exercida depois da Lei nº 3.807/60, desconsiderando, portanto, todo o período de labor, também exercido em tal situação, porém em data anterior à lei de regência" (Ag Rg no REsp nº 1015694, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza Assis de Moura, DJe 01/02/2011)
Essa norma foi expressamente revogada pela Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973, que passou a discipliná-la no artigo 9º, alterando, em efeitos práticos, apenas o período de carência de 15 (quinze) anos para 5 (cinco) anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
Sobreveio, então, o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, reclassificando as atividades profissionais segundo os agentes nocivos e os grupos profissionais tidos por perigosos, insalubres ou penosos, com os respectivos tempos mínimos de trabalho.
Importante ressaltar que os Decretos nºs. 53.831/64 e 83.080/79 tiveram vigências simultâneas, de modo que, conforme reiteradamente decidido pelo C. STJ, havendo colisão entre as mencionadas normas, prevalece a mais favorável ao segurado. (REsp nº 412351, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, pág. 355).
As atividades insalubres previstas nas aludidas normas são meramente exemplificativas, podendo outras funções ser assim reconhecidas, desde que haja similitude em relação àquelas legalmente estatuídas ou, ainda, mediante laudo técnico-pericial demonstrativo da nocividade da ocupação exercida. Nesse sentido, o verbete 198 da Súmula do TFR.
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, a matéria passou a ser prevista no inciso II do artigo 202 e disciplinada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação original previa que o benefício de aposentadoria especial seria devido ao segurado que, após cumprir a carência exigida, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade física, restando assegurada, ainda, a conversão do período trabalhado no exercício de atividades danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em seguida, foi editada a Lei nº 9.032/95, alterando o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, dispondo que a partir desse momento não basta mais o mero enquadramento da atividade exercida pelo segurado na categoria profissional considerada especial, passando a ser exigida a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, que poderá se dar por meio da apresentação de informativos e formulários, tais como o SB-40 ou o DSS-8030.
Posteriormente, com a edição do Decreto n.º 2.172, de 05/03/1997, que estabeleceu requisitos mais rigorosos para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, passou-se a exigir-se a apresentação de laudo técnico para a caracterização da condição especial da atividade exercida. Todavia, por se tratar de matéria reservada à lei, tal exigência apenas tem eficácia a partir da edição da Lei n.º 9.528, de 10/12/1997.
Cumpre observar que a Lei nº 9528/97 também passou a aceitar o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, documento que busca retratar as características de cada emprego do segurado, de forma a facilitar a futura concessão de aposentadoria especial. Assim, identificado no documento o perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, é possível a sua utilização para comprovação da atividade especial em substituição ao laudo pericial.
Ressalto que no tocante ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e à forma da sua demonstração, deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho, conforme jurisprudência pacificada da matéria (STJ - Pet 9.194/PR, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
Nos termos da Súmula nº 68 da TNU, “o laudo pericial não contemporâneo ao período trabalhado é apto à comprovação da atividade especial do segurado”. A extemporaneidade do documento comprobatório das condições especiais de trabalho não prejudica o seu reconhecimento como tal, "pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual a constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica." (Des. Fed. Fausto De Sanctis, AC nº 2012.61.04.004291-4, j. 07/05/2014); “inexiste exigência legal de contemporaneidade dos documentos técnicos que comprovam o exercício de labor especial” (8ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5008647-15.2021.4.03.6119, Rel. Desembargador Federal DAVID DINIZ DANTAS, julgado em 09/08/2022, DJEN DATA: 12/08/2022).
Ruído
O Decreto nº 53.831/64 considerava insalubre o labor desempenhado com exposição permanente a ruído acima de 80 dB; já o Decreto nº 83.080/79 fixava a pressão sonora em 90 dB. Na medida em que as normas tiveram vigência simultânea, prevalece disposição mais favorável ao segurado (80 dB).
Com a edição do Decreto nº 2.172/97, a intensidade de ruído considerada para fins de reconhecimento de insalubridade foi elevada para 90 dB, mas, em 2003, essa medida foi reduzida para 85 dB, por meio do Decreto nº 4.882, de 18 de novembro de 2003.
Até 09 de outubro de 2013, os Tribunais adotavam o enunciado pela Súmula nº 32 da TNU. Contudo, esta Súmula foi cancelada em decorrência do julgamento da PET 9059 pelo Superior Tribunal de Justiça (Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJe 09/09/2013) cujo entendimento foi sufragado no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), sob a sistemática dos recursos repetitivos.
Em relação ao agente ruído, vigora o princípio do tempus regit actum. Considera-se especial a atividade desenvolvida acima do limite de 80dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº 2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90dB até 18/11/2003, quando foi editado o Decreto nº 4882/2003. A partir de 19/11/2003 o limite passou a ser de 85 dB.
Saliente-se que a especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico previdenciário (a partir de 11/12/97).
É corrente em nossos tribunais a tese de que sempre se exigiu laudo técnico para comprovar a exposição do trabalhador aos agentes físicos ruído e calor em níveis superiores aos limites máximos de tolerância. Entretanto, no tocante às atividades profissionais exercidas até 10/12/97 - quando ainda não havia a exigência legal de laudo técnico -, essa afirmação deve ser compreendida, não na literalidade, mas no sentido de ser necessário o atesto efetivo e seguro dos níveis de intensidade dos agentes nocivos a que o trabalhador esteve exposto durante sua jornada laboral.
Logo, para as atividades profissionais exercidas até 10/12/97, é suficiente que os documentos apresentados façam expressa menção aos níveis de intensidade dos agentes nocivos.
A legislação de regência não exige que a nocividade do ambiente de trabalho seja aferida a partir de uma determinada metodologia. O artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91, exige que a comprovação do tempo especial seja feita por formulário, ancorado em laudo técnico elaborado por engenheiro ou médico do trabalho, o qual, portanto, pode se basear em qualquer metodologia científica. Não tendo a lei determinado que a aferição só poderia ser feita por meio de uma metodologia específica, não se pode deixar de reconhecer o labor especial pelo fato de o empregador ter utilizado uma técnica diversa daquela indicada na Instrução Normativa do INSS, pois isso representaria uma extrapolação do poder regulamentar da autarquia.
Na sessão de julgamento de 08/02/2017, sob a sistemática dos recursos especiais repetitivos (Tema 1083), o STJ estabeleceu a tese de que o exercício de atividades sob condições especiais pela exposição a ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido através do Nível de Exposição Normalizado (NEN), que indica a média ponderada de ruído. Na ausência deste, deverá ser adotado o critério de nível máximo (pico) de ruído, desde que comprovada a habitualidade e permanência da exposição, através de perícia judicial.
Contudo, acerca da habitualidade e permanência da exposição ao agente ruído, entendo aplicável à hipótese a norma prevista no artigo 375 do CPC/2015, considerando que o cotejo das provas carreadas aos autos, em especial as descrições das atividades desenvolvidas pelo segurado, permite concluir que o segurado ficava habitual e permanentemente exposto ao agente nocivo indicado nos formulários previdenciários/PPP durante a jornada de trabalho, não se fazendo necessário, portanto, a conversão do feito em diligência para a produção de laudo pericial, em observância aos princípios da celeridade e economia processuais.
Saliente-se que de acordo com o definido pelo C. STJ a informação de inserção do NEN, no PPP ou LTCAT, somente tornou-se exigível a partir da edição do Decreto 4.882/2003.
Uso de equipamento de proteção individual - EPI, como fator de descaracterização do tempo de serviço especial
A questão foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do ARE nº 664335, da relatoria do E. Ministro Luiz Fux, com reconhecimento de repercussão geral, na data de 04.12.2014, em que restou decidido que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional ao reconhecimento das atividades especiais.
Restou assentado também que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
O fato de a empresa fornecer equipamento de proteção individual - EPI para neutralização dos agentes agressivos não afasta, por si só, a contagem do tempo especial, pois cada caso deve ser examinado em suas peculiaridades, comprovando-se a real efetividade do aparelho e o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça (AgInt no AREsp n. 1.889.768/MG, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 22/11/2021, DJe de 10/12/2021; REsp n. 1.800.908/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 11/4/2019, DJe de 22/5/2019; REsp 1428183/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 25/02/2014, DJe 06/03/2014).
Ainda, conforme a jurisprudência citada, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído, desde que em níveis acima dos limites legais, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas.
Agentes químicos
Considera-se especial o labor desempenhado de forma habitual e permanente com exposição a agentes químicos, conforme previsto na legislação previdenciária, entre eles:
- Hidrocarbonetos e derivados e outros tóxicos inorgânicos - no item 1.2.11 do Quadro do Decreto nº 53.831/64; nos itens 1.2.10 e 1.2.11 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79 e do Anexo IV, do Decreto nº 3.048/99;
- Poeiras minerais - no item 1.2.10 do Decreto 53.831/64, item 1.2.12 do Quadro I, do Decreto nº 83.080/79, e do Anexo IV, do Decreto nº 3.048/99;
- Fumos metálicos - no item 1.2.9 do Decreto 53.831/64;
- Agentes cancerígenos previstos no Anexo IV, do Decreto nº 3.048/99.
Consoante estabelecido no Anexo 13 da NR-15 do Ministério do Trabalho, a exposição do trabalhador a agentes químicos tem sua intensidade aferida a partir de análise qualitativa ou quantitativa.
Quanto aos agentes hidrocarbonetos e derivados e outros tóxicos inorgânicos, em que a análise é qualitativa, prescinde, portanto, de quantificação da concentração da substância para caracterização da especialidade da atividade, bastando a comprovação do contato físico com o agente nocivo durante o labor.
Neste sentido: ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5287730-33.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA, julgado em 13/12/2022, Intimação via sistema DATA: 15/12/2022.
No que tange aos agentes químicos sujeitos à análise quantitativa, o reconhecimento da especialidade depende de sua quantificação, nos termos do Anexo IV da Decreto nº 3.048, de 1999.
Vale dizer que a exposição aos agentes cancerígenos prescinde de análise qualitativa ou quantitativa para configurar condição especial de trabalho, vez que a substância integra o rol de agentes cancerígenos, cujo risco potencial de agressão à saúde, impõe o reconhecimento da insalubridade (TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000745-28.2019.4.03.6136, Rel. Desembargador Federal LEILA PAIVA MORRISON, julgado em 16/12/2022, Intimação via sistema DATA: 28/12/2022).
A partir da vigência da Lei n.º 9.732/98, exigiu-se a elaboração de laudo técnico dispondo sobre a existência e utilização de tecnologia de proteção coletiva ou individual, passível de diminuir a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância.
Assim, a partir de 14/12/1998 o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição ao agente nocivo durante o labor; se o uso de EPI for capaz de neutralizar a nocividade do agente, não haverá respaldo legal à percepção da aposentadoria especial.
No julgamento do ARE 664.335/SC com repercussão geral (Relator Ministro Luiz Fux, DJe 12/2/2015), o Plenário do Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido de que (I) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (II) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (III) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Consoante jurisprudência desta Corte, a ausência da informação da habitualidade e permanência no PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário) não impede o reconhecimento da especialidade, porquanto o PPP é formulário padronizado pelo próprio INSS, a teor do § 1º do artigo 58 da Lei 8.213/91, sendo de competência da autarquia a adoção de medidas para reduzir as imprecisões no preenchimento do PPP pelo empregador; como os PPPs não apresentam campo específico para indicação de configuração de habitualidade e permanência da exposição ao agente, o ônus de provar a ausência desses requisitos é do INSS (AR 5009211-23.2018.4.03.0000, 3.ª Seção, Relator Desembargador Federal Luiz Stefanini, e-DJF3 1 7/5/2020).
Forçoso concluir, assim, que o mero preenchimento dos campos constantes do PPP e/ou a menção à utilização de EPI sem comprovação efetiva de seu fornecimento e fiscalização no uso, não tem o condão de descaracterizar a especialidade da atividade exercida sob exposição a agentes nocivos (AC n.º 0009611-62.2012.4.03.6102, Rel. Desembargador Federal Newton De Lucca, e-DJF3 Judicial 1 30/3/2020).
Fonte de custeio
Quanto à alegação de necessidade de prévio custeio, cumpre ressaltar inexistir vinculação do ato de reconhecimento de tempo de atividade perigosa/nociva ao eventual pagamento de encargos tributários com alíquotas diferenciadas, eis que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 não demandam tal exigência, que constituiria encargo para o empregador, não podendo o empregado ser por isso prejudicado. Assim já definiu o C. STF, ao apreciar o tema em repercussão geral ARE nº 664.335/SC, Rel. Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 09/12/2014, DJE 27/03/2015.
Caso concreto - elementos probatórios
Cinge-se a controvérsia acerca do reconhecimento de período(s) trabalhado(s) na qualidade de aluno aprendiz (18.01.93 a 22.12.95), estagiário (03.01.96 a 28.06.96) e da especialidade das atividades trabalhadas no(s) período(s) de 01.01.86 a 24.07.89, 01.08.89 a 14.06.93, 27.10.93 a 28.12.95, 19.07.96 a 01.08.97, 01.10.97 a 20.04.98, 08.06.98 a 10.06.98, 01.07.98 a 10.07.99, 03.01.2000 a 16.12.2003, 05.01.2004 a 06.04.2004, 03.05.2004 a 09.04.2012, 16.04.2012 a 26.03.2013, 22.10.2013 a 05.11.2015, 02.02.2016 a 14.04.2016, 30.11.2016 a 06.09.2017, 13.11.2017 a 11.07.2018 e de 12.07.2018 a 12.08.2022.
Aluno aprendiz
Para comprovar as suas alegações, o autor apresentou certidão emitida pelo ETEC Dr. Júlio Cardoso de Franca, vinculado ao Governo do Estado de São Paulo, com a informação de que o autor frequentou o curso “Habilitação Profissional Plena de Eletrotécnica” no período de 18.01.93 a 22.12.95, perfazendo tempo de estudo líquido de 2 anos, 10 meses e 8 dias (ID 278366801/86).
No entanto, inexiste nos autos comprovação de qualquer retribuição pecuniária à conta do orçamento, ainda que revertida na forma de alimentação, fardamento, material escolar, a viabilizar, com respaldo na Súmula 96/TCU, o cômputo do período para fins previdenciários.
Estagiário
A atividade de estagiário tem como principal objetivo a aprendizagem para futuro ingresso no mercado de trabalho. Não há entre o estagiário e a empresa contratante vínculo empregatício de qualquer natureza, cabendo à empresa apenas o pagamento de bolsa durante o período de estágio.
Não restando configurada a relação de emprego, nem tendo sido demonstrado o recolhimento previdenciário, na qualidade de contribuinte facultativo, referente ao período de estágio compreendido entre 03.01.96 a 28.06.96, na área de Manutenção Eletromecânica, junto às Centrais Elétricas S/A (ID 278366801/87), não há que se falar em reconhecimento de tempo de serviço.
A respeito do tema, transcrevo os seguintes julgados:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ESTAGIÁRIO. SEGURADO FACULTATIVO. RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES. TEMPO COMUM JÁ CONSIDERADO PELO INSS. ATIVIDADE ESPECIAL. PPP. RUÍDO. PERÍODO PARCIALMENTE RECONHECIDO. REVISÃO DEVIDA. PERMANÊNCIA E HABITUALIDADE. CAMPO QUE NÃO INTEGRA O FORMULÁRIO. ART. 29-C DA LEI Nº 8.213/91. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. DE OFÍCIO, ALTERAÇÃO DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS.
(...)
17 - Sustenta o demandante ter laborado em condições especiais nos períodos de 1º/02/1983 a 03/09/1985, 15/05/1995 a 31/12/1998 e de 1º/09/2009 a 04/06/2019.
18 - Durante o período de 1º/02/1983 a 03/09/1985, consoante cópia da CTPS e Perfil Profissiográfico Previdenciário trazido a juízo (ID 135355493 - Pág. 29/), o autor desenvolveu atividades como estagiário na empresa “Sadokin Eletro Eletrônica Ltda.”.
19 - O desenvolvimento da atividade de estágio, ainda que registrado em carteira de trabalho, tem por intuito promover o aprendizado do bolsista, credenciando-lhe para, futuramente, adentrar no mercado profissional de trabalho. Diferentemente, desprovido do caráter educativo e pedagógico, o exercício de atividades empregatícias tem por finalidade precípua a exploração da mão de obra.
20 - Caracterizados como situações distintas, assim também são tratados no âmbito previdenciário. Se por um lado o empregado enquadra-se como segurado obrigatório, por outro, o estagiário detém a condição de facultativo, o que lhe impõe a obrigatoriedade de inscrição na Previdência Social, e o consequente recolhimento das contribuições previdenciárias respectivas para obter o reconhecimento do tempo de serviço para fins previdenciários.
21 - Em exame dos autos, observa-se que, ao contrário do alegado pelo ente autárquico nas razões de inconformismo, houve efetivo recolhimento das contribuições previdenciárias, tendo, inclusive, referido período sido contabilizado como tempo comum no âmbito administrativo, conforme “resumo de documentos para cálculo de tempo de contribuição”.
(...)
(TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5004934-68.2020.4.03.6183, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 23/09/2022, DJEN DATA: 29/09/2022)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. INOVAÇÃO RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO. INTERESSE DE AGIR. DEFICIÊNCIA NA INSTRUÇÃO ADMINISTRATIVA. DEVER DE ORIENTAÇÃO. PRELIMINAR REJEITADA. ESTAGIÁRIO. SEGURADO FACULTATIVO. NECESSIDADE DE RECOLHIMENTO PARA FAZER JUS AO CÔMPUTO DO PERÍODO. AUSÊNCIA. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE CONHECIDA E DESPROVIDA.
(...)
5 - O desenvolvimento da atividade de estágio, ainda que registrado em carteira de trabalho, tem por intuito promover o aprendizado do bolsista, credenciando-lhe para, futuramente, adentrar no mercado profissional de trabalho. Diferentemente, desprovido do caráter educativo e pedagógico, o exercício de atividades empregatícias tem por finalidade precípua a exploração da mão de obra.
6 - Caracterizados como situações distintas, assim também são tratados no âmbito previdenciário. Se por um lado o empregado enquadra-se como segurado obrigatório, por outro, o estagiário detém a condição de facultativo, o que lhe impõe a obrigatoriedade de inscrição na Previdência Social, e o consequente recolhimento das contribuições previdenciárias respectivas para obter o reconhecimento do tempo de serviço para fins previdenciários.
7 – Apelação da parte autora parcialmente conhecida e desprovida. Apelação do INSS desprovida.
(TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0001918-33.2017.4.03.6108, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 10/03/2022, Intimação via sistema DATA: 18/03/2022)
Atividade especial
1 - 01.01.86 a 24.07.89 – serviços diversos/Indústria de Calçados junto à Italy Shoe Ind. de Calçados Ltda. (CTPS – ID 278366801/12) (91,18 dB; óleos, solventes – laudo pericial ID 278366870);
2 – 01.08.89 a 14.06.93 – ajudante de fabricação/Indústria de Calçados junto à Vulcabrás Azaleia S/A (92 dB) (CTPS – ID 278366801/12) (PPP emitido em 13.05.2019 – ID 278366801/55-57);
3 - 27.10.93 a 28.12.95 – auxiliar de montagem/Indústria de Calçados junto à Democrata Calçados e Artefatos de Couro Ltda. (CTPS – ID 278366801/28) (81 a 90 dB – PPP emitido em 14.05.2019 – ID 278366801/59-60) (91,18 dB; colas e solventes – laudo pericial ID 278366870);
4 - 19.07.96 a 01.08.97 – eletricista junto à Alpargatas S/A (77,8 dB; óleos, graxa, fumos metálicos, tensão superior a 250V) (laudo pericial ID 278366870);
5 - 01.10.97 a 20.04.98 – mecânico eletricista junto à Alla Ind. Com. E Representações Ltda. (77,8 dB; óleos, graxa, fumos metálicos, tensão superior a 250V) (laudo pericial ID 278366870);
6 - 08.06.98 a 10.06.98 - eletricista junto à Amazonas Ind. e Com. Ltda. (80,22 dB; óleos, graxa, fumos metálicos, tensão superior a 250V) (laudo pericial ID 278366870);
7 - 01.07.98 a 10.07.99 – mecânico eletricista junto à Marcos A. Alves Máquinas (77,8 dB; óleos, graxa, fumos metálicos, tensão superior a 250V) (laudo pericial ID 278366870);
8 - 03.01.2000 a 16.12.2003 – montador/Montagem junto à Poppi Máquinas e Equipamentos Ltda. (85,9 dB; óleos e solventes) (PPP emitido em 13.05.2019 – ID 278366801/61-64);
9 - 05.01.2004 a 06.04.2004 – mecânico de manutenção junto à Amazonas Ind. e Com. Ltda. (80,22 dB; óleos, graxa, fumos metálicos, tensão superior a 250V) (laudo pericial ID 278366870);
10 - 03.05.2004 a 09.04.2012 - montador/Montagem junto à Poppi Máquinas e Equipamentos Ltda. (85,9 dB; óleos e solventes) (PPP emitido em 13.05.2019 – ID 278366801/61-64);
11 - 16.04.2012 a 26.03.2013 – mecânico de manutenção e coordenador de manutenção industrial junto à Ind. Com. De Artefatos de Plásticos Rudolf Kamensek Ltda. (66, 23 dB; óleos minerais, tintas e solventes) (PPP emitido em 21.03.2013 – ID 278366801/65-66);
12 - 22.10.2013 a 05.11.2015 – eletricista/Manutenção junto à Couroquímica Couros e Acabamento Ltda. (77,8 dB – PPP emitido em 05.11.2015 – ID 278366801/68-69) (77,8 dB; óleos, graxa, fumos metálicos, tensão superior a 250V) (laudo pericial ID 278366870);
13 - 02.02.2016 a 14.04.2016 – mecânico manutenção junto à Rafarillo Ind. de Calçados Ltda. (75,78 dB – PPP emitido em 14.04.2016 – ID 278366801/70-71) (75,8 dB; óleos, graxa, fumos metálicos, tensão superior a 250V) (laudo pericial ID 278366870);
14 - 30.11.2016 a 06.09.2017 – mecânico junto à Ney Máquinas e Equipamentos EIRELI (75,8 dB; óleos, graxa, fumos metálicos, tensão superior a 250V) (laudo pericial ID 278366870);
15 - 13.11.2017 a 11.07.2018 – eletricista predial/Manutenção junto à Couroquímica Couros e Acabamento Ltda. (77,8 dB – PPP emitido em 11.07.2018 – ID 278366801/74-75) (77,8 dB; óleos, graxa, fumos metálicos, tensão superior a 250V) (laudo pericial ID 278366870);
16 - 12.07.2018 a 12.08.2022 – eletricista predial/Manutenção junto à Gamis Ind. e Com. De Artefatos em Couro EIRELI (68,4 dB; óleos, graxa – PPP emitido em 10.05.2019 – ID 278366801/76-77) (80,5 dB - laudo pericial ID 278366870).
No que concerne ao(s) interregno(s) de 01.01.86 a 24.07.89, 01.08.89 a 14.06.93 e de 27.10.93 a 28.04.95, é possível o reconhecimento do labor exercido na indústria calçadista como tempo especial pelo enquadramento por categoria profissional de atividade exercida, por se tratar de trabalhador usuário de cola sintética na fabricação de calçados, conforme previsão contida no Decreto nº 3.048/1999, Anexo II (agentes químicos – benzeno ou seus homólogos tóxicos).
Em sentido semelhante, cito precedente desta E. Turma Recursal: “(...) Até 28/04/1995 é possível o reconhecimento de tempo especial pelo enquadramento por categoria profissional de atividade exercida na indústria calçadista com base no código 1.2.11 do Decreto 53.831/64 e 83.080/79.” (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 0001108-14.2015.4.03.6113, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 25/05/2022, DJEN DATA: 02/06/2022; ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001535-47.2020.4.03.6113, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 17/11/2023, DJEN DATA: 21/11/2023).
Cumpre consignar, a propósito do conjunto probatório produzido nos autos, entendimento desta Turma julgadora no sentido do acolhimento do documento elaborado em data mais próxima à do labor sob análise (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv nº 0004177-43.2012.4.03.6183, julgado em 13/06/2020, DJe: 16/06/2020, Rel. Des. Fed. CARLOS EDUARDO DELGADO).
Por outro lado, verifica-se dos autos que foi determinada a produção de prova pericial pelo MM. Juiz a quo, para avaliação das condições ambientais dos períodos para os quais o autor não logrou obter a emissão de documentos (informativos, PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário), considerando-se sobretudo o encerramento das atividades de algumas empresas, conforme demonstrado nos autos (ID 278366773/1, 4, 7, 9).
O perito judicial consignou de forma expressa ter diligenciado in loco nas empresas ativas, em funcionamento regular, e elaborado o laudo pericial por similaridade com relação àquelas inativas, consideradas as funções e condições de trabalho equivalentes, presentes durante o labor de fato exercido, cujo laudo pericial (ID 278366870) deve ser acolhido como elemento de prova.
A realização de perícia por similaridade é possível quando restar comprovada a inexistência da empresa empregadora, a demonstração do mesmo objeto social e que as condições ambientais da empresa vistoriada e a tomada como paradigma eram similares.
Nesse sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. SÚMULA 284/STF. CÔMPUTO DE TEMPO ESPECIAL. PROVA TÉCNICA. PERÍCIA POR SIMILARIDADE. CABIMENTO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO EM PARTE E NESSA PARTE PROVIDO.1. Em preliminar, cumpre rejeitar a alegada violação do art. 535 do CPC, porque desprovida de fundamentação. O recorrente apenas alega que o Tribunal a quo não cuidou de atender o prequestionamento, sem, contudo, apontar o vício em que incorreu. Recai, ao ponto, portanto, a Súmula 284/STF.2. A tese central do recurso especial gira em torno do cabimento da produção de prova técnica por similaridade, nos termos do art. 429 do CPC e do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/1991.3. A prova pericial é o meio adequado e necessário para atestar a sujeição do trabalhador a agentes nocivos à saúde para seu enquadramento legal em atividade especial. Diante do caráter social da previdência, o trabalhador segurado não pode sofrer prejuízos decorrentes da impossibilidade de produção da prova técnica.4. Quanto ao tema, a Segunda Turma já teve a oportunidade de se manifestar, reconhecendo nos autos do Recurso Especial 1.397.415/RS, de Relatoria do Ministro Humberto Martins, a possibilidade de o trabalhador se utilizar de perícia produzida de modo indireto, em empresa similar àquela em que trabalhou, quando não houver meio de reconstituir as condições físicas do local onde efetivamente prestou seus serviços. 5. É exatamente na busca da verdade real/material que deve ser admitida a prova técnica por similaridade. A aferição indireta das circunstâncias de labor, quando impossível a realização de perícia no próprio ambiente de trabalho do segurado é medida que se impõe.6. A perícia indireta ou por similaridade é um critério jurídico de aferição que se vale do argumento da primazia da realidade, em que o julgador faz uma opção entre os aspectos formais e fáticos da relação jurídica sub judice, para os fins da jurisdição. 7. O processo no Estado contemporâneo tem de ser estruturado não apenas consoante as necessidades do direito material, mas também dando ao juiz e à parte a oportunidade de se ajustarem às particularidades do caso concreto.8. Recurso especial conhecido em parte e nessa parte provido.
(REsp 1370229/RS, SEGUNDA TURMA, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 11/03/2014)
Para o(s) intervalo(s) de 01.01.86 a 24.07.89, 27.10.93 a 28.12.95, 19.07.96 a 01.08.97, 01.10.97 a 20.04.98, 08.06.98 a 10.06.98, 01.07.98 a 10.07.99, 03.01.2000 a 16.12.2003, 05.01.2004 a 06.04.2004, 03.05.2004 a 09.04.2012, 16.04.2012 a 26.03.2013, 22.10.2013 a 05.11.2015, 02.02.2016 a 14.04.2016, 30.11.2016 a 06.09.2017, 13.11.2017 a 11.07.2018 e de 12.07.2018 a 12.08.2022, houve a comprovação da exposição habitual e permanente do autor a agentes químicos (hidrocarbonetos), tornando a atividade especial, nos termos do código 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64 e no item 1.2.10 do Decreto nº 83.080/79.
O(s) período(s) de 01.01.86 a 24.07.89 (91,18 dB), 01.08.89 a 14.06.93 (92 dB), 27.10.93 a 28.12.95 (91,18 dB), 19.11.2003 a 16.12.2003 (85,9dB) e de 03.05.2004 a 09.04.2012 (85,9 dB) deve(m) ser considerado(s) como trabalhado(s) em condições especiais, porquanto restou comprovada a exposição a ruído acima do limite permitido, enquadrando-se no código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 e no item 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79, bem como no item 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e no item 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99 c/c Decreto n.º 4.882/03.
Por outro lado, os períodos de 19.07.96 a 01.08.97 (77,8 dB), 01.10.97 a 20.04.98 (77,8 dB), 08.06.98 a 10.06.98 (80,22 dB), 01.07.98 a 10.07.99 (77,8 dB), 03.01.2000 a 18.11.2003 (85,9 dB), 05.01.2004 a 06.04.2004 (80,22 dB), 16.04.2012 a 26.03.2013 (66,23 dB), 22.10.2013 a 05.11.2015 (77,8 dB), 02.02.2016 a 14.04.2016 (75,78 dB; 75,8 dB), 30.11.2016 a 06.09.2017 (75,8 dB), 13.11.2017 a 11.07.2018 (77,8 dB) e de 12.07.2018 a 12.08.2022 (80,5 dB) não (é)são passível(is) de ser(em) reconhecido(s) como especial(is), tendo em vista a comprovação da exposição a ruído em intensidade inferior ao limite fixado na norma previdenciária para o(s) período(s), que era de 80 decibéis até 05.03.97, 90 decibéis de 06.03.97 a 18.11.2003 e de 85 decibéis a partir de 19.11.2003 (código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 e no item 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79, bem como no item 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e no item 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99 c/c Decreto n.º 4.882/03).
Outrossim, restou comprovada, nos períodos de 19.07.96 a 01.08.97, 01.10.97 a 20.04.98, 08.06.98 a 10.06.98, 01.07.98 a 10.07.99, 05.01.2004 a 06.04.2004, 22.10.2013 a 05.11.2015, 02.02.2016 a 14.04.2016, 30.11.2016 a 06.09.2017 e de 13.11.2017 a 11.07.2018, a exposição à tensão superior a 250 volts, acima do limite permitido, enquadrando-se no código 1.1.8 do Decreto nº 53.831/64, bem como no disposto na Lei nº 12.740/12.
Saliente-se que, consoante julgamento do Recurso Especial n.º 1.306.113/SC (tema 534/STJ), representativo de controvérsia, pela Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça, é possível reconhecer a especialidade de labor com exposição à tensão elétrica de 250 volts mesmo com a supressão do agente do rol do Decreto n.º 2.172/97.
Com efeito, embora a eletricidade não conste expressamente do rol de agentes nocivos previstos nos Decretos nº 2.172/97 e Decreto nº 3.048/99, sua condição especial permaneceu reconhecida pela Lei nº 7.369/85, pelo Decreto nº 93.412/86, e pela Lei nº 12.740/12.
A ausência de comprovação do caráter permanente da exposição à eletricidade não impede o reconhecimento da atividade especial. Nesse sentido, já decidiu esta Corte Regional: "Em se tratando de exposição a altas tensões elétricas, que tem o caráter de periculosidade, a caracterização em atividade especial independe da exposição do segurado durante toda a jornada de trabalho, pois que a mínima exposição oferece potencial risco de morte ao trabalhador, justificando o enquadramento especial." (Décima Turma, APELREEX 0001107-72.2014.4.03.6110, Rel. Desembargador Federal SERGIO NASCIMENTO, julgado em 12/04/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/04/2016).
Cito, ainda, acerca desta matéria, recente precedente da Sétima Turma julgadora deste Egrégio Tribunal: “(...) 17 – No mais, importante ser dito que restou superada a questão relacionada à supressão do agente eletricidade do rol do Decreto n.º 2.172/97, nos termos do entendimento adotado no REsp nº 1.306.113/SC, representativo de controvérsia, pela Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça.18 - Quanto ao período laborado na “IBM Brasil -Indústria de Máquinas e Serviços Ltda." de 01/03/1978 a 05/03/1997, o PPP trazido a juízo (ID 160111683, p. 7/11), com indicação dos responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, demonstra que o requerente estava exposto à tensão elétrica de 85 a 400V, o que permite o reconhecimento da especialidade, com fundamento no item 1.1.8 do Anexo do Decreto nº 53.831/64.19 - A ausência de informação, no Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, acerca da habitualidade e permanência de exposição ao agente nocivo, em nada prejudica o segurado, na medida em que tal campo específico não integra o formulário. Precedente.20 - Ademais, ressalte-se que os requisitos de "habitualidade" e "permanência" devem ser interpretados cumgranus salis. Exigir-se do trabalhador a exposição ininterrupta aos agentes agressivos, por toda a sua jornada de trabalho, ficaria restrita somente àqueles que tivessem sua saúde esmigalhada. Habitualidade pressupõe frequência, que, por sua vez, é atingida com o exercício cotidiano de determinado trabalho ou função. Portanto, o conceito de moderado ou, até mesmo, alternado não são auto-excludentes da ideia de habitualidade. A questão da permanência deve ser encarada da mesma forma. A ideia é de que a exposição seja duradoura, capaz de prejudicar a saúde do trabalhador. Mas não se exige seja ininterrupta, pois, a seguir esse raciocínio, somente faria jus à aposentadoria especial o trabalhador doente. Por esta razão, é que a situação de intermitência não afasta a especialidade do labor, desde que a exposição se dê rotineiramente, de maneira duradoura (...)” (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000675-91.2021.4.03.6119, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 03/03/2023, DJEN DATA: 09/03/2023).
A soma do(s) período(s) especial(ais) aqui reconhecido(s) totaliza, na data do requerimento administrativo (17.08.2019), mais de 25 anos de tempo de serviço especial, o que autoriza a concessão da aposentadoria especial, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
No que tange aos efeitos financeiros da concessão do benefício, considerando que o reconhecimento das atividades especiais decorreu, em parte, de produção de prova realizada apenas na esfera judicial, a hipótese do caso se amolda à previsão do Tema 1.124 do C. Superior Tribunal de Justiça, e, portanto, deve seguir o quanto vier a ser definido quando do julgamento dos recursos representativos de controvérsia Resp. 1905830/SP, 1912784/SP e 1913152/SP, afetados em 17/12/2021.
Contudo, embora haja determinação de suspensão de todos os recursos que versam sobre a matéria no âmbito dos tribunais, entendo que a questão terá impactos apenas na fase de liquidação da sentença, não havendo prejuízos processuais às partes a solução dos demais pontos dos recursos por esta Corte já neste momento, priorizando, assim, o princípio da celeridade processual, cabendo ao juiz da execução determinar a observância do quanto decidido pela Corte Superior quando da feitura dos cálculos do montante do crédito devido ao beneficiário.
As parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora na forma estabelecida e pelos índices previstos no capítulo 4.3, do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, alterado pela Resolução CJF nº 784/2022, de 08 de agosto de 2022, ou daquele que estiver em vigor na data da liquidação do título executivo judicial.
Diante da sucumbência mínima da parte autora (art. 86, § único, CPC), condeno o INSS ao pagamento de honorários de advogado, ora fixados em 10% do valor da condenação, considerados os valores vencidos até a data deste acórdão, nos termos dos incisos I ou II do §3º do artigo 85 do CPC/2015, da Súmula 111 e do Tema 1105 do C. STJ.
Ante o exposto, afasto a extinção do processo sem resolução do mérito reconhecida na sentença, com relação aos períodos de 01.01.86 a 24.07.89, 27.10.93 a 28.12.95, 19.07.96 a 01.08.97, 01.10.97 a 20.04.98, 08.06.98 a 10.06.98, 01.07.98 a 10.07.99, 02.02.2016 a 14.04.2016, 30.11.2016 a 06.09.2017 e de 12.07.2018 a 12.08.2022, restando prejudicada, no mérito, a apelação da parte autora, e de acordo com o art. 1.013, § 3º, III, julgo parcialmente procedente o pedido formulado na inicial, para reconhecer o labor em condições especiais nos períodos de 01.01.86 a 24.07.89, 01.08.89 a 14.06.93, 27.10.93 a 28.12.95, 19.07.96 a 01.08.97, 01.10.97 a 20.04.98, 08.06.98 a 10.06.98, 01.07.98 a 10.07.99, 03.01.2000 a 16.12.2003, 05.01.2004 a 06.04.2004, 03.05.2004 a 09.04.2012, 16.04.2012 a 26.03.2013, 22.10.2013 a 05.11.2015, 02.02.2016 a 14.04.2016, 30.11.2016 a 06.09.2017, 13.11.2017 a 11.07.2018 e de 12.07.2018 a 12.08.2022 e determinar ao INSS a concessão da aposentadoria especial, fixando os consectários legais nos termos explicitados na decisão, observado o julgamento oportunamente do tema 1124/STJ, no pertinente ao termo inicial dos efeitos financeiros da concessão.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA ESPECIAL. COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. SAPATEIRO. RUÍDO. AGENTES QUÍMICOS. ELETRICIDADE. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. DIB. TEMA 1124/STJ. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. SUCUMBÊNCIA MÍNIMA DO PEDIDO.
1. Apresentado o prévio requerimento administrativo antes da propositura da ação judicial, presente o interesse processual. Neste sentido: “Inexiste falta de interesse de agir em razão da apresentação de documento novo na demanda.” (ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0001695-18.2016.4.03.6140, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 03/02/2022, DJEN DATA: 08/02/2022)
2. Condições de imediato julgamento. Aplicação da regra do inciso III do §3º do art. 1.013 do CPC. Exame do mérito.
3. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua demonstração.
4. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário (a partir de 11/12/97).
5. Comprovado o exercício da função de sapateiro em período até 28/04/95, possível o enquadramento por categoria profissional da atividade exercida, por se tratar de trabalhador usuário de cola sintética na fabricação de calçados, conforme previsão contida no Decreto nº 3.048/1999, Anexo II (agentes químicos – benzeno ou seus homólogos tóxicos).
6. Para o agente ruído, considera-se especial a atividade desenvolvida acima do limite de 80dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº 2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90dB. A partir da edição do Decreto nº 4882 em 18/11/2003, o limite passou a ser de 85dB.
7. Comprovada a exposição habitual e permanente a agentes químicos, possível o enquadramento no código 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64 e no item 1.2.10 do Decreto nº 83.080/79.
8. A exposição à tensão elétrica superior a 250 volts enseja o reconhecimento do exercício do trabalho em condições especiais (Resp. nº 1.306.113/SC, Lei nº 7.369/85, Decreto nº 93.412/86 e Lei nº 12.740/12.)
9. A ausência de comprovação do caráter permanente da exposição à eletricidade não impede o reconhecimento da atividade especial.
10. A soma dos períodos redunda no total de mais de 25 anos de tempo de serviço especial, o que autoriza a concessão da aposentadoria especial, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
11. Termo inicial dos efeitos financeiros da concessão do benefício. Tema 1.124/STJ.
12. Juros e correção monetária. Aplicação dos índices previstos no capítulo 4.3, do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, alterado pela Resolução CJF nº 784/2022, de 08 de agosto de 2022, ou daquele que estiver em vigor na data da liquidação do título executivo judicial.
13. Honorários de advogado. Sucumbência mínima do pedido.
14. Afastada a extinção do processo sem resolução do mérito reconhecida na sentença, com relação aos períodos de 01.01.86 a 24.07.89, 27.10.93 a 28.12.95, 19.07.96 a 01.08.97, 01.10.97 a 20.04.98, 08.06.98 a 10.06.98, 01.07.98 a 10.07.99, 02.02.2016 a 14.04.2016, 30.11.2016 a 06.09.2017 e de 12.07.2018 a 12.08.2022, restando prejudicada, no mérito, a apelação da parte autora. Pedido parcialmente procedente.
