
| D.E. Publicado em 21/06/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal Relatora
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014696-02.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de apelação autoral tirada de sentença que, em autos de concessão de aposentadoria por idade de trabalhador rural, julgou improcedente o pedido e condenou a parte autora no pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em R$ 880,00, suspendendo-se a execução das mencionadas verbas em virtude da concessão da justiça gratuita (fls. 97/100).
Em seu recurso, pugna o autor pela reforma da decisão combatida, ao argumento de existência de início de prova material da atividade rurícola, corroborada pela prova testemunhal produzida nos autos (fls. 112/119).
Sem contrarrazões (fl. 133), subiram os autos a este Tribunal.
Em síntese, o relatório.
VOTO
Conheço do recurso de apelação, uma vez que cumpridos os requisitos de admissibilidade, conforme o artigo 1.011 do NCPC.
A aposentadoria por idade de rurícola exige idade mínima de 60 anos (homem) e 55 anos (mulher), bem assim comprovação do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência da benesse, conforme tabela progressiva, de cunho transitório, inserta no art. 142 da Lei nº 8.213/91, a ser manejada conforme o ano de implementação do requisito etário, ficando afastada a obrigatoriedade de contribuições. Findo o período de vigência da norma de transição, imperioso aplicar-se a regra permanente estampada no art. 48 e parágrafos do mesmo diploma, na dicção da Lei nº 11.718/2008, fincada, nesse particular, a exigência de demonstração do exercício de labor rural por 180 meses (carência da aposentadoria por idade).
Muito se debateu a respeito da comprovação da atividade rural para efeito de concessão do aludido benefício e, atualmente, reconhece-se na jurisprudência elenco de posicionamentos assentados sobre o assunto, a nortear apreciação das espécies e a valoração dos respectivos conjuntos probatórios. Dentre esses entendimentos, podem-se destacar os seguintes:
(i) é suficiente à demonstração do labor rural início de prova material (v.g., documentos expedidos por órgãos públicos que contemplem a qualificação rurícola da parte autora, não sendo taxativo o rol de documentos previsto no art. 106 da Lei nº 8.213/91), corroborado por prova testemunhal coesa e harmônica, sendo inservível a tal finalidade prova exclusivamente testemunhal (Súmula STJ 149), inclusive para os chamados "boias-frias" (REsp nº 1.321.493/PR, apreciado na sistemática do art. 543-C do CPC);
(ii) são extensíveis à mulher, a partir da celebração do matrimônio ou do limiar da união estável, os documentos em que os cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores (v.g., STJ, AGARESP 201402280175, Relatora Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJE 11/12/2014)
(iii) não se enquadra como princípio documental certidão recente da Justiça Eleitoral, preenchida de acordo com informações fornecidas pelo próprio postulante do jubilamento, assemelhando-se, portanto, à singela declaração unilateral de atividade profissional (e.g., TRF3, AC 00160584920114039999, Relator Juiz Convocado Valdeci dos Santos, Décima Turma, e-DJF3 01/07/2015; AC 00025385620104039999, AC 1482334, Relatora Desembargadora Federal Tania Marangoni, Oitava Turma, e-DJF3 16/04/2015).
(iv) o afastamento do ofício rural, após o preenchimento de todos os requisitos exigidos à aposentadoria, não interfere em sua concessão, sendo, contudo, inaplicável aos rurícolas o estatuído no art. 3º, da Lei nº 10.666/2003 (STJ, PET nº 7.476/PR, 3ª Seção, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 13/12/2010, Rel. p/ acórdão Min. Jorge Mussi; AgRg no REsp nº 1.253.184, 5ª Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 06/09/2011; AgRg no REsp nº 1.242.720, 6ª Turma, Rel. Min. Sebastião Reis Junior, j. 02/02/2012; REsp nº 1.304.136, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamim, j. 21/02/2013, DJe 07/03/2013), sob pena, inclusive, de se atribuir aos trabalhadores rurais regime híbrido em que se mesclariam as vantagens típicas dos campesinos e outras inerentes exclusivamente aos obreiros urbanos;
(v) possível o reconhecimento de tempo de serviço rural antecedente ou ulterior ao princípio de prova documental apresentado, desde que ratificado por testemunhos idôneos (STJ, REsp nº 1.348.633/SP, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJE 05/12/2014).
A despeito de toda evolução exegética a respeito da matéria, certo é que alguns pontos permaneceram polêmicos por anos e apenas recentemente experimentaram pacificação. Talvez o maior deles diga respeito, justamente, à necessidade de demonstração da labuta rural no período imediatamente anterior ao requerimento da benesse.
Respeitáveis posições recusavam uma resposta apriorística do que viesse a se entender pela expressão período imediatamente anterior, sob o argumento de que a solução da controvérsia passa por acurado estudo de cada caso concreto, com destaque à cronologia laboral da parte autora, a fim de definir se verdadeiramente se está diante de pessoa que dedicou sua vida profissional às lides rurais.
Sem embargo, o dissenso acabou desfechado pelo c. STJ em sede de recurso representativo de controvérsia, in verbis:
No mesmo sentido:
Da análise dos entendimentos jurisprudenciais coletados, penso que a concessão da aposentadoria por idade de trabalhador rural há de se atrelar à comprovação do desempenho de labor rural quando da propositura da ação, da formulação do requerimento administrativo ou, ao menos, por ocasião do atingimento do requisito etário, como, de resto, textualmente deliberado por esta E. Corte em paradigma da Terceira Seção: EI 00139351020134039999, Relatora DESEMBARGADORA FEDERAL THEREZINHA CAZERTA, e-DJF3 Judicial 1 10/06/2015.
Outra temática remanesce polêmica à atualidade, mormente na seara desta egrégia Corte, e diz com a necessidade de contemporaneidade do início de prova material amealhado a, quando menos, uma fração do período exigido pela lei para a outorga do benefício.
Muito embora reconheça postura algo hesitante deste Tribunal - que, muita vez, vem relativizando o atendimento dessa exigência, principalmente naquelas espécies em que o histórico laborativo rural da parte impressiona, permitindo divisar que na maior parte de sua jornada trabalhista a parte dedicou-se veramente aos ofícios campestres - tenho por certo que o egrégio STJ vem consagrando a imprescindibilidade de concomitância temporal - ainda que ínfima - entre a data do documento indiciário do afazer rurícola e o interstício de atividade rural necessário à concessão da benesse.
Seguem arestos nesse diapasão: STJ, AR 3994 / SP, Relator Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, TERCEIRA SEÇÃO, j. 23/09/2015, DJe 01/10/2015; STJ, AgRg no AREsp 436471 / PR, AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2013/0384226-1, Relator Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, j. 25/03/2014, DJe 15/04/2014; TRF3, APELREEX 00232553620034039999, Relator DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS, NONA TURMA, e-DJF3 10/07/2015.
Esposando o mesmo raciocínio, a Súmula 34 da TNU, verbis:
A propósito, tenho que a condicionante resulta, de certo modo, enaltecida em recurso repetitivo emanado do c. STJ. Vale constatar, num primeiro lanço, o seguinte aresto, exarado sob o rito do art. 543-C do CPC/1973:
Ora bem, da leitura da ementa retrotranscrita, ressai cristalino ser dispensável que o princípio de prova documental diga respeito a todo o período a comprovar-se: admite-se que aluda, apenas, à parcela deste. Equivale, pois, a afirmar-se que o princípio deve reportar-se ao menos a um quinhão do intervalo laborativo a ser comprovado. E, em ação de aposentadoria por idade rural, o que deve ser demonstrado é justamente o lapso dito de carência, vale dizer, a labuta campesina no período imediatamente anterior à vindicação do benefício, pois, sem isso, não há benesse a deferir-se.
Destarte, à luz dos julgados do c. STJ e da linha exegética acima, inclino-me pela simultaneidade, ainda quando diminuta, entre os documentos ofertados e o interregno laboral necessário à outorga do beneplácito.
Postas as balizas, passo a analisar o caso dos autos.
De pronto, verifica-se o cumprimento pela parte autora do requisito etário em 28/01/2013 (fl. 13), incumbindo-lhe, pois, demonstrar atividade campestre por 180 meses.
A título de início de prova material, o proponente colacionou, além de outros documentos extemporâneos ao lapso de carência da vindicada benesse (v.g., certidão de nascimento, ficha de identificação junto a Secretaria de Segurança Publica do Estado de São Paulo e certificado de dispensa de corporação), cópia de notas fiscais de aquisição de equipamentos para o desempenho de atividade rural, tais como foice e enxadas, em 01/2015 e 04/2015 (fls.18/19).
Verifica-se, ainda, que o requerente, segundo extrato do CNIS de fls. 29 e 56/59, verteu contribuições como empresário, através da pessoa jurídica "João de Paulo Bar - ME" nos seguintes períodos: 01/05/2008 a 31/07/2008; e de 01/10/2008 a 28/02/2009.
Nota-se, assim, que o requerente contribuiu como empresário no lapso de carência do beneplácito pretendido (28/01/1998 a 28/01/2013).
Não bastasse a fragilidade do conjunto probatório trazido na exordial, a prova oral também não favorece o pleito autoral.
A testemunha Arnaldo Grandezoli, ouvido em 18/05/2016, disse que conhece o requerente há aproximadamente 30 anos, pois o encontrava no caminho para o trabalho desempenhado na "Fazenda Quinaglia". Não soube informar por quanto tempo o requerente trabalhou na mencionada fazenda. Historiou que, posteriormente, o vindicante laborou para o "Sr. Dacio Castanho", em Bernadino de Campos, por volta de 20 anos. Asseverou que, desde 2010, o proponente labuta na "Fazenda Nossa Senhora de Lourdes", não sabendo qual o vínculo estabelecido entre o proprietário e o autor. Afirmou que não presenciou o trabalho rural do autor em nenhuma das propriedades, tendo este "passado todas as informações para ele".
José Roberto Totoneli, por sua vez, disse que conhece o requerente há 20 anos, quando este trabalhava para o "Sr. Décio Castanho". Afirmou que o autor prestou serviços sem registro para o referido tomador por 17 anos, sem apontar, contudo, as atividades que ele exercia. Demonstrando-se um pouco confuso, asseverou que o vindicante mudou-se posteriormente para a cidade, corrigindo-se imediatamente e dizendo que na verdade este passou a trabalhar no "Sítio Nossa Senhora de Lourdes", no ano de 2010. Noticiou que o proprietário permitiu que o requerente explorasse um pedaço de terra em troca deste "olhar" a propriedade. Questionado inúmeras vezes pelo magistrado a quo sobre a natureza do vínculo estabelecido entre as partes, o depoente não soube dizer que tipo de acordo foi estabelecido, insistindo apenas que o proponente trabalhava no pedaço de terra.
Alfim, Moacir Sartori mostrou-se incerto quanto à data em que conheceu o requerente, dizendo inicialmente que foi no ano de 1993, quando este trabalhava para o "Sr. Décio Castanho". Corrigiu-se afirmando que foi no ano de 1983, tendo o vindicante laborado para o referido tomador até o ano de 2010. Fazendo contas de quantos anos se passaram, voltou atrás e disse que, na verdade, conheceu o requerente em 1993. Questionado sobre a atividade desempenhada pelo autor neste período, disse que ele "mexia com café", sem indicar, contudo, as atividades por ele desempenhadas. Historiou que, há aproximadamente 6 anos, o proponente passou a trabalhar na "Fazenda Nossa Senhora de Lourdes", tendo o atual proprietário, filho do falecido "Dirceu Martins", cedido um pequeno pedaço de terra para exploração agrícola. Não soube dizer a que título ocorreu tal cessão, afimando apenas que o autor trabalha em companhia de seu cunhado.
A prova oral é, portanto, vaga em ponto crucial, porquanto, como dito, a concessão da aposentadoria pleiteada se vincula à comprovação do desempenho de labor rural quando da propositura da ação, da formulação do requerimento administrativo ou, quando menos, por ocasião do atingimento do requisito etário, o que não sucede, na espécie. De rigor, portanto, o indeferimento do pleito inicial e, de conseguinte, a manutenção da sentença de improcedência.
Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação.
É o voto.
ANA PEZARINI
Desembargadora Federal Relatora
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| Data e Hora: | 07/06/2018 15:00:24 |
