
| D.E. Publicado em 18/06/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, corrigir, de ofício, a sentença para fixar os critérios de atualização do débito, não conhecer de parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0032122-66.2013.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de ação em que se pleiteia a revisão da RMI de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante o reconhecimento de períodos laborados em atividade rural (01.01.77 a 31.12.77 e de 01.01.79 a 13.07.80).
Valor atribuído à causa: R$ 1.500,00 em 09.12.2010.
A sentença julgou procedente o pedido, para reconhecer como laborados em atividade rural os períodos de 01.01.77 a 31.12.77 e de 01.01.79 a 13.07.80, determinando ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a revisão do benefício com a devida averbação, condenando-o, em consequência, ao pagamento das diferenças desde a DIB reafirmada para 28.07.2003 (fls. 35 e 39), observada a prescrição quinquenal, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora desde a citação. Condenou o réu, também, ao pagamento de honorários de advogado, fixados em 15% (quinze por cento) do valor da condenação, considerado como termo final desta a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do C. STJ. Não houve condenação em custas.
Sentença submetida à remessa necessária.
Apela o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, alegando a impossibilidade do reconhecimento do labor rural, face à inexistência de início de prova material. Subsidiariamente, requer a reforma da sentença quanto à observância da prescrição quinquenal no pagamento das diferenças decorrentes da revisão; aos honorários de advogado, devendo ser fixados em 5% do valor da condenação e à isenção de custas processuais.
Contrarrazões pela parte apelada.
É o relatório.
VOTO
Não conheço da apelação do INSS no que se refere ao pedido de reconhecimento da prescrição quinquenal, já determinada na sentença, bem como à suposta condenação ao pagamento de custas processuais, porquanto ausente o interesse recursal quanto a estas questões.
No mais, presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Passo ao exame do mérito.
Aposentadoria por tempo de serviço/contribuição - requisitos
A aposentadoria por tempo de serviço, atualmente denominada aposentadoria por tempo de contribuição, admitia a forma proporcional e a integral antes do advento da Emenda Constitucional 20/98, fazendo jus à sua percepção aqueles que comprovem tempo de serviço (25 anos para a mulher e 30 anos para o homem na forma proporcional, 30 anos para a mulher e 35 anos para o homem na forma integral) desenvolvido totalmente sob a égide do ordenamento anterior, respeitando-se, assim, o direito adquirido.
Aqueles segurados que já estavam no sistema e não preencheram o requisito temporal à época da Emenda Constitucional 20 de 15 de dezembro de 1998, fazem jus à aposentadoria por tempo de serviço proporcional desde que atendam às regras de transição expressas em seu art. 9º, caso em que se conjugam o requisito etário (48 anos de idade para a mulher e 53 anos de idade para o homem) e o requisito contributivo (pedágio de 40% de contribuições faltantes para completar 25 anos, no caso da mulher e para completar 30 anos, no caso do homem).
Atualmente, são requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições (30 anos para a mulher e 35 anos para o homem), ressaltando-se que o tempo de serviço prestado anteriormente à referida Emenda equivale a tempo de contribuição, a teor do art. 4º da Emenda Constitucional 20/98.
Tempo de serviço rural anterior e posterior à Lei de Benefícios
A aposentadoria do trabalhador rural apresenta algumas especificidades, em razão sobretudo da deficiência dos programas de seguridade voltados a essa categoria de trabalhadores no período anterior à Constituição Federal de 1988 e do descumprimento da legislação trabalhista no campo. Assim é que, no seu art. 55, §2º, a Lei 8.213/91 estabeleceu ser desnecessário o recolhimento de contribuições previdenciárias pelo segurado especial ou trabalhador rural no período anterior à vigência da Lei de Benefícios, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço rural, exceto para efeito de carência. Neste sentido, já decidiu esta E. Corte: SÉTIMA TURMA, APELREEX 0005026-42.2014.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, julgado em 21/07/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:31/07/2014 e TERCEIRA SEÇÃO, AR 0037095-93.2010.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NELSON BERNARDES, julgado em 28/11/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/12/2013.)
Já em relação ao tempo de serviço rural trabalhado a partir da competência de novembro de 1991 (art. 55, §2º, da Lei 8.213/91 c/c o art. 60, X, do Decreto 3.048/99), ausente o recolhimento das contribuições, somente poderá ser aproveitado pelo segurado especial para obtenção dos benefícios previstos no art. 39, I, da Lei 8.213/91.
A prova do exercício de atividade rural
Muito se discutiu acerca da previsão contida no art. 55, §3º, da Lei de Benefícios, segundo a qual a comprovação do tempo de serviço exige início de prova material. O que a Lei nº 8.213/91 exige é apenas o início de prova material e é esse igualmente o teor da Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça.
Exigir documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se quer reconhecer equivaleria a erigir a prova documental como a única válida na espécie, com desconsideração da prova testemunhal produzida, ultrapassando-se, em desfavor do segurado, a exigência legal. Neste sentido, o C. STJ: AgRg no AREsp 547.042/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014.
Tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
É pacífico o entendimento dos Tribunais, considerando as difíceis condições dos trabalhadores rurais, admitir a extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou companheira, bem como da filha solteira residente na casa paterna. (REsp 707.846/CE, Rel. Min. LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJ de 14/3/2005)
Idade mínima para o trabalho rural
Não se olvida que há jurisprudência no sentido de admitir-se o labor rural a partir dos 12 (doze) anos de idade, por ser realidade comum no campo, segundo as regras ordinárias de experiência, mormente se a prova testemunhal é robusta e reforçada por documentos que indicam a condição de lavradores dos pais do segurado.
O raciocínio invocado em tais decisões é o de que a norma constitucional que veda o trabalho ao menor de 16 anos visa à sua proteção, não podendo ser invocada para, ao contrário, negar-lhe direitos. (RESP 200200855336, Min. Jorge Scartezzini, STJ - Quinta Turma, DJ 02/08/2004, p. 484.).
Tal ponderação não é isenta de questionamentos. De fato, emprestar efeitos jurídicos para situação que envolve desrespeito a uma norma constitucional, ainda que para salvaguardar direitos imediatos, não nos parece a solução mais adequada à proposta do constituinte - que visava dar ampla e geral proteção às crianças e adolescentes, adotando a doutrina da proteção integral, negando a possibilidade do trabalho infantil.
Não se trata, assim, de restringir direitos ao menor que trabalha, mas sim, de evitar que se empreste efeitos jurídicos, para fins previdenciários, de trabalho realizado em desacordo com a Constituição. Considero, desta forma, o ordenamento jurídico vigente à época em que o(a) autor(a) alega ter iniciado o labor rural para admiti-lo ou não na contagem geral do tempo de serviço, para o que faço as seguintes observações:
As Constituições Brasileiras de 1824 e 1891 não se referiram expressamente à criança e adolescente tampouco ao trabalho infantil.
A Constituição de 1934 foi a primeira a tratar expressamente da proteção à infância e à juventude e em seu artigo 121 consagrou, além de outros direitos mais favoráveis aos trabalhadores, a proibição de qualquer trabalho para os menores de 14 anos; de trabalho noturno para os menores de 16 anos; e de trabalho em indústrias insalubres para menores de 18 anos.
Por sua vez, a Constituição de 1937, repetiu a fórmula da proibição de qualquer trabalho para os menores de 14 anos; de trabalho noturno para os menores de 16 anos e de trabalho em indústrias insalubres para menores de 18 anos.
A Constituição de 1946 elevou a idade mínima para a execução de trabalho noturno de 16 para 18 anos, mantendo as demais proibições de qualquer trabalho para menores de 14 anos e em indústrias insalubres para menores de 18 anos, além de proibir a diferença de salário para o mesmo trabalho por motivo de idade.
A Constituição de 1967, embora tivesse mantido a proibição para o trabalho noturno e insalubre para menores de 18 anos, reduziu de 14 para 12 anos a idade mínima para qualquer trabalho.
Por fim, a Constituição da República de 1988, proíbe o trabalho noturno, perigoso e insalubre para os menores de 18 anos; e, inicialmente, de qualquer trabalho para menores de 14 anos, como constava nas Constituições de 1934, 1937 e 1946. Todavia, com a Emenda Constitucional 20, de 1998, a idade mínima foi elevada para 16 anos, salvo na condição de aprendiz a partir de 14 anos.
Entretanto, em atenção ao entendimento consolidado nesta E. 7ª Turma, no sentido de considerar as peculiaridades de um Brasil com elevado contingente populacional no meio rural antes da década de 70, admito, para o cômputo geral do tempo de serviço, o trabalho rural desenvolvido antes da Constituição de 1967, a partir dos 12 anos de idade. A partir da Constituição Federal de 1988, todavia, prevalece a idade nela estabelecida.
Caso concreto - elementos probatórios
Atividade rural
Cinge-se a controvérsia acerca de períodos laborados em atividade rural (01.01.77 a 31.12.77 e de 01.01.79 a 13.07.80), reconhecidos na sentença recorrida, considerando que em relação aos demais, quais sejam, de 01.01.75 a 31.12.76 e de 01.01.78 a 31.12.78, já houve o reconhecimento do labor rural na esfera administrativa do INSS (fls. 34).
A parte autora, nascida em 28.07.50 (fls. 10), trouxe aos autos, para comprovar o exercício de atividade rural dos períodos de 01.01.77 a 31.12.77 e de 01.01.79 a 13.07.80:
- certidão de casamento, celebrado em 26.07.75, em que é qualificado como lavrador (fls. 13);
- declaração de exercício de atividade rural, firmada em 10.12.2002 pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alto do Piquiri/PR, com homologação do INSS em 12.03.2003 dos períodos compreendidos entre 01.01.68 a 31.12.68, 01.01.71 a 31.12.71, 01.01.75 a 31.12.76 e de 01.01.78 a 31.12.78 como laborados em atividade rural.
Afasto o valor probante do documento de fls. 19 (registro de escritura de compra e venda de imóvel rural perante o Cartório de Registro de Imóveis de Umuarama/PR), devido a este dizer respeito a terceiros, cujo vínculo de parentesco com a parte autora não foi comprovado, não fornecendo nenhuma informação acerca do suposto trabalho rural da parte autora.
A testemunha ouvida em juízo (José Euclides da Silva) (fls. 145/146) confirmou haver laborado juntamente com o autor em atividade rural no período compreendido entre 1973 a 1979, em fazenda localizada no Paraná, para o então patrão, de nome Nelson Rodrigues Barbosa, circunstâncias que guardam consonância com os termos da entrevista prestada pelo autor perante agente administrativo do INSS (fls. 20/21).
Desta forma, entendo ser viável o reconhecimento do trabalho rural desenvolvido pelo autor informalmente no período de 01.01.77 a 31.12.77 e de 01.01.79 a 31.12.79, exceto para efeito de carência.
No pertinente ao período de 01.01.80 a 13.07.80, saliente-se a inviabilidade do reconhecimento do labor rural, porquanto não confirmado por prova testemunhal.
Assim, deve o INSS proceder ao recálculo da renda mensal inicial (RMI) do benefício da parte autora (NB nº 42/128.018.131-9), reconhecendo-se o trabalho rural exercido nos períodos de 01.01.77 a 31.12.77 e de 01.01.79 a 31.12.79.
São devidas as diferenças decorrentes do recálculo de sua RMI desde a data da DIB reafirmada para 28.07.2003 (fls. 35 e 39).
Considerando-se que a presente demanda foi proposta em 09.12.2010 (fls. 02), o pagamento das parcelas vencidas deve observar a prescrição quinquenal, nos termos do artigo 103, §único, da Lei n° 8.213/91, como determinado na sentença.
No que tange aos critérios de atualização do débito, por tratar-se de consectários legais, revestidos de natureza de ordem pública, são passíveis de correção de ofício, conforme precedentes do Superior Tribunal de Justiça:
Assim, corrijo a sentença e estabeleço que as parcelas vencidas deverão ser corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e a partir da vigência da Lei nº 11.960/09, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
No que tange aos honorários de advogado, verifico que a parte autora sucumbiu em parte mínima do pedido.
Assim, com fulcro no parágrafo único do artigo 21 do Código de Processo Civil/73, vigente à época da interposição do recurso, condeno o INSS ao pagamento de honorários de advogado fixados em 10% do valor da condenação, consoante entendimento desta Turma e artigo 20, parágrafos 3º e 4º, daquele Codex, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Ante o exposto, de ofício, corrijo a sentença para fixar os critérios de atualização do débito, não conheço de parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, dou parcial provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, para restringir o reconhecimento do labor em atividade rural aos períodos de 01.01.77 a 31.12.77 e de 01.01.79 a 31.12.79 e fixar os honorários de advogado nos termos explicitados na decisão.
É como voto.
PAULO DOMINGUES
Desembargador Federal Relator
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