Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5054812-28.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal LUIZ DE LIMA STEFANINI
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
30/06/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 07/07/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO
DE TRABALHADOR RURAL. PROVA DOCUMENTAL. PROVA TESTEMUNHAL
CORROBORAÇÃO. OMISSÃO RECONHECIDA. EMBARGOS PROVIDOS.
1.No caso vertente, reconhece-se a ocorrência de omissão no v. acórdão no tocante ao
reconhecimento de período de labor rural em favor da parte autora.
2. Início razoável de prova material que restou corroborado pela prova testemunhal, a ensejar o
reconhecimentodo trabalho rural exercido pela autora de 01/02/1980 a 17/08/2016, mantendo-se
o benefício concedido, bem como os demais termos do V. Acórdão embargado.
3.Ressalva-se que o período de atividade rural reconhecido anterior à Lei 8.213/91 não poderá
ser computado para efeito de carência, nos termos do §2º, do art.55, da Lei 8.213/91,
observando-se ainda que o tempo posterior ao advento do mencionado diploma legal somente
poderá ser considerado para efeito de concessão dos benefícios previstos no art.39, inciso I, da
mesma lei, o que deverá constar da certidão de averbação.
4. Embargos providos.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5054812-28.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
APELANTE: ANTONIA DE MELO DIAS DE MEIRA
Advogado do(a) APELANTE: DENILSON MARTINS - SP153940-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5054812-28.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
APELANTE: ANTONIA DE MELO DIAS DE MEIRA
Advogado do(a) APELANTE: DENILSON MARTINS - SP153940-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de embargos de declaração opostos pelo INSS em face do v. Acórdão desta C. Turma
(ID 145087118 - págs. 1/10), que, em julgamento realizado aos 19/10/2020, deu provimento à
apelação da parte autora para conceder o benefício de aposentadoria por idade rural, desde
17/08/2016.
O embargante alega a existência de omissão, obscuridade e contradição, uma vez que “deixou
o r. decisum de registrar o período em que reconhece o labor rural”, também aduzindo que
“após o ano de 1991 o tempo de atividade rural somente pode ser considerado mediante prova
de recolhimento da contribuição previdenciária”. Prequestiona a matéria.
Sem contrarrazões da parte autora.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5054812-28.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
APELANTE: ANTONIA DE MELO DIAS DE MEIRA
Advogado do(a) APELANTE: DENILSON MARTINS - SP153940-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
São cabíveis embargos de declaração para esclarecer obscuridade ou eliminar contradição,
suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a
requerimento, ou corrigir erro material, consoante dispõe o artigo 1.022, I, II e III, do CPC.
Têm por finalidade, portanto, a função integrativa do aresto, sem provocar qualquer inovação.
Somente em casos excepcionais é possível conceder-lhes efeitos infringentes.
No caso vertente, o v. acórdão foi proferido nestes termos:
“Trata-se de apelação interposta por ANTONIA DE MELO DIAS DE MEIRA, em sede de ação
proposta contra o INSS, cujo objeto é a concessão de aposentadoria por idade devida a
trabalhador rural, que alega ter trabalhado pelo tempo necessário previsto em lei, e que,
portanto, faria jus ao benefício.
Com a inicial vieram documentos.
Justiça gratuita concedida.
Contestação da parte ré oferecida.
Por sentença datada de 05/07/2018, o MMº Juízo “a quo” julgou improcedente o pedido, aos
argumentos de ausência de comprovação dos requisitos carência e imediatidade.
Em apelação, a parte autora alega, em síntese, haver provas suficientes do trabalho rural pelo
período de carência, pleiteando a concessão do benefício de aposentadoria rural.
Com contrarrazões recursais, os autos subiram a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
Em linhas introdutórias, destaco que antes da entrada em vigor da Constituição Federal de
1988 e da Lei nº 8.213/91, que a regulamentou, a Lei Complementar nº 11, de 25.05.1971, em
seu artigo 4º, previa que a aposentadoria por idade seria devida ao trabalhador rural quando
este completasse 65 (sessenta e cinco) anos, o que foi posteriormente alterado pela Lei
Complementar nº 16, de 30.10.1973, que, em seu artigo 5º, passou a prever que a qualidade de
trabalhador rural dependeria da comprovação de sua atividade pelo menos nos últimos três
anos anteriores à data do pedido do benefício, ainda que de forma descontínua.
Já a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 202, e inciso I, estabeleceu:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários de contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês,
e comprovada a regularidade dos reajustes dos salários de contribuição de modo a preservar
seus valores reais e obedecidas as seguintes condições:
I - aos sessenta e cinco anos de idade, para o homem, e aos sessenta, para a mulher,reduzido
em cinco anos o limite de idade para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que
exerçam suas atividades em regime de economia familiar, neste incluídos o produtor rural, o
garimpeiro e o pescador artesanal" – grifo nosso.
Referida norma constitucional foi regulamentada pela Lei nº 8.213/91, que dispõe sobre os
Planos de Benefícios da Previdência Social, tendo, em seu artigo 48, e §§ 1º e 2º, estabelecido
os requisitosetárioe deefetivo exercício de atividade ruralpelo período de carência do benefício
pretendido –conforme tabela de carências, prevista no artigo 142 daquela Lei-, para que
homens e mulheres possam obter a aposentadoria por idade, nos seguintes termos:
“Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se
mulher.
§ 1o Os limites fixados no caput sãoreduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso
de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I,
na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11;
§ 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo,o trabalhador rural deve comprovar o
efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei” – grifei.
Por sua vez, o artigo 39 da supra referida Lei garante ao trabalhador rural, segurado especial -
isto é, aquele que trabalha em regime de economia familiar -, aposentadoria por idade no valor
de um salário mínimo, desde que comprove efetivo exercício de atividade rural pelo período
legal de carência do benefício, “verbis”:
“Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, fica garantida
a concessão:
I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de
pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86,
desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no
período, imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses
correspondentes à carência do benefício requerido”.
Da mesma forma, prevê o artigo 143 da Lei nº 8.213/91:
“Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício”.
Destaco, por fim, o artigo 26, inciso III, da Lei nº 8.213/91, que isentou o segurado especial –
produtor rural em regime de economia familiar – do recolhimento de contribuições, fazendo jus
ao benefício, pois, independentemente de contribuição, desde que comprove exercício de
atividade rural pelo número de meses correspondentes à carência do benefício pretendido,
“verbis”:
“Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:
[...]
III - os benefícios concedidos na forma do inciso I do art. 39, aos segurados especiais referidos
no inciso VII do art. 11 desta Lei”.
Conclui-se, portanto, que o benefício deaposentadoria por idade ao trabalhador ruralestá
disciplinado nos artigos 39, I, 48 e 143, da Lei nº 8.213/91, exigindo-se, além da comprovação
da idade (60 anos para homens e 55 para mulheres), prova do exercício de atividade rural,
mesmo que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em
número de meses idêntico à carência do benefício, nos termos dos artigos 26, III e 142 daquela
Lei.
Pois bem, uma vez analisado o sistema normativo que regulamenta a concessão do benefício
em questão, importante destacar também os critérios de valoração das provas, já sedimentados
pela jurisprudência pátria.
Nesse sentido, esta E. Oitava Turma vem decidindo, “verbis”:
“[...]Declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais fazem prova do quanto nelas alegado,
desde que devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos
competentes para tanto, nos exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei nº 8.213/91, seja
em sua redação original, seja com a alteração levada a efeito pela Lei nº 9.063/95”.
Na mesma seara, declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por
testemunhas, noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento
então pretendido, tendo em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem
o crivo do contraditório, conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte.
Igualmente não alcançam os fins pretendidos, a apresentação de documentos comprobatórios
da posse da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos
da atividade exercida pela parte requerente.
Já a mera demonstração, pela parte demandante, de propriedade rural, só se constituirá em
elemento probatório válido desde que traga a respectiva qualificação como lavrador ou
agricultor. No mesmo sentido, a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante
a juntada dos respectivos comprovantes de pagamento das mensalidades.
Têm-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a
qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos
por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge
Scartezzini, v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248.
Da mesma forma, a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a
partir da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos
Tribunais.
Na atividade desempenhada em regime de economia familiar, toda a documentação
comprobatória, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida, em regra, em nome
daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar. Ressalte-se, contudo, que nem sempre é
possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de
documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da
família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja
eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do
meio rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos, de
sua necessidade, que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido, ou a entrega, como
forma de pagamento, pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar.
De qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº
463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em
nome dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constituem
início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos.
Ressalte-se que o trabalho urbano de membro da família não descaracteriza, por si só, o
exercício de trabalho rural em regime de economia familiar de outro. Para ocorrer essa
descaracterização, é necessária a comprovação de que a renda obtida com a atividade urbana
é suficiente à subsistência da família.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus
clausus, já que o "sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento
motivado" (AC nº 94.03.025723-7/SP, TRF 3ª Região, Rel. Juiz Souza Pires, 2º Turma, DJ
23.11.94, p. 67691), cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade
e sua aceitação.
Aprecio também a questão, insistentemente trazida à discussão pelo Ente Previdenciário, de
que a comprovação do exercício da atividade rural deva se referir ao período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, tal como estabelecido no art. 143 da Lei nº 8.213/91,
com redação alterada pela Lei nº 9.063/95.
Adoto o entendimento de que há exigência de que o tempo de trabalho rural deva ser exercido
no período imediatamente anterior ao requerimento. Nesse sentido o julgado em Recurso
Repetitivo do Superior Tribunal de Justiça. REsp nº 1.354.908/SP:
“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE
RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE
TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM
SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º
combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que
estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural,
momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo
48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter
atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo
descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do
direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu
ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência.
Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil.
(REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado
em 09/09/2015, DJe 10/02/2016)”.
No que se refere ao recolhimento das contribuições previdenciárias, destaco que o dever legal
de promover seu recolhimento junto ao INSS e descontar da remuneração do empregado a seu
serviço, compete exclusivamente ao empregador, por ser este o responsável pelo seu repasse
aos cofres da Previdência, a quem cabe a sua fiscalização, possuindo, inclusive, ação própria
para haver o seu crédito, podendo exigir do devedor o cumprimento da legislação. No caso da
prestação de trabalho em regime de economia familiar, é certo que o segurado é dispensado do
período de carência, nos termos do disposto no art. 26, III, da Lei de Benefícios e, na condição
de segurado especial, assim enquadrado pelo art. 11, VII, da legislação em comento, caberia o
dever de recolher as contribuições, tão-somente se houvesse comercializado a produção no
exterior, no varejo, isto é, para o consumidor final, para empregador rural-pessoa física, ou a
outro segurado especial (art. 30, X, da Lei de Custeio).
Por fim, outra questão que suscita debates é a referente ao trabalho urbano eventualmente
exercido pelo segurado ou por seu cônjuge, cuja qualificação como lavrador lhe é extensiva.
Perfilho do entendimento no sentido de que o desempenho de atividade urbana, de per si, não
constitui óbice ao reconhecimento do direito aqui pleiteado, desde que o mesmo tenha sido
exercido por curtos períodos, especialmente em época de entressafra, quando o humilde
campesino se vale de trabalhos esporádicos em busca da sobrevivência.
Da mesma forma, o ingresso no mercado de trabalho urbano não impede a concessão da
aposentadoria rural, na hipótese de já restar ultimada, em tempo anterior, a carência exigida
legalmente, considerando não só as datas do início de prova mais remoto e da existência do
vínculo empregatício fora da área rural, como também que a prova testemunhal, segura e
coerente, enseje a formação da convicção deste julgador acerca do trabalho campesino
exercido no período.(TRF 3ª REGIÃO, AGRAVO LEGAL EM APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002576-
92.2015.4.03.9999/SP, Rel. DES. FED. DAVI DANTAS, 8ª TURMA, julgado em 14 de dezembro
de 2015, v.u).
No mesmo sentido:Apelação cível nº 2014.03.99.038096-5, Rel. Des. Fed. GILBERTO
JORDAN, TRF 3ª Região, Julgado em 17.12.2014.
Do caso dos autos.
A parte autora nasceu em 17/05/1961 e completou o requisito idade mínima em 17/05/2016,
devendo, assim, demonstrar o efetivo exercício de atividade rural por, no mínimo, 180 meses,
conforme previsto no artigo 142 da Lei nº 8.213/91.
Como início de prova material de seu trabalho no campo, apresentou os seguintes documentos:
- CTPS do marido da autora indicando vínculos urbanos entre 1978 e 1982 e em 1987 e rurais
entre 1985 e 1998;
- CTPS da autora, com anotações de vínculos rurais entre os anos de 1980 e 1986, em 1990 e
1995;
- Certidão de casamento da autora, lavrada em 12/01/1991, na qual ela e o marido, Anizio Dias
de Meira, estão qualificados como lavradores;
Os informes do CNIS da autora (Id. 6646437, págs. 1/28) confirmam os vínculos rurais citados
na CTPS e indicam que efetuou recolhimentos, como facultativo/contribuinte individual, de
01/02/2007 a 28/02/2007, 01/03/2008 a 31/05/2008, 01/05/2013 a 31/08/2013 e de 01/02/2015
a 31/05/2015. Quanto ao marido da requente, confirmam os vínculos citados, indicam que
recebeu auxílio doença previdenciário, a título rural, de 27/09/2001 a 22/09/2004 e que recebe
aposentadoria por invalidez previdenciária, no ramo de atividade “rural”, desde 23/09/2004.
Narra a inicial que a autora sempre laborou na condição de rurícola, ora como boia-fria, ora em
regime de economia familiar.
Requereu o benefício com consectários.
Examinados os autos, a sentença é de ser reformada.
Os documentos oficiais juntados aos autos constituem início razoável de prova material do
trabalho rurícola da autora em nome próprio, como por extensão da atividade rurícola do
marido.
As testemunhas ouvidas em juízo confirmam que a demandante sempre trabalhou como
lavradora, de modo que a prova documental foi corroborada pela prova testemunhal.
Com efeito, a testemunha Roberto José da Silva afirma que é vizinho de chácara da autora, que
ela está no local há mais ou menos doze anos, que reside com esposo e filho, que plantam
verduras diversas, que a produção é vendida na cidade e que não têm empregados, que a
demandante sempre trabalhou na lavoura, que, antes da chácara, ela trabalhava em usina,
empreiteira e fazendas, cita os nomes de diversos locais, que trabalhavam perto, mas em
turmas diferentes.
Aparecida Ratko Suemits U Goes, que conhece a autora de Morro Agudo, declara que ela tem
uma chácara alugada, que, no local, eles cuidam de horta, têm galinha e porco, vendem os
ovos, que a testemunha compra deles, cita nomes de locais e empreiteiros para os quais a
autora já trabalhou, afirma que, desde que a conhece, ela sempre trabalhou na lavoura.
A prova testemunhal colhida confirma o trabalho rural da autora a evidenciar o cumprimento da
carência, não sendo necessária a comprovação de todo o período, uma vez que a prova
testemunhal complementa e corrobora a prova material trazida.
Tais depoimentos corroboram a prova documental apresentada aos autos quanto à atividade
rural, possibilitando a conclusão pela prevalência de efetivo exercício de atividade rural pela
parte autora, apta a tornar viável a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural,
uma vez que, como visto, houve início razoável de prova material corroborado pela prova oral
produzida em juízo, a demonstrar que a parte autora manteve-se de forma predominante nas
lides rurais, em período imediatamente anterior ao requisito etário, tendo sido cumprido o
requisito da imediatidade mínima exigida pelo art. 143 da Lei nº 8.213/91.
Os recolhimentos previdenciários em menor não constituem óbice a concessão do benefício, de
modo que as provas demonstram a predominância do trabalho rural exercido que foi confirmado
pelas testemunhas.
Assim sendo, merece procedência o recurso, razão pela qual a ele dou provimento, para
condenar o INSS a conceder à autora o benefício de aposentadoria por idade rural, no valor de
um salário mínimo mensal com abono anual e consectários legais, conforme a inicial.
Data de início do benefício: Fixo a data inicial na data do requerimento administrativo, em
17/08/2016, quando a autora reuniu os requisitos para a obtenção do benefício.
DA CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA
Com relação à correção monetária, cabe pontuar que o artigo 1º-F, da Lei 9.494/97, com a
redação dada pela Lei nº 11.960/09, foi declarado inconstitucional por arrastamento pelo
Supremo Tribunal Federal, ao julgar as ADIs nos 4.357 e 4.425, mas apenas em relação à
incidência da TR no período compreendido entre a inscrição do crédito em precatório e o efetivo
pagamento.
Isso porque a norma constitucional impugnada nas ADIs (art. 100, §12, da CRFB, incluído pela
EC nº 62/09) referia-se apenas à atualização do precatório e não à atualização da condenação,
que se realiza após a conclusão da fase de conhecimento.
Vislumbrando a necessidade de serem uniformizados e consolidados os diversos atos
normativos afetos à Justiça Federal de Primeiro Grau, bem como os Provimentos da
Corregedoria desta E. Corte de Justiça, a Consolidação Normativa da Corregedoria-Geral da
Justiça Federal da 3ª Região (Provimento COGE nº 64, de 28 de abril 2005) é expressa ao
determinar que, no tocante aos consectários da condenação, devem ser observados os critérios
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos da Justiça Federal.
A respeito do tema, insta considerar que, no dia 20/09/2017, no julgamento do RE nº 870.947,
com repercussão geral reconhecida, o Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou a
inconstitucionalidade da utilização da TR, também para a atualização da condenação.
No mesmo julgamento, em relação aos juros de mora incidentes sobre débitos de natureza não
tributária, como é o caso da disputa com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em
causa, o STF manteve a aplicação do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com redação
dada pela Lei 11.960/2009.
"In casu", como se trata da fase anterior à expedição do precatório, e tendo em vista que a
matéria não está pacificada, há de se concluir que devem ser aplicados os índices previstos
pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor por
ocasião da execução do julgado, em respeito ao Provimento COGE nº 64, de 28 de abril 2005
(AC 00056853020144036126, DESEMBARGADORA FEDERAL TANIA MARANGONI, TRF3 -
OITAVA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/05/2016), observado o entendimento firmado pelo
STF no RE 870.947.
DOS HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS
No caso, a fixação da verba honorária no patamar de 10% do valor atualizadoaté a data desta
decisão,uma vez que a sentença foi julgada improcedente,mostra-se adequada de acordo com
a complexidade da causa e, ademais,é este o patamar reiteradamente aplicado por esta Oitava
Turma nas ações previdenciárias.
Cumpridos os requisitos para percepção do benefício de aposentadoria por idade rural e
considerando seu caráter alimentar, nos termos do art. 300 do CPC,determino que o benefício
seja implantado no prazo de 30 dias, oficiando-se o INSS.
DAS CUSTAS PROCESSUAIS
O STJ entende que o INSS goza de isenção no recolhimento de custas processuais, perante a
Justiça Federal (art. 8º, da Lei nº 8.620/1993). Contudo, a Colenda 5ª Turma desta Corte tem
decidido que, não obstante a isenção da autarquia federal, se ocorreu o prévio recolhimento das
custas processuais pela parte contrária, o reembolso é devido, a teor do artigo 14, § 4º, da Lei
9.289/96, salvo se esta estiver amparada pela gratuidade da Justiça. Na hipótese, a parte
autora é beneficiária da justiça gratuita, não sendo devido, desse modo, o reembolso das custas
processuais pelo INSS.
Diante do exposto,DOU PROVIMENTOà apelação, para conceder o benefício de aposentadoria
por idade rural, desde 17/08/2016, nos termos da fundamentação supra.
É o voto”.
Passo a apreciar o período rural a ser reconhecido, a fim de sanar a aduzida omissão:
Como início de prova material de seu trabalho no campo, a parte autora apresentou os
seguintes documentos:
- CTPS do marido da autora indicando vínculos urbanos entre 1978 e 1982 e em 1987 e rurais
entre 1985 e 1998;
- CTPS da autora, com anotações de vínculos rurais entre os anos de 1980 e 1986, em 1990 e
1995;
- Certidão de casamento da autora, celebrado em 12/01/1991, na qual ela e o marido, Anizio
Dias de Meira, estão qualificados como lavradores;
A testemunha Roberto José da Silva afirma que conhece a autora de Morro Agudo, afirma que
é vizinho de chácara da autora, que ele reside no local há quinze anos e ela está lá há mais ou
menos doze anos, que a autora reside com o marido e o filho e plantam verduras, que o marido
se chama Anizio, que eles vendem a produção, não têm empregados, que trabalham só eles,
que a autora nunca trabalhou na cidade, só na lavoura, que, antes da chácara, ela trabalhou em
fazendas e usinas que cita, que desde que a conhece, a autora sempre trabalhou na roça.
Aparecida Ratko Suemits U Goes, por sua vez, que conhece a autora de Morro Agudo, declara
que são vizinhas atualmente, que a requerente tem uma chácara arrendada, que ela cuida
desta propriedade juntamente com o marido, que, no local, eles cuidam de horta, têm galinha e
porco, vendem os ovos, que a testemunha compra deles, que trabalham só os dois, cita nomes
de locais nos quais a autora laborou, afirma que, desde que a conhece, ela sempre laborou na
lavoura, que trabalharam juntas há uns quarenta anos mais ou menos, que a autora também
trabalhou com empreiteiros, cita os nomes, declara que, na chácara, a autora e esposo
trabalham até os dias atuais, que a última vez em que laboraram juntas foi em 1985.
Considerando que o primeiro registro de labor rural em nome da autora, conforme CTPS
juntada aos autos, data de 01/02/1980 (ID 6646430 – pág. 3) e que a prova testemunhal
confirma a continuidade do labor rural da autora, reconheço em favor da autora o períodorural
de 01/02/1980 a 17/08/2016 (data da DER).
Com relação ao recolhimento de contribuições previdenciárias, mister a observância do artigo
55, § 2°, da Lei n° 8.213/91, que preceitua: "O tempo de serviço do segurado trabalhador rural,
anterior à data de início de vigência desta lei, será computado independentemente do
recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme
dispuser o regulamento”.
Desse dispositivo legal, depreende-se que a atividade rural desempenhada em data anterior a
novembro de 1991pode ser considerada para averbação do tempo de serviço, sem
necessidade de recolhimento de contribuições previdenciárias, exceto para fins de carência.
A partir do advento da Lei 8.213/91, cabe ao segurado especial o recolhimento de contribuições
previdenciárias facultativas, se pretender o cômputo do tempo de serviço rural para fins de
obtenção de outros benefícios que não os arrolados no inciso I do artigo 39.
Nesse sentido, inclusive, a Súmula n.º 272 do Superior Tribunal de Justiça, que expressamente
determina que o segurado especial somente faz jus à aposentadoria por tempo de serviço se
recolher as contribuições facultativas.
Dessa forma, o reconhecimento de período posterior, sem contribuições previdenciárias
facultativas, servirá somente para futura concessão de aposentadoria por idade ou por
invalidez, auxílio-doença, auxílio-reclusão ou pensão, ficando vedado o aproveitamento do
referido período para os demais fins previdenciários,o que não impede a averbação do
respectivo período.
Ressalve-se, então, que o período de atividade rural reconhecido anterior à Lei 8.213/91 não
poderá ser computado para efeito de carência, nos termos do §2º, do art.55, da Lei 8.213/91,
observando-se ainda que o tempo posterior ao advento do mencionado diploma legal somente
poderá ser considerado para efeito de concessão dos benefícios previstos no art.39, inciso I, da
mesma lei, o que deverá constar da certidão de averbação.
Diante do exposto,DOU PROVIMENTOaos embargos de declaração opostos pelo INSS para
sanar a omissão alegada e, com isso, reconhecer o trabalho rural exercido pela autora de
01/02/1980 a 17/08/2016, mantendo-se o benefício concedido, bem como os demais termos do
V. Acórdão embargado.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO
DE TRABALHADOR RURAL. PROVA DOCUMENTAL. PROVA TESTEMUNHAL
CORROBORAÇÃO. OMISSÃO RECONHECIDA. EMBARGOS PROVIDOS.
1.No caso vertente, reconhece-se a ocorrência de omissão no v. acórdão no tocante ao
reconhecimento de período de labor rural em favor da parte autora.
2. Início razoável de prova material que restou corroborado pela prova testemunhal, a ensejar o
reconhecimentodo trabalho rural exercido pela autora de 01/02/1980 a 17/08/2016, mantendo-
se o benefício concedido, bem como os demais termos do V. Acórdão embargado.
3.Ressalva-se que o período de atividade rural reconhecido anterior à Lei 8.213/91 não poderá
ser computado para efeito de carência, nos termos do §2º, do art.55, da Lei 8.213/91,
observando-se ainda que o tempo posterior ao advento do mencionado diploma legal somente
poderá ser considerado para efeito de concessão dos benefícios previstos no art.39, inciso I, da
mesma lei, o que deverá constar da certidão de averbação.
4. Embargos providos. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu DAR PROVIMENTO aos embargos de declaração opostos pelo INSS
para sanar a omissão alegada e, com isso, reconhecer o trabalho rural exercido pela autora de
01/02/1980 a 17/08/2016, mantendo-se o benefício concedido, bem como os demais termos do
V. Acórdão embargado, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
