
| D.E. Publicado em 21/11/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do Autor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000399-68.2009.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de ação em que se pleiteia a revisão da RMI de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante o reconhecimento de período laborado em atividades especiais.
A sentença julgou improcedente. Condenou o Autor, também, ao pagamento de honorários de advogado, fixados em R$ 400,00, observada a gratuidade concedida.
Apela o Autor, sustentando, preliminarmente, cerceamento de defesa ante o indeferimento da complementação da prova pericial. No mérito, pretende a reforma da sentença para que seja reconhecido o tempo especial pleiteado.
Contrarrazões pela parte apelada, pugnando pela manutenção da sentença.
É o relatório.
VOTO
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
A preliminar de cerceamento de defesa confunde-se com o mérito e com este será analisado.
Aposentadoria Especial
A aposentadoria por tempo de serviço especial teve assento primeiro no artigo 31 da Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960, Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS, que estabeleceu que seria concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinquenta) anos de idade e 15 (quinze) anos de contribuições, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, em serviços que, para esse efeito, fossem considerados penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo.
Essa norma foi expressamente revogada pela Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973, que passou a discipliná-la no artigo 9º, alterando, em efeitos práticos, apenas o período de carência de 15 (quinze) anos para 5 (cinco) anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
Sobreveio, então, o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, reclassificando as atividades profissionais segundo os agentes nocivos e os grupos profissionais tidos por perigosos, insalubres ou penosos, com os respectivos tempos mínimos de trabalho.
Importante ressaltar que os Decretos nºs. 53.831/64 e 83.080/79 tiveram vigências simultâneas, de modo que, conforme reiteradamente decidido pelo C. STJ, havendo colisão entre as mencionadas normas, prevalece a mais favorável ao segurado. (REsp nº 412351, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, pág. 355).
As atividades insalubres previstas nas aludidas normas são meramente exemplificativas, podendo outras funções ser assim reconhecidas, desde que haja similitude em relação àquelas legalmente estatuídas ou, ainda, mediante laudo técnico-pericial demonstrativo da nocividade da ocupação exercida. Nesse sentido, o verbete 198 da Súmula do TFR.
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, a matéria passou a ser prevista no inciso II do artigo 202 e disciplinada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação original previa que o benefício de aposentadoria especial seria devido ao segurado que, após cumprir a carência exigida, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade física, restando assegurada, ainda, a conversão do período trabalhado no exercício de atividades danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em seguida, foi editada a Lei nº 9.032/95, alterando o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, dispondo que a partir desse momento não basta mais o mero enquadramento da atividade exercida pelo segurado na categoria profissional considerada especial, passando a ser exigida a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, que poderá se dar por meio da apresentação de informativos e formulários, tais como o SB-40 ou o DSS-8030.
Posteriormente, com a edição do Decreto n.º 2.172, de 05/03/1997, que estabeleceu requisitos mais rigorosos para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, passou-se a exigir-se a apresentação de laudo técnico para a caracterização da condição especial da atividade exercida. Todavia, por se tratar de matéria reservada à lei, tal exigência apenas tem eficácia a partir da edição da Lei n.º 9.528, de 10/12/1997.
Cumpre observar que a Lei nº 9528/97 também passou a aceitar o Perfil Profissiográfico Previdenciário, documento que busca retratar as características de cada emprego do segurado, de forma a facilitar a futura concessão de aposentadoria especial. Assim, identificado no documento o perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, é possível a sua utilização para comprovação da atividade especial em substituição ao laudo pericial.
Ressalto que no tocante ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e à forma da sua demonstração, deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho, conforme jurisprudência pacificada da matéria (STJ - Pet 9.194/PR, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
A extemporaneidade do documento comprobatório das condições especiais de trabalho não prejudica o seu reconhecimento como tal, "pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual a constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica." (Des. Fed. Fausto De Sanctis, AC nº 2012.61.04.004291-4, j. 07/05/2014)
Especificamente em relação ao ruído, o Decreto nº 53.831/64 considerava insalubre o labor desempenhado com exposição permanente a ruído acima de 80 dB; já o Decreto nº 83.080/79 fixava a pressão sonora em 90 dB. Na medida em que as normas tiveram vigência simultânea, prevalece disposição mais favorável ao segurado (80 dB).
Com a edição do Decreto nº 2.172/97, a intensidade de ruído considerada para fins de reconhecimento de insalubridade foi elevada para 90 dB, mas, em 2003, essa medida foi reduzida para 85 dB, por meio do Decreto nº 4.882, de 18 de novembro de 2003.
Até 09 de outubro de 2013, os Tribunais adotavam o enunciado pela Súmula nº 32 da TNU. Contudo, esta Súmula foi cancelada em decorrência do julgamento da PET 9059 pelo Superior Tribunal de Justiça (Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJe 09/09/2013) cujo entendimento foi sufragado no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), sob a sistemática dos recursos repetitivos.
Em relação ao agente ruído, vigora o princípio do tempus regit actum. Considera-se especial a atividade desenvolvida acima do limite de 80dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº 2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90dB até 18/11/2003, quando foi editado o Decreto nº 4882/2003. A partir de 19/11/2003 o limite passou a ser de 85 dB.
Saliente-se que a especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico profissional (a partir de 11/12/97).
É corrente em nossos tribunais a tese de que sempre se exigiu laudo técnico para comprovar a exposição do trabalhador aos agentes físicos ruído e calor em níveis superiores aos limites máximos de tolerância. Entretanto, no tocante às atividades profissionais exercidas até 10/12/97 - quando ainda não havia a exigência legal de laudo técnico -, essa afirmação deve ser compreendida, não na literalidade, mas no sentido de ser necessário o atesto efetivo e seguro dos níveis de intensidade dos agentes nocivos a que o trabalhador esteve exposto durante sua jornada laboral.
Logo, para as atividades profissionais exercidas até 10/12/97, é suficiente que os documentos apresentados façam expressa menção aos níveis de intensidade dos agentes nocivos.
Uso de equipamento de proteção individual - EPI, como fator de descaracterização do tempo de serviço especial
A questão foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do ARE nº 664335, da relatoria do E. Ministro Luiz Fux, com reconhecimento de repercussão geral, na data de 04.12.2014, em que restou decidido que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional ao reconhecimento das atividades especiais.
Restou assentado também que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
O fato de a empresa fornecer equipamento de proteção individual - EPI para neutralização dos agentes agressivos não afasta, por si só, a contagem do tempo especial, pois cada caso deve ser examinado em suas peculiaridades, comprovando-se a real efetividade do aparelho e o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1428183/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 25/02/2014, DJe 06/03/2014).
Ainda, conforme a jurisprudência citada, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído, desde que em níveis acima dos limites legais, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas.
Caso concreto - elementos probatórios
Pleiteia a parte autora por meio desta ação a revisão da RMI da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante o reconhecimento de períodos laborados em condições especiais.
De início, verifica-se que a controvérsia cinge-se à especialidade das atividades trabalhadas no período de 06/11/1984 a 12/04/1999.
Sustenta o Autor ser sócio de empresa do ramo alimentício, na fabricação e comércio de sorvetes. Descreve, no formulário SB 8030, a atividade como "pesar e medir os ingredientes para obter as quantidades necessárias ao preparo dos sorvetes; misturar os ingredientes através de máquinas operatrizes apropriadas, operando-as até o processo final de fabricação da massa de sorvete desejada; despejar a massa em formas ou similares apropriados e colocá-los no freezer; efetuar serviços de gerência da empresa; executar outras atividades correlatas" - fls. 39.
Atesta o formulário que o Autor era exposto a níveis de pressão sonora de 91 dB no desenvolver de seu labor.
Já o laudo pericial, produzido em juízo (fls. 212/222) assevera que o Autor desempenhava atividades administrativas, concluindo, ao final que não houve insalubridade.
Pois bem. Entendo que a atividade de sócio-gerente possui natureza eminentemente administrativa, diferentemente do empregado. Observo que o Autor se aposentou por tempo de serviço na categoria de empresário/empregador, que mesmo sendo da espécie de contribuinte individual, é diferenciada na lei quando esta restringe a concessão de aposentadoria especial àqueles contribuintes cooperados filiados à cooperativa de trabalho, o que não é verificado nestes autos.
A propósito:
"DIREITO CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA ESPECIAL. JULGAMENTO DA APELAÇÃO PELO ART. 557 DO CPC. POSSIBILIDADE. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE ESPECIAL. DESEMPENHO DE FUNÇÕES ADMINISTRATIVAS NA PRÓPRIA EMPRESA, NÃO ENQUADRADAS NAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DA ESPECIALIDADE DO ALUDIDO PERÍODO. AUSÊNCIA DE EXPOSIÇÃO DE FORMA PERMANENTE, NÃO OCASIONAL NEM INTERMITENTE, A AGENTES PREJUDICIAIS À SAÚDE OU À INTEGRIDADE FÍSICA. AGRAVO DESPROVIDO. 1. O ordenamento jurídico pátrio prevê expressamente a possibilidade de julgamento da apelação pelo permissivo do Art. 557, caput e § 1º-A do CPC, nas hipóteses previstas pelo legislador. O recurso pode ser manifestamente improcedente ou inadmissível mesmo sem estar em confronto com súmula ou jurisprudência dominante, a teor do disposto no caput, do Art. 557 do CPC, sendo pacífica a jurisprudência do STJ a esse respeito. 2. Os documentos reproduzidos com o procedimento administrativo, revelam que o autor, ao constituir a empresa Amarildo Cini - ME, e requerer sua inscrição no Registro do Comércio, declarou sua profissão de "comerciante", tendo sido cadastrado na Previdência Social como contribuinte empresário - ocupação empresário, com início em 24/03/1998, bem como, a cópia do recibo de pagamento de salário mensal - dezembro de 2008, descreve o autor com o cargo de "titular empresário" - código CBO "25105 001 ADMINISTRAÇÃO" e os vencimentos com o código "PRO-LABORE DIRET/PROPRIETÁRIOS", sem qualquer menção aos adicionais de insalubridade/periculosidade, levando à convicção de que o mesmo também desempenhava funções administrativas na própria empresa, não enquadradas nas condições especiais. 3. Tendo em vista que as provas produzidas nos autos levam à convicção de que o segurado também desempenhava funções administrativas na própria empresa, não enquadradas nas condições especiais, o aludido período não deve ser reconhecido especial, uma vez que a parte autora não estava exposta de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física. 4. Não se mostra razoável desconstituir a autoridade dos precedentes que orientam a conclusão que adotou a decisão agravada. 5. Agravo desprovido." (TRF 3ª Região, AC nº 00098082220094036102, Rel. Des. Federal Baptista Pereira, DJe 28/01/2015)
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AGRAVO PREVISTO NO ART. 557, §1º DO C.P.C. ATIVIDADE ESPECIAL. NÃO COMPROVADA. EMPRESÁRIO. JUROS DE MORA. CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. I - O agravo regimental interposto deve ser recebido como agravo previsto no art. 557, § 1º, do Código de Processo Civil, considerando a tempestividade e o princípio da fungibilidade recursal. II - A contagem diferenciada para fins de acréscimo de tempo de serviço há que se apoiar em prova de atividade profissional desenvolvida com pessoalidade, de forma contínua, habitual e permanente pelo trabalhador, situação não configurada nos autos. III - O autor não era trabalhador autônomo, ou seja, não prestava serviços de forma unipessoal, por conta própria. Exercia atividade empresarial por firma constituída por quatro sócios, conforme contrato social de empresa cujo objeto social era "a exploração de industrialização para terceiros de artes gráficas, serigráficas e silk-screen". Assim, não há como se considerar especial a atividade empresária do sócio, unicamente em razão da atividade econômica explorada pela empresa. IV - Não há condenação do réu ao pagamento de benefício previdenciário, assim, prejudicado o pedido de condenação em verbas acessórias. V - Agravo da parte autora improvido (art.557, §1º C.P.C)". (TRF 3ª região, AC nº 00030516520064036183, Des. Federal Sérgio Nascimento, DJe 26/06/2013)
A prova testemunhal produzida corrobora a natureza também administrativa de suas atividades. Com efeito, é dito que o Autor fazia compras, descaracterizando a permanência e a habitualidade necessárias ao reconhecimento do tempo especial.
Assim, mantenho a r. sentença lançada nos autos.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do autor, nos termos explicitados na decisão.
É como voto.
PAULO DOMINGUES
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 09/11/2016 17:11:59 |
