
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5055459-81.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARCOS FERREIRA BARBOSA
Advogado do(a) APELADO: CLAUDINEI APARECIDO DA SILVA - SP244117-N
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5055459-81.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARCOS FERREIRA BARBOSA
Advogado do(a) APELADO: CLAUDINEI APARECIDO DA SILVA - SP244117-N
R E L A T Ó R I O
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO CONSOLIM (Relator):
Trata-se de embargos de declaração opostos pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em face do acórdão Id 287092984, mediante o qual restou provida parcialmente a apelação do INSS e a remessa oficial tida por ocorrida, para fixar a correção monetária na forma explicitada no voto do acórdão, mantendo, no mais, a sentença a quo, pela qual foi julgado procedente o pedido da parte autora, MARCOS FERREIRA BARBOSA, a fim de reconhecer a especialidade dos períodos de 13.12.1990 a 20.2.1998, 20.2.1998 a 21.9.1998, 5.10.1998 a 15.12.2018 e, por consequência, conceder o benefício de aposentadoria especial, com DIB em 15.12.2018.
A parte embargante sustenta, em síntese, que o acórdão embargado incorreu em vício, uma vez que: a) não observada a determinação de suspensão dos processos, em qualquer fase e em todo o território nacional, que versem sobre o Tema 1.224 do excelso Supremo Tribunal Federal, atinente aos Recursos Especiais 1.905.830/SP, 1.912.784/SP e 1.913.152/SP; b) não observada a determinação de suspensão dos processos, em qualquer fase e em todo o território nacional, que versem sobre o Tema 1.209 do excelso Supremo Tribunal Federal, atinente ao RE 1.368.225, que pode ser aplicado para toda e qualquer atividade considerada ordinariamente como de risco, não apenas à de vigilante; c) os efeitos financeiros foram fixados desde o requerimento administrativo, com base em documentos que não foram apreciados previamente na seara administrativa; d) a determinação de revisão do benefício fundamentou-se em documento não apresentado na ocasião em que o benefício previdenciário foi pleiteado na esfera administrativa, circunstância caracterizadora da falta de interesse de agir da parte autora; e) não foi tratada da circunstância de que desde 6.3.1997 a periculosidade relacionada à atividade por exposição ao “agente nocivo” eletricidade deixou de ser caracterizada como especial. Prequestiona a matéria.
Intimada, a parte contrária apresentou manifestação sobre os embargos de declaração.
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5055459-81.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARCOS FERREIRA BARBOSA
Advogado do(a) APELADO: CLAUDINEI APARECIDO DA SILVA - SP244117-N
V O T O
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO CONSOLIM (Relator):
Nos termos do artigo 1.022 do Código de Processo Civil, os embargos de declaração são o instrumento processual adequado para a integração do julgado nas hipóteses de omissão, obscuridade ou contradição, podendo também ser utilizados para a correção de vício ou erro material.
Ausentes as hipóteses previstas no aludido dispositivo legal, compete à parte inconformada com o teor da decisão, lançar mão dos recursos cabíveis com o fim de obter a reforma do ato judicial, já que os embargos de declaração não se prestam à manifestação de inconformismo ou à rediscussão do julgado. Nesse sentido: STJ, ED no MS n. 17963/DF, Primeira Seção, Relator Ministro PAULO SERGIO DOMINGUES, DJe 14.3.2023.
Ainda que se pretenda a análise da matéria à finalidade de prequestionamento, para o conhecimento dos embargos de declaração é necessária a demonstração de um dos vícios enumerados na norma processual citada. Nesse sentido:
“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO E OBSCURIDADE. INEXISTÊNCIA. PRETENSÃO DE REJULGAMENTO DO RECURSO. IMPOSSIBILIDADE. EMBARGOS REJEITADOS.
1. Os embargos de declaração poderão ser opostos com a finalidade de eliminar da decisão qualquer erro material, obscuridade, contradição ou suprir omissão sobre ponto acerca do qual se impunha pronunciamento, o que não é o caso dos autos.
2. Na esteira da uníssona jurisprudência desta Corte de Justiça, os embargos de declaração não constituem instrumento adequado ao prequestionamento, com vistas à futura interposição de recurso extraordinário, razão pela qual, para tal escopo, também não merecem prosperar.
3. Embargos de declaração rejeitados”.
(STJ - EDcl no AgInt nos EDcl no AREsp 1929948 SC 2021/0224604-0, Terceira Turma, Relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, DJe 7.4.2022)
Feitas essas considerações, anoto que, ao afetar o REsp n. 1.905.830 ao rito dos recursos repetitivos, a Primeira Turma do colendo Superior Tribunal de Justiça delimitou a seguinte questão de direito controvertida: “Definir o termo inicial dos efeitos financeiros dos benefícios previdenciários concedidos ou revisados judicialmente, por meio de prova não submetida ao crivo administrativo do INSS: se a contar da data do requerimento administrativo ou da citação da autarquia previdenciária”.
Na decisão de afetação, o Ministro HERMAN BENJAMIN relatou que o acórdão recorrido condenou o INSS a conceder benefício previdenciário a segurado desde a DER e que, em suas razões recursais, a autarquia sustentou que: a Certidão de Tempo de Contribuição - CTC, documento imprescindível para a comprovação de que o tempo nela certificado não foi utilizado em regime próprio, foi emitida somente após a data do requerimento administrativo; só tomou conhecimento daquela certidão por ocasião de sua citação na ação judicial; e que o pedido de concessão do benefício de aposentadoria da parte autora foi analisado, na época, de acordo com os elementos de que a autarquia previdenciária dispunha a respeito da parte autora. Na referida decisão, ainda restou consignado que, ao admitir o Recurso Especial interposto, a Vice-Presidência do Tribunal Regional Federal da 3.ª Região registrou que: segundo as razões recursais do INSS, não há interesse de agir para a ação judicial quando o segurado, a despeito de ter realizado requerimento administrativo, não apresenta, na seara administrativa, documentação idônea para viabilizar a concessão do benefício pleiteado, vindo a apresentar ou produzir essa prova somente em Juízo; por ocasião do julgamento do RESP n. 1.369.834/SP, o colendo Superior Tribunal de Justiça aderiu ao entendimento consolidado pelo excelso Supremo Tribunal Federal no RE n. 631.240/MG, julgado sob o regime da repercussão geral, definindo que a concessão de benefícios previdenciários depende, como regra, de prévio requerimento administrativo, sem o qual é legítimo ao juiz extinguir processo judicial, sem resolução do mérito, por ausência de condição da ação (interesse de agir); e que a matéria tratada no recurso admitido distingue-se daquela tratada no RE n.631.240/MG, uma vez que houve prévio requerimento administrativo e o indeferimento do pedido pelo INSS decorreu da não apresentação de provas acerca de fatos anteriores ou contemporâneos ao requerimento.
No presente feito, o segurado formulou requerimento administrativo em 23.1.2019 (Id 258960633, p. 4), o qual foi indeferido, situação que afasta a alegação de falta de interesse processual suscitada, nos termos definidos no RE n.631.240/MG.
Nessa esteira, em relação ao termo inicial dos efeitos financeiros, à vista da afetação do Tema n. 1.124, conforme o acima assinalado, cumpre consignar que a sua solução dar-se-á por ocasião da liquidação do julgado, observando-se o que for decidido no aludido paradigma.
Agregue-se a pertinência de se ressaltar que o entendimento a ser firmado pelo colendo Superior Tribunal de Justiça, acerca do Tema 1124, não traz consigo a necessidade de suspensão processual, uma vez que a respectiva diretriz a ser implantada surtirá impactos apenas na fase de cumprimento da sentença. Nesse sentido: TRF/3.ª, ApCiv n. 5187175-08.2020.4.03.9999, Oitava Turma, Relatora Desembargadora Federal THEREZINHA CAZERTA, Intimação via sistema em 14.12.2022.
Outrossim, afasto a alegação de necessidade de sobrestamento do feito pelo Tema 1.209, uma vez que decisão proferida pelo excelso Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário 1.368.225, publicada em 26.4.2022, refere-se à atividade de vigilante, não se aplicando ao presente feito, que analisa a possibilidade de reconhecimento de atividade especial com exposição ao agente nocivo eletricidade.
Nesse contexto, impõe-se reconhecer que tais argumentos relacionados à necessidade de suspensão do processo suscitados pelo INSS nestes embargos de declaração não possuem respaldo jurídico.
De outra parte, verifico que o acórdão embargado, apesar de confirmar a especialidade das condições de trabalho ratificada pela sentença a quo – tema relacionado a exposição a altas tensões elétricas –, deixou de analisar específica questão apresentada pelo INSS, razão pela qual passo às considerações pertinentes.
Pela via da integração por este julgado, passo aos esclarecimentos pertinentes à questão trazida pela embargante.
Observo que malgrado o item 1.1.8 do Decreto n. 53.831/1964 reconhecesse a nocividade por exposição ao agente “tensão elétrica” superior a 250 volts, essa disposição não foi mantida no Decreto n. 2.172/1997, o que resultou na exclusão da eletricidade do rol de agentes insalubres.
No entanto, no julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia n. 1.306.113, atinente ao Tema n. 534, o colendo Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que é possível o enquadramento por exposição a tensões elétricas mesmo após a edição do Decreto n. 2.172/1997. Neste sentido:
“RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTE ELETRICIDADE. SUPRESSÃO PELO DECRETO 2.172/1997 (ANEXO IV). ARTS. 57 E 58 DA LEI 8.213/1991. ROL DE ATIVIDADES E AGENTES NOCIVOS. CARÁTER EXEMPLIFICATIVO. AGENTES PREJUDICIAIS NÃO PREVISTOS. REQUISITOS PARA CARACTERIZAÇÃO. SUPORTE TÉCNICO MÉDICO E JURÍDICO. EXPOSIÇÃO PERMANENTE, NÃO OCASIONAL NEM INTERMITENTE (ART. 57, § 3º, DA LEI 8.213/1991).
1. Trata-se de Recurso Especial interposto pela autarquia previdenciária com o escopo de prevalecer a tese de que a supressão do agente eletricidade do rol de agentes nocivos pelo Decreto 2.172/1997 (Anexo IV) culmina na impossibilidade de configuração como tempo especial (arts. 57 e 58 da Lei 8.213/1991) de tal hipótese a partir da vigência do citado ato normativo.
2. À luz da interpretação sistemática, as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991). Precedentes do STJ.
3. No caso concreto, o Tribunal de origem embasou-se em elementos técnicos (laudo pericial) e na legislação trabalhista para reputar como especial o trabalho exercido pelo recorrido, por consequência da exposição habitual à eletricidade, o que está de acordo com o entendimento fixado pelo STJ.
4. Recurso Especial não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.
(STJ, REsp n. 1.306.113/SC, Primeira Seção, Relator Ministro HERMAN BENJAMIN, DJe 7.3.2013, grifei).
Esta Corte Regional também pronunciou-se no sentido de que a exposição do trabalhador a tensões elétricas superiores a 250 volts enseja o reconhecimento da especialidade das condições de trabalho. Nesse sentido:
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. ELETRICIDADE. RISCO À INTEGRIDADE FÍSICA. OBSCURIDADE INEXISTENTE. PREQUESTIONAMENTO.
(omissis)
III - Em se tratando de exposição a altas tensões elétricas, que tem o caráter de periculosidade, a caracterização em atividade especial independe da exposição do segurado durante toda a jornada de trabalho, pois que a mínima exposição oferece potencial risco de morte ao trabalhador, justificando o enquadramento especial.
IV - O artigo 58 da Lei 8.213/91 garante a contagem diferenciada para fins previdenciários ao trabalhador que exerce atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física (perigosa).
V - Tendo em vista que a atividade profissional desempenhada pelo autor o expunha de forma habitual e permanente à tensão elétrica acima de 250 volts, mantidos os termos da decisão agravada que reconheceu o exercício de atividade especial por risco à integridade física do requerente, agente nocivo previsto no código 1.1.8 do Decreto 53.831/64.
(omissis)
(TRF/3ª Região, AC 0035340-68.2014.4.03.9999, Décima Turma, Relator Desembargador Federal SÉRGIO NASCIMENTO, e-DJF3 3.6.2015).
Anoto, por oportuno, a tese firmada por ocasião do julgamento do PEDILEF 0501567-42.2017.4.05.8405/RN, atinente ao Tema TNU n. 210:
“Para aplicação do artigo 57, § 3.º, da Lei n. 8.213/91 à tensão elétrica superior a 250 V, exige-se a probabilidade da exposição ocupacional, avaliando-se, de acordo com a profissiografia, o seu caráter indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, independente de tempo mínimo de exposição durante a jornada.”
No caso dos autos, a especialidade das condições de trabalho foi reconhecida em razão da constatação de exposição, de forma habitual e permanente, à tensão elétrica acima do limite de tolerância.
Ante o exposto, acolho parcialmente os embargos de declaração, para, com acréscimo de fundamento, tão somente, suprimir do acórdão embargado a omissão apontada, sem efeitos infringentes, consoante a fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL OMISSÃO. AGENTE NOCIVO ELETRICIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PARCIALMENTE ACOLHIDOS SEM EFEITOS INFRINGENTES.
1. Nos termos do artigo 1.022 do Código de Processo Civil, os embargos de declaração são o instrumento processual adequado para a integração do julgado nas hipóteses de omissão, obscuridade ou contradição, podendo também ser utilizados para a correção de vício ou erro material.
2. O segurado formulou requerimento administrativo, que foi indeferido, situação que afasta a alegação de falta de interesse processual suscitada, nos termos definidos no RE n.631.240/MG.
3. Relativamente ao termo inicial dos efeitos financeiros, à vista da afetação do Tema n. 1.124, cumpre consignar que a sua solução dar-se-á por ocasião da liquidação do julgado, observando-se o que for decidido no aludido paradigma.
4. Afastada a alegação de necessidade de sobrestamento do feito pelo Tema 1.209, uma vez que decisão proferida pelo excelso Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário 1.368.225, publicada em 26.4.2022, refere-se à atividade de vigilante, não se aplicando ao presente feito, que analisa a possibilidade de reconhecimento de atividade especial com exposição ao agente nocivo eletricidade.
5. No julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia n. 1.306.113, atinente ao Tema n. 534, o colendo Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que é possível o enquadramento por exposição a tensões elétricas mesmo após a edição do Decreto n. 2.172/1997.
6. A especialidade das condições de trabalho foi reconhecida em razão da constatação de exposição, de forma habitual e permanente, à tensão elétrica acima do limite de tolerância.
7. Embargos de declaração parcialmente acolhidos, para, com acréscimo de fundamento, tão somente, suprimir do acórdão embargado a omissão apontada, sem efeitos infringentes.
