
| D.E. Publicado em 22/03/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal Relatora
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REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL Nº 0012724-77.2009.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
Felix Pereira da Silva ajuizou ação, em 05/10/2009, objetivando o reconhecimento do exercício de atividade especial nos períodos de 01/10/1975 a 08/10/1976, 01/03/1977 a 16/11/1977, 01/02/1978 a 30/12/1979, 01/02/1980 a 31/07/1982, 01/10/1982 a 31/07/1985, 02/09/1985 a 01/11/1986, 01/09/1987 a 24/01/1990, 02/01/1991 a 02/03/1998 e 02/01/1999 a 01/08/2009, para fins de concessão do benefício de aposentadoria especial ou por tempo de contribuição, com a conversão dos períodos especiais em comuns.
O Juízo a quo proferiu sentença, submetida ao reexame necessário, a julgar parcialmente procedente o pedido, para reconhecer como especiais as atividades exercidas pelo autor nos períodos de 02/09/1985 a 01/11/1986, 01/09/1987 a 24/01/1990 e 02/01/1991 a 02/03/1998, a fim de conceder o benefício da aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER (30/06/2009, fl. 23). Fixou honorários advocatícios, determinando a compensação em razão da sucumbência recíproca, e concedeu a antecipação da tutela jurisdicional (fls. 103/111verso).
Sem apelação das partes, subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
De início, no tocante ao período trabalhado pelo autor na empresa Auto Ônibus Lago Azul Ltda., cuja especialidade foi reconhecida na sentença, em que pese a decisão, em sua parte dispositiva, trazer grafado o período 02/01/1991 a 02/03/1998, é certo que o interregno de atividade qualificada como especial é de 02/01/1991 a 05/03/1997, conforme fundamentação no corpo da r. sentença, no sentido de que "é possível o enquadramento como especial no Código 1.2.11 do quadro anexo do Decreto 53.831/64 para o lapso temporal de 02/01/1991 a 05/03/1997, pois a partir da vigência do Decreto n. 2.172/97 não há previsão como nociva à saúde da atividade do autor com a exposição acima aludida". Tratando-se, pois, de patente equívoco material, cabível a sua correção neste instante procedimental.
No que tange ao mérito, cumpre, antes de examiná-lo frente às provas apresentadas, tecer algumas considerações acerca da matéria.
Nos termos dos artigos 52 e 53 da Lei n.º 8.213/91, a aposentadoria por tempo de serviço (atualmente denominada aposentadoria por tempo de contribuição), é devida, na forma proporcional ou integral, respectivamente, ao segurado que tenha completado 25 anos de serviço (se mulher) e 30 anos (se homem), ou 30 anos de serviço (se mulher) e 35 anos (se homem).
O período de carência exigido, por sua vez, está disciplinado pelo artigo 25, inciso II, da Lei de Planos de Benefícios da Previdência Social, o qual prevê 180 (cento e oitenta) contribuições mensais, bem como pela norma transitória contida em seu artigo 142.
Contudo, após a Emenda Constitucional n.º 20, de 15 de dezembro de 1998, respeitado o direito adquirido à aposentadoria com base nos critérios anteriores até então vigentes, aos que já haviam cumprido os requisitos para sua obtenção (art. 3º), não há mais que se falar em aposentadoria proporcional.
Excepcionalmente, poderá se aposentar, ainda, com proventos proporcionais, o segurado filiado ao regime geral da previdência social até a data de sua publicação (D.O.U. de 16/12/1998) que preencher as seguintes regras de transição: idade mínima de 53 (cinquenta e três) anos, se homem, e 48 (quarenta e oito) anos, se mulher, e um período adicional de contribuição equivalente a 40% (quarenta por cento) do tempo que, àquela data (16/12/1998), faltaria para atingir o limite de vinte e cinco ou trinta anos de tempo de contribuição (art. 9º, § 1º).
No caso da aposentadoria integral, descabe a exigência de idade mínima ou "pedágio", consoante exegese da regra permanente, menos gravosa, inserta no artigo 201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal, como já admitiu o próprio INSS administrativamente.
Registre-se, por oportuno, que, para efeito de concessão desse benefício, poderá ser considerado o tempo de serviço especial prestado em qualquer época, o qual será convertido em tempo de atividade comum, à luz do disposto no artigo 70, § 2º, do atual Regulamento da Previdência Social (Decreto n.º 3.048/1999): "As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum constantes deste artigo, aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período".
Inexiste, pois, limitação à conversão em comento quanto ao período laborado, seja ele anterior à Lei n.º 6.887/1980 ou posterior a 1998, havendo o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, inclusive, firmado a compreensão de que se mantém "a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998, pois a partir da última reedição da MP n. 1.663, parcialmente convertida na Lei 9.711/1998, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o referido § 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/1991". Ficou assentado, ademais, que o enquadramento da atividade especial rege-se pela lei vigente ao tempo do labor, mas "a obtenção de benefício fica submetida às regras da legislação em vigor na data do requerimento", ou seja, no momento em que foram implementados os requisitos para a concessão da aposentadoria, como é o caso da regra que define o fator de conversão a ser utilizado (REsp 1151363/MG, Terceira Seção, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 05/04/2011).
Em sintonia com o aresto supracitado, a mesma Corte, ao analisar outro recurso submetido à sistemática do artigo 543-C do CPC/1973, decidiu que a "lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço", de modo que a conversão do tempo de atividade comum em especial, para fins de aposentadoria especial, é possível apenas no caso de o benefício haver sido requerido antes da entrada em vigor da Lei n.º 9.032/95, que deu nova redação ao artigo 57, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, exigindo que todo o tempo de serviço seja especial (REsp 1310034/PR, Primeira Seção, Rel.Min. Herman Benjamin, DJe 19/12/2012).
DA COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE ESPECIAL
No que tange à atividade especial, o atual decreto regulamentar estabelece que a sua caracterização e comprovação "obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço" (art. 70,§ 1º), como já preconizava a jurisprudência existente acerca da matéria e restou sedimentado nos recursos repetitivos supracitados.
Dessa forma, até o advento da Lei n.º 9.032, de 28 de abril de 1995, para a configuração da atividade especial, bastava o seu enquadramento nos Anexos dos Decretos n.ºs. 53.831/64 e 83.080/79, os quais foram validados pelos Decretos n.ºs. 357/91 e 611/92, possuindo, assim, vigência concomitante.
Consoante entendimento consolidado de nossos tribunais, a relação de atividades consideradas insalubres, perigosas ou penosas constantes em regulamento é meramente exemplificativa, não exaustiva, sendo possível o reconhecimento da especialidade do trabalho executado mediante comprovação nos autos. Nesse sentido, a Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos: "Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento".
A partir da referida Lei n.º 9.032/95, que alterou o artigo 57, §§ 3º e 4º, da Lei n.º 8.213/91, não mais se permite a presunção de insalubridade, tornando-se necessária a comprovação da efetiva exposição a agentes prejudiciais à saúde ou integridade física do segurado e, ainda, que o tempo trabalhado em condições especiais seja permanente, não ocasional nem intermitente.
A propósito:
A comprovação podia ser realizada por meio de formulário específico emitido pela empresa ou seu preposto (SB-40, DISES BE 5235, DSS 8030 ou DIRBEN 8030, atualmente, Perfil Profissiográfico Previdenciário-PPP), ou outros elementos de prova, independentemente da existência de laudo técnico, com exceção dos agentes agressivos ruído e calor, os quais sempre exigiram medição técnica.
Posteriormente, a Medida Provisória n.º 1.523/96, com início de vigência na data de sua publicação, em 14/10/1996, convertida na Lei n.º 9.528/97 e regulamentada pelo Decreto n.º 2.172, de 05/03/97, acrescentou o § 1º ao artigo 58 da Lei n.º 8.213/91, determinando a apresentação do aludido formulário "com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho". Portanto, a partir da edição do Decreto n.º 2.172/97, que trouxe o rol dos agentes nocivos, passou-se a exigir, além das informações constantes dos formulários, a apresentação do laudo técnico para fins de demonstração da efetiva exposição aos referidos agentes.
Incluiu-se, ademais, o § 4º do mencionado dispositivo legal, in verbis:
O Decreto n.º 3.048/99, em seu artigo 68, § 9º, com a redação dada pelo Decreto n.º 8.123/2013, ao tratar dessa questão, assim definiu o PPP:
Por seu turno, o INSS editou a Instrução Normativa INSS/PRES n.º 77, de 21/01/2015, estabelecendo, em seu artigo 260, que: "Consideram-se formulários legalmente previstos para reconhecimento de períodos alegados como especiais para fins de aposentadoria, os antigos formulários em suas diversas denominações, sendo que, a partir de 1º de janeiro de 2004, o formulário a que se refere o § 1º do art. 58 da Lei nº 8.213, de 1991, passou a ser o PPP".
Quanto à conceituação do PPP, dispõe o artigo 264 da referida Instrução Normativa:
Assim, o PPP, à luz da legislação de regência e nos termos da citada Instrução Normativa, deve apresentar, primordialmente, dois requisitos: assinatura do representante legal da empresa e identificação dos responsáveis técnicos habilitados para as medições ambientais e/ou biológicas.
Na atualidade, a jurisprudência tem admitido o PPP como substitutivo tanto do formulário como do laudo técnico, desde que devidamente preenchido.
A corroborar o entendimento esposado acima, colhem-se os seguintes precedentes:
Quanto ao uso de Equipamento de Proteção Individual - EPI, no julgamento do ARE n.º 664.335/SC, em que restou reconhecida a existência de repercussão geral do tema ventilado, o Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o mérito, decidiu que, se o aparelho "for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial". Destacou-se, ainda, que, havendo divergência ou dúvida sobre a sua real eficácia, "a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial".
Especificamente em relação ao agente agressivo ruído, estabeleceu-se que, na hipótese de a exposição ter se dado acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do EPI, "não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria". Isso porque não há como garantir, mesmo com o uso adequado do equipamento, a efetiva eliminação dos efeitos nocivos causados por esse agente ao organismo do trabalhador, os quais não se restringem apenas à perda auditiva.
DO CASO CONCRETO
Passo a análise, nos limites da remessa oficial, dos períodos reconhecidos na sentença como de labor em condições especiais.
- 02/09/1985 a 01/11/1986 e 01/09/1987 a 24/01/1990, laborados na empresa Auto Posto Francorrochense Ltda., na função de frentista, conforme registro em CTPS (fls. 38/39) - formulários DSS-830 (fls. 27 e 30) informam a exposição do autor, de forma habitual e permanente, à "inalação de vapores de gasolina, álcool, diesel, entre outros agentes nocivos à saúde".
- 02/01/1991 a 05/03/1997, laborado na empresa Auto Ônibus Lago Azul Ltda., na função de lubrificador - laudo técnico pericial elaborado na Justiça do Trabalho (Ação Trabalhista nº 826/98 - Reclamante: Felix Pereira da Silva, Reclamada: Auto Ônibus Lago Azul Ltda., fls. 57/74) informa a exposição do autor a óleo lubrificante, advertindo que "os óleos de lubrificação são óleos derivados do petróleo, que contém os chamados 'Hidrocarbonetos Aromáticos Policíclicos" que são normalmente utilizados nas indústrias como óleos para lubrificação de ônibus".
No tocante às funções de frentista e lubrificador, verifica-se a exposição do trabalhador a agentes químicos prejudiciais à saúde, tais como gasolina, óleos e etanol (hidrocarbonetos), cabendo o enquadramento das atividades, no código 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64 e 1.2.10 do Anexo I do Decreto n.º 83.080/79.
Acrescente-se, ainda, a periculosidade da atividade em posto de revenda de combustível líquido, decorrente da permanência em área sujeita à ocorrência de incêndios e explosões, devido à existência de substâncias inflamáveis, conforme posicionamento do colendo Supremo Tribunal Federal, esposado na Súmula nº 212: "Tem direito ao adicional de serviço perigoso o empregado de posto de revenda de combustível líquido".
Nesse sentido:
Acentue-se, outrossim, quanto ao período de 02/01/1991 a 05/03/1997, ser perfeitamente admissível a comprovação do labor nocivo por meio de laudo técnico pericial elaborado na Justiça do Trabalho, tendo em vista que a ação trabalhista refere-se a vínculo empregatício estabelecido entre o autor e a mesma empresa apontada na CTPS (fl. 39), sendo irrelevante, ademais, a ausência de participação do INSS na lide laboral, desde que propiciado o contraditório em relação à prova, possibilitando o debate em torno de sua higidez, como ocorreu no caso em tela.
Nesse sentido:
Assim, faz jus o demandante ao reconhecimento da especialidade dos períodos em questão, razão pela qual não merece reparos a r. sentença recorrida.
Somados os períodos insalubres reconhecidos neste feito (02/09/1985 a 01/11/1986, 01/09/1987 a 24/01/1990 e 02/01/1991 a 05/03/1997) àqueles períodos de labor comum incontroversos (CTPS, fls. 35/39 e CNIS, fl. 24), verifica-se que, afastados os lapsos concomitantes, possui o autor, até a data do requerimento administrativo (30/06/2009), 34 anos, 04 meses e 20 dias de tempo de contribuição.
Percebe-se, ademais, que, além da carência exigida, foram atendidas as regras transitórias previstas na referida emenda constitucional: "pedágio" e idade mínima de 53 anos (data de nascimento: 01/09/1955, fl.21).
Portanto, presentes os requisitos, é devido o benefício da aposentadoria por tempo de contribuição, na forma proporcional, conforme entendeu acertadamente a juíza sentenciante.
O termo inicial do benefício foi corretamente fixado a partir da data de entrada do requerimento administrativo (vide decisão do STJ, em caso similar, no REsp 1568343/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 05/02/2016).
Solucionado o mérito, passo à análise dos consectários.
Sobre os valores em atraso, incidirão juros e correção monetária em conformidade com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE 870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux.
Mantenho os honorários advocatícios nos moldes fixados na sentença, à míngua de recurso da parte autora.
Os valores já pagos após o termo inicial fixado para a aposentadoria concedida nestes autos, seja na via administrativa ou por força de decisão judicial, a título de mesmo benefício ou cuja cumulação seja vedada por lei, deverão ser integralmente abatidos do débito, sendo resguardado ao autor o direito de optar pelo benefício que entender mais vantajoso (art. 124 da Lei 8.213/1991 e art. 20, § 4º, da Lei 8.742/1993).
Ante o exposto, dou parcial provimento à remessa oficial, para corrigir o erro material verificado na decisão monocrática, na forma da fundamentação. Mantida, no mais, a r. sentença recorrida, explicitados os critérios de incidência dos juros de mora e da correção monetária.
É como voto.
ANA PEZARINI
Desembargadora Federal Relatora
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