
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5144814-39.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: IVAIR LUIZ BORGES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: LUIS MANOEL FULGUEIRAL BELL - SP328766-N, REGINA CRISTINA FULGUERAL - SP122295-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, IVAIR LUIZ BORGES
Advogados do(a) APELADO: LUIS MANOEL FULGUEIRAL BELL - SP328766-N, REGINA CRISTINA FULGUERAL - SP122295-N
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5144814-39.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: IVAIR LUIZ BORGES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: LUIS MANOEL FULGUEIRAL BELL - SP328766-N, REGINA CRISTINA FULGUERAL - SP122295-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, IVAIR LUIZ BORGES
Advogados do(a) APELADO: LUIS MANOEL FULGUEIRAL BELL - SP328766-N, REGINA CRISTINA FULGUERAL - SP122295-N
R E L A T Ó R I O
Trata-se de embargos de declaração interpostos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em face do acórdão proferido por esta Nona Turma que rejeitou a matéria preliminar e, no mérito, negou provimento à apelação da autarquia e deu parcial provimento à apelação da parte autora.
A parte embargante alega, precipuamente, a ocorrência de vício no julgado quanto ao reconhecimento da especialidade do período laboral exercido em lavoura de cana-de-açúcar, sustentando, em síntese, a impossibilidade de enquadramento dessa atividade no item 2.2.1 do Decreto n. 53.831/1964 (trabalhadores na agropecuária) e a ocorrência de omissão no julgado quanto ao uso de EPI eficaz.
Ao apreciar a questão, esta Nona Turma negou provimento aos embargos de declaração.
Em razão do provimento ao recurso especial interposto pelo INSS nestes autos, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou o acórdão que apreciou os embargos de declaração e determinou o retorno dos autos a este Tribunal, a fim de que seja realizado novo julgamento com o expresso enfrentamento das questões tidas por omitidas.
Transitada em julgado a decisão do STJ, os autos foram remetidos a esta Corte.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5144814-39.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: IVAIR LUIZ BORGES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: LUIS MANOEL FULGUEIRAL BELL - SP328766-N, REGINA CRISTINA FULGUERAL - SP122295-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, IVAIR LUIZ BORGES
Advogados do(a) APELADO: LUIS MANOEL FULGUEIRAL BELL - SP328766-N, REGINA CRISTINA FULGUERAL - SP122295-N
V O T O
Em cumprimento ao deliberado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em sede de recurso especial, passo a novo julgamento dos embargos de declaração.
O artigo 1.022 do Código de Processo Civil (CPC) admite embargos de declaração quando, na sentença ou no acórdão, houver obscuridade, contradição ou omissão de ponto sobre o qual devia pronunciar-se o juiz ou o tribunal. Também admite embargos de declaração para correção de erro material, em seu inciso III.
Efetivamente, o acórdão embargado manifestou-se sobre o período de atividade exercido nas lavouras de cana de açúcar, nos seguintes termos:
“Neste caso, em relação ao interstício de 26/08/1985 a 23/02/1986, a parte autora logrou demonstrar, via Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), o exercício das funções de plantio, carpa e colheita de cana-de-açúcar, atividades que comportam o enquadramento perseguido, nos termos do entendimento firmando nesta Nona Turma, em razão da penosidade e exposição a hidrocarbonetos policíclicos aromáticos, consoante artigo da Revista Brasileira de Medicina do Trabalho (De Abreu, Dirce et al. A produção da cana-de-açúcar no Brasil e a saúde do trabalhador rural. Revista Brasileira de Medicina do Trabalho, v. 9, n. 2, p. 49-61, 2011. Disponível em: <http://hdl.handle.net/11449/72967>.)”
Como se nota, o julgado não indicou, em momento algum, ter havido enquadramento pela categoria profissional, nos termos do item 2.2.1 do Decreto n. 53.831/1964.
De toda forma, a hipótese em debate não comportaria esse enquadramento, nos termos já estabelecidos pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em pedido de uniformização de lei:
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. EMPREGADO RURAL. LAVOURA DA CANA-DE-AÇÚCAR. EQUIPARAÇÃO. CATEGORIA PROFISSIONAL. ATIVIDADE AGROPECUÁRIA. DECRETO 53.831/1964. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES.
1. Trata-se, na origem, de Ação de Concessão de Aposentadoria por Tempo de Contribuição em que a parte requerida pleiteia a conversão de tempo especial em comum de período em que trabalhou na Usina Bom Jesus (18.8.1975 a 27.4.1995) na lavoura da cana-de-açúcar como empregado rural.
2. O ponto controvertido da presente análise é se o trabalhador rural da lavoura da cana-de-açúcar empregado rural poderia ou não ser enquadrado na categoria profissional de trabalhador da agropecuária constante no item 2.2.1 do Decreto 53.831/1964 vigente à época da prestação dos serviços.
3. Está pacificado no STJ o entendimento de que a lei que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação do labor. Nessa mesma linha: REsp 1.151.363/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011; REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 19.12.2012, ambos julgados sob o regime do art. 543-C do CPC (Tema 694 - REsp 1398260/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 5/12/2014).
4. O STJ possui precedentes no sentido de que o trabalhador rural (seja empregado rural ou segurado especial) que não demonstre o exercício de seu labor na agropecuária, nos termos do enquadramento por categoria profissional vigente até a edição da Lei 9.032/1995, não possui o direito subjetivo à conversão ou contagem como tempo especial para fins de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição ou aposentadoria especial, respectivamente. A propósito: AgInt no AREsp 928.224/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 8/11/2016; AgInt no AREsp 860.631/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 16/6/2016; REsp 1.309.245/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 22/10/2015; AgRg no REsp 1.084.268/SP, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJe 13/3/2013; AgRg no REsp 1.217.756/RS, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, DJe 26/9/2012; AgRg nos EDcl no AREsp 8.138/RS, Rel. Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, DJe 9/11/2011; AgRg no REsp 1.208.587/RS, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 13/10/2011; AgRg no REsp 909.036/SP, Rel. Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, DJ 12/11/2007, p. 329; REsp 291.404/SP, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJ 2/8/2004, p. 576.
5. Pedido de Uniformização de Jurisprudência de Lei procedente para não equiparar a categoria profissional de agropecuária à atividade exercida pelo empregado rural na lavoura da cana-de-açúcar.”
(PUIL 452/PE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08/05/2019, DJe 14/06/2019)
Não obstante, remanesce a possibilidade de enquadramento do período debatido como exercido sob condições especiais, em razão da sujeição do autor aos agentes nocivos destacados no acórdão embargado.
Nesse aspecto, a atividade desenvolvida nas lavouras de cana-de-açúcar envolve desgaste físico excessivo, sujeição a hidrocarbonetos policíclicos aromáticos, além do contato com a fuligem da cana-de-açúcar, o que demonstra a extrema penosidade da função.
Esse também é o entendimento desta Nona Turma: ApCiv 5555531-16.2019.4.03.9999, Desembargador Federal Gilberto Rodrigues Jordan, Data: 9/8/2019; ApCiv 0000424-68.2015.4.03.6120, Desembargadora Federal Marisa Santos, e-DJF3: 7/8/2019.
De fato, diante do conjunto probatório apresentado, sobretudo do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), o julgado recorrido consignou a compreensão de que o autor estava sujeito a hidrocarbonetos policíclicos aromáticos, a possibilitar o enquadramento do período debatido no código 1.2.10 do anexo do Decreto n. 83.080/1979.
Em relação à impugnação da autarquia ao enquadramento dos períodos de exposição a agentes químicos deletérios posteriores a 2/12/1998, apesar da indicação de utilização de Equipamento de Proteção Individual (EPI) eficaz, o decisum embargado assentou:
“Em relação ao período de 02/04/2000 a 30/04/2007, a parte autora logrou demonstrar, via PPP e laudo técnico, a exposição habitual e permanente a agentes químicos defensivos agrícolas (glifosato - herbicida organofosforado) - situação que autoriza o enquadramento nos códigos 1.2.6 do anexo dos Decretos n. 53.831/1964 e 83.080/1979, e 1.0.12 do anexo do Decreto n. 3.048/1999.
(...)
Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na hipótese, o EPI não é realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
O campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
Avaliou-se, desse modo, a real eficácia do uso de EPI, considerando as atividades desempenhadas pela parte autora e as teses fixadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral (Tema n. 555).
Nesse contexto, há informação no laudo técnico (id 174597844) de que: “em algumas situações de Risco de Acidente é utilizado o EPI como proteção eficaz, em outras situações segue como recomendações”.
Assim, no caso concreto, embora indicada a existência desses equipamentos no PPP, existe dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade dos agentes químicos, situação em que o reconhecimento da especialidade deve ser mantido.
Diante do exposto, à luz do determinado pelo STJ, dou parcial provimento aos embargos de declaração, para, nos termos da fundamentação, aclarar o julgado, sem efeito infringente.
É o voto.
E M E N T A
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PREVIDENCIÁRIO. NOVO JULGAMENTO À LUZ DO DETERMINADO PELO STJ.
- O artigo 1.022 do CPC admite embargos de declaração quando, na sentença ou no acórdão, houver obscuridade, contradição ou omissão de ponto sobre o qual devia pronunciar-se o juiz ou o tribunal, ou ainda para correção de erro material (inciso III).
- Não cabe equiparar a categoria profissional de agropecuária (item 2.2.1 do Decreto n. 53.831/1964) à atividade exercida pelo empregado rural na lavoura da cana de açúcar. Precedentes do STJ.
- Remanesce, contudo, o reconhecimento dos períodos debatidos como exercidos sob condições especiais, em razão da sujeição do autor a agentes nocivos (hidrocarbonetos policíclicos aromáticos), a possibilitar o enquadramento no código 1.2.10 do anexo do Decreto n. 83.080/1979.
- O campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares.
- A especialidade da atividade não é afastada na hipótese em que o EPI fornecido é incapaz de descaracterizar completamente a nocividade, consideradas as atividades desempenhadas pela parte autora e aspectos relevantes ao caso concreto.
- Embargos de declaração, reapreciados à luz do determinado pelo STJ, parcialmente providos.
