
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004183-04.2023.4.03.6110
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MAURO OLIMPIO RODRIGUES
Advogado do(a) APELADO: EDUARDO ALAMINO SILVA - SP246987-A
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004183-04.2023.4.03.6110
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MAURO OLIMPIO RODRIGUES
Advogado do(a) APELADO: EDUARDO ALAMINO SILVA - SP246987-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Trata-se de ação ordinária em que se objetiva a concessão de aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de período(s) trabalhado(s) em atividades especiais, com pedido de reafirmação da DER.
A sentença julgou procedente o pedido para reconhecer o tempo de serviço especial trabalhado pelo segurado nas pessoas jurídicas Eucatex S.A. Indústria e Comércio, de 09/09/1986 a 05/05/1987 e Delta Star Conetores Elétricos Ltda., de 31/03/1995 a 30/08/1996, 01/09/1996 a 21/05/1997, 22/05/1998 a 28/10/1998, 29/10/1998 a 28/10/1999, 10/11/2000 a 17/06/2002, 05/02/2004 a 04/02/2005, 15/03/2005 a 14/02/2006, 15/03/2006 a 04/08/2006, 05/08/2007 a 10/08/2007, 26/08/2008 a 25/08/2009, 22/08/2012 a 31/07/2013, 01/11/2014 a 12/11/2014; 28/12/2020 a 25/11/2021 e 26/11/2021 a 26/09/2022. Condenou o INSS a implantar o benefício de aposentadoria especial – NB 46/203.414.224-6, desde a data da entrada do requerimento administrativo (DER) em 07/10/2022, DIB em 07/10/2022 e RMI a ser calculada pelo Instituto Nacional do Seguro Social segundo os parâmetros da Lei n.º 9.876/99, acrescido de juros de mora e correção monetária nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal. Condenou o INSS, ainda, no pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, observando-se a Súmula nº 111 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça. Custas nos termos da Lei n.º 9.289/96.
Sentença não submetida à remessa necessária, nos termos do § 3º, I, do artigo 496 do Código de Processo Civil/2015.
Apela o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, requerendo, preliminarmente, seja o feito extinto sem análise de mérito, nos termos do art. 17 c/c o art. 485, VI, ambos do CPC, relativamente aos períodos já reconhecidos como especiais administrativamente (05/02/2004 a 04/02/2005 e 26/08/2008 a 25/08/2009) e a submissão da sentença ao reexame necessário. No mérito, alega que em relação aos períodos de 09/09/86 a 05/05/87, 31/03/95 a 30/08/96, 01/09/96 a 21/05/97, 22/05/98 a 28/10/98, 29/10/98 a 28/10/99, 10/11/2000 a 17/06/2002, 15/03/2006 a 04/08/2006, 05/08/2007 a 10/08/2007, 01/11/2014 a 12/11/2014 não há responsável técnico pelos registros ambientais, e que em relação aos períodos de 28/12/2020 a 25/11/2021 e 26/11/2021 a 26/09/2022 é vedada a conversão de tempo especial em comum, não tendo sido comprovados os requisitos legais para a caracterização da nocividade da exposição ao ruído no ambiente de trabalho. Sustenta, ainda, que nos termos do art. 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91, é vedada a percepção concomitante de aposentadoria especial com rendimentos decorrentes do desempenho de atividades enquadradas como especiais, após a ciência pelo segurado da efetiva implantação de sua aposentadoria especial. Caso mantida a sentença, requer: a observância da prescrição quinquenal; seja a parte intimada a firmar e juntar aos autos a autodeclaração prevista no anexo Ida Portaria INSS nº 450, de 03 de abril de 2020, em observância às regras de acumulação de benefícios estabelecida no art. 24, §§ 1.º e 2.º da Emenda Constitucional 103/2019; a fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula 111 do STJ; a declaração de isenção de custas e outras taxas judiciárias; o desconto dos valores já pagos administrativamente ou de qualquer benefício inacumulável recebido no período e a cobrança de eventuais valores pagos em sede de antecipação dos efeitos da tutela posteriormente revogada.
Com contrarrazões da parte autora, vieram os autos ao Tribunal.
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004183-04.2023.4.03.6110
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Inicialmente, verifico que consta do resumo de cálculos do INSS (ID 289960503, pág. 20) que os períodos de 05/02/2004 a 04/02/2005 e 26/08/2008 a 25/08/2009 já foram enquadrados como especiais. Assim, acolho a preliminar de falta de interesse de agir e julgo extinto o feito sem resolução do mérito em relação a tais períodos, nos termos do art. 485, VI, do CPC.
Por sua vez, embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo termo inicial do benefício, seu valor aproximado e a data da sentença, que o valor total da condenação será inferior à importância de 1.000 (mil) salários mínimos estabelecida no inciso I do §3º do art. 496 do CPC/15.
Assim, é nítida a inadmissibilidade, na hipótese em tela, da remessa necessária.
Passo ao exame do mérito.
Considerando que a prescrição não corre durante o curso do processo administrativo e que a ação foi ajuizada dentro do prazo de 5 anos contado do seu término, não se pode falar em prescrição quinquenal (art. 103, § único, Lei 8.213/91).
Aposentadoria Especial
A aposentadoria por tempo de serviço especial teve assento primeiro no artigo 31 da Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960, Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS, que estabeleceu que seria concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinquenta) anos de idade e 15 (quinze) anos de contribuições, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, em serviços que, para esse efeito, fossem considerados penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo.
Prevê ainda, o mencionado diploma legal, no art. 162, o reconhecimento de atividade especial prestada em data anterior à sua edição, na hipótese de seu cômputo ser mais benéfico ao segurado.
Como assentado pelas Cortes Superiores "tal hipótese, apesar de similar, não se confunde com a questão da legislação aplicável ao caso de concessão de aposentadoria, tampouco com aquela que diz respeito à possibilidade de aplicação retroativa da lei nova que estabeleça restrição ao cômputo do tempo de serviço. (...) Interpretação diversa levaria à conclusão de que o segurado, sujeito a condições insalubres de trabalho, só teria direito à aposentadoria especial após 15, 20 e 25 anos de trabalho exercida depois da Lei nº 3.807/60, desconsiderando, portanto, todo o período de labor, também exercido em tal situação, porém em data anterior à lei de regência" (Ag Rg no REsp nº 1015694, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza Assis de Moura, DJe 01/02/2011)
Essa norma foi expressamente revogada pela Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973, que passou a discipliná-la no artigo 9º, alterando, em efeitos práticos, apenas o período de carência de 15 (quinze) anos para 5 (cinco) anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
Sobreveio, então, o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, reclassificando as atividades profissionais segundo os agentes nocivos e os grupos profissionais tidos por perigosos, insalubres ou penosos, com os respectivos tempos mínimos de trabalho.
Importante ressaltar que os Decretos nºs. 53.831/64 e 83.080/79 tiveram vigências simultâneas, de modo que, conforme reiteradamente decidido pelo C. STJ, havendo colisão entre as mencionadas normas, prevalece a mais favorável ao segurado. (REsp nº 412351, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, pág. 355).
As atividades insalubres previstas nas aludidas normas são meramente exemplificativas, podendo outras funções ser assim reconhecidas, desde que haja similitude em relação àquelas legalmente estatuídas ou, ainda, mediante laudo técnico-pericial demonstrativo da nocividade da ocupação exercida. Nesse sentido, o verbete 198 da Súmula do TFR.
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, a matéria passou a ser prevista no inciso II do artigo 202 e disciplinada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação original previa que o benefício de aposentadoria especial seria devido ao segurado que, após cumprir a carência exigida, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade física, restando assegurada, ainda, a conversão do período trabalhado no exercício de atividades danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em seguida, foi editada a Lei nº 9.032/95, alterando o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, dispondo que a partir desse momento não basta mais o mero enquadramento da atividade exercida pelo segurado na categoria profissional considerada especial, passando a ser exigida a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, que poderá se dar por meio da apresentação de informativos e formulários, tais como o SB-40 ou o DSS-8030.
Posteriormente, com a edição do Decreto n.º 2.172, de 05/03/1997, que estabeleceu requisitos mais rigorosos para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, passou-se a exigir-se a apresentação de laudo técnico para a caracterização da condição especial da atividade exercida. Todavia, por se tratar de matéria reservada à lei, tal exigência apenas tem eficácia a partir da edição da Lei n.º 9.528, de 10/12/1997.
Cumpre observar que a Lei nº 9528/97 também passou a aceitar o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, documento que busca retratar as características de cada emprego do segurado, de forma a facilitar a futura concessão de aposentadoria especial. Assim, identificado no documento o perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, é possível a sua utilização para comprovação da atividade especial em substituição ao laudo pericial.
Ressalto que no tocante ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e à forma da sua demonstração, deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho, conforme jurisprudência pacificada da matéria (STJ - Pet 9.194/PR, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
Nos termos da Súmula nº 68 da TNU, “o laudo pericial não contemporâneo ao período trabalhado é apto à comprovação da atividade especial do segurado”. A extemporaneidade do documento comprobatório das condições especiais de trabalho não prejudica o seu reconhecimento como tal, "pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual a constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica."(Des. Fed. Fausto De Sanctis, AC nº 2012.61.04.004291-4, j. 07/05/2014); “inexiste exigência legal de contemporaneidade dos documentos técnicos que comprovam o exercício de labor especial” (8ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5008647-15.2021.4.03.6119, Rel. Desembargador Federal DAVID DINIZ DANTAS, julgado em 09/08/2022, DJEN DATA: 12/08/2022).
Da vedação prevista no art. 57, § 8º, da Lei 8.213/91
O Plenário do E. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 709 de repercussão geral (RE nº 791.961-PR, j.08.06.2020), em que se discute, à luz dos arts. 5º, XIII; 7º, XXXIII, e 201, § 1º, da Constituição Federal, a constitucionalidade do § 8º do art. 57 da Lei 8.213/1991, que veda a percepção do benefício da aposentadoria especial pelo segurado que continuar exercendo atividade ou operação nociva à saúde ou à integridade física, firmou a seguinte tese: “I) É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não. II) Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o benefício previdenciário em questão”.
Em 24.02.2021, o Pleno do STF, por maioria, acolheu parcialmente os embargos de declaração, para: “a) esclarecer que não há falar em inconstitucionalidade do § 8º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, em razão da alegada ausência dos requisitos autorizadores da edição da Medida Provisória que o originou, pois referida MP foi editada com a finalidade de se promoverem ajustes necessários na Previdência Social à época, cumprindo, portanto, as exigências devidas; b) alterar a redação da tese de repercussão geral fixada, para evitar qualquer contradição entre os termos utilizados no acórdão ora embargado, devendo ficar assim redigida: “4. Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral: ‘(i) [é] constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não; (ii) nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros; efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o pagamento do benefício previdenciário em questão.’”; c) modular os efeitos do acórdão embargado e da tese de repercussão geral, de forma a preservar os segurados que tiveram o direito reconhecido por decisão judicial transitada em julgado até a data deste julgamento; e d) declarar a irrepetibilidade dos valores alimentares recebidos de boa-fé, por força de decisão judicial ou administrativa, até a proclamação do resultado deste julgamento, nos termos do voto do Relator.”
Em 04.10.2021, o Pleno retomou a análise da matéria em sede de embargos de declaração opostos pelo Ministério Público Federal para modular os efeitos, excepcionalmente e temporalmente, da incidência do acórdão, no tocante aos profissionais de saúde constantes do rol do art. 3º-J da Lei nº 13.979/2020, e que estejam trabalhando diretamente no combate à pandemia do COVID-19, ou prestando serviços de atendimento a pessoas atingidas pela doença em hospitais ou instituições congêneres, públicos ou privados, ficando suspensos os efeitos do acórdão proferido nos autos, enquanto estiver vigente a referida lei, que dispõe sobre as medidas de emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do vírus SARS-COV2, rejeitando os aclaratórios opostos pelo Sindicato dos Trabalhadores no Comércio de Minérios, Derivados de Petróleo e Combustíveis de Santos e Região.
Depreende-se assim, que o exercício da atividade especial pelo segurado durante o trâmite do processo administrativo ou judicial, seja de concessão ou de revisão, não altera o seu direito à percepção do benefício e dos efeitos financeiros decorrentes. Apenas com a implantação efetiva do benefício é que se lhe aplica a vedação do § 8º do art. 57 da Lei 8.213/1991, cabendo ao INSS, dentro das suas atribuições, fiscalizar o afastamento do segurado das atividades a partir de então.
Ruído
O Decreto nº 53.831/64 considerava insalubre o labor desempenhado com exposição permanente a ruído acima de 80 dB; já o Decreto nº 83.080/79 fixava a pressão sonora em 90 dB. Na medida em que as normas tiveram vigência simultânea, prevalece disposição mais favorável ao segurado (80 dB).
Com a edição do Decreto nº 2.172/97, a intensidade de ruído considerada para fins de reconhecimento de insalubridade foi elevada para 90 dB, mas, em 2003, essa medida foi reduzida para 85 dB, por meio do Decreto nº 4.882, de 18 de novembro de 2003.
Até 09 de outubro de 2013, os Tribunais adotavam o enunciado pela Súmula nº 32 da TNU. Contudo, esta Súmula foi cancelada em decorrência do julgamento da PET 9059 pelo Superior Tribunal de Justiça (Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJe 09/09/2013) cujo entendimento foi sufragado no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), sob a sistemática dos recursos repetitivos.
Em relação ao agente ruído, vigora o princípio do tempus regitactum. Considera-se especial a atividade desenvolvida acima do limite de 80dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº 2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90dB até 18/11/2003, quando foi editado o Decreto nº 4882/2003. A partir de 19/11/2003 o limite passou a ser de 85 dB.
Saliente-se que a especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico previdenciário (a partir de 11/12/97).
É corrente em nossos tribunais a tese de que sempre se exigiu laudo técnico para comprovar a exposição do trabalhador aos agentes físicos ruído e calor em níveis superiores aos limites máximos de tolerância. Entretanto, no tocante às atividades profissionais exercidas até 10/12/97 - quando ainda não havia a exigência legal de laudo técnico -, essa afirmação deve ser compreendida, não na literalidade, mas no sentido de ser necessário o atesto efetivo e seguro dos níveis de intensidade dos agentes nocivos a que o trabalhador esteve exposto durante sua jornada laboral.
Logo, para as atividades profissionais exercidas até 10/12/97, é suficiente que os documentos apresentados façam expressa menção aos níveis de intensidade dos agentes nocivos.
A legislação de regência não exige que a nocividade do ambiente de trabalho seja aferida a partir de uma determinada metodologia. O artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91, exige que a comprovação do tempo especial seja feita por formulário, ancorado em laudo técnico elaborado por engenheiro ou médico do trabalho, o qual, portanto, pode se basear em qualquer metodologia científica. Não tendo a lei determinado que a aferição só poderia ser feita por meio de uma metodologia específica, não se pode deixar de reconhecer o labor especial pelo fato de o empregador ter utilizado uma técnica diversa daquela indicada na Instrução Normativa do INSS, pois isso representaria uma extrapolação do poder regulamentar da autarquia.
Na sessão de julgamento de 08/02/2017, sob a sistemática dos recursos especiais repetitivos (Tema 1083), o STJ estabeleceu a tese de que o exercício de atividades sob condições especiais pela exposição a ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido através do Nível de Exposição Normalizado (NEN), que indica a média ponderada de ruído. Na ausência deste, deverá ser adotado o critério de nível máximo (pico) de ruído, desde que comprovada a habitualidade e permanência da exposição, através de perícia judicial.
Contudo, acerca da habitualidade e permanência da exposição ao agente ruído, entendo aplicável à hipótese a norma prevista no artigo 375 do CPC/2015, considerando que o cotejo das provas carreadas aos autos, em especial as descrições das atividades desenvolvidas pelo segurado, permite concluir que o segurado ficava habitual e permanentemente exposto ao agente nocivo indicado nos formulários previdenciários/PPP durante a jornada de trabalho, não se fazendo necessário, portanto, a conversão do feito em diligência para a produção de laudo pericial, em observância aos princípios da celeridade e economia processuais.
Saliente-se que de acordo com o definido pelo C. STJ a informação de inserção do NEN, no PPP ou LTCAT, somente tornou-se exigível a partir da edição do Decreto 4.882/2003.
Uso de equipamento de proteção individual - EPI, como fator de descaracterização do tempo de serviço especial
A questão foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do ARE nº 664335, da relatoria do E. Ministro Luiz Fux, com reconhecimento de repercussão geral, na data de 04.12.2014, em que restou decidido que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional ao reconhecimento das atividades especiais.
Restou assentado também que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
O fato de a empresa fornecer equipamento de proteção individual - EPI para neutralização dos agentes agressivos não afasta, por si só, a contagem do tempo especial, pois cada caso deve ser examinado em suas peculiaridades, comprovando-se a real efetividade do aparelho e o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça (AgInt no AREsp n. 1.889.768/MG, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 22/11/2021, DJe de 10/12/2021; REsp n. 1.800.908/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 11/4/2019, DJe de 22/5/2019; REsp 1428183/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 25/02/2014, DJe 06/03/2014).
Ainda, conforme a jurisprudência citada, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído, desde que em níveis acima dos limites legais, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas.
Fonte de custeio
Quanto à alegação de necessidade de prévio custeio, cumpre ressaltar inexistir vinculação do ato de reconhecimento de tempo de atividade perigosa/nociva ao eventual pagamento de encargos tributários com alíquotas diferenciadas, eis que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 não demandam tal exigência, que constituiria encargo para o empregador, não podendo o empregado ser por isso prejudicado.Assim já definiu o C. STF, ao apreciar o tema em repercussão geral ARE nº 664.335/SC, Rel. Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 09/12/2014, DJE 27/03/2015.
Caso concreto - elementos probatórios
Atividade especial
Quanto à alegação de necessidade de a parte autora apresentar autodeclaração, entendo que se trata de procedimento a ser efetuado na esfera administrativa, na qual é dispensada a determinação judicial.
Restou demonstrado que a parte autora exerceu atividade especial nos seguintes períodos:
1. 09/09/86 a 05/05/1987
Empresa: Delta Star Conetores Elétricos Ltda.
Agente(s) nocivo(s): ruído
Enquadramento legal: código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 e no item 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79, bem como no item 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e no item 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99 c/c Decreto n.º 4.882/03.
Provas: PPP (ID 289960501 - Pág. 21), datado de 04/02/2016.
Verifica-se que o PPP supracitado demonstra regularidade com a legislação previdenciária, encontrando-se assinado e datado, bem como preenchido com a descrição das funções exercidas, ressaltando-se, por oportuno, a inexistência de exigência legal da indicação de perito responsável pela avaliação das condições de trabalho nos períodos de 09/09/86 a 05/05/87.
2) Períodos: 31/03/1995 a 30/08/1996, 01/09/1996 a 21/05/1997, 22/05/1998 a 28/10/1998, 29/10/1998 a 28/10/1999, 10/11/2000 a 17/06/2002, 05/02/2004 a 04/02/2005, 15/03/2005 a 14/02/2006, 15/03/2006 a 04/08/2006, 05/08/2007 a 10/08/2007, 26/08/2008 a 25/08/2009, 22/08/2012 a 31/07/2013, 01/11/2014 a 12/11/2014; 28/12/2020 a 25/11/2021 e 26/11/2021 a 26/09/2022
Empresa: Eucatex S.A. Indústria e Comércio
Agente(s) nocivo(s): ruído
Enquadramento legal: código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 e no item 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79, bem como no item 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e no item 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99 c/c Decreto n.º 4.882/03.
Provas: PPP (ID 289960501 - Pág. 25), datado de 26/09/2022.
Verifica-se que o PPP supracitado também demonstra regularidade com a legislação previdenciária, encontrando-se assinado e datado, bem como preenchido com a descrição das funções exercidas, ressaltando-se, por oportuno, a inexistência de exigência legal da indicação de perito responsável pela avaliação das condições de trabalho nos períodos de 31/03/95 a 30/08/96 e 01/09/96 a 21/05/97.
Ressalte-se, ainda, que consta do PPP de ID 289960501 - Pág. 25 as seguintes observações:
“Observação 2: Declaramos também que no período de 22/05/98 a 28/10/1998 não havia laudo ambiental, de modo que também utilizamos os dados do laudo ambiental anterior de trabalho do segurado, de 22/05/97 a 21/05/98 e dessa forma os decibéis avaliados e considerados correspondem a 94,6 DbA relativo ao local de exercício e trabalho do segurado, sendo que os respectivos dados do período foram anotados no campo 15 – Exposição a Fatores de Risco e no campo 15.4 – Intens./Conc – os quais representam os respectivos dados para o período de trabalho de: 23/03/1994 a 30/03/1995, 01/04/1995 a 30/08/1996 e 01/09/1996 a 21/05/1997”.
“Observação 3: Declaramos também que no período de 10/11/2000 a 17/06/2002 não havia laudo ambiental, de modo que utilizamos também os dados do laudo ambiental emitido em 10/11/99 a 09/11/2000 do período anterior de trabalho do segurado, e dessa forma os decibéis avaliados e considerados correspondem a 94,0 Db relativo ao local de exercício e trabalho do segurado, sendo que os respectivos dados do período foram anotados no campo 15 – Exposição a Fatores de Risco e no campo 15.4 – Intens./Conc – os quais representam os respectivos dados para o período de trabalho de 10/11/2000 a 17/06/2002.”
“Observação 6: O período do laudo ambiental anterior terminou em 14/03/2006 e o novo laudo iniciou-se em 05/08/2006, de modo que ficou um pequeno lapso de tempo anterior ao novo laudo ambiental, ou seja, de 15/03/2006 a 04/08/2006 (...). Entretanto, neste período exerceu suas atividades no mesmo local de trabalho, o qual não sofreu alteração no leiaute e no ambiente de trabalho. De modo que o respectivo período a considerar: 15/03/2006 a 04/08/2006 foi lançado no campo 15 da Exposição a fatores de risco (89,5 dBA) conforme dados obtidos no laudo anterior de 15/03/2005 a 14/03/2006.”
“Observação 7: O período do laudo ambiental anterior terminou em 04/08/2007 e o novo laudo iniciou-se em 11/08/2007, de modo que ficou um pequeno lapso de tempo anterior ao novo laudo ambiental, ou seja, de 05/08/2007 a 10/08/2007 (...). Entretanto, neste período exerceu suas atividades no mesmo local de trabalho, o qual não sofreu alteração no leiaute e no ambiente de trabalho. De modo que o respectivo período a considerar: 05/08/2007 a 10/08/2007 foi lançado no campo 15 da Exposição a fatores de risco (89,5 dBA) conforme dados obtidos no laudo anterior de 05/08/2006 a 04/08/2007.”
“Observação 9: O período do laudo ambiental anterior terminou em 31/07/2014 e o novo laudo iniciou-se em 13/11/2014, de modo que ficou um pequeno lapso de tempo anterior ao novo laudo ambiental, ou seja, de 01/11/2014 a 12/11/2014 (...). Entretanto, neste período exerceu suas atividades no mesmo local de trabalho, o qual não sofreu alteração no leiaute e no ambiente de trabalho. De modo que o respectivo período a considerar: 01/11/2014 a 12/11/2014 foi lançado no campo 15 da Exposição a fatores de risco (96,0 dBA) conforme dados obtidos no laudo anterior de 01/08/2013 a 31/07/2014.”
Assim, mantenho o reconhecimento da especialidade dos períodos de 09/09/1986 a 05/05/1987, de 31/03/1995 a 30/08/1996, 01/09/1996 a 21/05/1997, 22/05/1998 a 28/10/1998, 29/10/1998 a 28/10/1999, 10/11/2000 a 17/06/2002, 15/03/2005 a 14/02/2006, 15/03/2006 a 04/08/2006, 05/08/2007 a 10/08/2007, 22/08/2012 a 31/07/2013, 01/11/2014 a 12/11/2014; 28/12/2020 a 25/11/2021 e 26/11/2021 a 26/09/2022.
A soma do(s) período(s) especial(ais) aqui reconhecido(s) com os períodos já enquadrados administrativamente pelo INSS (v. ID 289960503, pág. 21/22) totaliza mais de 25 anos de tempo de serviço especial, o que autoriza a concessão da aposentadoria especial, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91 (v. tabela em ID 289960407 - Pág. 9/11).
Aplica-se ao INSS a norma do art. 4º, I, da Lei 9.289/96, que estabelece que as autarquias federais são isentas do pagamento de custas processuais nos processos em trâmite perante a Justiça Federal. Entretanto, consoante disposto no parágrafo único do mencionado art. 4º, compete-lhe o reembolso dos valores eventualmente recolhidos a esse título pela parte vencedora.
Considerando o parcial provimento do recurso, incabível a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015. Precedente do STJ (AgInt nos EREsp n. 1.539.725/DF, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Segunda Seção, julgado em 9/8/2017, DJe de 19/10/2017.)
Ante o exposto, acolho a preliminar de falta de interesse de agir e julgo extinto o feito, sem resolução do mérito, em relação aos períodos de 05/02/2004 a 04/02/2005 e 26/08/2008 a 25/08/2009, nos termos do art. 485, VI, do CPC, rejeito a preliminar relativa à necessidade de submissão à remessa necessária, e dou parcial provimento à apelação do INSS para isentá-lo do pagamento de custas.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR EM RELAÇÃO A PERÍODOS JÁ ENQUADRADOS PELO INSS. REMESSA NECESSÁRIA. DESNECESSIDADE. APOSENTADORIA ESPECIAL. COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. RUÍDO. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. CUSTAS. JUSTIÇA FEDERAL. ISENÇÃO. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
1. Períodos de 05/02/2004 a 04/02/2005 e 26/08/2008 a 25/08/2009 já enquadrados como especiais pelo INSS. Preliminar de falta de interesse de agir acolhida. Extinção o feito, sem resolução do mérito, em relação a tais períodos, nos termos do art. 485, VI, do CPC.
2. Valor da condenação inferior a 1.000 salários mínimos. Preliminar não conhecida.
3. Considerando que a prescrição não corre durante o curso do processo administrativo e que a ação foi ajuizada dentro do prazo de 5 anos contado do seu término, não se pode falar em prescrição quinquenal (art. 103, § único, Lei 8.213/91).
4. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua demonstração.
5. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário (a partir de 11/12/97).
6. Para o agente ruído, considera-se especial a atividade desenvolvida acima do limite de 80dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº 2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90dB. A partir da edição do Decreto nº 4882 em 18/11/2003, o limite passou a ser de 85dB.
7. O uso de Equipamento de Proteção Individual – EPI para o agente nocivo ruído, desde que em níveis acima dos limites legais, não descaracteriza o tempo de serviço especial.
8. A soma dos períodos redunda no total de mais de 25 anos de tempo de serviço especial, o que autoriza a concessão da aposentadoria especial, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
9. O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS é isento do pagamento de custas processuais nos processos em trâmite na Justiça Federal, exceto as de reembolso. Art. 4º, I, da Lei 9.289/96.
10. Inaplicável a sucumbência recursal, considerando o parcial provimento do recurso. Honorários de advogado mantidos.
11. Preliminar de falta de interesse de agir acolhida. Extinção o feito, sem resolução do mérito, em relação aos períodos de 05/02/2004 a 04/02/2005 e 26/08/2008 a 25/08/2009, nos termos do art. 485, VI, do CPC. Preliminar de necessidade de remessa rejeitada. Apelação do INSS parcialmente provida.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
