
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5011573-73.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NELI DOS SANTOS FONTES
Advogado do(a) APELADO: MARIA LETICIA TRIVELLI - SP77862-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5011573-73.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NELI DOS SANTOS FONTES
Advogado do(a) APELADO: MARIA LETICIA TRIVELLI - SP77862-A
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DE SEGURO SOCIAL – INSS contra a sentença (ID 129978920 e ID 7494344) que acolheu o cálculo elaborado pela contadoria judicial (fls. 121/126 dos autos físicos), no valor total de R$ 17.246,13 (dezessete mil, duzentos e quarenta e seis reais e treze centavos) atualizado para 09/2014, bem como condenou a parte embargada ao pagamento dos honorários advocatícios fixados no percentual mínimo legal sobre o proveito econômico obtido, nos moldes do artigo 85, § 3º do CPC/2015.
Sustenta o apelante o equívoco na conta acolhida pelos seguintes motivos: a) deixou de aplicar o índice de atualização monetária (TR - Taxa Referencial) previsto nos termos da Lei nº 11.960/2009, de acordo com a redação dada pelo artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, a partir de 06/2009; b) computou como devido o pagamento do abono/décimo – terceiro, nos anos de 2010 e 2011, quando, na verdade, segundo alega, neste período, nada seria devido diante da necessidade de desconto das parcelas do benefício em virtude dos recolhimentos efetuados, bem como aduz que, em relação ao ano de 2012, o pagamento do abono deve ser proporcional; c) deixou de abater as parcelas recebidas a título do benefício de aposentadoria por idade (nas competências de 04/2012 a 06/2012) implantada na via administrativa em data posterior ao termo inicial da aposentadoria por invalidez, concedida na ação de conhecimento, independentemente da boa-fé ou do caráter alimentar de tal verba. Assevera que a primeira conta por ele apresentada apurou indevidamente a RMI, estando correto o cálculo no valor de R$ 8.488,07 (oito mil, quatrocentos e oitenta e oito reais e sete centavos) – fls. 132/133 dos autos físicos - cuja homologação requer – id 7494347.
Em contrarrazões e nas petições intercorrentes (id 10886117 e id 129978920), a parte apelada insurge-se contra o desconto mensal de parcelas do benefício de aposentadoria por invalidez, no valor equivalente a 30% (trinta por cento), como forma de compensação do erro cometido no ato da implantação de tal benefício (em 01/09/2014), o qual lhe acarretou o pagamento da RMI a maior, resultando em um débito no importe de R$ 34.652,12 (trinta e quatro mil, seiscentos e cinquenta e dois reais e doze centavos) perante a autarquia previdenciária.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5011573-73.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NELI DOS SANTOS FONTES
Advogado do(a) APELADO: MARIA LETICIA TRIVELLI - SP77862-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
No caso em tela, os pontos controvertidos consistem: a) no índice de atualização monetária aplicado sobre as diferenças devidas; b) cabimento ou não de pagamento dos abonos anuais nos anos de 2010 e 2011 e do abono integral no ano de 2012; c) desconto ou não de parcelas pagas administrativamente a título de aposentadoria por idade no período de apuração dos atrasados; d) correção e homologação da conta elaborada pelo INSS no montante de R$ 8.488,07 (oito mil, quatrocentos e oitenta e oito reais e sete centavos).
Para o deslinde do feito, cumpre ressaltar que a execução norteia-se pelo princípio da fidelidade ao título executivo, o que consiste em limitar-se ao cumprimento dos comandos definidos no r. julgado prolatado na ação de conhecimento e acobertado pela coisa julgada.
Desta forma, não se admitem execuções que se divorciem dos mandamentos fixados na demanda cognitiva, que têm força de lei nos limites da lide e das questões decididas (artigo 503 do CPC/2015). Nesse sentido, é a jurisprudência: (AGARESP 201402558410, MARCO AURÉLIO BELLIZZE, STJ - TERCEIRA TURMA, DJE DATA: 22/04/2015. DTPB).
Pois bem. A sentença proferida na demanda cognitiva julgou parcialmente procedente o pedido formulado na petição inicial determinando o restabelecimento do benefício previdenciário de auxílio-doença (NB 502.134.376-5) desde 29.01.2006 até a data da elaboração do laudo pericial produzido nos autos (29.11.2010) e sua posterior conversão em aposentadoria por invalidez a partir de 30/11/2010, bem como determinou a compensação dos valores recebidos a título do benefício de aposentadoria por idade (NB 160.011.285-1), desde 18.04.2012.
O v. acórdão não conheceu do agravo retido e da apelação interposta pelo INSS e deu parcial provimento à remessa oficial, para alterar o termo inicial do benefício para 29/11/2010 (data do laudo pericial) – id. 7494131.
No tocante à atualização das diferenças, o r. julgado (proferido em 13/02/2014) estabeleceu o seguinte: “a correção monetária incide sobre as prestações em atraso, desde as respectivas competências, na forma da legislação de regência, observando-se que, a partir de 11.08.2006 o IGP-DI deixa de ser utilizado como índice de atualização monetária dos débitos previdenciários, devendo ser adotado, da retro aludida data (11/08/2006) em diante, o INPC em vez do IGP-DI, nos termos do artigo 31 da Lei nº 10.741/2003 c.c o artigo 41-A da Lei nº 8.213/91, com a redação que lhe foi dada pela Medida Provisória nº 316, de 11 de agosto de 2006, posteriormente convertida na Lei nº 11.430, de 26.12.2006.” - fl. 06, id 7494131.
Portanto, não prospera a irresignação do INSS quanto à necessidade de adoção da TR – Taxa Referencial, nos termos da Lei 11.960/2009, a partir de 07/2009, na atualização das diferenças, já que a pretensão veiculada pelo apelante não atende aos termos do r. julgado.
Insta consignar, ainda, que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux, declarou a inconstitucionalidade da TR - Taxa Referencial, cujos embargos de declaração que objetivavam a modulação dos seus efeitos para fins de atribuição de eficácia prospectiva foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019.
Desta forma, o cálculo acolhido na sentença recorrida está correto no tocante ao critério de atualização monetária das diferenças pelo INPC, em detrimento da TR, nos termos do precedente jurisprudencial citado, da previsão contida no Manual de Cálculos da Justiça Federal e de acordo com o teor do título executivo.
Cumpre ressaltar que a questão envolvendo os abonos está relacionada com os descontos das parcelas dos atrasados no período em que concomitantemente houve o recolhimento de contribuições previdenciárias, bem como no período em que a parte apelada/embargada esteve em gozo de benefício de aposentadoria por idade.
Nesse sentido, o título executivo consignou expressamente: (...) o fato de a autora ter efetuado recolhimentos na qualidade de contribuinte individual – faxineira, após o ajuizamento da demanda não afasta a sua incapacidade laborativa, pois o segurado precisa se manter durante o longo período em que é obrigado a aguardar a implantação do benefício, por necessidade de sobrevivência, não incidindo, consequentemente, o comando estabelecido pelo artigo 46 da Lei nº 8.213/91. Ademais, o perito foi taxativo ao atestar a incapacidade total da autora, cabendo ao caso apenas descontar os períodos em que as contribuições foram efetuadas – fl. 04, id 7494131.
Na conta acolhida, segundo constou no laudo do Setor de Cálculos da Justiça Federal, na Primeira Instância “(...) foram descontados os períodos em que a autora efetuou contribuições (11/2020 a 06/2012), conforme expressamente determinado no v. acórdão, 5º parágrafo da fl. 193.” (id 7494337, fl. 02 e id 7494341, fl. 02).
Partindo de uma interpretação restritiva, à luz do princípio da fidelidade ao título executivo, não devem ser admitidos descontos de valores que não estejam expressamente consignados no r. julgado, de modo que são devidos os abonos no respectivo interregno de 2010 e 2011, tal como bem advertiu o juízo a quo
Em contrapartida, não procedeu com o mesmo acerto o magistrado sentenciante ao asseverar que não há que se falar em devolução dos valores recebidos a título de aposentadoria por idade, já que presentes a boa-fé e levando-se em consideração a irrepetibilidade da verba alimentar (...) – id 7494344.
Importa salientar que, na presente hipótese, não se trata de restituição de valores, mas tão somente de compensação ou abatimento de verbas recebidas, a título de benefício inacumulável, na conta dos atrasados.
Frise-se, ademais, que o próprio título executivo expressamente determinou “a obrigatoriedade de dedução, na fase de liquidação, dos valores eventualmente pagos à parte autora após o termo inicial assinalado à benesse outorgada, ao mesmo título ou cuja cumulação seja vedada por lei (artigo 124 da Lei 8.213/1991 e art. 20, § 4º, da Lei 8.742/1993).” – id 7494131.
Nessa esteira, a pretensão recursal merece guarida apenas no tocante ao dever de que, na conta de liquidação, seja efetuado o desconto dos valores oriundos da implantação da aposentadoria por idade (NB 41/160.011.2851) recebidos administrativamente nas competências de 04/2012 a 06/2012 (id 7494332, fl. 05), uma vez que estão compreendidas no período de apuração dos atrasados da aposentadoria por invalidez (DIB: 29/11/2010 e DIP: 01/09/2014 fl. 07, id 7494332), sendo vedada a cumulação entre ambas, com fulcro no artigo 124, inciso II, da Lei de Benefícios. Pela mesma razão, neste caso, também deve ser descontado o abono proporcional relativo ao ano de 2012, caso recebido, a título da aposentadoria por idade.
Em relação à matéria veiculada em contrarrazões de apelação (id 7494346) e nas manifestações de id 10886117 e id 129978920, qual seja – “confisco” ou desconto mensal nas parcelas da aposentadoria relativa a montante pago a maior, por força de erro administrativo na implantação da RMI – convém esclarecer que tal equívoco foi constatado pela contadoria judicial, consoante esclarecimentos prestados (id 7494337): “(...) Verificamos que a RMI utilizada pelas partes está incorreta, pois consideram que a RMI da aposentadoria por invalidez era derivada de auxílio-doença NB 502.134.376-5 (DIB 28/10/2003 e DCB 29/01/2006). No entanto, entre a cessação e do auxílio-doença e a DIB da aposentadoria por invalidez (29/11/2010) a autora contribui à previdência como contribuinte obrigatório.”
Considerando que o acórdão prolatado na demanda cognitiva determinou apenas a concessão da aposentadoria por invalidez, a partir da data do laudo pericial, reformando parte da sentença que restabelecia o auxílio-doença em momento anterior, e que houve recolhimento de contribuições previdenciárias no período entre a cessação deste último e a concessão da aposentadoria, a apuração da RMI pela contadoria judicial obedeceu a critérios distintos daqueles originalmente empregados pelo INSS, os quais se baseavam na mera conversão do salário de benefício do auxílio-doença.
No entanto, não incumbe a esta E. Turma Recursal dirimir o impasse entre a possibilidade de desconto mensal de tais verbas, nos termos do artigo 115, inciso II, da Lei de Benefícios e a irrepetibilidade dos valores de caráter alimentar recebidos de boa-fé, a uma porque tal matéria não consiste em objeto da apelação interposta pelo INSS; a duas porque a aludida questão é tratada no REsp 1.381.734 submetido à apreciação pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, na sistemática dos recursos repetitivos: Tema 979: “Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social.” Em consequência, foi determinada a suspensão do processamento de todos os processos, individuais ou coletivos, que versem sobre a mesma matéria e tramitem no território nacional, nos termos do art. 1.037, II, do CPC/2015.
Deste modo, os cálculos de liquidação devem ser retificados pela contadoria judicial, na Primeira Instância, de acordo com os critérios delimitados neste voto, nos termos da fundamentação.
Por fim, ressalte-se que, no caso de ser constatado eventual saldo negativo ou débito da parte autora em favor da autarquia previdenciária, em virtude dos citados valores recebidos a maior, e não obstante os descontos mensais já efetuados administrativamente, a determinação quanto à eventual restituição de tais verbas ficará a cargo do juízo a quo, que deverá observar o decidido pela Corte Superior no tocante ao tema em questão, em virtude de seu efeito vinculante.
Ante o exposto,
dou parcial provimento à apelação interposta pelo INSS
, para que os cálculos de liquidação sejam retificados na Primeira Instância, consoante fundamentação.É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. APELAÇÃO. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. TAXA REFERENCIAL (TR). INCONSTITUCIONALIDADE. INPC. FIDELIDADE AO TÍTULO EXECUTIVO. ABONOS ANUAIS. DESCONTOS. BENEFÍCIO INACUMULÁVEL. PAGAMENTOS ADMINISTRATIVOS. RENDA MENSAL INICIAL. CONTADORIA JUDICIAL. RETIFICAÇÃO. PAGAMENTO A MAIOR. TEMA 979/STJ. PARCIAL PROVIMENTO.
1- No caso em tela, os pontos controvertidos consistem: a) no índice de atualização monetária aplicado sobre as diferenças devidas; b) cabimento ou não de pagamento dos abonos anuais nos anos de 2010 e 2011 e do abono integral no ano de 2012; c) desconto ou não de parcelas pagas administrativamente a título de aposentadoria por idade no período de apuração dos atrasados; d) correção e homologação da conta elaborada pelo INSS no montante de R$ 8.488,07 (oito mil, quatrocentos e oitenta e oito reais e sete centavos).
2- Para o deslinde do feito, cumpre ressaltar que a execução norteia-se pelo princípio da fidelidade ao título executivo, o que consiste em limitar-se ao cumprimento dos comandos definidos no r. julgado prolatado na ação de conhecimento e acobertado pela coisa julgada. Não se admitem execuções que se divorciem dos mandamentos fixados na demanda cognitiva, que têm força de lei nos limites da lide e das questões decididas (artigo 503 do CPC/2015). Precedente.
3- Não prospera a irresignação do INSS quanto à necessidade de adoção da TR – Taxa Referencial, nos termos da Lei 11.960/2009, a partir de 07/2009, na atualização das diferenças, já que a pretensão veiculada pelo apelante não atende aos termos do r. julgado, que determinou o emprego do INPC, desde 11/08/2006. Insta consignar, ainda, que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux, declarou a inconstitucionalidade da TR - Taxa Referencial, cujos embargos de declaração que objetivavam a modulação dos seus efeitos para fins de atribuição de eficácia prospectiva foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019.
4- Partindo de uma interpretação restritiva, à luz do princípio da fidelidade ao título executivo, não devem ser admitidos descontos de valores que não estejam expressamente consignados no r. julgado, de modo que são devidos os abonos no respectivo interregno de 2010 e 2011, tal como bem advertiu o juízo a quo.
5 -A pretensão recursal merece guarida apenas no tocante ao dever de que, na conta de liquidação, seja efetuado o desconto dos valores oriundos da implantação da aposentadoria por idade (NB 41/160.011.2851) recebidos administrativamente nas competências de 04/2012 a 06/2012 (id 7494332, fl. 05), uma vez que estão compreendidas no período de apuração dos atrasados da aposentadoria por invalidez (DIB: 29/11/2010 e DIP: 01/09/2014 fl. 07, id 7494332), sendo vedada a cumulação entre ambas, com fulcro no artigo 124, inciso II, da Lei de Benefícios. Pela mesma razão, neste caso, também deve ser descontado o abono proporcional relativo ao ano de 2012, caso recebido, a título da aposentadoria por idade.
6- Em relação à matéria veiculada em contrarrazões de apelação (id 7494346) e nas manifestações de id 10886117 e id 129978920 não incumbe a esta E. Turma Recursal dirimir o impasse entre a possibilidade de desconto mensal de tais verbas, nos termos do artigo 115, inciso II, da Lei de Benefícios e a irrepetibilidade dos valores de caráter alimentar recebidos de boa-fé, a uma porque tal matéria não consiste em objeto da apelação interposta pelo INSS; a duas porque a aludida questão é tratada no REsp 1.381.734 submetido à apreciação pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, na sistemática dos recursos repetitivos: Tema 979/STJ.
7- Deste modo, os cálculos de liquidação devem ser retificados pela contadoria judicial, na Primeira Instância, de acordo com os critérios delimitados neste voto, nos termos da fundamentação.
8 - Por fim, ressalte-se que, no caso de ser constatado eventual saldo negativo ou débito da parte autora em favor da autarquia previdenciária, em virtude dos citados valores recebidos a maior, e não obstante os descontos mensais já efetuados administrativamente, a determinação quanto à eventual restituição de tais verbas ficará a cargo do juízo a quo, que deverá observar o decidido pela Corte Superior no tocante ao tema em questão, em virtude de seu efeito vinculante.
9 - Apelação parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação interposta pelo INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
