D.E. Publicado em 12/07/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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Data e Hora: | 28/06/2016 18:33:07 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0012684-49.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A Desembargadora Federal MARISA SANTOS (RELATORA): BRUNO FERREIRA CARDOSO ajuizou ação contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando a concessão de pensão por morte de NILSON RODRIGUES DE OLIVEIRA, falecido em 24.01.2015.
Narra a inicial que o autor era companheiro do falecido. Noticia que a união estável durou mais de quatro anos e somente foi encerrada em razão do óbito.
O juízo "a quo" julgou procedente o pedido e concedeu a pensão por morte a partir do requerimento administrativo. Correção monetária das parcelas vencidas e juros moratórios de 1% ao mês, contados da citação. Condenou o INSS em custas e despesas processuais. Honorários advocatícios fixados em 10% das parcelas vencidas até a sentença.
Sentença proferida em 21.09.2015, não submetida ao reexame necessário.
O INSS apela (fls. 71/77), sustentando em síntese, que não foi comprovada a existência da união estável. Subsidiariamente, pede a fixação dos juros moratórios nos termos da Lei 11.960/09 e dos honorários advocatícios em 5% das parcelas vencidas até a sentença.
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
VOTO
A Desembargadora Federal MARISA SANTOS (RELATORA):
Em matéria de pensão por morte, o princípio segundo o qual tempus regit actum impõe a aplicação da legislação vigente na data do óbito do segurado.
Considerando que o falecimento ocorreu em 24.01.2015, aplica-se a Lei 8.213/91.
O evento morte está comprovado com a certidão de óbito, juntada às fls. 10.
A qualidade de segurado do falecido está demonstrada, tendo em vista que o extrato do Sistema Único de Benefícios - DATAPREV indica que era beneficiário de auxílio-doença no valor de um salário mínimo (NB 604.139.844-0).
A dependência econômica é a questão controvertida neste processo.
O art. 16, II e § 4º, da Lei 8.213/91, na redação vigente na data do óbito, dispunha:
O preceito legal citado merece interpretação extensiva de modo a guardar compatibilidade vertical com o disposto nos arts. 5º, I e X, e 3º, IV da Constituição Federal:
A norma supõe aplicação ampliativa para abrigar, além das relações heterossexuais, as uniões entre pessoas do mesmo sexo. Somente assim, resguarda-se a positividade do princípio constitucional da isonomia (art. 5º, I) e da não-discriminação (art. 3º, I, da CF), na sua vertente da vedação ao tratamento discriminatório em função da orientação sexual.
Da combinação dos dispositivos constitucionais citados emergem os fundamentos que conferem amparo jurídico à pretensão da autora, consagrando, em consonância com as diretrizes do constitucionalismo contemporâneo, a força normativa dos princípios constitucionais, e, em especial, a aptidão desses mesmos princípios a guiar a interpretação de normas infraconstitucionais.
O instituto da pensão por morte tem sede constitucional no art. 201: "Art. 201. Os planos de previdência social, mediante contribuição, atenderão, nos termos da lei, a: (...) V - pensão por morte de segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, obedecido o disposto no §2º".
Tira-se da leitura do preceito constitucional que o legislador constituinte originário não excluiu do âmbito de proteção previdenciária os relacionamentos homoafetivos, sendo tal silêncio revelador da opção constitucional em permitir que a norma produza efeitos no campo da previdência social. Nessa linha de considerações, afasta-se qualquer atrito entre o entendimento ora adotado e o disposto no art. 226, § 3º, da Constituição Federal.
A admissão de uniões homoafetivas para fins de proteção do sistema previdenciário não encontra resistência importante nem na doutrina nem no âmbito da jurisprudência do STJ e deste Tribunal:
Até mesmo no âmbito administrativo, conforme os precedentes transcritos, o entendimento adotado prevalece, como se verifica da Instrução Normativa n. 45, editada pela Presidência do INSS em 6.8.2010, que em seu art. 25 dispõe: "Por força da decisão judicial proferida na Ação Civil Pública nº 2000.71.00.009347-0, o companheiro ou a companheira do mesmo sexo de segurado inscrito no RGPS integra o rol dos dependentes e, desde que comprovada a vida em comum, concorre, para fins de pensão por morte e de auxílio-reclusão, com os dependentes preferenciais de que trata o inciso I do art. 16 da Lei nº 8.213, de 1991, para óbito ou reclusão ocorridos a partir de 5 de abril de 1991, conforme o disposto no art. 145 do mesmo diploma legal, revogado pela MP nº 2.187-13, de 2001."
No âmbito de processos judiciais, o reconhecimento da vida em comum de casais homossexuais não se subordina à verificação da apresentação pelo beneficiário de documentos elencados em instruções normativas editadas pela autarquia, sob pena de violação ao princípio do livre convencimento motivado do juiz, que governa o regime de avaliação das provas no sistema processual civil brasileiro.
A propósito, o Supremo Tribunal Federal já enfrentou a matéria, proferindo julgado assim ementado:
Assim, o companheiro do segurado, contanto que demonstre convivência pública, duradoura e contínua, está abrigado pelo disposto no art. 16 da Lei 8.213/91, sendo a dependência econômica, neste caso, presumida.
Resta saber se o autor e o de cujus realmente mantiveram vida em comum, qualificada por vínculo afetivo razoavelmente duradouro, como exige a legislação previdenciária de regência.
Para comprovar a existência da união estável, o autor juntou aos autos os documentos de fls. 07/21.
A certidão de óbito (fl. 10) que teve o autor como declarante informa que o de cujus era solteiro e residia à Rua Waldomiro Soares, 83, Santa Rita, Tatuí - SP, mesmo endereço informado na petição inicial desta ação (fl. 02) e que consta no boleto de pagamento de prestação do CDHU em nome do falecido, com vencimento em 10.12.2014 (fls. 12/13), na fatura de cartão de crédito em nome do autor, com vencimento em 06.01.2015 (fls. 14/16).
O autor também foi o responsável pela internação do falecido, ocorrida em 23.01.2015 (fl. 17).
A declaração emitida em 04.02.2015 por Via Varejo S/A informa que o falecido consta como cônjuge do autor na ficha cadastral (fl. 18).
Às fls. 19/20, foram juntadas cópias de fotografias.
Na audiência, realizada em 21.09.2015, foram colhidos os depoimentos das testemunhas que confirmaram razoavelmente a existência da união estável na época do óbito.
A testemunha Eni Aparecida Rocha Cardoso afirmou que conhece o autor desde 2010 e o falecido desde 2008 e eles viviam juntos como companheiros.
Por sua vez, a testemunha Vera Lúcia de Oliveira informou que conhece o autor há cerca de um ano e também conhecia o falecido; que eles viviam como companheiros.
Comprovada a condição de companheiro(a) do(a) segurado(a) falecido(a), o(a) autor(a) tem direito ao benefício da pensão por morte. A dependência, no caso, é presumida, na forma prevista no art. 16, da Lei 8.213/91.
Termo inicial do benefício mantido na data do requerimento administrativo (20.03.2015 - fl. 21).
A renda mensal inicial deverá ser calculada conforme o disposto no art. 75 da Lei 8.213/91, observando-se a redação então vigente, com posteriores reajustes, na forma de lei.
Os juros moratórios são fixados em 0,5% ao mês, contados da citação até o dia anterior à vigência do novo CC (11.01.2003); em 1% ao mês a partir da vigência do novo CC, nos termos de seu art. 406 e do art. 161, § 1º, do CTN; e, a partir da vigência da Lei 11.960/09 (29.06.2009), na mesma taxa aplicada aos depósitos da caderneta de poupança, conforme art. 5º, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97.
As parcelas vencidas serão acrescidas de juros moratórios a partir da citação. As parcelas vencidas a partir da citação serão acrescidas de juros moratórios a partir dos respectivos vencimentos.
Honorários advocatícios mantidos em 10% das parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula 111 do STJ, não incidindo a regra do art. 85 do CPC/2015, considerando que a interposição do recurso se deu na vigência do CPC anterior.
DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação para fixar o critério de incidência dos juros moratórios como segue. Os juros moratórios são fixados em 0,5% ao mês, contados da citação até o dia anterior à vigência do novo CC - dia 11.01.2003; em 1% ao mês a partir da vigência do novo CC, nos termos de seu art. 406 e do art. 161, § 1º, do CTN; e, a partir da vigência da Lei 11.960/09 - dia 29.06.2009, na mesma taxa aplicada aos depósitos da caderneta de poupança, conforme art. 5º, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97. As parcelas vencidas serão acrescidas de juros moratórios a partir da citação. As parcelas vencidas a partir da citação serão acrescidas de juros moratórios a partir dos respectivos vencimentos.
Antecipo, de ofício, a tutela de urgência, nos termos dos arts. 300, caput, 536, caput e 537, §§, do Novo CPC, para que o INSS proceda à imediata implantação do benefício. Oficie-se à autoridade administrativa para cumprir a ordem judicial no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de multa diária, a ser oportunamente fixada em caso de descumprimento.
Segurado(a): Nilson Rodrigues de Oliveira
CPF: 326.879.438-60
Beneficiário(a): Bruno Ferreira Cardoso
CPF: 393.083.48-40
DIB: 20.03.2015 (data do requerimento administrativo)
RMI: um salário mínimo
É o voto.
MARISA SANTOS
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 28/06/2016 18:33:10 |