
| D.E. Publicado em 08/03/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, corrigir, de ofício, o erro material na sentença, dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, tida por interposta, bem como negar provimento ao recurso adesivo do autor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal Relatora
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000350-61.2008.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Antonio Alves Batista ajuizou ação, em 17/09/2001, objetivando o reconhecimento de períodos laborados em atividades especiais, com a consequente concessão do benefício de aposentadoria especial.
Indeferido pelo Juízo a quo o pedido de tutela antecipada (fls. 200/202), foi reformada a decisão em sede de agravo de instrumento (fls. 223/224).
Foi proferida sentença, em 04/12/2006, não submetida ao reexame necessário, a julgar procedente o pedido para a concessão do benefício da aposentadoria especial, reconhecendo os interregnos de 23/10/1978 a 01/10/1979, 28/11/1979 a 23/12/1981, 01/06/1982 a 20/09/1987 e 16/11/1987 até a data do decisum, como de atividades exercidas em condições especiais, condenando o INSS à concessão do benefício a partir da data do requerimento administrativo (08/08/2000) e ao pagamento das parcelas vencidas, devidamente corrigidas. Condenado o INSS ao pagamento de honorários advocatícios de 10% sobre o valor da condenação (fls. 408/412).
O INSS apelou, pugnando pela reforma da decisão, insurgindo-se quanto ao reconhecimento do tempo de serviço especial. Subsidiariamente pleiteou a fixação do termo inicial do benefício na data da citação, bem como pela redução dos honorários advocatícios para 5% sobre o valor da causa (fls. 417/422).
Pretende o autor, por sua vez, em seu recurso adesivo, a manutenção da sentença de procedência, com reforma apenas em relação à verba honorária, que quer ver majorada para 15% sobre o valor da condenação (433/435).
Com a apresentação das contrarrazões pelas partes (fls. 424/430 e 438/439), subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Inicialmente, afigura-se incorreta a não submissão da sentença ao reexame necessário.
A r. sentença a quo, provimento de natureza condenatória proferido sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, tem crédito ilíquido, configurando hipótese de conhecimento do reexame necessário, nos moldes da Súmula nº 490 do c. Superior Tribunal de Justiça, que assim dispõe: "A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas".
Portanto, conheço da remessa oficial.
Impende observar, também, que na sentença hostilizada, em sua parte dispositiva, equivocadamente constou o período de 01/06/1982 a 20/09/1987, quando o correto é 01/06/1982 a 30/09/1987, conforme CNIS que se anexa e registro em CTPS (fl. 21), padecendo, aí, de nítido erro material, passível de correção, de ofício, neste instante procedimental.
Passo à análise do mérito.
Discute-se, no presente feito, o direito da parte autora ao reconhecimento de exercício de atividades em condições especiais e, consequentemente, a benefício de aposentadoria especial.
A aposentadoria especial - modalidade de aposentadoria por tempo de contribuição com tempo mínimo reduzido - é devida ao segurado que tiver trabalhado, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, conforme disposição legal, a teor do preceituado no artigo 57 da Lei nº 8.213/91 e no artigo 201, § 1º, da Constituição Federal.
O período de carência exigido, por sua vez, está disciplinado pelo artigo 25, inciso II, da Lei de Planos de Benefícios da Previdência Social, o qual prevê 180 (cento e oitenta) contribuições mensais, bem como pela norma transitória contida em seu artigo 142.
Registre-se, por oportuno, que o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em recurso submetido à sistemática do artigo 543-C do CPC/1973, decidiu que a "lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço", de modo que a conversão do tempo de atividade comum em especial, para fins de aposentadoria especial, é possível apenas no caso de o benefício haver sido requerido antes da entrada em vigor da Lei n.º 9.032/95, que deu nova redação ao artigo 57, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, exigindo que todo o tempo de serviço seja especial (REsp 1310034/PR, Primeira Seção, Rel.Min. Herman Benjamin, DJe 19/12/2012).
A caracterização e comprovação da atividade especial, de acordo com o atual Regulamento da Previdência Social (Decreto n.º 3.048/1999), "obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço" (art. 70,§ 1º), como já preconizava a jurisprudência existente acerca da matéria e restou sedimentado em sede de recurso repetitivo (REsp 1151363/MG, Terceira Seção, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 05/04/2011; REsp 1310034/PR, citado acima).
Dessa forma, até o advento da Lei n.º 9.032, de 28 de abril de 1995, para a configuração da atividade especial, bastava o seu enquadramento nos Anexos dos Decretos n.ºs. 53.831/64 e 83.080/79, os quais foram validados pelos Decretos n.ºs. 357/91 e 611/92, possuindo, assim, vigência concomitante.
Consoante entendimento consolidado de nossos tribunais, a relação de atividades consideradas insalubres, perigosas ou penosas constantes em regulamento é meramente exemplificativa, não exaustiva, sendo possível o reconhecimento da especialidade do trabalho executado mediante comprovação nos autos. Nesse sentido, a Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos: "Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento".
A partir da referida Lei n.º 9.032/95, que alterou o artigo 57, §§ 3º e 4º, da Lei n.º 8.213/91, não mais se permite a presunção de insalubridade, tornando-se necessária a comprovação da efetiva exposição a agentes prejudiciais à saúde ou integridade física do segurado e, ainda, que o tempo trabalhado em condições especiais seja permanente, não ocasional nem intermitente.
A propósito:
A comprovação podia ser realizada por meio de formulário específico emitido pela empresa ou seu preposto (SB-40, DISES BE 5235, DSS 8030 ou DIRBEN 8030, atualmente, Perfil Profissiográfico Previdenciário-PPP), ou outros elementos de prova, independentemente da existência de laudo técnico, com exceção dos agentes agressivos ruído e calor, os quais sempre exigiram medição técnica.
Posteriormente, a Medida Provisória n.º 1.523/96, com início de vigência na data de sua publicação, em 14/10/1996, convertida na Lei n.º 9.528/97 e regulamentada pelo Decreto n.º 2.172, de 05/03/97, acrescentou o § 1º ao artigo 58 da Lei n.º 8.213/91, determinando a apresentação do aludido formulário "com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho". Portanto, a partir da edição do Decreto n.º 2.172/97, que trouxe o rol dos agentes nocivos, passou-se a exigir, além das informações constantes dos formulários, a apresentação do laudo técnico para fins de demonstração da efetiva exposição aos referidos agentes.
Incluiu-se, ademais, o § 4º do mencionado dispositivo legal, in verbis:
O Decreto n.º 3.048/99, em seu artigo 68, § 9º, com a redação dada pelo Decreto n.º 8.123/2013, ao tratar dessa questão, assim definiu o PPP:
Por seu turno, o INSS editou a Instrução Normativa INSS/PRES n.º 77, de 21/01/2015, estabelecendo, em seu artigo 260, que: "Consideram-se formulários legalmente previstos para reconhecimento de períodos alegados como especiais para fins de aposentadoria, os antigos formulários em suas diversas denominações, sendo que, a partir de 1º de janeiro de 2004, o formulário a que se refere o § 1º do art. 58 da Lei nº 8.213, de 1991, passou a ser o PPP".
Quanto à conceituação do PPP, dispõe o artigo 264 da referida Instrução Normativa:
Assim, o PPP, à luz da legislação de regência e nos termos da citada Instrução Normativa, deve apresentar, primordialmente, dois requisitos: assinatura do representante legal da empresa e identificação dos responsáveis técnicos habilitados para as medições ambientais e/ou biológicas.
Na atualidade, a jurisprudência tem admitido o PPP como substitutivo tanto do formulário como do laudo técnico, desde que devidamente preenchido.
A corroborar o entendimento esposado acima, colhem-se os seguintes precedentes:
No tocante ao agente nocivo ruído, tendo em vista o princípio tempus regit actum, restou pacificado na jurisprudência que os níveis de pressão sonora a serem considerados insalubres são os seguintes: acima de 80 dB, até 05/03/1997, na vigência do Decreto n.º 53.831/64, superior a 90 dB, de 06/03/1997 a 18/11/2003, conforme Decreto n.º 2.172/97 e acima de 85 dB, a contar de 19/11/2003, quando foi publicado o Decreto n.º 4.882/2003, o qual não se aplica retroativamente, consoante assentado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, em recurso submetido ao regime do art. 543-C do CPC/1973 (REsp 1398260/PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 05/12/2014).
Quanto ao uso de Equipamento de Proteção Individual - EPI, no julgamento do ARE n.º 664.335/SC, em que restou reconhecida a existência de repercussão geral do tema ventilado, o Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o mérito, decidiu que, se o aparelho "for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial". Destacou-se, ainda, que, havendo divergência ou dúvida sobre a sua real eficácia, "a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial".
Especificamente em relação ao agente agressivo ruído, estabeleceu-se que, na hipótese de a exposição ter se dado acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do EPI, "não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria". Isso porque não há como garantir, mesmo com o uso adequado do equipamento, a efetiva eliminação dos efeitos nocivos causados por esse agente ao organismo do trabalhador, os quais não se restringem apenas à perda auditiva.
DO CASO CONCRETO
Passo à análise dos períodos reconhecidos na sentença como de trabalho urbano em condições especiais, a saber: 23/10/1978 a 01/10/1979, 28/11/1979 a 23/12/1981, 01/06/1982 a 30/09/1987 e 16/11/1987 a 04/12/2006 (data do decisum), à mingua de recurso da parte autora com relação aos demais períodos pleiteados na inicial.
- 23/10/1978 a 01/10/1979 - laborado na empresa Mangels Indústria e Comércio Ltda., nas funções de ajudante geral (23/10/1978 a 31/05/1979) e operador de produção I (01/06/1979 a 01/10/1979) - formulários DSS 8030 de fls. 43/44 informam a exposição ao agente nocivo ruído registrado em nível de 90dB(A). Contudo não foi apresentado laudo técnico comprovando a referida exposição, imprescindível quando se trata do agente nocivo ruído, inviabilizando o reconhecimento da especialidade.
- 28/11/1979 a 23/12/1981- laborado na empresa BS Continental S/A Utilidades Domésticas, na função de prensista - formulário DISES.BE-5235 de fl. 47 e laudo técnico de fls. 48/49 informam a exposição ao agente nocivo ruído registrado em nível de 95dB(A), vale dizer, acima dos limites estabelecidos em lei, impondo-se o enquadramento no código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64.
- 01/06/1982 a 30/09/1987 - laborado na empresa Sebastião Belezin Cia Ltda., na função de mecânico - formulário DSS 8030 de fl. 46 informa a exposição ao agente nocivo ruído sem registro quando ao nível de exposição, bem como a agentes químicos do tipo hidrocarbonetos e outros derivados de carbono (óleo diesel, graxa, óleo queimado), impondo-se o enquadramento da atividade laborativa no código 1.2.11 do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64 e código 1.2.10 do Anexo I do Decreto n.º 83.080/1979.
- 16/11/1987 a 04/12/2006 - laborado na empresa UNIALCO S/A Álcool e Açúcar, nas funções de mecânico de manutenção (16/11/1987 a 31/05/1990) e líder de moagem (01/06/1990 a 08/08/2000) - formulário DSS 8030 de fl. 34, emitido em 17/09/1998, laudo técnico de fls. 35/42 (data do levantamento: 14/09/1998) e laudo judicial de fls. 323/400 (juntado aos autos em 17/08/2006, fl. 321 verso) informam a exposição ao agente nocivo ruído registrado em nível médio de 92dB(A), vale dizer, acima dos limites estabelecidos em lei, impondo-se o enquadramento no código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, bem como a agentes químicos do tipo hidrocarbonetos e outros derivados de carbono (óleo diesel, graxa, óleo queimado), possibilitando também o enquadramento da atividade laborativa no código 1.2.11 do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64 e código 1.2.10 do Anexo I do Decreto n.º 83.080/1979.
Destarte, entendo que devem ser consideradas, como especiais, tão somente as atividades exercidas nos períodos de 28/11/1979 a 23/12/1981, 01/06/1982 a 30/09/1987 e 16/11/1987 a 17/08/2006 (data da juntada do laudo judicial).
Desse modo, verifica-se que, da soma dos interregnos de atividade especial, por ocasião do requerimento administrativo, datado de 08/08/2000 (fl.89), contava o autor com o total de 20 anos, 01 mês e 19 dias de tempo de serviço especial, até a data da citação (08/01/2002, fl. 227v), 21 anos, 06 meses e 19 dias e, até a data da juntada do laudo judicial (17/08/2006), 26 anos, 01 mês e 28 dias, além de haver cumprido a carência exigida, nos termos da legislação de regência.
Portanto, presentes os requisitos, é devido o benefício da aposentadoria especial, razão pela qual merece ser mantida, neste aspecto, a r. sentença recorrida.
O termo inicial do benefício deve ser fixado a partir da data da juntada do laudo judicial (17/08/2006), tendo em vista o reconhecimento da especialidade até essa época e também por, somente nesse momento, terem sido implementados os requisitos necessários à aposentação.
Sobre os valores em atraso, incidirão juros e correção monetária em conformidade com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE 870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux.
Mantenho os honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da decisão concessiva do benefício, consoante § 3º do artigo 20 do Código de Processo Civil de 1973 (vigente no momento da publicação do decisum), Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e jurisprudência desta 9ª Turma. Cumpre destacar, nesse ponto, que não se aplica ao caso em análise disposto no artigo 85 do NCPC, tendo em vista que a sentença impugnada foi publicada antes do início de sua vigência.
Por fim, conforme se verifica do CNIS, o demandante já recebe o benefício de aposentadoria especial desde 14/02/2002 (NB 1235637538), razão pela qual deverá optar pelo benefício que entender mais vantajoso - a atual aposentadoria percebida ou a concedida nos presentes autos, sem mescla de efeitos financeiros, ou seja, elegendo a aposentadoria outorgada em nível administrativo, sucederá a renúncia à benesse concedida neste feito, bem como aos respectivos valores atrasados. Por outro lado, caso opte pela aposentadoria deferida judicialmente, os valores já pagos, na via administrativa, deverão ser integralmente abatidos do débito.
Ante o exposto, corrijo, de ofício, o erro material na sentença, na forma da fundamentação, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E A REMESSA OFICIAL, TIDA POR INTERPOSTA, para excluir o período de 23/10/1978 a 01/10/1979, limitar o reconhecimento da especialidade, quanto ao derradeiro interregno, até 17/08/2006, e fixar o termo inicial do benefício na data da juntada do laudo judicial, bem como NEGO PROVIMENTO AO RECURSO ADESIVO DO AUTOR. No mais, fica mantida a r. sentença recorrida, explicitados os critérios de incidência de correção monetária e juros de mora.
É como voto
ANA PEZARINI
Desembargadora Federal Relatora
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