Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5794387-65.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
18/05/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 21/05/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO.
CONVERSÃO DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO EM
APOSENTADORIA ESPECIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. JULGAMENTO CONFORME O
ESTADO. DESNECESSIDADE DE MAIS PROVAS. COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES
ESPECIAIS. AGENTES BIOLÓGICOS. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. JUROS E
CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. SUCUMBÊNCIA
MÍNIMA DA PARTE AUTORA.
1. Pedido de conversão da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição em aposentadoria
especial, mediante o reconhecimento de período(s) laborado(s) em atividades especiais,
anteriores à data do requerimento administrativo. Possibilidade jurídica do pedido.
2. Possibilidade de imediato julgamento, ex vi do artigo 1.013, § 3º, III, da norma processual.
3. Alegação de cerceamento de defesa afastada. Documentos hábeis à comprovação das
condições de trabalho.
4. São requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com
os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições, ressaltando-se
que o tempo de serviço prestado anteriormente à Emenda Constitucional 20/98 equivale a tempo
de contribuição, a teor do seu art. 4º.
5. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o
reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua
demonstração.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
6. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da
atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no
período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico previdenciário (a
partir de 11/12/97).
7. Condição especial de trabalho configurada. Exposição habitual e permanente a agentes
biológicos (vírus, bactérias e protozoários), nos termos do código 1.3.2 do Decreto nº 53.831/64,
item 1.3.4 do Decreto nº 83.080/79 e item 3.0.1 do Decreto n° 2.172/97.
8. O período de afastamento por incapacidade deve ser computado como especial para fins de
aposentadoria por tempo de contribuição independente de sua natureza, acidentária ou não
acidentária, conforme julgado proferido pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em
sede de recurso repetitivo sobre o assunto (tema 998).
9. Reconhecidas as atividades especiais, deve o INSS proceder ao recálculo da renda mensal
inicial (RMI) do benefício da parte autora.
10. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a
elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-
se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa
Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947,
tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
11. Sucumbência mínima da parte autora. Condenação do INSS ao pagamento de honorários.
Aplicação da regra do parágrafo único do artigo 86 do Código de Processo Civil/2015.
12. Preliminar de cerceamento de defesa rejeitada. Apelação da parte autora parcialmente
provida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5794387-65.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: MARIGILDA PASCOTTE
Advogado do(a) APELANTE: RENATA BORSONELLO DA SILVA - SP117557-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5794387-65.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: MARIGILDA PASCOTTE
Advogado do(a) APELANTE: RENATA BORSONELLO DA SILVA - SP117557-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação em que se pleiteia a conversão da aposentadoria por tempo de
serviço/contribuição em aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de período(s)
laborado(s) em atividades especiais (29.07.85 a 31.12.91, 29.04.95 a 02.03.97 e de 03.03.97 a
13.09.2011 - DER), incluídos períodos de gozo de auxílio doença previdenciário (02.11.2003 a
31.03.2005, 05.08.2007 a 04.10.2007 e de 20.12.87 a 29.07.2009).
A sentença julgou improcedente o pedido, ao fundamento de que o acolhimento da pretensão
exordial violaria o ato jurídico perfeito (art. 5º, XXXVI, da CF). Não houve condenação em
honorários de advogado, face à concessão da gratuidade.
Apela a parte autora, pugnando pela reforma da sentença e pelo acolhimento integral do pedido
exordial. Alega cerceamento de defesa, tendo em vista que o próprio art. 103 da Lei nº 8.213/91
prevê a revisão do benefício previdenciário concedido.
Sem contrarrazões.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5794387-65.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: MARIGILDA PASCOTTE
Advogado do(a) APELANTE: RENATA BORSONELLO DA SILVA - SP117557-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do(s) recurso(s) de apelação.
Pleiteia a parte autora a conversão da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição em
aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de período(s) laborado(s) em atividades
especiais (29.07.85 a 31.12.91, 29.04.95 a 02.03.97 e de 03.03.97 a 13.09.2011 - DER).
Sustenta a parte autora que reconhecido o labor em condições especiais nos períodos
pleiteados, teria preenchido os requisitos legais à concessão da aposentadoria especial por
ocasião do requerimento administrativo.
Considerando-se que os períodos impugnados são anteriores à data do requerimento
administrativo, já foram submetidos à análise pelo INSS por ocasião da concessão do benefício,
bem como tendo em vista o dever da entidade autárquica em conceder o benefício mais
vantajoso ao segurado, viável a pretensão exordial, merecendo reforma a sentença recorrida.
Encontrando-se o processo em condições de imediato julgamento, aplico a regra do artigo
1.013, § 3º, III, da norma processual e passo ao exame do mérito.
Preliminarmente, afasto a alegação de cerceamento de defesa, posto que, no caso dos autos,
os documentos acostados são, em tese, hábeis à comprovação das condições de trabalho do
autor na época pretendida.
O documento contemporâneo ao contrato de trabalho demonstra quais eram os eventuais
fatores de riscos ambientais a que estava exposto o autor e, atualmente, a realização de perícia
ou outra prova não seria capaz de contradizê-lo ou demonstrar com tanta fidedignidade quais
eram as condições de trabalho àquela época.
Aposentadoria Especial
A aposentadoria por tempo de serviço especial teve assento primeiro no artigo 31 da Lei nº
3.807, de 26 de agosto de 1960, Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS, que estabeleceu
que seria concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinquenta) anos de idade e 15
(quinze) anos de contribuições, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e
cinco) anos, conforme a atividade profissional, em serviços que, para esse efeito, fossem
considerados penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo.
Prevê ainda, o mencionado diploma legal, no art. 162, o reconhecimento de atividade especial
prestada em data anterior à sua edição, na hipótese de seu cômputo ser mais benéfico ao
segurado.
Como assentado pelas Cortes Superiores "tal hipótese, apesar de similar, não se confunde com
a questão da legislação aplicável ao caso de concessão de aposentadoria, tampouco com
aquela que diz respeito à possibilidade de aplicação retroativa da lei nova que estabeleça
restrição ao cômputo do tempo de serviço. (...) Interpretação diversa levaria à conclusão de que
o segurado, sujeito a condições insalubres de trabalho, só teria direito à aposentadoria especial
após 15, 20 e 25 anos de trabalho exercida depois da Lei nº 3.807/60, desconsiderando,
portanto, todo o período de labor, também exercido em tal situação, porém em data anterior à
lei de regência" (Ag Rg no REsp nº 1015694, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza Assis de
Moura, DJe 01/02/2011)
Essa norma foi expressamente revogada pela Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973, que passou
a discipliná-la no artigo 9º, alterando, em efeitos práticos, apenas o período de carência de 15
(quinze) anos para 5 (cinco) anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
Sobreveio, então, o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, reclassificando as atividades
profissionais segundo os agentes nocivos e os grupos profissionais tidos por perigosos,
insalubres ou penosos, com os respectivos tempos mínimos de trabalho.
Importante ressaltar que os Decretos nºs. 53.831/64 e 83.080/79 tiveram vigências simultâneas,
de modo que, conforme reiteradamente decidido pelo C. STJ, havendo colisão entre as
mencionadas normas, prevalece a mais favorável ao segurado. (REsp nº 412351, 5ª Turma,
Rel. Min. Laurita Vaz, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, pág. 355).
As atividades insalubres previstas nas aludidas normas são meramente exemplificativas,
podendo outras funções ser assim reconhecidas, desde que haja similitude em relação àquelas
legalmente estatuídas ou, ainda, mediante laudo técnico-pericial demonstrativo da nocividade
da ocupação exercida. Nesse sentido, o verbete 198 da Súmula do TFR.
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, a matéria passou a ser prevista no inciso
II do artigo 202 e disciplinada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação original previa que o
benefício de aposentadoria especial seria devido ao segurado que, após cumprir a carência
exigida, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme
a atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a
integridade física, restando assegurada, ainda, a conversão do período trabalhado no exercício
de atividades danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em seguida, foi editada a Lei nº 9.032/95, alterando o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, dispondo
que a partir desse momento não basta mais o mero enquadramento da atividade exercida pelo
segurado na categoria profissional considerada especial, passando a ser exigida a
demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e
biológicos, que poderá se dar por meio da apresentação de informativos e formulários, tais
como o SB-40 ou o DSS-8030.
Posteriormente, com a edição do Decreto n.º 2.172, de 05/03/1997, que estabeleceu requisitos
mais rigorosos para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos,
passou-se a exigir-se a apresentação de laudo técnico para a caracterização da condição
especial da atividade exercida. Todavia, por se tratar de matéria reservada à lei, tal exigência
apenas tem eficácia a partir da edição da Lei n.º 9.528, de 10/12/1997.
Cumpre observar que a Lei nº 9528/97 também passou a aceitar o Perfil Profissiográfico
Previdenciário, documento que busca retratar as características de cada emprego do segurado,
de forma a facilitar a futura concessão de aposentadoria especial. Assim, identificado no
documento o perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, é possível a sua
utilização para comprovação da atividade especial em substituição ao laudo pericial.
Ressalto que no tocante ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e
à forma da sua demonstração, deve ser observada a legislação vigente à época da prestação
do trabalho, conforme jurisprudência pacificada da matéria (STJ - Pet 9.194/PR, Rel. Ministro
ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
A extemporaneidade do documento comprobatório das condições especiais de trabalho não
prejudica o seu reconhecimento como tal, "pois a situação em época remota era pior ou ao
menos igual a constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do
ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica." (Des. Fed. Fausto De
Sanctis, AC nº 2012.61.04.004291-4, j. 07/05/2014)
Especificamente em relação ao ruído, o Decreto nº 53.831/64 considerava insalubre o labor
desempenhado com exposição permanente a ruído acima de 80 dB; já o Decreto nº 83.080/79
fixava a pressão sonora em 90 dB. Na medida em que as normas tiveram vigência simultânea,
prevalece disposição mais favorável ao segurado (80 dB).
Com a edição do Decreto nº 2.172/97, a intensidade de ruído considerada para fins de
reconhecimento de insalubridade foi elevada para 90 dB, mas, em 2003, essa medida foi
reduzida para 85 dB, por meio do Decreto nº 4.882, de 18 de novembro de 2003.
Até 09 de outubro de 2013, os Tribunais adotavam o enunciado pela Súmula nº 32 da TNU.
Contudo, esta Súmula foi cancelada em decorrência do julgamento da PET 9059 pelo Superior
Tribunal de Justiça (Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJe
09/09/2013) cujo entendimento foi sufragado no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Ministro
Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), sob a sistemática dos
recursos repetitivos.
Em relação ao agente ruído, vigora o princípio do tempus regit actum. Considera-se especial a
atividade desenvolvida acima do limite de 80dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº
2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90dB
até 18/11/2003, quando foi editado o Decreto nº 4882/2003. A partir de 19/11/2003 o limite
passou a ser de 85 dB.
Saliente-se que a especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento
legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou
formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico
previdenciário (a partir de 11/12/97).
É corrente em nossos tribunais a tese de que sempre se exigiu laudo técnico para comprovar a
exposição do trabalhador aos agentes físicos ruído e calor em níveis superiores aos limites
máximos de tolerância. Entretanto, no tocante às atividades profissionais exercidas até 10/12/97
- quando ainda não havia a exigência legal de laudo técnico -, essa afirmação deve ser
compreendida, não na literalidade, mas no sentido de ser necessário o atesto efetivo e seguro
dos níveis de intensidade dos agentes nocivos a que o trabalhador esteve exposto durante sua
jornada laboral.
Logo, para as atividades profissionais exercidas até 10/12/97, é suficiente que os documentos
apresentados façam expressa menção aos níveis de intensidade dos agentes nocivos.
Uso de equipamento de proteção individual - EPI, como fator de descaracterização do tempo de
serviço especial
A questão foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do ARE nº 664335, da
relatoria do E. Ministro Luiz Fux, com reconhecimento de repercussão geral, na data de
04.12.2014, em que restou decidido que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva
exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente
capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional ao reconhecimento das
atividades especiais.
Restou assentado também que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico
Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não
descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
O fato de a empresa fornecer equipamento de proteção individual - EPI para neutralização dos
agentes agressivos não afasta, por si só, a contagem do tempo especial, pois cada caso deve
ser examinado em suas peculiaridades, comprovando-se a real efetividade do aparelho e o uso
permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. Precedentes do Superior Tribunal
de Justiça (REsp 1428183/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em
25/02/2014, DJe 06/03/2014).
Ainda, conforme a jurisprudência citada, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído,
desde que em níveis acima dos limites legais, constata-se que, apesar do uso de Equipamento
de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável,
até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao
organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas.
Caso concreto - elementos probatórios
Pleiteia a parte autora por meio desta ação a conversão da aposentadoria por tempo de
serviço/contribuição em aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de período(s)
laborado(s) em atividades especiais (29.07.85 a 31.12.91, 29.04.95 a 02.03.97 e de 03.03.97 a
13.09.2011 - DER).
De início, verifica-se que a controvérsia cinge-se à especialidade das atividades trabalhadas
no(s) período(s) de 29.07.85 a 31.12.91, 29.04.95 a 02.03.97 e de 03.03.97 a 13.09.2011,
objeto de impugnação no apelo da parte autora, considerando que em relação ao(s) período(s)
de 01.01.92 a 12.03.93 e de 03.08.92 a 28.04.95, já houve o reconhecimento na esfera
administrativa do INSS (ID 73828486/2).
Quanto ao reconhecimento da insalubridade, o(s) período(s) compreendido(s) entre 29.07.85 a
31.12.91, laborado junto à Irmandade Santa Casa de Misericórdia de Araras/SP, na função de
atendente de enfermagem/Centro Terapia Intensiva, é(são) passível(is) de reconhecimento
como especial(is) em razão do enquadramento com base na categoria profissional, nos termos
do código 1.3.2 do Decreto n.º 53.831/1964 e do item 1.3.4 do Decreto n.º 83.080/1979,
conforme se verifica dos documentos (PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário) (ID
73828490/1-2).
Nesse sentido, segue aresto exarado por esta Turma Julgadora:
"PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. NÃO PREENCHIMENTO
DOS REQUISITOS DA APOSENTADORIA ESPECIAL. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA
POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. (...)
As atividades realizadas como auxiliar de enfermagem, atendente de enfermagem e técnica de
enfermagem, exercidas pela autora, estão no campo de aplicação do quadro anexo ao Decreto
n.º 53.831/1964, item 1.3.2, e no anexo I do Decreto n.º 83.080/1979, item 1.3.4., podendo ser
reconhecidas como especiais pelo mero enquadramento da categoria profissional nos referidos
Decretos até a edição da Lei n.º 9.032/1995. (...)- Os argumentos trazidos pelo Agravante não
são capazes de desconstituir a Decisão agravada. - Agravo desprovido.
(TRF- 3ª Região, APELREEX 00113440520084036102, 7ª Turma, Rel. Des. Fed. Fausto de
Sanctis, e-DJF3 Judicial 1 data 30/10/14)
Com relação ao(s) período(s) de 29.04.95 a 02.03.97, laborado na função de auxiliar de
enfermagem, junto à Fundação de Desenvolvimento da Unicamp, e de 03.03.97 a 13.09.2011,
laborado na função de técnico de enfermagem, junto à Universidade Estadual de Campinas,
igualmente viável o reconhecimento como especial(is), porquanto restou comprovada a
exposição habitual e permanente a agentes biológicos (doenças infecciosas), conforme
documentos (Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP) (ID 73828490/3-4, 73828453/2-6 e
73828490/5-6), enquadrando-se no código 1.3.2 do Decreto nº 53.831/64, item 1.3.4 do Decreto
nº 83.080/79 e item 3.0.1 do Decreto n° 2.172/97.
A descrição pormenorizada das atividades, constante no PPP, confirma a efetiva exposição,
bem como o contato físico com pacientes e materiais de trabalho, típico de profissionais da área
da saúde (enfermeiros, técnicos, auxiliares e atendentes de enfermagem), em tarefas como
administração de medicamentos, curativos, limpeza de secreções e fezes etc.
Embora o PPP aponte a eficácia dos equipamentos de proteção individual, tal informação não
obsta a efetiva exposição aos agentes nocivos, notadamente os infecciosos, que deve ser
interpretada como potencialmente insalubre e perigosa, considerando o risco de perfuração do
material protetor no atendimento ambulatorial/hemocentro (Resp 1470537 - RS (2014/0188441-
2).
O(s) período(s) de afastamento por incapacidade (02.11.2003 a 31.03.2005, 05.08.2007 a
04.10.2007 e de 20.12.87 a 29.07.2009) deve(m) ser computado(s) como especial(is) para fins
de aposentadoria por tempo de contribuição independente de sua natureza, acidentária ou não
acidentária, conforme julgado proferido pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em
sede de recurso repetitivo sobre o assunto (tema 998).
Assim, computo como especial(is) o(s) período(s) de afastamento do demandante.
Verifica-se que a soma do período especial aqui reconhecido (29.07.85 a 31.12.91, 29.04.95 a
02.03.97 e de 03.03.97 a 13.09.2011) com aquele(s) já admitido(s) como especial(is) pelo INSS
no âmbito administrativo (01.01.92 a 12.03.93 e de 03.08.92 a 28.04.95) totaliza mais de 25
anos de tempo de serviço especial, o que autoriza a conversão da aposentadoria por tempo de
serviço em aposentadoria especial, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
São devidas as diferenças decorrentes da conversão da aposentadoria por tempo de
serviço/contribuição em aposentadoria especial desde a data do requerimento administrativo
em 13.09.2011, uma vez que a parte autora demonstrou que já havia preenchido os requisitos
necessários ao reconhecimento das atividades especiais desde então.
Acresça-se, no pertinente à fixação do termo inicial do benefício, jurisprudência consolidada do
Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que “[...] o termo inicial dos efeitos financeiros da
revisão de benefício previdenciário deve retroagir à data da concessão do benefício, uma vez
que o deferimento da ação revisional representa o reconhecimento tardio de um direito já
incorporado ao patrimônio jurídico do segurado” (REsp nº 1.732.289/SP, Rel. Ministro Herman
Benjamin, Segunda Turma, julgado em 24/4/2018, DJe 21/11/2018). No mesmo sentido: REsp
nº 1745509/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em
11/06/2019, DJe 14/06/2019.
Contudo, considerando que o benefício foi concedido em 03.10.2011 (ID 73828447/1) e que a
ação foi ajuizada em 24.10.2018, ainda que o termo inicial do pagamento das diferenças tenha
sido fixado na data do requerimento formulado naquela esfera, o pagamento das parcelas
vencidas deve observar a prescrição quinquenal, nos termos do artigo103, §único, da Lei n°
8.213/91.
As parcelas vencidas deverão ser corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora
pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça
Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção
monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial, consoante decidido
pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº
810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
No que tange aos honorários de advogado, verifico que a parte autora sucumbiu em parte
mínima do pedido.
Assim, com fulcro no parágrafo único do artigo 86 do Código de Processo Civil/2015, condeno o
INSS ao pagamento de honorários de advogado, fixados em 10% do valor da condenação,
consoante o entendimento desta Turma e o disposto §§ 2º e 3º do artigo 85 do Código de
Processo Civil/2015, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da
Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Ante o exposto, rejeito a preliminar de cerceamento de defesa e, no mérito, dou parcial
provimento à apelação da parte autora, para afastando a impossibilidade jurídica do pedido,
reconhecer os períodos de 29.07.85 a 31.12.91, 29.04.95 a 02.03.97 e de 03.03.97 a
13.09.2011 como laborados em condições especiais e determinar ao INSS a conversão da
aposentadoria por tempo de serviço em aposentadoria especial, nos termos do art. 57 da Lei nº
8.213/91, e o pagamento das diferenças decorrentes da conversão desde a data do
requerimento administrativo, observada a prescrição quinquenal, fixando os consectários legais
nos termos explicitados.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO.
CONVERSÃO DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO EM
APOSENTADORIA ESPECIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. JULGAMENTO CONFORME O
ESTADO. DESNECESSIDADE DE MAIS PROVAS. COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES
ESPECIAIS. AGENTES BIOLÓGICOS. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. JUROS E
CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL.
SUCUMBÊNCIA MÍNIMA DA PARTE AUTORA.
1. Pedido de conversão da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição em aposentadoria
especial, mediante o reconhecimento de período(s) laborado(s) em atividades especiais,
anteriores à data do requerimento administrativo. Possibilidade jurídica do pedido.
2. Possibilidade de imediato julgamento, ex vi do artigo 1.013, § 3º, III, da norma processual.
3. Alegação de cerceamento de defesa afastada. Documentos hábeis à comprovação das
condições de trabalho.
4. São requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com
os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições, ressaltando-se
que o tempo de serviço prestado anteriormente à Emenda Constitucional 20/98 equivale a
tempo de contribuição, a teor do seu art. 4º.
5. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o
reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua
demonstração.
6. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da
atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no
período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico previdenciário (a
partir de 11/12/97).
7. Condição especial de trabalho configurada. Exposição habitual e permanente a agentes
biológicos (vírus, bactérias e protozoários), nos termos do código 1.3.2 do Decreto nº
53.831/64, item 1.3.4 do Decreto nº 83.080/79 e item 3.0.1 do Decreto n° 2.172/97.
8. O período de afastamento por incapacidade deve ser computado como especial para fins de
aposentadoria por tempo de contribuição independente de sua natureza, acidentária ou não
acidentária, conforme julgado proferido pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em
sede de recurso repetitivo sobre o assunto (tema 998).
9. Reconhecidas as atividades especiais, deve o INSS proceder ao recálculo da renda mensal
inicial (RMI) do benefício da parte autora.
10. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a
elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta,
observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR
– Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº
870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
11. Sucumbência mínima da parte autora. Condenação do INSS ao pagamento de honorários.
Aplicação da regra do parágrafo único do artigo 86 do Código de Processo Civil/2015.
12. Preliminar de cerceamento de defesa rejeitada. Apelação da parte autora parcialmente
provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a preliminar de cerceamento de defesa e, no mérito, dar parcial
provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
