
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004845-35.2013.4.03.6100
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
APELANTE: INAJA BREITENSTEIN
Advogado do(a) APELANTE: JEFERSON LEANDRO DE SOUZA - SP208650-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: WILSON HARUAKI MATSUOKA JUNIOR - SP210114
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004845-35.2013.4.03.6100
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
APELANTE: INAJA BREITENSTEIN
Advogado do(a) APELANTE: JEFERSON LEANDRO DE SOUZA - SP208650-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: WILSON HARUAKI MATSUOKA JUNIOR - SP210114
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
RELATÓRIO
A Desembargadora Federal MARISA SANTOS (RELATORA):
Ação ajuizada por INAJA BREITENSTEIN contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), objetivando a concessão de pensão por morte de CARLOS ALEXANDRE BREITENSTEIN, falecido em 09.02.2010.
Narra a inicial que a autora era esposa do falecido. Noticia que seu último vínculo empregatício, relativo ao período de 09.02.2007 a 09.02.2010, foi reconhecido em reclamação trabalhista ajuizada post mortem.
O Juízo de 1º grau julgou improcedente o pedido e condenou a autora nas despesas processuais e em honorários advocatícios fixados no percentual mínimo legal, observando-se o disposto no art. 98, §§ 2º e 3º do CPC/2015.
A autora apela, sustentando, preliminarmente, a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, uma vez que o Juízo de 1º grau deixou de analisar as provas materiais apresentadas nos autos que comprovariam a prestação de serviços. Alega que foi comprovada a existência do último vínculo empregatício que foi objeto da reclamação trabalhista e que não pode ser penalizada pela ausência dos recolhimentos previdenciários.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
VOTO
A Desembargadora Federal MARISA SANTOS (RELATORA):
Inicialmente, observa-se que a sentença analisou a prova documental e testemunhal existente nos autos, concluindo que não poderia ser admitido o vínculo empregatício reconhecido na reclamação trabalhista.
Assim, não está caracterizada a ocorrência de cerceamento de defesa.
Em matéria de pensão por morte, o princípio segundo o qual tempus regit actum impõe a aplicação da legislação vigente na data do óbito do segurado.
Considerando que o falecimento ocorreu em 09.02.2010, aplica-se a Lei nº 8.213/91.
O evento morte está comprovado com a certidão de óbito (fl. 16).
A qualidade de segurado do falecido é a questão controvertida neste processo.
A CTPS (fls. 12/14) indica a existência de vínculos empregatícios nos períodos de 18.01.1988 a 30.08.1993, de 01.09.1997 a 30.09.1998 e de 09.02.2007 a 09.02.2010.
Na consulta ao CNIS (fls. 23/27), constam registros nos períodos de 14.07.1975 até data não informada, de 02.04.1984 a 06.11.1987, de 09.11.1987 a 12/1987, de 11.01.1988 a 11.01.1988, de 14.01.1988 a 30.08.1993, de 14.01.1988 a 01.05.1991, de 01.09.1997 a 30.09.1998 e de 26.07.2004 a 21.09.2004.
O de cujus se inscreveu como empresário em 01.02.1977, em 01.06.1984 e em 28.11.1994, recolheu contribuições de 01/1985 a 04/1985 e de 11/1994 a 10/1995, destacando-se que os recolhimentos relativos às competências de 05/1995 a 10/1995, foram extemporâneos.
O último vínculo empregatício, relativo ao período de 09.02.2007 a 09.02.2010, foi reconhecido em reclamação trabalhista ajuizada post mortem contra Thermar Tecnologia Ltda (fls. 50/94), onde houve a homologação de acordo firmado entre as partes nos seguintes termos: "A recda reconhece o vínculo empregatício com o de cujus no período de 09/02/07 a 09/02/10, no cargo de engenheiro, mediante remuneração de R$ 3.060,00 durante todo o contrato. Ofícios ao INSS e ao DRT para as providências cabíveis."
Cabe analisar se a sentença proferida na reclamação trabalhista pode ser conceituada como início de prova material, na forma prevista no art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91:
§3º. A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no artigo 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.
Não se desconhece que o art. 55 da Lei nº 8.213/91 seja relativo à contagem de tempo de serviço. A sentença homologatória de acordo não é prova material suficiente para comprovar o exercício da atividade, mas, sim, pressuposto para a análise de outras provas constantes dos autos.
Na obra "Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social", de Daniel Machado da Rocha e José Paulo Baltazar Junior, Livraria do Advogado editora, 7ª ed., 2007, fls. 239/240, tecem-se comentários a respeito da questão das reclamatórias trabalhista s, esclarecedores sobre a pertinência da coesão dos dados apresentados:
...
d) Reclamatória trabalhista . Na verdade, muitas reclamatórias trabalhista s são ajuizadas com desvirtuamento da finalidade, ou seja, não visam a dirimir controvérsia entre empregador e empregado, mas sim a obter direitos perante a Previdência Social. Em alguns casos há uma verdadeira simulação de reclamatória, com o reconhecimento do vínculo empregatício por parte do empregador, em acordo.
Sua admissibilidade como meio de prova de tempo de contribuição para fins previdenciários possui, a nosso ver, um óbice intransponível: a eficácia subjetiva da coisa julgada. Não tendo o Instituto integrado a lide, não poderá sofrer os efeitos da decisão nela proferia. Além disso, a competência para conhecer de questões relativas à contagem do tempo de serviço destinado à obtenção de benefícios é da Justiça Federal.
De todo modo, os documentos juntados ao processo trabalhista poderão servir como elementos de convicção a serem apreciados pela autoridade administrativa ou na ação previdenciária proposta perante a Justiça Federal.
A reclamatória trabalhista é apenas um dos elementos formadores de convicção, não podendo ser o único.
Duas situações distintas podem ocorrer: o reconhecimento de parcelas a serem computadas no salário de contribuição (caso em que o vínculo já é reconhecido, e as contribuições foram recolhidas a menor); e o reconhecimento do vínculo empregatício (casos em que o recolhimento não ocorreu). Os reflexos decorrentes de uma ou outra situação são diferentes na esfera previdenciária.
No sentido da necessidade de outras provas, a jurisprudência:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. TRABALHADOR URBANO. SENTENÇA TRABALHISTA. ANOTAÇÃO NA CTPS POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL. PROVA MATERIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 472 DO CPC. INEXISTÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULAS 282 E 356/STF. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. NÃO-OCORRÊNCIA. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO IMPROVIDO.
1. O Superior Tribunal de Justiça já consolidou sua jurisprudência no sentido de que a sentença homologatória proferida nos autos de reclamação trabalhista é válida como prova material para fins de reconhecimento do tempo de serviço urbano, desde que fundamentada em elementos que demonstrem o exercício da atividade laborativa na função e os períodos alegados, sem que isso caracterize ofensa ao art. 472 do Código de Processo Civil.
...
4. Agravo regimental improvido.
(STJ, AGA 520885, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª Turma, unânime, DJ 18.12.2006, p. 463)
PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA TRABALHISTA. UTILIZAÇÃO. OBEDIÊNCIA AO ART. 55, § 3º, DA LEI Nº 8.213/91. PROVA MATERIAL. NECESSIDADE. SÚMULA Nº 149 DO STJ. PRECEDENTE DA QUINTA TURMA.
1. "A sentença trabalhista pode ser considerada como início de prova material se no bojo dos autos acham-se documentos que atendem o requisito do § 3º, do art, 55, da Lei nº 8.213/91, não constituindo reexame de prova sua constatação, mas valoração de prova." (AgRg no Resp 282.549/RS, Quinta Turma, rel Min. Gilson Dipp, DJ de 12.03.2001.)
2. No caso, não houve produção de qualquer espécie de prova nos autos da reclamatória trabalhista , que foi julgada procedente porque houve reconhecimento do pedido na audiência de conciliação, instrução e julgamento, razão pela qual a utilização desse título judicial, para fins de obtenção de benefício previdenciário, afronta o art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91 e o comando da Súmula nº 149 do STJ.
3. Ressalva do acesso às vias ordinárias.
4. Recurso especial conhecido e provido.
(STJ, RESP 499591, Rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, unânime, DJ 04.08.2003, p. 400).
No caso dos autos, não foram juntadas as guias de recolhimento das contribuições relativas ao vínculo empregatício reconhecido na reclamação trabalhista.
Contudo, foram apresentados o crachá (fl. 38) e o cartão de visita da empresa em nome do falecido, onde consta a anotação de que era engenheiro (fl. 267), além de e-mails relativos ao ano de 2005, relacionados a passagens aéreas (fls. 210/222) e extratos de conta corrente (fls. 95/209), que se referem a depósitos de cheques.
Nas audiências, realizadas em 24.11.2015 e 14.04.2016, foram colhidos os depoimentos da autora e das testemunhas, que confirmaram a prestação de serviços pelo falecido na empresa reclamada. Contudo, não restou comprovada a existência de efetiva relação de emprego.
A autora afirmou que o marido, depois que voltou do Chile, foi convidado por Edmir Gonçalves, sócio da Thermar Tecnologia Ltda, que era seu amigo, para trabalhar na empresa que havia sido aberta recentemente.
Edmir Gonçalves informou que os dois não haviam acertado a questão relativa às contribuições previdenciárias, mas que, exceto o FGTS, ele recebia as outras verbas trabalhistas.
Destaca-se que o falecido tinha cadastro como empresário desde 01.02.1977 (NIT 1.096.133.846-3 - fl. 35) e era sócio-gerente de uma empresa denominada Etac Instalações Ltda, desde 22.11.1976, conforme documentos juntados às fls. 42/47, que tinha por objetivo: "a compra, venda, instalação, manutenção, reparos e substituições de aparelhos de ar condicionado, exaustores, e instalações elétricas e/ou hidráulicas. Se reservando ainda o direito, da compra e venda dos aparelhos citados, bem como de peças avulsas".
Considerando as declarações prestadas pela autora e pelo sócio da Thermar Tecnologia Ltda, que era amigo do falecido, há indicação de que havia a prestação de serviços como engenheiro, mas sem configurar a existência de vínculo empregatício com a empresa.
Assim, não pode ser admitido o vínculo reconhecido na reclamação trabalhista.
Como bem destacou o Juízo de 1º grau: "ficou mais provado que havia uma situação de coleguismo e parceria entre amigos, igualmente qualificados nas obras".
Dessa forma, cabia ao de cujus o recolhimento das contribuições que iriam conferir a qualidade de segurado na data do óbito.
O último registro do falecido anotado no CNIS encerrou em 21.09.2004. Dessa forma, já tinha perdido a qualidade de segurado na data do óbito (09.02.2010), ainda que fosse estendido o período de graça por 36 meses, nos termos do art. 15, II e §§1º e 2º, da Lei nº 8.213/91.
O benefício poderia ser concedido, ainda, se o segurado tivesse direito adquirido a alguma espécie de aposentadoria, o que também não ocorreu. O de cujus ainda não teria tempo suficiente para a aposentadoria por tempo de serviço ou por contribuição. Também não poderia aposentar-se por idade, uma vez que tinha 58 anos.
Por esses motivos, na data do óbito, o falecido não mantinha a qualidade de segurado.
Quanto à necessidade de comprovação da qualidade de segurado na data do óbito para a concessão de pensão por morte, já se manifestou o STJ em sede de recurso repetitivo:
RECURSO ESPECIAL SUBMETIDO AOS DITAMES DO ART. 543-C DO CPC E DA RESOLUÇÃO Nº 8/STJ. PENSÃO POR MORTE. PERDA PELO DE CUJUS DA CONDIÇÃO DE SEGURADO. REQUISITO INDISPENSÁVEL AO DEFERIMENTO DO BENEFÍCIO. EXCEÇÃO. PREENCHIMENTO EM VIDA DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS À APOSENTAÇÃO. INOCORRÊNCIA. RECURSO PROVIDO.
I - A condição de segurado do de cujus é requisito necessário ao deferimento do benefício de pensão por morte ao(s) seu(s) dependente(s). Excepciona-se essa regra, porém, na hipótese de o falecido ter preenchido, ainda em vida, os requisitos necessários à concessão de uma das espécies de aposentadoria do Regime Geral de Previdência Social - RGPS. Precedentes.
II - In casu, não detendo a de cujus, quando do evento morte, a condição de segurada, nem tendo preenchido em vida os requisitos necessários à sua aposentação, incabível o deferimento do benefício de pensão por morte aos seus dependentes.
Recurso especial provido.
(REsp 1110565/SE, 3ª Seção, DJe 03/08/2009, Rel. Min. Felix Fischer).
Se o falecido não tinha direito a nenhuma cobertura previdenciária, seus dependentes, em consequência, também não o têm.
REJEITO a preliminar e NEGO PROVIMENTO à apelação.
É o voto.
Não pode ser conhecido recurso que, sob o rótulo de embargos declaratórios, pretende substituir a decisão recorrida por outra. Os embargos declaratórios são apelos de integração, não de substituição.
O art. 1.025 que consagrar o que parcela da doutrina e da jurisprudência chama de 'prequestionamento ficto', forte no que dispõe a Súmula 356 do STF. A regra, bem-entendida a razão de ser do recurso extraordinário e do recurso especial a partir do 'modelo constitucional do direito processual civil', não faz nenhum sentido e apenas cria formalidade totalmente estéril, que nada acrescenta ao conhecimento daqueles recursos a não ser a repetição de um verdadeiro ritual de passagem, que vem sendo cultuado pela má compreensão e pelo mau uso do enunciado da Súmula 356 do STF e pelo desconhecimento da Súmula 282 do STF e da Súmula 211 do STJ. Mais ainda e sobretudo: pela ausência de uma discussão séria e centrada sobre o que se pode e sobre o que não se pode ser compreendido como 'prequestionamento', tendo presente a sua inescondível fonte normativa, qual seja, o modelo que a Constituição Federal dá aos recursos extraordinário e especial, e, para ir direto ao ponto, à interpretação da expressão 'causa decidida' empregada pelos incisos III dos arts. 102 e 105 da CF.
STF, SÚMULA 356: O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento.
No âmbito do novo CPC não há falar em embargos de declaração para fins de prequestionamento, em sentido estrito.
E mesmo se assim não fosse, para fins de prequestionamento (a fim de possibilitar a futura interposição de recurso à superior instância), os Embargos de Declaração estão sujeitos à presença de vício na decisão embargada, o que não se verifica, conforme acima especificado.
REJEITO os embargos de declaração.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. PREQUESTIONAMENTO FICTO. CONTRADIÇÃO INEXISTENTE.
I - Mesmo para fins de prequestionamento, os embargos de declaração só têm cabimento quando presente contradição, omissão ou obscuridade no julgado embargado.
II - Considerada a orientação do novo CPC, nos termos dos arts. 994, IV, 1.022 a 1026, existe divergência na doutrina quanto à recepção do prequestionamento ficto pelo art. 1.025 ("consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade").
III - Foi analisado que apesar de ter sido reconhecido em reclamação trabalhista o vínculo empregatício relativo ao período de 09.02.2007 a 09.02.2010, os documentos existentes nos autos e a prova testemunhal não indicaram a existência de efetiva relação de emprego e dessa forma cabia ao de cujus o recolhimento das contribuições que iriam conferir a qualidade de segurado na data do óbito.
IV - Inexiste no acórdão embargado qualquer omissão a ser sanada.
V - Embargos de declaração rejeitados.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu rejeitar os embargos de declaração, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
