
| D.E. Publicado em 22/08/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora e negar provimento à remessa necessária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0007136-94.2006.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
Trata-se de ação em que se pleiteia a revisão da RMI de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante o reconhecimento de períodos laborados em atividade rural (01.01.70 a 26.06.70, 01.01.74 a 31.12.76 e de 15.06.80 a 19.10.80).
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido, para reconhecer como laborados em atividade rural os períodos compreendidos entre 01.01.70 e 26.06.70 e de 15.06.80 a 19.10.80, determinando ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a revisão do benefício com a devida averbação, condenando-o, em consequência, ao pagamento das diferenças desde a data da citação (30.10.2006 - fls. 38, verso), corrigidas monetariamente nos termos "da Lei 8.213/91 e subsequentes critérios oficiais de atualização, sobre as prestações vencidas, desde quando devidas, de acordo com o enunciado na Súmula nº 08 - TRF 3ª Região, acrescidas de juros moratórios de 1% ao mês a partir de então (artigo 406 do novo Código Civil), devendo incidir de forma englobada em relação às prestações anteriores à citação e, após, calculados mês a mês, de forma decrescente". Diante da sucumbência recíproca, deixou de condenar as partes em honorários de advogado. Não houve condenação em custas.
Sentença submetida à remessa necessária.
Apela a parte autora pugnando pelo reconhecimento do labor rural no período de 01.01.74 a 31.12.76. Subsidiariamente, requer a reforma da sentença com o afastamento da prescrição quinquenal, à vista da apresentação de pedido de revisão em 09.02.2001, pendente de análise à época do ajuizamento da presente ação; quanto ao termo inicial do pagamento das diferenças e da incidência de juros de mora, a partir da data do requerimento administrativo (e não da citação); quanto aos honorários de advogado, com a fixação em 20% do valor da condenação. Requer, ainda, a concessão do pedido de antecipação da tutela com vistas à imediata revisão do benefício.
Sem contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Passo ao exame do mérito.
Aposentadoria por tempo de serviço/contribuição - requisitos
A aposentadoria por tempo de serviço, atualmente denominada aposentadoria por tempo de contribuição, admitia a forma proporcional e a integral antes do advento da Emenda Constitucional 20/98, fazendo jus à sua percepção aqueles que comprovem tempo de serviço (25 anos para a mulher e 30 anos para o homem na forma proporcional, 30 anos para a mulher e 35 anos para o homem na forma integral) desenvolvido totalmente sob a égide do ordenamento anterior, respeitando-se, assim, o direito adquirido.
Aqueles segurados que já estavam no sistema e não preencheram o requisito temporal à época da Emenda Constitucional 20 de 15 de dezembro de 1998, fazem jus à aposentadoria por tempo de serviço proporcional desde que atendam às regras de transição expressas em seu art. 9º, caso em que se conjugam o requisito etário (48 anos de idade para a mulher e 53 anos de idade para o homem) e o requisito contributivo (pedágio de 40% de contribuições faltantes para completar 25 anos, no caso da mulher e para completar 30 anos, no caso do homem).
Atualmente, são requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições (30 anos para a mulher e 35 anos para o homem), ressaltando-se que o tempo de serviço prestado anteriormente à referida Emenda equivale a tempo de contribuição, a teor do art. 4º da Emenda Constitucional 20/98.
Tempo de serviço rural anterior e posterior à Lei de Benefícios
A aposentadoria do trabalhador rural apresenta algumas especificidades, em razão sobretudo da deficiência dos programas de seguridade voltados a essa categoria de trabalhadores no período anterior à Constituição Federal de 1988 e do descumprimento da legislação trabalhista no campo. Assim é que, no seu art. 55, §2º, a Lei 8.213/91 estabeleceu ser desnecessário o recolhimento de contribuições previdenciárias pelo segurado especial ou trabalhador rural no período anterior à vigência da Lei de Benefícios, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço rural, exceto para efeito de carência. Neste sentido, já decidiu esta E. Corte: SÉTIMA TURMA, APELREEX 0005026-42.2014.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, julgado em 21/07/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:31/07/2014 e TERCEIRA SEÇÃO, AR 0037095-93.2010.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NELSON BERNARDES, julgado em 28/11/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/12/2013.)
Já em relação ao tempo de serviço rural trabalhado a partir da competência de novembro de 1991 (art. 55, §2º, da Lei 8.213/91 c/c o art. 60, X, do Decreto 3.048/99), ausente o recolhimento das contribuições, somente poderá ser aproveitado pelo segurado especial para obtenção dos benefícios previstos no art. 39, I, da Lei 8.213/91.
A prova do exercício de atividade rural
Muito se discutiu acerca da previsão contida no art. 55, §3º, da Lei de Benefícios, segundo a qual a comprovação do tempo de serviço exige início de prova material. O que a Lei nº 8.213/91 exige é apenas o início de prova material e é esse igualmente o teor da Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça.
Exigir documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se quer reconhecer equivaleria a erigir a prova documental como a única válida na espécie, com desconsideração da prova testemunhal produzida, ultrapassando-se, em desfavor do segurado, a exigência legal. Neste sentido, o C. STJ: AgRg no AREsp 547.042/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014.
Tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
É pacífico o entendimento dos Tribunais, considerando as difíceis condições dos trabalhadores rurais, admitir a extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou companheira, bem como da filha solteira residente na casa paterna. (REsp 707.846/CE, Rel. Min. LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJ de 14/3/2005)
Idade mínima para o trabalho rural
Não se olvida que há jurisprudência no sentido de admitir-se o labor rural a partir dos 12 (doze) anos de idade, por ser realidade comum no campo, segundo as regras ordinárias de experiência, mormente se a prova testemunhal é robusta e reforçada por documentos que indicam a condição de lavradores dos pais do segurado.
O raciocínio invocado em tais decisões é o de que a norma constitucional que veda o trabalho ao menor de 16 anos visa à sua proteção, não podendo ser invocada para, ao contrário, negar-lhe direitos. (RESP 200200855336, Min. Jorge Scartezzini, STJ - Quinta Turma, DJ 02/08/2004, p. 484.).
Tal ponderação não é isenta de questionamentos. De fato, emprestar efeitos jurídicos para situação que envolve desrespeito a uma norma constitucional, ainda que para salvaguardar direitos imediatos, não nos parece a solução mais adequada à proposta do constituinte - que visava dar ampla e geral proteção às crianças e adolescentes, adotando a doutrina da proteção integral, negando a possibilidade do trabalho infantil.
Não se trata, assim, de restringir direitos ao menor que trabalha, mas sim, de evitar que se empreste efeitos jurídicos, para fins previdenciários, de trabalho realizado em desacordo com a Constituição. Considero, desta forma, o ordenamento jurídico vigente à época em que o(a) autor(a) alega ter iniciado o labor rural para admiti-lo ou não na contagem geral do tempo de serviço, para o que faço as seguintes observações:
As Constituições Brasileiras de 1824 e 1891 não se referiram expressamente à criança e adolescente tampouco ao trabalho infantil.
A Constituição de 1934 foi a primeira a tratar expressamente da proteção à infância e à juventude e em seu artigo 121 consagrou, além de outros direitos mais favoráveis aos trabalhadores, a proibição de qualquer trabalho para os menores de 14 anos; de trabalho noturno para os menores de 16 anos; e de trabalho em indústrias insalubres para menores de 18 anos.
Por sua vez, a Constituição de 1937, repetiu a fórmula da proibição de qualquer trabalho para os menores de 14 anos; de trabalho noturno para os menores de 16 anos e de trabalho em indústrias insalubres para menores de 18 anos.
A Constituição de 1946 elevou a idade mínima para a execução de trabalho noturno de 16 para 18 anos, mantendo as demais proibições de qualquer trabalho para menores de 14 anos e em indústrias insalubres para menores de 18 anos, além de proibir a diferença de salário para o mesmo trabalho por motivo de idade.
A Constituição de 1967, embora tivesse mantido a proibição para o trabalho noturno e insalubre para menores de 18 anos, reduziu de 14 para 12 anos a idade mínima para qualquer trabalho.
Por fim, a Constituição da República de 1988, proíbe o trabalho noturno, perigoso e insalubre para os menores de 18 anos; e, inicialmente, de qualquer trabalho para menores de 14 anos, como constava nas Constituições de 1934, 1937 e 1946. Todavia, com a Emenda Constitucional 20, de 1998, a idade mínima foi elevada para 16 anos, salvo na condição de aprendiz a partir de 14 anos.
Entretanto, em atenção ao entendimento consolidado nesta E. 7ª Turma, no sentido de considerar as peculiaridades de um Brasil com elevado contingente populacional no meio rural antes da década de 70, admito, para o cômputo geral do tempo de serviço, o trabalho rural desenvolvido antes da Constituição de 1967, a partir dos 12 anos de idade. A partir da Constituição Federal de 1988, todavia, prevalece a idade nela estabelecida.
Caso concreto - elementos probatórios
Atividade rural
De início, verifica-se que a controvérsia cinge-se à especialidade das atividades trabalhadas nos períodos de 01.01.70 a 26.06.70 e de 15.06.80 a 19.10.80 (reconhecidos na sentença) e de 01.01.74 a 31.12.76 (objeto de impugnação na apelação), considerando que em relação aos demais, quais sejam, de 27.06.70 a 31.12.73 e de 01.01.77 a 14.06.80, já houve reconhecimento na esfera administrativa do INSS (fls. 187/188).
A parte autora, nascida em 08.05.48 (fls. 11), trouxe aos autos, para comprovar o exercício de atividade rural:
- certidão de casamento, celebrado em 27.06.70, em que é qualificado como lavrador (fls. 126);
- certidão de nascimento do filho do autor (Marcos Rogério Fabris), ocorrido em 02.04.71, em que é qualificado como lavrador (fls. 127);
- certidão de nascimento da filha do autor (Rosemeire Fabris), ocorrido em 11.06.72, em que é qualificado como lavrador (fls. 128);
- certidão de nascimento da filha do autor (Rosangela Fabris), ocorrido em 22.06.73, em que é qualificado como lavrador (fls. 129);
- certidão de nascimento do filho do autor (Marcos Wiles Fabris), ocorrido em 20.09.75, em que é qualificado como lavrador (fls. 130);
- certidão de nascimento do filho do autor (Edivan dos Santos Fabris), ocorrido em 03.06.80, em que é qualificado como lavrador (fls. 131).
Ademais, conforme já decidido pela E. 7ª Turma, e tendo em vista o julgamento do Recurso Especial n.º 1.348.633/SP, representativo de controvérsia, pela 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, é possível a admissão de tempo de serviço rural anterior à prova documental, desde que corroborado por prova testemunhal idônea, o que de fato ocorreu.
As testemunhas ouvidas em juízo (fls. 244/245) puderam confirmar o labor rural diário do autor em fazenda localizada no município de Iretama/PR, na cultura de café, milho, arroz e feijão, de 1970 até 1980.
Desta forma, viável o reconhecimento do trabalho rural desenvolvido pelo autor informalmente, nos períodos de 01.01.70 a 26.06.70, 01.01.74 a 31.12.76 e de 15.06.80 a 19.10.80, exceto para efeito de carência.
Assim, deve o INSS proceder ao recálculo da renda mensal inicial (RMI) do benefício da parte autora (NB nº 42/110.171.086-9).
Assiste razão ao apelante ao impugnar o termo inicial do pagamento das diferenças, fixado na sentença, na data da citação. São devidas as diferenças decorrentes do recálculo de sua RMI desde a data do requerimento administrativo em 28.05.98 (fls. 13).
Saliente-se a inocorrência da prescrição (artigo 103, §único, da Lei n° 8.213/91), tendo em vista que o benefício foi concedido em sede recursal em 26.08.2000 (fls. 194), houve a apresentação de pedido administrativo de revisão em 09.02.2001 (fls. 277/278), pendente de análise na data do ajuizamento da presente ação em 11.10.2006 (fls. 02).
Para o cálculo dos juros de mora, aplicam-se os critérios estabelecidos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação. Quanto à correção monetária, acompanho o entendimento firmado pela Sétima Turma no sentido da aplicação do Manual de Cálculos, naquilo que não conflitar como o disposto na Lei nº 11.960/2009, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009.
Inverto o ônus da sucumbência e condeno o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS ao pagamento de honorários de advogado fixados em 10% do valor da condenação, consoante entendimento desta Turma e artigo 20, parágrafos 3º e 4º, do Código de Processo Civil de 1973, aplicável ao caso concreto eis que o recurso foi interposto na sua vigência, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça, não se aplicando as normas dos §§1º a 11º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação da parte autora, para reconhecer o trabalho rural exercido no período de 01.01.74 a 31.12.76, fixar o termo inicial do pagamento das diferenças na data do requerimento administrativo e os critérios de atualização do débito e os honorários de advogado nos termos explicitados na decisão e nego provimento à remessa necessária.
Por fim, considerando o caráter alimentar das prestações reclamadas e que os recursos aos Tribunais Superiores não são dotados de efeito suspensivo (art. 995 CPC/2015), concedo a tutela antecipada e determino, com apoio nos artigos 300 e 497 do CPC/2015, a imediata revisão da renda mensal inicial - RMI a ser apurada pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.
É como voto.
PAULO DOMINGUES
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 09/08/2017 15:10:53 |
