Processo
ApReeNec - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO / MS
5003976-51.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal MARISA FERREIRA DOS SANTOS
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
07/02/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 12/02/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. APOSENTADORIA
POR IDADE HÍBRIDA. PROVA TESTEMUNHAL POUCO CONVINCENTE.
- Para fins de concessão de aposentadoria por idade híbrida, o período de carência pode ser
composto por períodos de atividade rural, ainda que sem contribuição, e de atividade urbana que,
somados, devem totalizar 180 (cento e oitenta) meses.
- Daí resulta a equação para a aposentadoria híbrida: idade (65 ou 60 anos) e 180 meses de
carência, compostos pela soma dos períodos de atividade rural, ainda que sem contribuição, com
os períodos de atividade urbana.
- Desnecessário que a última atividade exercida seja de natureza rural. Precedentes do STJ.
- A autora completou 60 anos em 09.09.2017.
- A prova testemunhal se mostrou frágil e contraditória com os registros existentes no CNIS.
- O conjunto probatório existente nos autos não se mostrou convincente para comprovar o
alegado trabalho rural.
- Considerando os períodos de contribuição existentes no CNIS, a autora não preenche os
requisitos para a concessão da aposentadoria por idade, uma vez que não cumprida a carência
de 180 meses.
- Honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa, suspensa a sua exigibilidade por
ser beneficiária da assistência judiciária gratuita (art. 98, § 3º, do CPC/2015).
- Apelação provida.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Acórdao
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº5003976-51.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
INTERESSADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
INTERESSADO: MAURA DA SILVA FARIAS
Advogado do(a) INTERESSADO: CLAUDEVANO CANDIDO DA SILVA - MS18187-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº5003976-51.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
INTERESSADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
INTERESSADO: MAURA DA SILVA FARIAS
Advogado do(a) INTERESSADO: CLAUDEVANO CANDIDO DA SILVA - MS18187-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Desembargadora Federal MARISA SANTOS (RELATORA):
A autora pede aposentadoria por idade, pelo reconhecimento da atividade rural.
Nascida em 09.09.1957, afirma ter trabalhado no meio rural desde a infância e que a partir de
2009, passou a intercalar serviços de natureza urbana com o trabalho rural. Ingressou com
pedido administrativo em 12.09.2017, indeferido porque não comprovou o efetivo exercício de
atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício por tempo igual
ao número de meses correspondente à carência do benefício.
O Juízo de 1ºgrau julgou procedente o pedido para conceder a aposentadoria por idade a partir
de 01.11.2016, com correção monetária e juros de mora nos termos do art. 1º-F da Lei nº
9.494/97. Sem custas processuais. Honorários advocatícios fixados em 10% das parcelas
vencidas até a sentença.
Sentença proferida em 06.03.2018, não submetida ao reexame necessário.
O INSS apela, sustentando que a autora não cumpriu os requisitos para a concessão da
aposentadoria por idade híbrida.
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº5003976-51.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
INTERESSADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
INTERESSADO: MAURA DA SILVA FARIAS
Advogado do(a) INTERESSADO: CLAUDEVANO CANDIDO DA SILVA - MS18187-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Desembargadora Federal MARISA SANTOS (RELATORA):
A Lei nº 11.718/08 alterou o art. 48 da Lei nº 8.213/91, que passou a ter a seguinte redação:
Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de
trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na
alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo
exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior
ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei.
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2o
deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição
sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco)
anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher.
§ 4o Para efeito do § 3o deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de
acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-
de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-
contribuição da Previdência Social.
Com o término da vigência do prazo previsto no art. 143 da Lei nº 8.213/91, em 31.12.2010,
aquela regra de transição deixou de ser aplicada aos trabalhadores rurais que já exerciam suas
atividades durante a legislação anterior.
A todos os trabalhadores rurais são aplicáveis as regras do art. 48 e seus parágrafos para fins de
aposentadoria por idade.
A regra geral em vigor é a do § 2º do art. 48, que garante aposentadoria por idade ao trabalhador
rural que complete 60 (sessenta) anos de idade, se homem, ou 55 (cinquenta e cinco), se mulher,
desde que comprove o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no
período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de
meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período
a que se referem os incisos III a VIII do § 9º do art. 11. A carência para a aposentadoria por idade
é de 180 (cento e oitenta) meses.
A regra geral tem, então, a seguinte equação: idade (60 ou 55 anos) + 180 meses de efetivo
exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior
ao requerimento do benefício.
A referência à forma "descontínua" da atividade faz supor que o legislador aceita que o
trabalhador possa exercer, eventualmente, atividade urbana, para atender situação emergencial
de falta de emprego, desde que o tempo decorrido não lhe retire a natureza de trabalhador rural.
A experiência tem demonstrado que muitos trabalhadores rurais têm dificuldade para comprovar o
tempo de atividade exigido pela lei, em razão da simplicidade do homem do campo, até mesmo
daquele que lhe dá emprego, da dificuldade de coletar documentos, das longas distâncias que
deve percorrer para cuidar de seus direitos, enfim, situações que muitas vezes os fazem deixar
para trás documentos que, no futuro, serão imprescindíveis para a defesa de seus direitos
previdenciários.
Daí que a comprovação da atividade esbarra em tantas dificuldades que o legislador não poderia
deixar de contemplar as situações em que o rurícola deixa o campo e vai exercer atividade
urbana e, depois, retorna às suas origens. Nessas situações, o que normalmente acontece é que
o trabalhador acaba não conseguindo comprovar o tempo de atividade rural suficiente à
concessão da aposentadoria. Mas também não consegue comprovar a carência para a
aposentadoria por idade como urbano.
O § 3º do art. 48 parece querer, justamente, dar cobertura previdenciária aos que não conseguem
comprovar os requisitos nem para uma nem para outra aposentadoria. Convém transcrever:
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2º
deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição
sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco)
anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher.
Da nova previsão legal conclui-se que o período de carência pode ser composto por períodos de
atividade rural e de atividade urbana que, somados, devem totalizar 180 (cento e oitenta) meses.
Mas a idade já não será reduzida em 5 (cinco) anos: os homens deverão comprovar 65 (sessenta
e cinco) anos e as mulheres 60 (sessenta) anos.
Daí resulta a equação para a aposentadoria híbrida: idade (65 ou 60 anos) + 180 meses,
compostos pela soma dos períodos de atividade rural com os períodos de atividade urbana.
Há, porém, mais um aspecto a ser considerado. A aposentadoria híbrida está expressamente
garantida para os trabalhadores rurais. Trata-se, a nosso ver, de mais uma cobertura
previdenciária garantida aos trabalhadores rurais, que não pode ser estendida aos trabalhadores
urbanos.
Na verdade, aos urbanos continua sendo possível somar períodos de atividade rural sem
contribuição previdenciária apenas para fins de tempo de serviço, mas não para efeitos de
carência.
Não é o que ocorre na aposentadoria híbrida, cujo cálculo da renda mensal inicial está previsto no
§ 4º do art. 48:
§ 4o Para efeito do § 3o deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de
acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-
de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-
contribuição da Previdência Social.
Ou seja, na aposentadoria híbrida, os períodos de atividade rural continuam a ser computados
mesmo sem contribuição.
Prevalece no STJ o entendimento de que não constitui "óbice à concessão do benefício o fato de
que a última atividade exercida pelo segurado, no período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício ou ao implemento da idade mínima, não tenha sido de natureza
agrícola" (cf. RESP 1.590.691-RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Dje 13.04.2016).
Nesse sentido também a decisão proferida no REsp 1.407.613, Rel. Min. Herman Benjamim, DJe
28.11.2014:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. ART. 48, §§ 3º e 4º, DA LEI
8.213/1991. TRABALHO URBANO E RURAL NO PERÍODO DE CARÊNCIA. REQUISITO.
LABOR CAMPESINO NO MOMENTO DO IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO OU DO
REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. EXIGÊNCIA AFASTADA. CONTRIBUIÇÕES. TRABALHO
RURAL. CONTRIBUIÇÕES. DESNECESSIDADE.
1. O INSS interpôs Recurso Especial aduzindo que a parte ora recorrida não se enquadra na
aposentadoria por idade prevista no art. 48, § 3º, da Lei 8.213/1991, pois no momento do
implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo era trabalhadora urbana, sendo
a citada norma dirigida a trabalhadores rurais. Aduz ainda que o tempo de serviço rural anterior à
Lei 8.213/1991 não pode ser computado como carência.
2. O § 3º do art. 48 da Lei 8.213/1991 (com a redação dada pela Lei 11.718/2008) dispõe: "§ 3o
Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no § 2o
deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição
sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco)
anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher."
3. Do contexto da Lei de Benefícios da Previdência Social se constata que a inovação legislativa
trazida pela Lei 11.718/2008 criou forma de aposentação por idade híbrida de regimes de
trabalho, contemplando aqueles trabalhadores rurais que migraram temporária ou definitivamente
para o meio urbano e que não têm período de carência suficiente para a aposentadoria prevista
para os trabalhadores urbanos (caput do art. 48 da Lei 8.213/1991) e para os rurais (§§ 1º e 2º do
art. 48 da Lei 8.213/1991).
4. Como expressamente previsto em lei, a aposentadoria por idade urbana exige a idade mínima
de 65 anos para homens e 60 anos para mulher, além de contribuição pelo período de carência
exigido. Já para os trabalhadores exclusivamente rurais, as idades são reduzidas em cinco anos
e o requisito da carência restringe-se ao efetivo trabalho rural (art. 39, I, e 143 da Lei 8.213/1991).
5. A Lei 11.718/2008, ao incluir a previsão dos §§ 3º e 4º no art. 48 da Lei 8.213/1991, abrigou,
como já referido, aqueles trabalhadores rurais que passaram a exercer temporária ou
permanentemente períodos em atividade urbana, já que antes da inovação legislativa o mesmo
segurado se encontrava num paradoxo jurídico de desamparo previdenciário: ao atingir idade
avançada, não podia receber a aposentadoria rural porque exerceu trabalho urbano e não tinha
como desfrutar da aposentadoria urbana em razão de o curto período laboral não preencher o
período de carência.
6. Sob o ponto de vista do princípio da dignidade da pessoa humana, a inovação trazida pela Lei
11.718/2008 consubstancia a correção de distorção da cobertura previdenciária: a situação
daqueles segurados rurais que, com a crescente absorção da força de trabalho campesina pela
cidade, passam a exercer atividade laborais diferentes das lides do campo, especialmente quanto
ao tratamento previdenciário.
7. Assim, a denominada aposentadoria por idade híbrida ou mista (art. 48, §§ 3º e 4º, da Lei
8.213/1991) aponta para um horizonte de equilíbrio entre as evolução das relações sociais e o
Direito, o que ampara aqueles que efetivamente trabalharam e repercute, por conseguinte, na
redução dos conflitos submetidos ao Poder Judiciário.
8. Essa nova possibilidade de aposentadoria por idade não representa desequilíbrio atuarial, pois,
além de exigir idade mínima equivalente à aposentadoria por idade urbana (superior em cinco
anos à aposentadoria rural), conta com lapsos de contribuição direta do segurado que a
aposentadoria por idade rural não exige.
9. Para o sistema previdenciário, o retorno contributivo é maior na aposentadoria por idade
híbrida do que se o mesmo segurado permanecesse exercendo atividade exclusivamente rural,
em vez de migrar para o meio urbano, o que representará, por certo, expressão jurídica de
amparo das situações de êxodo rural, já que, até então, esse fenômeno culminava em severa
restrição de direitos previdenciários aos trabalhadores rurais.
10. Tal constatação é fortalecida pela conclusão de que o disposto no art. 48, §§ 3º e 4º, da Lei
8.213/1991 materializa a previsão constitucional da uniformidade e equivalência entre os
benefícios destinados às populações rurais e urbanas (art. 194, II, da CF), o que torna irrelevante
a preponderância de atividade urbana ou rural para definir a aplicabilidade da inovação legal aqui
analisada.
11. Assim, seja qual for a predominância do labor misto no período de carência ou o tipo de
trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento
administrativo, o trabalhador tem direito a se aposentar com as idades citadas no § 3º do art. 48
da Lei 8.213/1991, desde que cumprida a carência com a utilização de labor urbano ou rural. Por
outro lado, se a carência foi cumprida exclusivamente como trabalhador urbano, sob esse regime
o segurado será aposentado (caput do art. 48), o que vale também para o labor exclusivamente
rurícola (§§1º e 2º da Lei 8.213/1991).
12. Na mesma linha do que aqui preceituado: REsp 1.376.479/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell
Marques, Segunda Turma, Julgado em 4.9.2014, pendente de publicação.
14. Observando-se a conjugação de regimes jurídicos de aposentadoria por idade no art. 48, § 3º,
da Lei 8.213/1991, denota-se que cada qual deve ser observado de acordo com as respectivas
regras.
15. Se os arts. 26, III, e 39, I, da Lei 8.213/1991 dispensam o recolhimento de contribuições para
fins de aposentadoria por idade rural, exigindo apenas a comprovação do labor campesino, tal
situação deve ser considerada para fins do cômputo da carência prevista no art. 48, § 3º, da Lei
8.213/1991, não sendo, portanto, exigível o recolhimento das contribuições.
16. Correta a decisão recorrida que concluiu (fl. 162/e-STJ): "somados os 126 meses de
reconhecimento de exercício de atividades rurais aos 54 meses de atividades urbanas, chega-se
ao total de 180 meses de carência por ocasião do requerimento administrativo, suficientes à
concessão do benefício, na forma prevista pelo art. 48, § 3º, da Lei nº 8.213/1991". 17. Recurso
Especial não provido.
Há muitos outros julgados no mesmo sentido:
REsp 1.476.383, Relator Ministro Sérgio Kukina, DJe 08/10/2015;
REsp 1.470.637, Relator Ministro Sérgio Kukina, DJe 06/04/2016;
REsp 1.580.168, Relatora Ministra Regina Helena Costa, DJe 07/04/2016;
REsp 1.590.691, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe de 13/04/2016;
REsp 1.497.086, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 06/04/2015;
AgRg no REsp 1.477.835, Relatora Ministra Assusete Magalhães, DJe de 20/05/2015.
Por fim, no julgamento do REsp 1.674.221/SP, representativo de controvérsia (Tema 1007), de
relatoria do Min. Napoleão Nunes Maia Filho (DJe 04.09.2019), o STJ fixou a seguinte tese: "o
tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991,
pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por
idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art.
48, §3º da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de
carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do
requerimento administrativo".
As decisões da Corte Superior devem ser aplicadas com vistas à pacificação dos conflitos e à
segurança jurídica.
Para comprovar a atividade rural, a autora apresentou os seguintes documentos:
- CTPS onde constam vínculos empregatícios de natureza urbana de 16.10.2009 a 05.03.2010,
de 08.05.2011 a 23.05.2011 e de 01.09.2012 a 01.04.2013 e de natureza rural de 01.11.2016 a
12.04.2017 (p. 20/23);
- CTPS do filho, Valdenir da Silva Faria, em que constam registros de atividade rural de
01.09.2015 a 10.12.2015 e de 03.11.2016 a 12.04.2017 (p. 24/26);
- certidão de casamento, realizado em 26.05.1979, em que o cônjuge foi qualificado como
“lavrador” (p. 27).
A consulta ao CNIS da autora indica a existência de vínculo empregatícios de natureza urbana de
06.08.1992 a 08.09.1992, de 12.04.1993 a 12/1993, de 01.10.1993 a 15.01.1994, de 16.10.2009
a 05.03.2010, de 08.05.2011 a 23.05.2011 e de 01.09.2012 a 01.04.2013, além de registro de
natureza rural de 01.11.2016 a 13.03.2017 (p. 57/58).
Quanto ao cônjuge, de quem ela afirma ter se separado de fato em 2000, constam nos extratos
do CNIS, registros de atividade urbana de 01.06.1985 a 12.03.1986, de 01.07.1986 a 30.07.1988,
de 02.01.1989 a 30.06.1989, de 01.02.2012 a 31.03.2012, além de registros de trabalho rural de
01.10.1994 a 02.01.1998, de 01.07.1998 a 01.09.2001, de 01.09.2001 a 08/2002 e de 16.01.2003
a 07/2011 e a partir de 01.12.2012.
A certidão de casamento pode ser admitida como início de prova material do exercício de
atividade rural, mas deve ser observado que o cônjuge teve registros de natureza urbana de 1985
a 1989 e que a autora também exerceu atividade urbana de 1992 a 1994, conforme os extratos
do CNIS juntados aos autos.
O reconhecimento de trabalho rural exercido na qualidade de diarista ou em regime de economia
familiar depende da apresentação de início de prova material contemporânea aos fatos, conforme
previsto no art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, corroborado por posicionamento jurisprudencial
consolidado na Súmula 149 do STJ. Admitida somente a averbação/reconhecimento da atividade
campesina após os 12 anos de idade.
A prova material apresentada deve guardar a necessária correlação lógica e pertinente com a
prova oral, devendo considerar, ainda, as situações peculiares do rurícola diarista, que não possui
similaridade com a do rurícola em regime de economia familiar, pois o primeiro trabalha de forma
avulsa, com vínculo não empregatício com o tomador do serviço, e mediante remuneração, e o
segundo trabalha por conta própria, em regra, com a cooperação de familiares, sem qualquer
vínculo de dependência financeira com terceiros, visando a subsistência ou o rendimento
decorrente da venda da produção.
Evidente, portanto, que a prova material de cada modalidade de trabalho rural possui
características próprias, principalmente quanto ao alcance e à possibilidade de seu
aproveitamento por outrem.
O trabalho rural em regime de economia familiar permite o aproveitamento do início de prova
material em reciprocidade entre os membros da entidade familiar, sendo permitida a comunicação
da qualificação profissional de um membro para outro, como ocorre entre os cônjuges, entre pais
e filhos, e em outras hipóteses nas quais presente o parentesco.
No reconhecimento do trabalho rural do diarista não se permite, em regra, o aproveitamento da
prova material, que não em nome próprio, em razão do caráter solitário e avulso do trabalho
desempenhado.
Assim, o diarista só poderá aproveitar o início de prova material produzida em nome de outrem,
mesmo que de algum familiar, se devidamente amparado pelas demais provas dos autos.
Ocorre que, se de um lado a jurisprudência alarga o conceito de início de prova material, por
outro lado, o início de prova material, por si só, não serve para comprovar o trabalho rural, sendo
indispensável a existência de prova testemunhal convincente.
Nesse sentido:
(...)
2. "A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação
administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada
em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na
ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento." (artigo
55, parágrafo 3º, da Lei 8.213/91).
3. O início de prova material, de acordo com a interpretação sistemática da lei, é aquele feito
mediante documentos que comprovem o exercício da atividade nos períodos a serem contados,
devendo ser contemporâneos dos fatos a comprovar, indicando, ainda, o período e a função
exercida pelo trabalhador.
4. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que para fins de concessão do benefício de
aposentadoria por idade, o início de prova material deverá ser corroborado por idônea e robusta
prova testemunhal.
5. Em havendo o acórdão recorrido afirmado que, a par de não bastante à demonstração do
tempo de serviço a prova documental, a testemunhal era insuficiente à comprovação da atividade
rural desempenhada pelo segurado, a preservação da improcedência do pedido de aposentadoria
por idade é medida que se impõe.
6. Ademais, a 3ª Seção desta Corte tem firme entendimento no sentido de que a simples
declaração prestada em favor do segurado, sem guardar contemporaneidade com o fato
declarado, carece da condição de prova material, exteriorizando, apenas, simples testemunho
escrito que, legalmente, não se mostra apto a comprovar a atividade laborativa para fins
previdenciários (EREsp 205.885/SP, Relator Ministro Vicente Leal, in DJ 30/10/2000).
7. Recurso não conhecido.
(STJ, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, REsp 434015/CE, DJ 17.03.2003).
Na audiência, realizada em 06.03.2018, foi colhida a prova testemunhal.
A testemunha Dominga Rosa da Silva afirmou que a autora trabalhava na Fazenda Cachoeira na
década de 1980, onde ela teria ficado por cerca de 10 anos, em lavoura de arroz, milho e feijão;
que depois foi para a Fazenda Forquilha; que depois que ela se separou do Valdecir, ela
continuou trabalhando com o filho na fazenda do Emílio Leal, onde ficou por cerca de três a
quatro anos e depois na fazenda Três Irmãos, último local onde trabalhou; que acha que ela
nunca trabalhou na cidade.
A testemunha Maria de Fátima Silva Queiroz declarou que a autora trabalhou em várias fazendas;
que em 1975 ela trabalhou na fazenda do Osvaldo Filotel e ela já era casada; que ficou uns
quatro anos no local, onde plantava roça, mexia com gado, consertava cerca; que depois ela foi
para o Sr. Olício, na fazenda Coqueiro, onde ficou por cinco anos; que depois trabalhou com o
Emílio Leal por 10 anos; que ela se separou do marido em 2000, mas continuou trabalhando
como o filho nas fazendas, recordando-se da fazenda Serra e da fazenda Três Irmãos e fazia
serviços gerais; que veio para a cidade há cerca de um ano e pouco, mas continua trabalhando
com o filho.
A prova testemunhal se mostrou frágil e contraditória com os registros existentes no CNIS, uma
vez que mencionam que a autora trabalhou em diversas propriedades rurais desde 1975, mas o
cônjuge teve registros de natureza urbana no período de 1985 a 1989 e a própria autora também
teve vínculos urbanos de 1992 a 1994. Ademais, as propriedades mencionadas pelas
testemunhas também não coincidem com os registros de atividade rural observados no CNIS do
marido da autora.
Assim, o conjunto probatório existente nos autos não se mostrou convincente para comprovar o
alegado trabalho rural.
Considerando os períodos de contribuição existentes no CNIS, a autora não preenche os
requisitos para a concessão da aposentadoria por idade, uma vez que não cumprida a carência
de 180 meses.
DOU PROVIMENTO à apelação para julgar improcedente o pedido de aposentadoria por idade.
Condeno a parte vencida no pagamento das custas e despesas processuais, além de honorários
advocatícios fixados em 10% do valor da causa, suspendendo sua exigibilidade por ser
beneficiária da justiça gratuita (art. 98, § 3º, do CPC/2015).
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. APOSENTADORIA
POR IDADE HÍBRIDA. PROVA TESTEMUNHAL POUCO CONVINCENTE.
- Para fins de concessão de aposentadoria por idade híbrida, o período de carência pode ser
composto por períodos de atividade rural, ainda que sem contribuição, e de atividade urbana que,
somados, devem totalizar 180 (cento e oitenta) meses.
- Daí resulta a equação para a aposentadoria híbrida: idade (65 ou 60 anos) e 180 meses de
carência, compostos pela soma dos períodos de atividade rural, ainda que sem contribuição, com
os períodos de atividade urbana.
- Desnecessário que a última atividade exercida seja de natureza rural. Precedentes do STJ.
- A autora completou 60 anos em 09.09.2017.
- A prova testemunhal se mostrou frágil e contraditória com os registros existentes no CNIS.
- O conjunto probatório existente nos autos não se mostrou convincente para comprovar o
alegado trabalho rural.
- Considerando os períodos de contribuição existentes no CNIS, a autora não preenche os
requisitos para a concessão da aposentadoria por idade, uma vez que não cumprida a carência
de 180 meses.
- Honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa, suspensa a sua exigibilidade por
ser beneficiária da assistência judiciária gratuita (art. 98, § 3º, do CPC/2015).
- Apelação provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
