
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000017-63.2019.4.03.6143
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: JOSE MARINO DOS SANTOS VITTOR
Advogados do(a) APELANTE: DIEGO INHESTA HILARIO - SP286973-N, ERICA CILENE MARTINS - SP247653-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000017-63.2019.4.03.6143
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: JOSE MARINO DOS SANTOS VITTOR
Advogados do(a) APELANTE: DIEGO INHESTA HILARIO - SP286973-N, ERICA CILENE MARTINS - SP247653-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Trata-se de ação em que se pleiteia a conversão da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição em aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de período(s) laborado(s) em atividades especiais (03.02.76 a 31.10.84), com pedido subsidiário de revisão da RMI do benefício.
A sentença julgou improcedente o pedido e condenou a parte autora ao pagamento de honorários de advogado, a serem fixados na fase de execução do julgado em percentual mínimo do valor atualizado da causa, observada a concessão da gratuidade.
Apela a parte autora, pugnando pelo reconhecimento do labor em condições especiais no período rejeitado na sentença e acolhimento integral do pedido exordial, reconhecendo-lhe a conversão do benefício para aposentadoria especial.
Sem contrarrazões (ID 282249215).
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000017-63.2019.4.03.6143
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: JOSE MARINO DOS SANTOS VITTOR
Advogados do(a) APELANTE: DIEGO INHESTA HILARIO - SP286973-N, ERICA CILENE MARTINS - SP247653-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do(s) recurso(s) de apelação.
Passo ao exame do mérito.
Aposentadoria Especial
A aposentadoria por tempo de serviço especial teve assento primeiro no artigo 31 da Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960, Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS, que estabeleceu que seria concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinquenta) anos de idade e 15 (quinze) anos de contribuições, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, em serviços que, para esse efeito, fossem considerados penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo.
Prevê ainda, o mencionado diploma legal, no art. 162, o reconhecimento de atividade especial prestada em data anterior à sua edição, na hipótese de seu cômputo ser mais benéfico ao segurado.
Como assentado pelas Cortes Superiores "tal hipótese, apesar de similar, não se confunde com a questão da legislação aplicável ao caso de concessão de aposentadoria, tampouco com aquela que diz respeito à possibilidade de aplicação retroativa da lei nova que estabeleça restrição ao cômputo do tempo de serviço. (...) Interpretação diversa levaria à conclusão de que o segurado, sujeito a condições insalubres de trabalho, só teria direito à aposentadoria especial após 15, 20 e 25 anos de trabalho exercida depois da Lei nº 3.807/60, desconsiderando, portanto, todo o período de labor, também exercido em tal situação, porém em data anterior à lei de regência." (Ag Rg no REsp nº 1015694, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza Assis de Moura, DJe 01/02/2011)
Essa norma foi expressamente revogada pela Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973, que passou a discipliná-la no artigo 9º, alterando, em efeitos práticos, apenas o período de carência de 15 (quinze) anos para 5 (cinco) anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
Sobreveio, então, o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, reclassificando as atividades profissionais segundo os agentes nocivos e os grupos profissionais tidos por perigosos, insalubres ou penosos, com os respectivos tempos mínimos de trabalho.
Importante ressaltar que os Decretos nºs. 53.831/64 e 83.080/79 tiveram vigências simultâneas, de modo que, conforme reiteradamente decidido pelo C. STJ, havendo colisão entre as mencionadas normas, prevalece a mais favorável ao segurado. (REsp nº 412351, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, pág. 355).
As atividades insalubres previstas nas aludidas normas são meramente exemplificativas, podendo outras funções ser assim reconhecidas, desde que haja similitude em relação àquelas legalmente estatuídas ou, ainda, mediante laudo técnico-pericial demonstrativo da nocividade da ocupação exercida. Nesse sentido, o verbete 198 da Súmula do TFR.
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, a matéria passou a ser prevista no inciso II do artigo 202 e disciplinada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação original previa que o benefício de aposentadoria especial seria devido ao segurado que, após cumprir a carência exigida, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade física, restando assegurada, ainda, a conversão do período trabalhado no exercício de atividades danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em seguida, foi editada a Lei nº 9.032/95, alterando o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, dispondo que a partir desse momento não basta mais o mero enquadramento da atividade exercida pelo segurado na categoria profissional considerada especial, passando a ser exigida a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, que poderá se dar por meio da apresentação de informativos e formulários, tais como o SB-40 ou o DSS-8030.
Posteriormente, com a edição do Decreto n.º 2.172, de 05/03/1997, que estabeleceu requisitos mais rigorosos para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, passou-se a exigir-se a apresentação de laudo técnico para a caracterização da condição especial da atividade exercida. Todavia, por se tratar de matéria reservada à lei, tal exigência apenas tem eficácia a partir da edição da Lei n.º 9.528, de 10/12/1997.
Cumpre observar que a Lei nº 9528/97 também passou a aceitar o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, documento que busca retratar as características de cada emprego do segurado, de forma a facilitar a futura concessão de aposentadoria especial. Assim, identificado no documento o perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, é possível a sua utilização para comprovação da atividade especial em substituição ao laudo pericial.
Ressalto que no tocante ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e à forma da sua demonstração, deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho, conforme jurisprudência pacificada da matéria (STJ - Pet 9.194/PR, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
Nos termos da Súmula nº 68 da TNU, “o laudo pericial não contemporâneo ao período trabalhado é apto à comprovação da atividade especial do segurado”. A extemporaneidade do documento comprobatório das condições especiais de trabalho não prejudica o seu reconhecimento como tal, "pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual a constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica." (Des. Fed. Fausto De Sanctis, AC nº 2012.61.04.004291-4, j. 07/05/2014); “inexiste exigência legal de contemporaneidade dos documentos técnicos que comprovam o exercício de labor especial” (8ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5008647-15.2021.4.03.6119, Rel. Desembargador Federal DAVID DINIZ DANTAS, julgado em 09/08/2022, DJEN DATA: 12/08/2022).
Da vedação prevista no art. 57, § 8º, da Lei 8.213/91
O Plenário do E. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 709 de repercussão geral (RE nº 791.961-PR, j.08.06.2020), em que se discute, à luz dos arts. 5º, XIII; 7º, XXXIII, e 201, § 1º, da Constituição Federal, a constitucionalidade do § 8º do art. 57 da Lei 8.213/1991, que veda a percepção do benefício da aposentadoria especial pelo segurado que continuar exercendo atividade ou operação nociva à saúde ou à integridade física, firmou a seguinte tese: “I) É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não. II) Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o benefício previdenciário em questão”.
Em 24.02.2021, o Pleno do STF, por maioria, acolheu parcialmente os embargos de declaração, para: “a) esclarecer que não há falar em inconstitucionalidade do § 8º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, em razão da alegada ausência dos requisitos autorizadores da edição da Medida Provisória que o originou, pois referida MP foi editada com a finalidade de se promoverem ajustes necessários na Previdência Social à época, cumprindo, portanto, as exigências devidas; b) alterar a redação da tese de repercussão geral fixada, para evitar qualquer contradição entre os termos utilizados no acórdão ora embargado, devendo ficar assim redigida: “4. Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral: ‘(i) [é] constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não; (ii) nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros; efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o pagamento do benefício previdenciário em questão.’”; c) modular os efeitos do acórdão embargado e da tese de repercussão geral, de forma a preservar os segurados que tiveram o direito reconhecido por decisão judicial transitada em julgado até a data deste julgamento; e d) declarar a irrepetibilidade dos valores alimentares recebidos de boa-fé, por força de decisão judicial ou administrativa, até a proclamação do resultado deste julgamento, nos termos do voto do Relator.”
Em 04.10.2021, o Pleno retomou a análise da matéria em sede de embargos de declaração opostos pelo Ministério Público Federal para modular os efeitos, excepcionalmente e temporalmente, da incidência do acórdão, no tocante aos profissionais de saúde constantes do rol do art. 3º-J da Lei nº 13.979/2020, e que estejam trabalhando diretamente no combate à pandemia do COVID-19, ou prestando serviços de atendimento a pessoas atingidas pela doença em hospitais ou instituições congêneres, públicos ou privados, ficando suspensos os efeitos do acórdão proferido nos autos, enquanto estiver vigente a referida lei, que dispõe sobre as medidas de emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do vírus SARS-COV2, rejeitando os aclaratórios opostos pelo Sindicato dos Trabalhadores no Comércio de Minérios, Derivados de Petróleo e Combustíveis de Santos e Região.
Depreende-se assim, que o exercício da atividade especial pelo segurado durante o trâmite do processo administrativo ou judicial, seja de concessão ou de revisão, não altera o seu direito à percepção do benefício e dos efeitos financeiros decorrentes. Apenas com a implantação efetiva do benefício é que se lhe aplica a vedação do § 8º do art. 57 da Lei 8.213/1991, cabendo ao INSS, dentro das suas atribuições, fiscalizar o afastamento do segurado das atividades a partir de então.
Ruído
O Decreto nº 53.831/64 considerava insalubre o labor desempenhado com exposição permanente a ruído acima de 80 dB; já o Decreto nº 83.080/79 fixava a pressão sonora em 90 dB. Na medida em que as normas tiveram vigência simultânea, prevalece disposição mais favorável ao segurado (80 dB).
Com a edição do Decreto nº 2.172/97, a intensidade de ruído considerada para fins de reconhecimento de insalubridade foi elevada para 90 dB, mas, em 2003, essa medida foi reduzida para 85 dB, por meio do Decreto nº 4.882, de 18 de novembro de 2003.
Até 09 de outubro de 2013, os Tribunais adotavam o enunciado pela Súmula nº 32 da TNU. Contudo, esta Súmula foi cancelada em decorrência do julgamento da PET 9059 pelo Superior Tribunal de Justiça (Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJe 09/09/2013) cujo entendimento foi sufragado no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), sob a sistemática dos recursos repetitivos.
Em relação ao agente ruído, vigora o princípio do tempus regit actum. Considera-se especial a atividade desenvolvida acima do limite de 80dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº 2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90dB até 18/11/2003, quando foi editado o Decreto nº 4882/2003. A partir de 19/11/2003 o limite passou a ser de 85 dB.
Saliente-se que a especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico previdenciário (a partir de 11/12/97).
É corrente em nossos tribunais a tese de que sempre se exigiu laudo técnico para comprovar a exposição do trabalhador aos agentes físicos ruído e calor em níveis superiores aos limites máximos de tolerância. Entretanto, no tocante às atividades profissionais exercidas até 10/12/97 - quando ainda não havia a exigência legal de laudo técnico -, essa afirmação deve ser compreendida, não na literalidade, mas no sentido de ser necessário o atesto efetivo e seguro dos níveis de intensidade dos agentes nocivos a que o trabalhador esteve exposto durante sua jornada laboral.
Logo, para as atividades profissionais exercidas até 10/12/97, é suficiente que os documentos apresentados façam expressa menção aos níveis de intensidade dos agentes nocivos.
A legislação de regência não exige que a nocividade do ambiente de trabalho seja aferida a partir de uma determinada metodologia. O artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91, exige que a comprovação do tempo especial seja feita por formulário, ancorado em laudo técnico elaborado por engenheiro ou médico do trabalho, o qual, portanto, pode se basear em qualquer metodologia científica. Não tendo a lei determinado que a aferição só poderia ser feita por meio de uma metodologia específica, não se pode deixar de reconhecer o labor especial pelo fato de o empregador ter utilizado uma técnica diversa daquela indicada na Instrução Normativa do INSS, pois isso representaria uma extrapolação do poder regulamentar da autarquia.
Na sessão de julgamento de 08/02/2017, sob a sistemática dos recursos especiais repetitivos (Tema 1083), o STJ estabeleceu a tese de que o exercício de atividades sob condições especiais pela exposição a ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido através do Nível de Exposição Normalizado (NEN), que indica a média ponderada de ruído. Na ausência deste, deverá ser adotado o critério de nível máximo (pico) de ruído, desde que comprovada a habitualidade e permanência da exposição, através de perícia judicial.
Contudo, acerca da habitualidade e permanência da exposição ao agente ruído, entendo aplicável à hipótese a norma prevista no artigo 375 do CPC/2015, considerando que o cotejo das provas carreadas aos autos, em especial as descrições das atividades desenvolvidas pelo segurado, permite concluir que o segurado ficava habitual e permanentemente exposto ao agente nocivo indicado nos formulários previdenciários/PPP durante a jornada de trabalho, não se fazendo necessário, portanto, a conversão do feito em diligência para a produção de laudo pericial, em observância aos princípios da celeridade e economia processuais.
Saliente-se que de acordo com o definido pelo C. STJ a informação de inserção do NEN, no PPP ou LTCAT, somente tornou-se exigível a partir da edição do Decreto 4.882/2003.
Uso de equipamento de proteção individual - EPI, como fator de descaracterização do tempo de serviço especial
A questão foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do ARE nº 664335, da relatoria do E. Ministro Luiz Fux, com reconhecimento de repercussão geral, na data de 04.12.2014, em que restou decidido que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional ao reconhecimento das atividades especiais.
Restou assentado também que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
O fato de a empresa fornecer equipamento de proteção individual - EPI para neutralização dos agentes agressivos não afasta, por si só, a contagem do tempo especial, pois cada caso deve ser examinado em suas peculiaridades, comprovando-se a real efetividade do aparelho e o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça (AgInt no AREsp n. 1.889.768/MG, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 22/11/2021, DJe de 10/12/2021; REsp n. 1.800.908/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 11/4/2019, DJe de 22/5/2019; REsp 1428183/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 25/02/2014, DJe 06/03/2014).
Ainda, conforme a jurisprudência citada, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído, desde que em níveis acima dos limites legais, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas.
Labor em lavoura canavieira
No julgamento do PUIL Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei n.º 452/PE, o E. Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido da impossibilidade de equiparação da categoria profissional de agropecuária, constante no item 2.2.1 do Anexo ao Decreto n.º 53.831/1964, à atividade exercida pelo empregado rural na lavoura da cana de açúcar (STJ, 1ª Seção, PUIL n. 452/PE, relator Ministro Herman Benjamin, j. 8/5/2019, DJe 14/6/2019).
No entanto, é cediço que a atividade desempenhada por trabalhadores rurais na lavoura canavieira envolve o(a) corte, carpa manual da cana de açúcar, plantio, queimada, aplicação constante de produtos químicos, como pesticidas, inseticidas e herbicidas, além da exposição a substâncias nocivas (hidrocarbonetos aromáticos, compostos de carbono) decorrentes da fuligem da palha da cana queimada.
Considerando-se, ainda, as condições climáticas extenuantes e circunstâncias de trabalho na lavoura canavieira, que demanda notório desgaste físico, em que pese anteriormente ter me posicionado em sentido contrário, entendo possível o reconhecimento como especial da atividade na lavoura da cana de açúcar em razão da insalubridade do trabalho, com base nos códigos 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64, 1.2.10 do Decreto nº 83.080/79 e 1.0.17, Anexo IV do Decreto nº 3.048/99.
A propósito, cito julgados desta C. 7ª Turma: ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001141-18.2018.4.03.6143, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 24/08/2023, DJEN DATA: 28/08/2023; ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 6073769-26.2019.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 10/08/2023, DJEN DATA: 17/08/2023; ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 0008166-16.2016.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 10/08/2023, DJEN DATA: 17/08/2023; ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5335560-92.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 09/05/2023, DJEN DATA: 15/05/2023; ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5316013-66.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 09/05/2023, DJEN DATA: 15/05/2023; ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5316991-43.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 09/05/2023, DJEN DATA: 12/05/2023.
Fonte de custeio
Quanto à alegação de necessidade de prévio custeio, cumpre ressaltar inexistir vinculação do ato de reconhecimento de tempo de atividade perigosa/nociva ao eventual pagamento de encargos tributários com alíquotas diferenciadas, eis que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 não demandam tal exigência, que constituiria encargo para o empregador, não podendo o empregado ser por isso prejudicado. Assim já definiu o C. STF, ao apreciar o tema em repercussão geral ARE nº 664.335/SC, Rel. Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 09/12/2014, DJE 27/03/2015.
Caso concreto - elementos probatórios
Cinge-se a controvérsia acerca da especialidade das atividades trabalhadas no(s) período(s) de 03.02.76 a 31.10.84, objeto de impugnação no(s) recurso(s), considerando que em relação ao(s) período(s) de 01.11.84 a 31.07.87, 01.08.87 a 28.02.89, 01.03.89 a 10.12.98, 11.12.98 a 30.04.2004 e de 01.05.2004 a 17.01.2007 (DER), já houve o reconhecimento na esfera administrativa do INSS (ID 282249122/10-12).
- 03.02.76 a 31.10.84 – serviços gerais de lavoura/Agrícola em lavoura canavieira junto à São Martinho S/A (PPP emitido em 16.05.2017 – ID 282249129/97-103; PPP emitido em 14.06.2022 – ID 282249210).
Anote-se, de início, entendimento desta Turma julgadora no sentido do acolhimento do documento elaborado em data mais próxima à do labor sob análise (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv nº 0004177-43.2012.4.03.6183, julgado em 13/06/2020, DJe: 16/06/2020, Rel. Des. Fed. CARLOS EDUARDO DELGADO).
Adotando-se o entendimento da C. 7ª Turma e considerando-se a regularidade do documento (PPP) emitido em 16.05.2017 – ID 282249129/97-103 com a legislação previdenciária, encontrando-se assinado e datado, bem como preenchido com descrição das funções exercidas, de rigor o acolhimento deste como documento comprobatório, por ser mais contemporâneo ao exercício das atividades no período ora sob análise, em relação àquele emitido em 14.06.2022 – ID 282249210.
Havendo prova nos autos mediante o documento (ID 282249129/97-103) de que a parte autora, no(s) período(s) de 03.02.76 a 31.10.84, trabalhou na lavoura de cana-de-açúcar, extrai-se que, realizando atividades de plantio, manutenção e colheita, ficou exposta a agentes nocivos de natureza química e física, o que é suficiente para o reconhecimento da especialidade de mencionado(s) lapso(s) temporal(is).
Destarte, reconheço o labor em condições especiais no(s) período(s) de 03.02.76 a 31.10.84.
Verifica-se que a soma do período especial aqui reconhecido com aquele(s) já admitido(s) como especial(is) pelo INSS no âmbito administrativo totaliza mais de 25 anos de tempo de serviço especial, o que autoriza a conversão da aposentadoria por tempo de serviço em aposentadoria especial, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
Em relação à fixação do termo inicial das prestações em atraso em virtude da revisão do benefício, transcrevo em parte as razões de decidir expostas pelo Ministro Herman Benjamin, na questão de ordem do REsp. 1912784/SP, que alterou os termos do tema 1124 do STJ:
"A terceira, e última, situação prevista no Tema n. 350 que dispensa o requerimento prévio envolve as pretensões de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido.
Neste caso, importante frisar, o requerimento continua sendo exigido se a pretensão depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração.
É possível constatar que essa situação, em verdade, não constitui exceção, senão confirmação da regra da exigência de requerimento prévio.
Ora, se a pretensão do segurado não depende da análise de matéria de fato alheia ao conhecimento do INSS, significa que já poderia ter sido apreciada por ocasião da concessão original do benefício a ser revisado, restabelecido ou mantido. Afinal, o INSS tem o dever legal de conceder, à luz dos elementos fáticos de que teve conhecimento, a melhor prestação possível ao segurado. A rigor, há aqui uma ação administrativa prévia a ser objeto de controle judicial: a irregularidade da concessão original do benefício a ser revisado, ou da cessação do benefício a ser restabelecido/mantido.
Em contrapartida, se a revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido depender de matéria de fato alheia ao conhecimento do INSS, caberá ao segurado levar os fatos ao conhecimento da autarquia previdenciária, por meio de documentos a serem veiculados em requerimento administrativo específico. Somente no caso de indeferimento dessa postulação surgirá o interesse de agir."
Seguindo-se a lógica adotada pelo C. STJ no decisum acima, cabe ao segurado levar ao INSS o conhecimento de matérias alheias ao seu conhecimento, o que ocorreu neste caso, em que o autor levou ao INSS, na seara administrativa, em sede de revisão apresentada em 11.08.2017, o documento apto a demonstrar a especialidade do labor desenvolvido (PPP emitido em 16.05.2017 – ID 282249129/97-103).
Desta forma, correto fixar o termo inicial para pagamento das prestações corrigidas em virtude da conversão do benefício em aposentadoria especial na data do pedido administrativo de revisão (11.08.2017), em vez da data do pedido administrativo de concessão do benefício, pois no primeiro momento em que o autor procurou pela autarquia, não apresentou tais documentos, não sendo exigível do INSS que lhe concedesse mais do que lhe foi demandado, neste específico caso.
Anoto que os critérios para fixação da RMI devem ser aqueles vigentes no momento em que a parte reuniu os requisitos para a concessão do benefício, como já assente na jurisprudência. Tal afirmação, entretanto, não se confunde com o termo inicial de pagamento de prestações já corrigidas de acordo com a nova RMI, o que, ao meu ver, deve ser fixado na data em que a autarquia tomou conhecimento da pretensão da parte, qual seja, a data do requerimento administrativo de revisão.
Ressalte-se a inocorrência da prescrição quinquenal (artigo 103, §único, da Lei n° 8.213/91), à vista da apresentação da revisão na via administrativa em 11.08.2017 (ID 282249122/13-17) e da propositura da presente ação em 08.01.2019.
As parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora na forma estabelecida e pelos índices previstos no capítulo 4.3, do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, alterado pela Resolução CJF nº 784/2022, de 08 de agosto de 2022, ou daquele que estiver em vigor na data da liquidação do título executivo judicial.
Inverto o ônus da sucumbência e condeno o INSS ao pagamento de honorários de advogado, ora fixados em 10% do valor da condenação, considerados os valores vencidos até a data deste acórdão, nos termos dos incisos I ou II do §3º do artigo 85 do CPC/2015, da Súmula 111 e do Tema 1105 do C. STJ.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação da parte autora, para reconhecer o labor em condições especiais no período de 03.02.76 a 31.10.84 e determinar ao INSS a conversão do benefício em aposentadoria especial, fixando-se o termo inicial das parcelas devidas na data da apresentação da revisão administrativa, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. CONVERSÃO DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL. LAVOURA CANAVIEIRA. COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. TERMO INICIAL DOS EFEITOS FINANCEIROS. DATA DA REVISÃO APRESENTADA NA ESFERA ADMINISTRATIVA. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA.
1. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua demonstração.
2. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico previdenciário (a partir de 11/12/97).
3. É possível o reconhecimento da especialidade do trabalho desempenhado na lavoura de cana de açúcar, tendo em vista as condições climáticas extenuantes e circunstâncias de trabalho na lavoura canavieira.
4. Reconhecida a atividade especial, deve o INSS proceder ao recálculo da renda mensal inicial (RMI) do benefício da parte autora, com a conversão da aposentadoria por tempo de serviço em aposentadoria especial, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
5. Termo inicial dos efeitos financeiros na data da revisão apresentada na esfera administrativa.
6. Juros e correção monetária. Aplicação dos índices previstos no capítulo 4.3, do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, alterado pela Resolução CJF nº 784/2022, de 08 de agosto de 2022, ou daquele que estiver em vigor na data da liquidação do título executivo judicial.
7. Honorários de advogado fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação (art. 85, §§ 2º e 3º, CPC), aplicada a Súmula 111/STJ (Tema 1105/STJ).
8. Apelação da parte autora parcialmente provida.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
